CRÔNICA: AMARREM
OS CINTOS E NÃO FUMEM
Carlos Eduardo Novaes
“Atenção, senhores passageiros para o Leblon,
queiram apresentar-se ao poste de embarque”. Me despedi rapidamente das duas
tias, três primos, uma cunhada, ouvi as apressadas recomendações de minha mãe
para que ficasse sempre atento olhando pela janelinha e antes de entrar ainda
acenei dos degraus do ônibus. Instalei-me, obedecendo ao painel luminoso que
dizia “aperte os cintos e não fume”. Logo depois o motorista acionou os
motores, (…) e só não levantou voo pela Rua do Catete porque os engarrafamentos
não deram espaço para a decolagem.
Não tínhamos ainda nem fechado dez
carros e o trocador veio à frente do ônibus explicando que como iríamos passar
pela orla marítima teríamos que aprender – para qualquer emergência – a colocar
o colete salva-vidas. O senhor ao meu lado ouvia atento o trocador. Pensei que
talvez estivesse fazendo sua primeira viagem de ônibus.
– É verdade, para o Leblon é a
primeira. – E interrompido por uma brusca freada, aproveitou para perguntar se
a viagem era toda assim.
– Só nos sinais – respondi.
–
E tem muitos sinais até o Leblon?
– Uns 500. Deve ter mais sinal do que
rua.
À minha frente, uma senhora quis saber
do trocador se estávamos no horário. “Estamos atrasados uns quinze minutos” -
disse ele. “E se não pegarmos mais do que seis congestionamentos poderemos
chagar ao Leblon por volta das oito horas”. Para quebrar um pouco a tensão da
viagem, aproveitei e perguntei à senhora o que iria fazer no Leblon.
– Vou visitar uma tia. E o senhor?
– Eu vou a negócios (se for bem
sucedido – pensei, mas não disse – volto de táxi).
Era evidente que o meu vizinho não
estava preparado para a viagem. Quando abalroamos o terceiro carro, ameaçou
saltar. Levantou-se, mas ao olhar para fora percebeu que estávamos em cima do
viaduto. Ficou lívido. Querendo distraí-lo, ainda comentei: “É bonita a vista
daqui, não?” – Ele não me ouviu. Estava preocupado com os roncos e os mais
estranhos ruídos que saíam do ônibus: “Que barulho é esse?” indagou.
– É do ônibus mesmo – disse um cidadão
sentado atrás.
– Mas esse ônibus está em péssimo
estado – comentou meu vizinho.
– É verdade – voltou o cidadão que
gostava de frases feitas – mas não se esqueça que cada coletividade tem um
coletivo que merece.
A viagem prosseguiu normal, ou seja:
cheia de solavancos, batidas, freadas súbitas e imprudências – a curva que
fizemos ao entrar na Barata Ribeiro foi de deixar envergonhada a Esquadrilha da
Fumaça. Às 11 horas, então, desembarcamos no Leblon. Antes do ônibus parar,
observei pela janelinha que todos os meus parentes que moram no bairro estavam
me aguardando. Me despedi do motorista, do trocador e desci à procura de um
telefone.
– Um telefone para quê? perguntou meu
primo que pratica surf.
– Pra avisar lá em casa que cheguei
vivo.
CARLOS
EDUARDO NOVAES. Travessia da Via Crucis.
Rio de Janeiro,
Editorial Nórdica, 1975.
Entendendo
o texto:
01 –
Damos algumas definições através das quais você deve localizar, no texto, as
palavras que se enquadram nelas.
a) pôr em
movimento: Acionar.
b) beira,
margem: Orla.
c) algo
acontecido, ocorrido: Sucedido.
d) ir de
encontro, chocar-se violentamente: Abalroar.
e) pálido:
Lívido.
f) que
surgem sem ser previstas: Súbitas.
02 – Ao dizer:
“Atenção, senhores passageiros para o Leblon, queiram apresentar-se ao poste de
embarque”, o Autor está ironizando, utilizando a forma de convocar os
passageiros de outro veículo de transporte. Que veículo é esse?
O avião.
03 – Em que
outros momentos do texto o Autor compara, ironicamente, o ônibus ao avião?
Transcreva os trechos.
“Aperte o cinto e não fume”; “… e só não
levantou voo pela Rua do Catete porque os engarrafamentos não deram espaço para
a decolagem”; “…colocar o colete salva-vidas.”
04 – O que
são frases feitas? Retire um exemplo do texto.
São frases organizadas com determinadas
palavras que encerram uma ideia. São também conhecidas como “ditos populares”
tais como: “Cada macaco no seu galho”, “Quem ama o feio, bonito lhe parece”. No
texto encontramos: “Cada coletividade tem o coletivo que merece”.
05 – O que
o Autor entende por viagem normal, no texto?
Viagem “cheia de solavancos, batidas,
freadas súbitas e imprudência…”
06 – Que tipo
de crítica faz o Autor no texto?
Critica a velocidade exagerada dos
ônibus, na cidade do Rio de Janeiro.
07 – Qual
a sua opinião e o que deve ser feito a respeito de um motorista de ônibus que
exagera na velocidade ao dirigir o veículo?
Resposta pessoal do aluno.
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