domingo, 26 de novembro de 2017

SONETO: BENDITO SEJA O DIA, O MÊS, O ANO - PETRARCA - COM GABARITO

SONETO: Bendito seja o dia, o mês, o ano
                  Petrarca


Bendito seja o dia, o mês, o ano,
A sazão, o lugar, a hora, o momento,
E o país de meu doce encantamento
Aos olhos de lume soberano.

E bendito o primeiro doce afano
Que tive ao ter de Amor conhecimento
E o arco e a seta a que devo o ferimento,
Aberta a chaga em fraco peito humano.

Bendito seja o mísero lamento
Que pela terra em vão hei dispersado
E o desejo e o suspiro e o sofrimento.

Bendito seja o canto sublimado
Que a celebra e também meu pensamento
Que na terra não tem outro cuidado.

                                             Petrarca. Poemas de amor de Petrarca.
                                                Tradução de Jamil Almansur Haddad.
                                                  Rio de Janeiro: Ediouro, 1998. p. 37.

Sazão: cada uma das estações do ano.
Afano: afã, aflição, ansiedade.
Cuidado: preocupação, interesse.

Interpretação do texto:
1 – Ao longo do poema, o eu lírico bendiz coisas de natureza diferente, como um dia, um país, um gesto. O que todos os elementos têm em comum?
      Eles tem em comum o fato de estarem ligados a mulher amada. Por esse motivo, o eu lírico bendiz o contexto em que a viu e por ela se apaixonou (dia, mês, ano, lugar, hora, estação do ano, etc.). Quando passa a bendizer comportamentos e sentimentos, também os relaciona à mulher amada.

2 – Os trovadores tratavam do tema do sofrimento amoroso em suas cantigas. No poema de Petrarca, o eu lírico também se refere a esse sofrimento. Em quais versos isso acontece?
      O eu lírico começa a fazer referência ao sofrimento amoroso nos versos finais da segunda estrofe (“[bendito] o arco e a seta a que devo o ferimento, / Aberta a chaga em fraco peito humano.”) e continua ao longo da terceira (“Bendito seja o mísero lamento, / Que pela terra em vão hei dispersado, / E o desejo e o suspiro e o sofrimento”).

      --- A abordagem do sofrimento amoroso, feita por Petrarca, assemelhasse às cantigas de amor trovadorescas? Por quê?
      Não. Nas cantigas de amor, o trovador afirma suas dores de amor como algo que pode enlouquece-lo ou leva-lo a desejar a morte. No poema de Petrarca, o sofrimento amoroso é visto como algo positivo, "bendito”.

3 – Releia:
      “E bendito o primeiro doce afano
      Que tive ao ter de Amor conhecimento
      E o arco e a seta a que devo o ferimento,
      Aberta a chaga em fraco peito humano.”
a)   Qual a metáfora utilizada para o amor pelo eu lírico?
A metáfora é a caracterização do amor como um “ferimento”.

b)   O eu lírico atribui o início do amor a Cupido. Que elementos do texto permitem essa identificação?
Os elementos mais evidentes são o arco e a seta responsáveis pelo “ferimento” que simboliza a entrada do amor no coração do eu lírico. Na mitologia, Eros é sempre representado como um menino alado que porta um arco e uma aljava cheia de setas. Com elas, desperta o amor nos corações humanos.

c)   A alusão a elementos da mitologia greco-latina é característica da produção do Renascimento. Por que a referência a esses mitos indica uma perspectiva diferente daquela predominante na Idade Média?
A visão de mundo medieval é teocêntrica, ou seja, Deus é a origem de todas as coisas. Quando o eu lírico responsabiliza um deus pagão, Eros, por seu amor, mostra que não adota uma postura marcada pela religiosidade medieval.

4 – Que características comuns podemos identificar entre o quadro de Ticiano e o poema de Petrarca?

      Nos dois casos, o desenvolvimento do tema é caracterizado por uma postura positiva, alegre. Além disso, as duas obras fazem referência à mitologia greco-latina.

MÚSICA(ATIVIDADES): COTIDIANO - CHICO BUARQUE - COM GABARITO

Música(Atividades): Cotidiano

                                         Chico Buarque
Todo dia ela faz tudo sempre igual
Me sacode às seis horas da manhã
Me sorri um sorriso pontual
E me beija com a boca de hortelã

Todo dia ela diz que é pra eu me cuidar
E essas coisas que diz toda mulher
Diz que está me esperando pro jantar
E me beija com a boca de café

Todo dia eu só penso em poder parar
Meio dia eu só penso em dizer não
Depois penso na vida pra levar
E me calo com a boca de feijão

Seis da tarde como era de se esperar
Ela pega e me espera no portão
Diz que está muito louca pra beijar
E me beija com a boca de paixão

Toda noite ela diz pra eu não me afastar
Meia-noite ela jura eterno amor
E me aperta pra eu quase sufocar
E me morde com a boca de pavor

Todo dia ela faz tudo sempre igual
Me sacode às seis horas da manhã
Me sorri um sorriso pontual
E me beija com a boca de hortelã.


Interpretação da letra:
1 – Como é a rotina diária do personagem da música?
      A rotina de um trabalhador na década de 70, contexto da ditadura militar, onde a mulher era associada ao espaço privada.

2 – Como a mulher e retratada pelo compositor na canção? Retire do texto uma frase que mostre essa imagem da mulher.
      Como uma mulher dedicada e apaixonada.
      “Todo dia ela diz que é pra eu me cuidar” / “E me beija com a boca de hortelã.”

3 – Qual seria o papel do homem na sociedade, de acordo com a canção? Retire do texto uma frase da canção que mostre o papel masculino.
      O papel do homem nesta época era ser o único provedor de uma família.
      “Me sacode as seis horas da manhã.”

4 – Os papéis do homem e da mulher mudaram em nossa sociedade, da data de lançamento da canção até hoje? Explique sua resposta e dê exemplos.
      Sim, a música foi composta na década 70, período da ditadura militar, nesta época era impossível para o autor pensar em uma música em que a mulher tivesse papel “ativo” ou “independente”. Já nos dias atuais cresce o número de mulheres chefes de família no país, segundo IBGE em 2014, 27,7 milhões de lares eram chefiados por mulheres.

5 – Em sua opinião, os papéis feminino e masculino são iguais na sociedade? Justifique sua resposta.
      Resposta pessoal do aluno.

6 – Como o personagem da música viveria a rotina?
      Como natural, pois não conhece uma outra forma.

7 – Em um texto literário, geralmente apresenta-se uma reflexão sobre a realidade. O autor recaia, através da linguagem, determinados fatos reais. Qual foi a realidade recriada pelo autor do texto?
      Recriou a rotina de um casal em que a mulher fica em casa, acorda o marido e o espera no portão no final do dia.

8 – Observe a forma como o texto como o texto se organiza. A primeira estrofe se repete no final, ou seja, o texto termina onde começou, como um círculo se fechando. Qual a relação entre essa estrutura circular, o título e o tema do poema?
      A relação com a vida que o casal tem, a rotina fazendo tudo igual na primeira estrofe e termina tudo se repetindo, por isso o título cotidiano.

9 – Quem é o “eu” do poema? E o “ela”?
      Um homem simples, levando uma vida de trabalhador. E “ela”, uma mulher dona de casa e apaixonada pelo seu marido.

10 – Comente a rotina do casal, apresentada na 1ª estrofe.
      Todo dia ela fazia tudo igual, acordava o marido as seis horas da manhã, sorri e o beija.

11 – A rotina do casal vai além da casa deles, isto é, é comum a outros casais. Transcreva um verso do poema que comprove esta afirmação.
  "  Todo dia eu só penso em poder parar
      Meio dia eu só penso em dizer não
      Depois penso na vida pra levar
      E me calo com a boca de feijão "

12 – O “eu” do poema se rebela diante a situação rotina. Em que momento isso acontece? Por quê?
      Ele se rebela todos os dias ele pensa em poder parar. “Todo dia eu só penso em poder parar” / “Meio dia eu só penso em dizer não.”

13 – Identifique no poema expressões ou palavras que expressam a ideia de rotina. Transcreva-as.
      “Acordar as seis horas da manhã” / “Diz que está me esperando pro jantar” / “Ela pega e me espera no portão”.

14 – O autor aproveita de outros dados, como o feijão que é um hábito alimentar comum no Brasil, para reforçar a ideia de rotineiro. Comente.
      Além de citar o feijão, também fala do café que faz parte da cultura do brasileiro.

15 – A linguagem coloquial escolhida pelo autor reforça a imagem de pessoa do povo. Comprove essa afirmação com exemplos do texto.
      Exemplos: pra/(para) e inicia vários versos com os pronomes (o, as, lhe, nos, te, me...) segundo as normas gramaticais não se inicia frases com os pronomes oblíquos.


TEXTO: PRECISA-SE DE PROFESSORES - J.C. OPINIÃO - COM GABARITO

Texto: Precisa-se de Professores


        A figura do docente, com conhecimento dos fundamentos didático-pedagógicos voltados para o ensino de conteúdos específicos, parece que vem sendo desprestigiado nos concursos para professores das universidades federais. Recentemente, acompanhei dois concursos para o cargo de professor da UFRPE e fiquei impressionado com o pouco valor dado pelas bancas de avaliação aos candidatos, de fatos professores, aqueles formados tanto pela licenciatura como pela prática docente. [...] Fica o meu apelo para que os dirigentes universitários deem a devida valorização à boa didática à formação inicial do professor e aos saberes docentes.
                                                                       J. C. Opinião, 29/08/10.
Interpretação do texto:
01 – O autor do texto acima diz que ficou impressionado com o pouco valor dado à formação didática dos professores e faz um apelo para a valorização da boa didática e dos saberes docentes.

Segundo a filosofia, valor significa:
a)   A necessidade de fusão com o ser e, ao mesmo tempo, a necessidade de individualização.
b)   Uma experiência humana de escolha de vida.
c)   Uma relação de igualdade e de justiça entre as pessoas do mesmo modo.
d)   Uma experiência sobre o que é, e uma orientação para o que deve ser.
e)   Atribuir importância a alguma coisa e não ficar indiferente a ela.

02 – Por que faltam professores de matérias específicas nas salas de aulas do país?
      O Brasil vem formando menos professores para dar aulas em matérias específicas.

03 – Quais são os principais motivos.
      O principal motivo dessa falta de profissionais são os baixos salários, e por isso eles preferem trabalhar nas empresas que estão atrás de matemáticos, físicos e biólogos. Além disso, estão pagando muito melhor.

04 – O autor enfatiza a valorização da boa didática, por quê?

      Na Didática reflete a formação deste profissional, onde ele constrói e reconstrói sua identidade profissional.

sábado, 25 de novembro de 2017

POESIA: Ó MEU BEM, POIS TE PARTISTE - COM GABARITO

POESIA: Ó meu bem, pois te partiste
                  Diogo Miranda


        Este poema é um exemplo da poesia palaciana apresentada nos serões do Paço Real Português no século XV.
        Ó meu bem, pois te partiste
        Dante meus olhos coitado,
        Os ledos me farão triste,
        Os tristes desesperado.


        Triste vida sem prazer
        Me deixas com grã cuidado,
        Que por meu negro pecado
        Me vejo vivo morrer;
        Meu prazer me destruíste,
        Meu nojo será dobrado,
        Porque sou cativo, triste,
        Do meu bem desesperado.

                                       Miranda, Diogo de. In: SPINA, Segismundo.
                    Era medieval. 8. ed. São Paulo: Difel, 1985. p. 139-140.
                                   (Coleção Presença da Literatura Portuguesa).
Dante: diante.
Ledos: alegres.
Grã: grande.
Nojo: sofrimento.

Interpretação do texto:
1 – Qual é o tema do poema?
      O tema desenvolvido é o do sofrimento amoroso.

a)   Como ele é desenvolvido?
O eu lírico fala de seu sofrimento após a partida de sua amada. Ele diz que, sem a sua presença, as pessoas alegres o deixarão triste e as tristes, desesperado. Ele sofre tanto que, mesmo vivo, sente-se morrer sem esperanças por ser “cativo” de um sentimento tão forte.

b)   Que elemento formal permite reconhecer o poema como característico da poesia palaciana?
O elemento formal que, claramente, associa o poema ao Humanismo é o uso, na trova, de versos de sete sílabas métricas (redondilhas maiores).

2 – O que o vocativo “Ó meu bem” sugere a respeito da relação entre o eu lírico e a mulher amada?
      O uso do vocativo “Ó meu bem” indica proximidade, intimidade do eu lírico com a mulher a quem se dirige.

      --- Explique em que esse trabalho é diferente daquele característico das cantigas trovadorescas.
      Nas cantigas de amor, o tratamento dispensado à amada era sempre respeitoso (minha senhora) e distante, como convinha ao amor cortês e à vassalagem amorosa. A mulher a quem o trovador se dirigia era idealizada e inatingível. No poema, o tema do sofrimento amoroso é desenvolvido de modo bem mais real do que nas composições medievais. A mulher é tratada pelo poeta com maior intimidade, atenuando o tom de veneração absoluta e idealização assumido pelos trovadores.

3 – Como o eu lírico está se sentindo?
      O eu lírico está sofrendo a perda de seu amor. Afirma que não tem mais prazer, que se sente morrer. Caracteriza a si mesmo como “cativo”, “triste” e “desesperado”. Por sentir um amor tão forte, sofrerá em dobro.

      --- Que linguagem o eu lírico faz do amor que sente? Justifique.
      O eu lírico afirma que o seu sentimento é um “negro pecado” e que o prazer de que desfrutou o destruiu. Por isso, mesmo vivo, sente-se morrer. A imagem de amor aqui presente é a de um sentimento arrebatado, mas também visto de forma negativa: um pecado que é punido com o sofrimento do eu lírico e a morte em vida.



CANTO IV - OS LUSÍADAS - DANTE ALIGHIERI - COM GABARITO

Canto IV - Os Lusíadas
                    Dante Alighieri


  Após cruzarem o rio Aqueronte e entrarem no Limbo, o primeiro círculo do inferno, Dante e Virgílio encontram as almas dos grandes mestres gregos e romanos.
[...]
À vista descansada então lançado
Em derredor, olhei detidamente,
A ver onde me achava, e como, e quando.
[...]
Bem à distância estávamos, mas não
Tanto que eu não pudesse ver em parte
Que a gente ali mostrava distinção.

“Ó tu, que glorificam ciência e arte,
Quem são estes”, falei, “com dignidade
Tal que os conversa assim dos mais à parte?”

Disse-me, então: “A notabilidade
Deles, que soa lá onde tens vida,
Do céu lhes houve a justa prioridade.”
[...]
O meu bom mestre prosseguiu, falando:
“Olha o que à mão aquela espada traz,
À frente dos demais, como em comando:

É Homero, cantor alto e capaz:
Com Horácio, o satírico, ali vem;
Ovídio logo após, Lucano atrás.

E porque cada um comigo tem
Este nome em comum que a voz entoa,
Disto me orgulho, e a nada aspiro além.”

Assim reunida a bela escola e boa
Eu vi do mestre altíssimo do calmo,
Que sobre os outros, como a águia, revoa.

Depois de terem conversado a um canto,
Volveram-se e fitaram-me, acenando:
E meu mestre sorriu de favor tanto.

E honra maior me foram demonstrando,
Tal, que acolhido em sua companhia,
Eu era o sexto aos mais ali somando.
[...].
                                                      Alighieri, Dante. A divina comédia.
                        Tradução de Cristiano Martins. 6. ed. Belo Horizonte:
                                   Vila Rica, 1991. p. 128-134. v. 1. (Fragmento).

Notabilidade: atributo de pessoa que é notável, admirável.
Lucano: poeta épico latino, que viveu entre os anos 39 e 65 d.C. Escreveu Farsália, em que narra episódios da guerra civil romana.

Interpretação do texto:
1 – A divina comédia, de Dante Alighieri, ilustra o olhar humanista para a religião e o desejo de compreender e explicar as coisas do mundo, da vida e da morte que caracterizam a literatura no Humanismo. Leia um trecho dessa obra.
a)   No catolicismo, as almas das pessoas não batizados são encaminhadas ao Limbo, pois não podem permanecer em presença de Deus sem ter sido purificadas do pecado original. De quem são as almas que Dante e Vergílio encontram no Limbo?
Dante e Vergílio encontram as almas de Homero, Horácio, Ovídio e Lucano.

b)   De que modo Dante apresenta essas personagens?
As personagens são apresentadas como poetas por meio da metáfora do canto. Homero é definido como o “cantor alto e capaz”.

2 – Dante pergunta a Virgílio por que razão os poetas gregos e latinos encontram-se separados das outras almas que estão no Limbo. Que explicação ele recebeu de seu mestre?
      Segundo Vergílio, a fama que esses poetas têm no mundo (“lá onde tens vida”) é tão grande, que garantiu a eles uma distinção entre as outras almas do Purgatório.

3 – Além de chamar Virgílio de “mestre”, Dante revela, nessa passagem de A divina comédia, que o considera superior aos outros poetas identificados. Transcreva no caderno os versos que comprovam essa afirmação.
      Os versos em que a superioridade de Virgílio é afirmada por Dante são: “Eu vi do mestre altíssimo do canto, / que sobre os outros, como a águia, revoa.”

a)   O que a referência à “bela escola e boa” revela sobre a importância desses poetas na visão de Dante?
Além de chamar Virgílio de “mestre”, Dante sugere que Homero, Horácio, Ovídio e Lucano constituem a “bela escola e boa” na qual aprendeu a arte de escrever poesia. Essa forma elogiosa de fazer referência aos poetas da Antiguidade ilustra a importância que é dada pelos artistas do Humanismo à cultura greco-latina.

b)   Qual é a “maior honra” vivida por Dante nesse momento? Explique.
A maior honra é ser acolhido como um igual entre os mestres clássicos. Essa é uma honra para Dante, porque significa que foi capaz de produzir uma obra tão boa e importante quanto a dos seus modelos.

4 – Que elementos desse trecho ilustram a tentativa, característica do Humanismo, de conciliar a religião católica e as influências da cultura greco-latina? Por quê?
      O fato de Dante escrever uma obra para explicar como seriam o inferno, o Purgatório e o Paraiso revela a importância do cristianismo para o ser humano que vive nesse período. O tratamento dado aos poetas clássicos, tratados como “mestres” formadores da boa escola, revela que a cultura greco-latina era o modelo inspirador da arte do período. A associação desses elementos ilustra a tentativa de conciliar cristianismo e as influências greco-latinas.


POESIA - CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE - COM GABARITO

Poesia
  
      Drummond tematiza, no poema, a dificuldade de transformar em verso a poesia do momento.

Gastei uma hora pensando um verso
Que a pena não quer escrever.
No entanto ele está cá dentro
Inquieto, vivo.
Ele está cá dentro
E não quer sair.
Mas a poesia deste momento
Inunda minha vida inteira.

                                Andrade, Carlos Drummond de. Obra completa.
                                                          São Paulo: Aguilar, 1964. p. 65.
                              Carlos Drummond de Andrade Granã Drummond
                                                            www.carlosdrummond.com.br.



Interpretação do texto:

1 – O poema de Drummond também aborda o fazer poético. Como ele é caracterizado no texto?
      O poema trata de tensão entre a inspiração e sua realização.

a)   Nesse poema, o fazer poético pode ser entendido como uma ação racional? Explique.
O fazer poético é apresentado como a luta para dar forma à poesia que está dentro do eu lírico (“ele está cá dentro / inquieto vivo. / Ele está cá dentro / e não quer sair”). Esse esforço para dar forma ao que está vivo dentro do poeta exige um trabalho racional que não se mostra eficiente. O trabalho intelectual do poeta não é suficiente para garantir a tradução do sentimento poético que o invade, já que o verso simplesmente não “sai”. Nesse sentido, poderíamos dizer que o poeta não tem controle sobre o fazer poético.

b)   O eu lírico afirma que “a poesia deste momento inunda minha vida inteira”. O que sugere a expressão destacada?
Seria importante que os alunos percebessem que a poesia que invade a vida do poeta é a do momento em que ele percebe que a criação do poema independe de sua vontade. Embora não consiga traduzir em palavras o que sente, a poesia está viva dentro dele, mas não quer sair. Esse momento é, segundo ele, repleto de poesia.

2 – Qual é a visão do fazer poético do poema de Drummond? Explique.
      No poema de Drummond, o fazer poético é apresentado de modo diverso: a dificuldade do poeta está em tentar escrever o verso “inquieto, vivo” e não encontrar uma expressão formal, por mais que “pense” em como traduzir em palavras essa inspiração. Poderíamos dizer que, nesse poema, a poesia é fruto de uma inspiração, e o maior esforço do poeta será encontrar uma forma capaz de expressar o que sente.
     
3 – Que elemento, na forma e no tratamento dado ao tema, ele permite associar o momento de produção? Explique.
      No poema temos uma linguagem mais simples, com frases mais compreensíveis, versos brancos e livres, o que nos leva a identificar uma estrutura linguística muito próxima da que utilizamos hoje e nos permite associar o momento de produção do texto com uma estética que valoriza a expressão acima de qualquer rigor formal.



SONETO: A UM POETA - OLAVO BILAC - COM GABARITO

 SONETO: A um poeta

       O fazer poético é o tema deste soneto de Olavo Bilac.

Longe do estéril turbilhão da rua,
Beneditino, escreve! No aconchego
Do claustro, na paciência e no sossego,
Trabalha, e teima, e lima, e sofre, e sua!

Mas que na forma se disfarce o emprego
Do esforço; e a trama viva se construa
De tal modo, que a imagem fique nua,
Rica mas sóbria, como um templo grego.

Não se mostre na fábrica o suplício
Do mestre. E natural, o efeito agrade,
Sem lembrar os andaimes do edifício:

Porque a beleza, gêmea da verdade,
Arte pura, inimiga do artifício,
É a força e a graça na simplicidade.

                             Olavo, Bilac. Poesias. São Paulo: Martins Fontes,
                                           1996. p. 336. (Coleção Poetas do Brasil).

Beneditino: membro da ordem religiosa dos beneditinos. Por extensão, passou a designar alguém que se devota incansavelmente a um trabalho muito meticuloso.
Claustro: Local de recolhimento, de meditação.

Interpretação do texto:
1 – O que os versos de Bilac sugerem sobre o trabalho do poeta para produzir um texto?
      O trabalho do poeta, segundo Bilac, deve ser árduo. Isso fica claro no verso “Trabalha, e teima, e lima, e sofre, e sua!”.

a)   Esse trabalho se baseia na razão ou na emoção? Justifique.
O esforço para atingir a “perfeição” do verso não deve transparecer no poema. Por isso, o trabalho do poeta é intelectualizado e distanciado da realidade que o cerca. Para conseguir a perfeição do poema, o poeta deve realizar um trabalho que privilegia as ações racionais e não a emoção.

b)   Quais são as condições necessárias, segundo o eu lírico, para que se possa escrever um bom poema?
O poeta deve se afastar da vida mundana, cotidiana, e trabalhar com afinco e de forma meticulosa (como um beneditino).

c)   De que maneira essas condições contribuem para obter a forma perfeita no poema?
Como se trata de alcançar, no poema, a perfeição da forma, o ideal de beleza, nada pode atrapalhar o poeta. Por isso, ele deve isolar-se do mundo em seu claustro e “lapidar” incansavelmente o verso até que ele fique impecável.

2 – Na segunda estrofe, o eu lírico compara o resultado a ser alcançado pelo poeta a um tempo grego.
a)   Que qualidades comuns haveria entre o poema ideal e um templo grego?
A riqueza e a sobriedade, ou seja, a linguagem rica, mas enxuta.

b)   Copie no caderno outros trechos do texto em que a mesma ideia é reforçada.
Possibilidade: na última estrofe, as referências à arte pura, inimiga do artifício, com força e graça na simplicidade reforçam a ideia de riqueza e sobriedade.

3 – Na terceira estrofe, é utilizada a metáfora do andaime e do edifício para representar o poema. Explique como esses elementos se associam à criação de um poema.
      O edifício seria o poema pronto, e os andaimes representariam o poema ainda em construção. O leitor do poema desconhece quanto foi necessário ao poeta suar e trabalhar até produzir sua obra, assim como aqueles que observam o edifício pronto não presenciam o esforço dos trabalhadores que o constroem.