segunda-feira, 11 de maio de 2020

ENTREVISTA: O VOVÔ MALUQUINHO - ANDRÉA CAPELATO - COM GABARITO

Entrevista: O vovô maluquinho
                    Andréa Capelato

            O menino maluquinho, a mais conhecida criação de Ziraldo, completa 18 anos e já faz parte do imaginário brasileiro

        Enquanto o Menino Maluquinho atinge a sua maioridade – embora nas páginas do livro continue tendo 11 anos –, seu criador se prepara para comemorar 50 anos de carreira no ano que vem. Também ele, embora já avô de quatro netos, continua na contramão do tempo. Ziraldo Alves Pinto, 65 anos, desenha e escreve um Brasil diferente, que parece sair direto das suas lembranças da infância nos anos 40 no interior de Minas.
        Há inocência, alegria e otimismo de sobra no Brasil de Ziraldo. Seu traço econômico e preciso e suas histórias com enredos sentimentais têm uma rara empatia com a emoção das crianças. A obra do artista resiste à modernidade globalizada e cosmopolita, trazendo ao universo infantil os valores da tradição, da família, do interior. Aquele interior onde aprendeu a ler o mundo. O filho mais velho de dona Zizinha e de seu Geraldo desde cedo foi estimulado a gostar dos livros, que eram seus presentes preferidos. Podia também desenhar onde quisesse, até nas paredes da casa.
        Desde seu primeiro emprego de ajudante de empório, aos nove anos, Ziraldo já fez de tudo: foi aprendiz de tipografia, auxiliar de cartório, bancário, publicitário, redator, funcionário do Ministério da Cultura... Mas o seu destino seria mesmo divertir a criançada. “Sem perceber, acabei me preparando para isso a toda”, afirmou certa vez. Criador de A Turma do Pererê, de Flicts, de O Menino Maluquinho, de Uma Professora Bem Maluquinha e de mais de 60 outros títulos já publicados, Ziraldo é um dos maiores sucessos de literatura infantil desde Monteiro Lobato: mais de três milhões de exemplares vendidos. Na opinião dele, a escola deveria se preocupar mais em ensinar o aluno a gostar da leitura do que em passar os conteúdos curriculares. “Ler é mais importante do que estudar”, não se cansa de repetir.
        Na entrevista a seguir que concedeu a Pais&Teens em maio deste ano, ele fala sobre isso e também sobre a sua visão da adolescência. Aliás, Ziraldo ainda nos deve o Menino Maluquinho adolescente.

        Pais&Teens – Dá para contar um pouco sobre a sua adolescência?

        Ziraldo – Ah, não vou contar não. Ou melhor, deixa eu simplificar. Eu era um menino que gostava de desenhar. A minha lembrança mais antiga sou eu desenhando; deitado no chão e desenhando. Eu era o menino que sabia desenhar, que sabia tudo sobre a guerra, que gostava de ficar na sala ouvindo a conversa dos adultos. E que, logo que aprendeu a ler, não parou mais. Fiz o grupo escolar e o ginásio em Caratinga, no interior de Minas. Depois, vim para o Rio de Janeiro, fui adolescente no Rio com férias em Caratinga para descobrir a alegria que pode te dar o olhar da mulher...

        Pais&Teens – Como chegou à carreira de cartunista? Quando se decidiu por essa vocação?

        Ziraldo – Vim vindo. De pequeno eu já sabia o que queria. É preciso ter vocação e obstinação. Vocação só é pouco. Ah, sim: é bom também ter talento.

        Pais&Teens – Para que público você gosta mais de criar?

        Ziraldo – Eu gosto de desenhar, de ilustrar, de pintar e de escrever. Não necessariamente nesta ordem. Ultimamente ando gostando muito mais de escrever. Mas escrever é mais difícil do que desenhar, muito mais envolvente, muito mais perigoso... Escrever para criança, para quem gosta de carinho, é muito gratificante.
        [...]

        Pais&Teens – Como você vê a questão dos limites e da disciplina para o adolescente de hoje, tanto na família como dentro da escola?

        Ziraldo – Todo mundo precisa de limite. Todo mundo precisa de regra, todo mundo tem de saber que a cada direito corresponde um dever. Não há possibilidade de convivência sem que se observem estes princípios tão politicamente corretos. Quando o adolescente descobre o mundo, ele o descobre por seus próprios instintos. E tem força, sabedoria, talento, disposição, neurônios, razões, energia bastantes para mudar tudo! “Saiam da frente que, finalmente, chegou o que detém a verdade!” De fato, o ser humano nasce criança, vai formando sua personalidade (ou melhor, vai construindo uma personalidade cujo alicerce já está no útero), vai sendo impactado pelo meio onde vive, e aí mergulha na adolescência: o saboroso inferno da existência. E a adolescência é o inferno. Mas o inferno é que é bom – imagine que chatice deve ser o céu! Aquela paz, aquelas pombinhas voando, aquelas flores, aquela brisa, aquela monotonia, aquela Suíça. [...] E aí o adolescente olha os pais, os amigos dos pais, os professores, os adultos à sua volta e descobre que não encontra ali qualquer modelo de futuro que o fascine. Depois, passa. Não tem importância. A vida de adulto não é tão babaca quanto o adolescente pensa que vai ser. Pode ser um grande barato, também. Quando ele emerge da adolescência e entra na idade adulta – o que pode acontecer aos 18 anos, aos 20, ou 25, aos 30, ou nuca – ele descobre que pode ser um adulto tão feliz quanto foi na adolescência, em companhia dos amigos, sem os pais por perto. Mas ele só conseguirá isto se tiver sido uma criança feliz. Está no Menino Maluquinho.

        Pais&Teens – E como seria o Menino Maluquinho na adolescência? A história termina antes...

        Ziraldo – O Menino Maluquinho vai ser um adolescente como quase todos, dono do mundo, consumista, egoísta, perplexo, injustiçado, incompreendido, profundamente infeliz, intensamente feliz, inconstante, desajeitado, mal-amado, bem-amado, indeciso, chato, rimbaudianamente só [referência a Rimbaud, poeta francês que escreveu até os 19 anos]. Ou não.

        Pais&Teens – Você tem manifestado ideias novas sobre as prioridades da Educação. Qual seria o principal papel da escola na formação do adolescente?

        Ziraldo – Outro dia fizeram um fórum aí em São Paulo para saber como se faz um país com a educação. Só se fará um país verdadeiro para o próximo milênio se conseguirmos fazer do Brasil um país de leitores. Quem não lê, mal fala, mal ouve, mal vê. Vi isto escrito no prédio de uma velha livraria do Rio, quando era menino; continuamos sendo um país que mal fala, mal ouve, mal vê. Como poderemos escolher um futuro sem dominar o código de compreensão das coisas, que é ler e escrever? [...] A criança tem de ler como quem ouve e escrever como quem fala. Tem de ser capaz de escrever tudo o que pensa e ler tudo o que lhe dizem. O resto vem por acréscimo. Atenção: a escola tem de ensinar a gostar de ler!
                                                   Pais&Teens, jul. 1998.
Fonte: Livro – Ler, entender, criar – Português – 6ª Série – Ed. Ática, 2007 – p. 154-9.

Entendendo a entrevista:

01 – Releia: “Enquanto o Menino Maluquinho atinge a sua maioridade – embora nas páginas do livro continue tendo 11 anos [...]”.
a)   O que significa alguém atingir a maioridade?
Completar 18 anos.

b)   O Menino Maluquinho atingiu a maioridade, mas nas páginas do livro continua tendo 11 anos. Como se explica isso?
É porque a história O Menino Maluquinho já existe a mais de dezoito anos.

02 – Na época em que a entrevista foi publicada, quem se preparava para completar cinquenta anos de carreira no ano seguinte?
      Ziraldo, o criador da personagem.

03 – Quem é o vovô maluquinho a que o título do texto se refere? Que trecho permite concluir isso?
      O próprio Ziraldo. “Também ele, embora já avô de quatro netos, continua na contramão do tempo.

04 – Reúna-se com um colega e releiam este trecho: “Seu traço econômico e preciso e suas histórias com enredos sentimentais têm uma rara empatia com a emoção das crianças”.
O que vocês entendem por “traço econômico”? Para responder, observem a figura do Menino Maluquinho, prestando atenção na forma como é desenhado.
      Resposta pessoal do aluno. Sugestão: A expressão se refere ao traçado simples e sem excesso de detalhes de Ziraldo, que consegue representar as figuras e as cenas utilizando o mínimo de linhas.

05 – Leia:
“Fiz o grupo escolar e o ginásio em Caratinga, no interior de Minas. Depois, vim para o Rio de Janeiro [...]”
“Outro dia fizeram um fórum aí em São Paulo para saber como se faz um país com a educação.”
Com base nas informações contidas nesse trechos, responda:
a)   Onde Ziraldo se encontrava quando deu a entrevista? Que trecho permite chegar a essa conclusão?
No Rio de Janeiro. “[...] vim para o Rio de Janeiro [...]”.

b)   Por que Ziraldo diz “aí em São Paulo”? Quem, provavelmente, se encontrava em São Paulo?
Pode-se deduzir que a entrevistadora se encontrava em São Paulo no momento da entrevista.

06 – Releia um trecho da resposta de Ziraldo à quarta pergunta: “Saiam da frente que, finalmente, chegou o que detém a verdade!”
a)   Quem, de acordo com a visão de Ziraldo, acredita deter a verdade?
O adolescente.

b)   Você concorda com a visão de Ziraldo sobre o adolescente?
Resposta pessoal do aluno.

07 – Em duas das perguntas a entrevistadora associou o tema da adolescência à escola. Por quê?
      Porque o espaço escolar está – ou deveria estar – muito presente na vida do adolescente. Muitos das questões vividas pelos adolescentes relacionam-se com a vida na escola.

08 – Na opinião de Ziraldo, “ler é mais importante do que estudar” e a principal preocupação da escola deveria ser ensinar o aluno a gostar de ler. Converse com seus colegas: vocês concordam com Ziraldo? É possível ensinar a gostar de uma coisa (de ler, neste caso)?
      Resposta pessoal do aluno.

09 – Esse texto foi tirado de uma revista chamada Pais&Teens. O que significa a palavra teen (se não souber, consulte um dicionário de inglês)? A quem, provavelmente, se dirige essa revista?
      Teen significa “adolescente”.

10 – O texto “O Vovô Maluquinho” pode ser dividido em duas partes. Quais são elas?
      Apresentação do entrevistado e entrevista.

11 – Esse texto também poderia ser observado em relação à linguagem empregada, pois há trechos com linguagem mais formal – mais próxima da norma-padrão – e trechos com linguagem mais informal.
a)   Que trechos apresentam uma linguagem mais próxima da norma-padrão? Cite pelo menos uma frase que comprove sua afirmação.
A apresentação e as perguntas. “A obra do artista resiste à modernidade globalizada e cosmopolita, trazendo ao universo infantil os valores da tradição, da família, do interior”.

b)   Que trechos trazem marcas da oralidade, isto é, expressões e construções próprias da linguagem oral? Cite pelo menos um trecho que comprove essa afirmação.
Essas marcas se encontram principalmente nas respostas de Ziraldo, dando a impressão ao leitor de o estar ouvindo falar. “Ah, não vou contar não”, “Vim vindo. De pequeno eu já sabia [...]”, “A vida de adulto não é tão babaca quanto o adolescente pensa [...]”, “Pode ser um grande barato [...]”.

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