sábado, 14 de maio de 2022

MÚSICA: FORA DA ORDEM - CAETANO VELOSO - COM GABARITO

 Música: Fora da Ordem 

                 Caetano Veloso

Vapor barato, um mero serviçal do narcotráfico

Foi encontrado na ruína de uma escola em construção

Aqui tudo parece que é ainda construção e já é ruína

Tudo é menino e menina no olho da rua

O asfalto, a ponte, o viaduto ganindo pra lua

Nada continua

E o cano da pistola que as crianças mordem

Reflete todas as cores da paisagem da cidade que é muito mais bonita e muito mais intensa do que no cartão-postal

 

Alguma coisa está fora da ordem

Fora da nova ordem mundial...

 

Escuras coxas duras tuas duas de acrobata mulata

Tua batata da perna moderna, a trupe intrépida em que fluis

Te encontro em Sampa de onde mal se vê quem sobe e desce a rampa

Alguma coisa em nossa transa é quase luz forte demais

Parece pôr tudo à prova, parece fogo, parece, parece paz

Parece paz

Pletora de alegria, um show de Jorge Benjor dentro de nós

É muito, é grande, é total

 

Alguma coisa está fora da ordem

Fora da nova ordem mundial...

 

Meu canto esconde-se como um bando de ianomâmis na floresta

Na minha testa caem, vêm colocar-se plumas de um velho cocar

Estou de pé em cima do monte de imundo lixo baiano

Cuspo chicletes do ódio no esgoto exposto do Leblon

Mas retribuo a piscadela do garoto de frente do Trianon

Eu sei o que é bom

Eu não espero pelo dia em que todos os homens concordem

Apenas sei de diversas harmonias bonitas possíveis sem juízo final

 

Alguma coisa está fora da ordem

Fora da nova ordem mundial... 

VELOSO, Caetano. Circuladô, Polygrm, 1991.

Fonte: Livro – Viva Português 2° – Ensino médio – Língua portuguesa – 1ª edição 1ª impressão – São Paulo – 2011. Ed. Ática. p. 63-5.

Entendendo a música:

01 – De acordo com o texto, qual o significado das palavras abaixo:

·        Fluir: correr brandamente, dirigir-se com suavidade.

·        Ianomâmi: comunidade indígena que habita o norte da Amazônia, em diversos pontos da fronteira entre Brasil e Venezuela.

·        Leblon: bairro da cidade do Rio de Janeiro.

·        Pletora: exuberância, superabundância de energia.

·        Trianon: parque da cidade de São Paulo.

·        Trupe: grupo de artistas.

·        Vapor barato: o equivalente ao soldado raso, na hierarquia do tráfico de drogas.

02 – Alguns versos de “Fora da ordem” apresentam contradições que reforçam o título da música. Veja, por exemplo, nos versos abaixo, que a contradição entre construção e ruína cria a ideia de que, no Brasil, tudo acaba antes de começar.

        “Foi encontrado na ruína de uma escola em construção

         Aqui tudo parece que é ainda construção e já é ruína.”

No verso “Tudo é menino e menina no olho da rua” também podemos ver uma contradição que confirma a ideia de que nada continua. Vamos analisar:

a)   Quem são os meninos e as meninas a que o eu lírico se refere nesse trecho?

São as crianças abandonadas.

b)   O que significa a expressão "olho da rua"?

“Olho da rua” é o lugar para onde se vai quando se é expulso, despedido ou enjeitado, abandonado.

c)   Relacione esse verso à ideia de que "nada continua":

Toda criança que vai parar na rua tem seu desenvolvimento interrompido.

03 – Releia os três últimos versos da primeira estrofe.

a)   Que diferença pode haver entre a paisagem da cidade refletida no "cano da pistola que as crianças mordem" e a paisagem retratada no cartão-postal?

A cidade revelada pelo cano da pistola é a cidade onde há, também, violência, insegurança, injustiça. É, entretanto, a cidade verdadeira. Já os cartões-postais costumam mostra apenas paisagens limpas, bem cuidadas, onde não se percebem desigualdades sociais, etc. Seriam as partes mais bonitas, porém menos fiéis à realidade e menos vivas.

b)   Pode-se perceber uma crítica na própria composição de um trecho como "cano da pistola que as crianças mordem". O que esse trecho expõe?

Ao dizer que a criança morde o cano da pistola, o texto revela que, para muitas crianças, só a violência é oferecida. Elas não recebem os cuidados e a proteção de que necessitam; em vez disso, são submetidas à convivência com a violência e as armas. Esse trecho ainda nos traz à mente a chocante imagem de alguém ameaçado com uma arma na boca.

04 – A letra da canção sugere um percurso do eu lírico por vários lugares do Brasil.

a)   Procure identificar as palavras, nomes ou expressões que fazem referência a algum lugar do país (cidade, estado, região) e indique no caderno quais são os lugares.

Sampa (São Paulo), Rampa (Brasília, pela referência à rampa do Palácio do Planalto, sede do Governo Federal), Floresta (os estados por onde se estende a floresta Amazônica), Lixo baiano (Bahia), Leblon (Rio de Janeiro), Trianon (São Paulo).

b)   Que problema o eu lírico associa a cada um desses lugares?

Sampa: de lá mal se vê quem sobe ou desce a rampa (quem está ou deixa o poder); Floresta: os Ianomâmis são obrigados a viver escondidos, tentando proteger-se se armas à sua sobrevivência e à sua dignidade; Bahia: um monte de imundo lixo; Leblon: esgoto exposto; Trianon: garoto de frete (prostituição masculina).

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário