domingo, 4 de agosto de 2019

CONTO: OS DOIS PAPUDOS - RUTH GUIMARÃES - COM GABARITO

CONTO: OS DOIS PAPUDOS

           
                    Ruth Guimarães

        Vivia numa povoação um alegre papudo, estimado de todos, muito folgazão e boêmio. Não o impedia o papo de soltar grandes risadas. Pouco se lhe dava que o achassem feio, ou o chamassem de papudo. A verdade é que o tal papo o incomodava, mas o que não tem remédio remediado está, filosofava ele. E vamos tocar viola, e vamos amanhecer nos fandangos, viva a alegria, minha gente, que se vive uma vez só.
        Certo dia, foi ao povoado vizinho, a uma festa de casamento, levando embaixo do braço a inseparável viola. Demorou mais que de costume, bebeu uns tragos a mais, porém não deixou de voltar para casa, pois era tão trabalhador quanto festeiro, e tinha que pegar no serviço no outro dia bem cedo.
       Havia luar. Num grande estirão avistava a estrada larga, as touceiras de mato. Passava o gambá por perto dele, e o tatu, roncando, e voava baixo, silenciosamente, a corujinha campeira. O papudo não sentia medo. Andava em paz com Deus e com os Homens. Os animais, que adivinham nele um homem de coração compassivo, também não tinham medo dele.
       De repente, ao virar numa curva, viu embaixo da figueira brava, ramalhuda, uma roda de anões cantando. Todos com capuzes vermelhos, cachimbo com a brasa luzindo, a barba branca comprida, descendo até a altura do peito.
        -- O que será aquilo?
       Por um instante teve algum temor. Mas era tarde para fugir. Os foliões já o tinham visto. E, se se tratava de festa, isto era com ele. Saltou decidido para o meio da roda, empunhando a viola.
       -- Eu também sei cantar.
       Enquanto pinicava as cordas, prestava atenção às palavras dos dançarinos. Eles entoavam:
      Segunda, terça
      Quarta, quinta...
      E tornavam ao começo:
      Segunda, terça
      Quarta, quinta...
      E assim sempre, numa musiquinha muito cacete. Acostumado aos desafios, a improvisar, o papudo esperou a sua deixa. Assim que os anões começaram:
      Segunda, terça
      Quarta, quinta...
      Ele emendou:
      Sexta, sábado
      Domundo também.
      A roda pegou fogo. Os pequenos duendes barbudos gostaram da novidade. Rodopiavam cantando numa animação delirante, e foi assim a noite toda. E o papudo tocando e dançando.
      De madrugada, ao primeiro cantar do galo, a roda se desfez. O mais velho deles, e que parecia o chefe, perguntou-lhe:
       -- Que é que você quer, em paga de ter tocado para nós?
       -- Eu até que me diverti com esta festa - replicou o papudo.
       -- Mas peça qualquer coisa.
       -- Posso pedir seja o que for?
       -- Pode.
       -- Eu queria - disse ele, meio hesitante - queria me ver livre deste papo, que me incomoda muito.
      Um anãozinho agarrou o papo com as duas mãos, subiu pelo peito do papudo, firmou bem os pés, deu um arrancão.
      O papudo fechou os olhos.
      -- Agora eles me matam.
      De repente sentiu o pescoço leve. Abriu os olhos. Os anõezinhos tinham sumido. Não ouviu mais nada. Meio cinzento, despontava o dia.
       "Sonhei", pensou ele. "Bebi demais naquele casamento."
       Passou a mão pelo pescoço, estava liso, sem excrescência nenhuma.
       "Agora fiquei mais bonito", pensou também, muito satisfeito.
       E aí deu com o papo jogado em cima do cupim.
       Agarrou a viola e foi para casa.
       Imagine-se a sensação que não foi, o papudo amanhecer, sem mais nem menos, sem o papo.
      -- Que milagre foi esse? - perguntavam.
      Papudo ria, papudo cantava, continuava folgazão como sempre, mas não contava a aventura, de medo que o chamassem de louco, e não acreditassem.
      Esse moço tinha um compadre, que também era papudo.
      E tanto apertou o amigo, e tanto falou:
      -- Eu também quero me ver livre desse aleijão. Quero ficar bonito, e arranjar uma namorada. Você não é amigo.
      Foi assim, até que o moço lhe contou tudo.
      O outro encarou, incrédulo.
      -- Verdade?
      -- Verdade.
      -- O anão falou que você podia pedir o que quisesse?
      -- Falou.
      -- E você em vez de pedir riquezas, pediu para ficar sem o papo?
      -- Ora, pobreza não me incomoda, mas o papo incomodava.
      -- Mas você é louco. Você é um burro. Pedisse riqueza. Quem é rico, que é que tem o papo? Quem se incomoda com papo? Eu, se fosse rico, me casaria com uma mulher bonita, do mesmo jeito.     Você é bobo. Onde é esse lugar, onde você encontrou os fantasmas?
      O outro preveniu:
      -- Compadre, você vai lá com esganação, vai ofender os anõezinhos, e ainda se arrepende.
      -- Nada disso. Você o que é, é um egoísta. Está formoso, que se danem os outros.
      Aí o moço encolheu os ombros e falou:
      -- Sua alma, sua palma. Vá lá, depois não se queixe.
      Ensinou onde era, o compadre invejoso agarrou a viola e foi, noite alta, direitinho como o outro tinha feito. Também era noite de luar. Também dançou a noite inteira, cantando. Ao primeiro cantar do galo a roda se desfez.
      -- Que é que você quer, em paga de ter tocado para nós?
      O papudo deu uma piscadela maliciosa para o anão e falou, esfregando o indicador e o polegar, no gesto clássico, que significa dinheiro:
      -- Eu quero aquilo que o meu compadre não quis.
      Um anãozinho foi ao cupim, tirou o papo do outro que estava lá, e grudou em cima do papo do invejoso.
      E assim, por sua louca ambição, ele ficou com dois papos.

                                                 GUIMARÃES, Ruth (org.). Lendas e fábulas do Brasil, 4. ed. São Paulo: Cultrix, 1972.

Fonte: Livro - Para Viver Juntos - Português - 6º ano - Ensino Fundamental- Anos Finais - Edições SM - p.50 a 53..
Entendendo o conto:



01 – Em que lugar ocorre a história que você leu? Copie trechos do texto que justifiquem sua resposta.
      Em um povoado rural. “Num grande estirão avistava a estrada larga, as touceiras do mato”.

02 – O conto trata de dois homens que tinham uma característica que os diferenciava das outras pessoas.
a)   Que característica era essa?
Os dois homens eram papudos.

b)   A característica dessas personagens tem muita importância para o desenvolvimento do enredo. Que conflito ela desencadeia?
Os dois homens querem se livrar do papo que possuem, pois o papo é considerado um defeito físico.

c)   Havia alguma reação dos amigos e conhecidos em relação à característica das personagens? Que reação era essa?
Pode-se perceber no primeiro parágrafo que todos chamavam uma das personagens de papudo e o achavam feio, mas ele não dava atenção a isso.

d)   Ao longo do conto, pode-se perceber uma oposição entre as duas personagens principais. Qual é a diferença entre elas?
Um era alegre, de bem com a vida; o outro, ganancioso.

e)   O conto fala da transformação das personagens. Quem favorece a transformação delas?
Os duendes da floresta, seres mágicos que cumprem desejos.

03 – No final do conto, as características das duas personagens principais se modificam.
a)   Que mudanças o texto aponta em cada uma?
O primeiro homem fica livre do papo. O segundo tem seu papo duplicado.

b)   Por que essas mudanças ocorreram?
Porque os duendes atenderam aos pedidos conforme o entendimento deles.

04 – De que maneira a festança com os duendes colaborou para a transformação dos papudos?
      Durante a festa, os duendes divertiam-se muito e quiseram retribuir a alegria recebida. Por isso satisfizeram o desejo dos homens.

a)   Como eram as festas descritas na história? O que acontecia nelas?
Tinha muita bebida, canto, dança e se estendiam até a madrugada.

05 – Releia o seguinte trecho:
        “Por um instante teve algum temor. Mas era tarde para fugir. Os foliões já o tinham visto. E, se se tratava de festa, isto era com ele. Saltou decidido para o meio da roda, empunhando a viola.”

a)   Quem eram os foliões aos quais o trecho se refere?
Os duendes.

b)   Que estratégia a personagem usou para se defender dos foliões?
Usou sua viola, tocando e alegrando o ambiente.

c)   Como se caracteriza, no texto, o ambiente onde se passa a ação?
Repleto de alegria e de elementos mágicos.

06 – O que a expressão “Vivia numa povoação um alegre papudo” indica sobre a narrativa?
      O início do texto, com o tempo verbal de “vivia”, indica que a história ocorreu em uma época passada, não determinada.

07 – Quanto tempo duraram os fatos narrados na história?
      Não é possível determinar o tempo exato de duração dos acontecimentos, mas é possível supor que foram duas noites. No conto popular, não há marcas exatas de duração temporal do acontecimento.

08 – Quais outras expressões de tempo aparecem no texto?
      “Certo dia”; “por um instante”; “e assim sempre”; “de madrugada”; “ao primeiro cantar do galo”.

09 – Que efeito a ausência dessas expressões pode causar na narrativa?
      Se as expressões forem omitidas na narrativa, o leitor terá dificuldade em compreender a sequência dos acontecimentos.

10 – Leia o trecho a seguir, retirado do conto Os dois papudos.  
         "Enquanto pinicava as cordas, prestava atenção às palavras dos dançarinos. Eles entoavam: Segunda, terça Quarta, quinta".

a)    Identifique uma expressão utilizada nesse trecho que faça referência a uma das ações realizadas pelo papudo.
Enquanto pinicava as cordas.

b)    Considerando a situação apresentada no conto, o que essa expressão significa?
Tocando um instrumento de cordas.

c)    Reescreva a frase em qual a expressão é utilizada, substituindo-a pelo significado indicado na resposta anterior.
Enquanto tocava instrumentos de cordas...

d)    Após a reescrita, qual mudança é possível observar na frase?
Mais clareza de sentido.

e)    Por que será que, ao recontar a história, essa expressão foi usada?
Apenas para melhor identificar o tipo de texto.

f)      Qual é a relação entre o uso dessa expressão e o fato de o texto ser um conto popular?
Porque melhor identifica a linguagem não padrão.


33 comentários:

  1. Respostas
    1. tambem acho tava em duvida pesqisei e achei todas as resposta

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    2. claro ela ja deu todas sa respostas que mais oque

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  2. Minha avó me contava esse conto, saudades

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  3. Como ruth Guimarães descobria as histórias que Registrava em livros? Quero resposta por favor

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  4. nao esta de acordo com o meu texto dque do livro

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  5. O meu tbm não sai eu teve que ficar campiando as resposta affff😤

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  6. Quais valores são transmitidos no conto "os dois papudos"?

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  7. qual é a sua hipótese sobre como eram as personagens se confirmou?justifique-se

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  8. E eu que não copiei em sala e agora tenho que copiar isso sem saber se é isso mesmo que é pra copiar

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  9. Qual delas marca quando acontece a narrativa? Por favor me responde mais rápido possível

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  10. O que significa “FOLGAZÃO” no texto “Os dois papudos?

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