domingo, 29 de outubro de 2023

POEMA: TODAS AS VIDAS - CORA CORALINA - COM GABARITO

 Poema: Todas as vidas

              Cora Coralina

Vive dentro de mim
uma cabocla velha
de mau-olhado,
acocorada ao pé do borralho,
olhando pra o fogo.
Benze quebranto.
Bota feitiço...
Ogum. Orixá.
Macumba, terreiro.
Ogã, pai-de-santo...

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Vive dentro de mim
a lavadeira do Rio Vermelho,
Seu cheiro gostoso
d’água e sabão.
Rodilha de pano.
Trouxa de roupa,
pedra de anil.
Sua coroa verde de São-Caetano.

Vive dentro de mim
a mulher cozinheira.
Pimenta e cebola.
Quitute bem feito.
Panela de barro.
Taipa de lenha.
Cozinha antiga
toda pretinha.
Bem cacheada de picumã.
Pedra pontuda.
Cumbuco de coco.
Pisando alho-sal.

Vive dentro de mim
a mulher do povo.
Bem proletária.
Bem linguaruda,
desabusada, sem preconceitos,
de casca-grossa,
de chinelinha,
e filharada.

Vive dentro de mim
a mulher roceira.
– Enxerto da terra,
meio casmurra.
Trabalhadeira.
Madrugadeira.
Analfabeta.
De pé no chão.
Bem parideira.
Bem criadeira.
Seus doze filhos.
Seus vinte netos.

Vive dentro de mim
a mulher da vida.
Minha irmãzinha...
tão desprezada,
tão murmurada...
Fingindo alegre seu triste fado.

Todas as vidas dentro de mim:
Na minha vida –
a vida mera das obscuras.

Cora Coralina, em “Poemas dos becos de Goiás e estórias mais”, Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1965.

Entendendo o poema:

01 – Qual é a principal ideia ou tema do poema?

      O poema celebra e homenageia a diversidade de experiências e vidas das mulheres brasileiras, destacando diferentes aspectos de suas vidas e papéis na sociedade.

02 – Quais são algumas das figuras femininas mencionadas no poema?

      O poema menciona diversas figuras femininas, como a cabocla velha, a lavadeira, a mulher cozinheira, a mulher do povo, a mulher roceira e a mulher da vida.

03 – O que a mulher cozinheira simboliza no poema?

      A mulher cozinheira simboliza a habilidade culinária e a cultura alimentar do povo brasileiro, destacando a importância da comida tradicional e da cozinha caseira.

04 – Qual é o papel da mulher roceira no poema?

      A mulher roceira representa a vida rural e o trabalho árduo no campo, enfatizando a relação próxima com a terra, a maternidade e a criação dos filhos.

05 – O que o poema sugere sobre a diversidade das vidas das mulheres brasileiras?

      O poema sugere que as mulheres brasileiras desempenham papéis diversos e desempenham uma ampla gama de atividades, desde tarefas domésticas até trabalhos na roça, enfatizando a riqueza da cultura e das experiências femininas.

06 – Qual é a mensagem geral transmitida pelo poema "Todas as vidas"?

        A mensagem geral do poema é a celebração e a valorização das múltiplas facetas da vida das mulheres brasileiras, reconhecendo a importância de todas as suas experiências e contribuições para a sociedade.

 

 

POEMA: RIO TEJO - MARCELO ANDRADE - COM GABARITO

 Poema: Rio Tejo

             Marcelo Andrade

Tejo rio da Espanha e Portugal
Rio Tejo de Lisboa e Toledo capital
Tejo rio das forjas de muitas espadas
Rio Tejo das naus de águas navegadas

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhpV3A5frT5mBEsW0iAgOHPVV2OwPp-wmBlAELIUSzPuvp2e3YX7pUaAZf4heo8xh2nnW5GAqYW5RJihxdEQd-YbpuBVpwoaFSdTt5QoSDxOYnv0x8m6zGEAsRbhsaYdiPS13kv3BcnCMOh_VmIg8BLyDKeM4knI667AaxV6zv4HwtykktYkiIa2XQ-lto/s1600/Tejo.jpg


Teu leito é da meseta e da montanha
Tua terra é da Espanha
Tua nascente é do Monte Universal
Tua foz é do mar de Portugal

Rio Tejo, és o rio da Torre de Belém
A guardiã branca e casta do mar d’além
Tejo rio, és o rio do Alcácer de Toledo
A fortaleza incorruptível sem medo

Rio Tejo, acompanhaste a clássica civilização
Testemunhaste os bárbaros e sua conversão
Choraste pelos mouros e a injusta conquista
Alegraste pelos cruzados e a justa reconquista

Rio Tejo, a água que, por todo seu leito, percorre
É o sangue que, nas veias de Portugal e Espanha, corre
O sangue que Portugal deu pelos mares navegados
E a Espanha deu pelos territórios conquistados

De suas águas saíram as caravelas de futuras vitórias
Para suas águas voltaram as naus com muitas histórias
Suas águas foram usadas para a forja de espadas
Que na mão de reis ajudaram terras a serem tomadas

Rio Tejo, não chores por rios mais famosos
Tampouco por outros mais formosos
Teu curso é de terras majestosas
Teu leito é de águas corajosas

Tejo rio, não chores por rios maiores
Ou pretensamente melhores
Rio Tejo, tens belas histórias
Escritas com lutas e glórias.

Marcelo Andrade. Rio Tejo. Nov. / 2002.

Entendendo o poema:

01 – Qual é o tema central do poema "Rio Tejo" de Marcelo Andrade?

      O tema central do poema é o Rio Tejo, destacando sua importância histórica e geográfica para Espanha e Portugal.

02 – Quais cidades são mencionadas no poema em relação ao Rio Tejo?

      O poema menciona Lisboa, Toledo e Alcácer de Toledo em relação ao Rio Tejo.

03 – De que maneira o poema descreve a história e a importância do Rio Tejo?

      O poema descreve a história do Rio Tejo ao destacar seu papel nas navegações, conquistas territoriais, e sua associação com eventos históricos relevantes para Portugal e Espanha.

04 – Quais são alguns dos elementos simbólicos associados ao Rio Tejo no poema?

      O poema associa o Rio Tejo a elementos simbólicos como a Torre de Belém, a guardiã branca do mar, Alcácer de Toledo como uma fortaleza incorruptível e as caravelas que partiram de suas águas em busca de vitórias.

05 – Como o poema descreve a relação entre o Rio Tejo e a história de Portugal e Espanha?

      O poema descreve o Rio Tejo como um símbolo do sangue derramado por Portugal e Espanha em suas jornadas marítimas e conquistas territoriais.

06 – Qual é a atitude do poema em relação ao Rio Tejo? Como ele o descreve?

      O poema exalta o Rio Tejo, descrevendo-o como um rio majestoso e corajoso, repleto de histórias de lutas e glórias.

07 – O que o poema sugere sobre a importância do Rio Tejo em relação a outros rios?

      O poema sugere que o Rio Tejo é importante e digno de reconhecimento, mesmo em comparação com rios mais famosos ou considerados melhores, devido à sua rica história e significado para as nações de Portugal e Espanha.

 

 

 

POEMA: A EDUCAÇÃO PELA PEDRA - JOÃO CABRAL DE MELO NETO - COM GABARITO

 Poema: A educação pela pedra

              João Cabral de Melo Neto

Uma educação pela pedra: por lições;
para aprender da pedra, frequentá-la;
captar sua voz inenfática, impessoal
(pela de dicção ela começa as aulas).
A lição de moral, sua resistência fria
ao que flui e a fluir, a ser maleada;
a de poética, sua carnadura concreta;
a de economia, seu adensar-se compacta:
lições da pedra (de fora para dentro,
cartilha muda), para quem soletrá-la.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgcab5sRSJZGYLxVAQ2m8GCYyKsU7FRvojU-fS1ZEc0DOfllCi32pbbSnUrgLQdlNaujpnMRgi61-mQgURdK_Qmoh8nu49GEnwwxUwIhyphenhyphenV0mO3nBV2wKpcNiHKPneXchic8FdWUlCyQf9yqhIYe5bmR682CeV0ZcHQLwllBLExPrWGWQ9yAMIYPgiJOkZM/s320/educa%C3%A7%C3%A3o-aa.png 



Outra educação pela pedra: no Sertão
(de dentro para fora, e pré-didática).
No Sertão a pedra não sabe lecionar,
e se lecionasse, não ensinaria nada;
lá não se aprende a pedra: lá a pedra,
uma pedra de nascença, entranha a alma.

             Melo Neto, João Cabral de. A educação pela pedra. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1996. p. 21.

Entendendo o poema:

01 – Qual é o tema principal do poema "A Educação pela Pedra"?

      O tema principal do poema é a pedra e as lições que ela pode ensinar.

02 – O que o poeta sugere ser a primeira lição que a pedra oferece?

      A primeira lição que a pedra oferece, de acordo com o poema, é uma lição de moral, mostrando sua resistência fria ao que flui e a fluir.

03 – Como o poeta descreve a pedra em relação à lição de poética?

      O poeta descreve a pedra como tendo uma "carnadura concreta" na lição de poética.

04 – Qual é o cenário onde a pedra não pode lecionar de acordo com o poema?

      A pedra não pode lecionar no Sertão, como mencionado no poema.

05 – Qual é a razão pela qual a pedra no Sertão não pode lecionar?

      No Sertão, a pedra não sabe lecionar e, mesmo que soubesse, o poema sugere que não ensinaria nada.

06 – Qual é a diferença entre as lições da pedra "de fora para dentro" e "de dentro para fora"?

      As lições "de fora para dentro" referem-se à pedra ensinando a quem a estuda de fora, enquanto as lições "de dentro para fora" se referem a como a pedra faz parte da alma das pessoas no Sertão, mesmo sem ensinar nada.

07 – Como o poema caracteriza a pedra em termos de comunicação?

      O poema caracteriza a voz da pedra como "inenfática" e "impessoal", sugerindo que a pedra tem uma comunicação não verbal e fria, como uma lição muda para aqueles que a estudam.

 



 

POEMA: SENTIMENTO DO MUNDO - CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE - COM GABARITO

 Poema: SENTIMENTO DO MUNDO

            CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE

Tenho apenas duas mãos
e o sentimento do mundo,
mas estou cheio escravos,
minhas lembranças escorrem
e o corpo transige
na confluência do amor.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjZaoGZgfMNagPaWX7pw6zNbCd741nnf_V_MW9B9isy9T53DU7hmHXjfuf-DqfhqxaFG7y-5tF7j82bOPLIk5vTv_iJuZDNVGcGu4lWh0O9P8gGJzgk3OyDPyA9Zx2QTMRAWJAEyu4DClsTB9pO0NKapUGCCURUTJZN3lV5b9qv3FuGpix_WGv9adNgReY/s320/SENTIMENTO.jpg


Quando me levantar, o céu
estará morto e saqueado,
eu mesmo estarei morto,
morto meu desejo, morto
o pântano sem acordes.

Os camaradas não disseram
que havia uma guerra
e era necessário
trazer fogo e alimento.
Sinto-me disperso,
anterior a fronteiras,
humildemente vos peço
que me perdoeis.

Quando os corpos passarem,
eu ficarei sozinho
desfiando a recordação
do sineiro, da viúva e do microscopista
que habitavam a barraca
e não foram encontrados
ao amanhecer

esse amanhecer
mais noite que a noite.

Carlos Drummond de Andrade.

Entendendo o poema:

01 – Qual é o sentimento predominante no poema?

      O sentimento predominante no poema é de desolação e alienação em relação ao mundo.

02 – Que metáfora é usada para descrever a sensação de solidão no poema?

      A metáfora usada é a de "ficar sozinho desfiando a recordação", o que sugere uma sensação de isolamento.

03 – O que o autor expressa sobre o estado do mundo e sua própria condição no poema?

      O autor expressa um sentimento de desamparo e desconexão em relação ao mundo. Ele se sente impotente diante das injustiças e da degradação do mundo e da sociedade.

04 – Por que o autor menciona "escravos" no início do poema?

      O autor menciona "escravos" no início do poema para simbolizar a sensação de sobrecarga e opressão que ele sente, como se estivesse sobrecarregado com as preocupações do mundo.

05 – O que os camaradas do autor não disseram e por que isso é significativo?

      Os camaradas não disseram que havia uma guerra e que era necessário trazer fogo e alimento. Isso é significativo porque sugere que o autor se sente despreparado e não informado em um momento crítico, o que aumenta seu sentimento de impotência.

06 – Qual é o significado da última estrofe, que menciona o "amanhecer mais noite que a noite"?

      A última estrofe sugere um amanhecer sombrio e desolador, simbolizando a falta de esperança e a escuridão que o autor sente em relação ao mundo e à sua própria vida.

 

 

CONTO: PELE DE BICHO - IRMÃOS GRIMM - COM GABARITO

 Conto: Pele de bicho

            Irmãos Grimm

        Um conto de fadas dos Irmãos Grimm.

        Houve, uma vez, um rei cuja esposa tinha os cabelos iguais ao outro e era tão linda como não havia outra na terra.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgpLSSD-7vEm451UGKBJUKiush3sJiB0qriNCVjo8JxpKTdlf1EIMxDrEhkIXHpKGXOcCAJiCoYnwO8qog5AV7GmxBCqNDv4j5YoOBdtP01a6LXtLXtZdRPyv62OhyphenhyphenmVrwAC8Obp-RvNU9-0WngbQasuzEZ7P4kEA4ZHkw2dw_ZyueXo1__s5jEomDHv88/s1600/RAINHA.jpg


        Quis o céu que a nobre e bondosa rainha adoecesse sem que médico algum pudesse salvar-lhe a vida. Sentindo aproximar-se a última hora, chamou o esposo e recomendou:

        -- Depois de minha morte, se quiseres casar-te outra vez, não cases com mulher menos formosa do que eu; que tenha os cabelos dourados como os meus e seja muito mais prendada. Exijo tua promessa para morrer tranquila.

        O rei prometeu tudo o que ela quis. Pouco depois a rainha morreu, deixando-o louco de desespero e verdadeiramente inconsolável; sua dor era tão grande que não queria pensar em eventual casamento. Mas, decorrido algum tempo, os conselheiros reuniram-se e juntos foram pedir ao rei que tornasse a casar:

        -- O rei não pode reinar sozinho, é necessário que se case para que tenhamos a nossa rainha.

        O rei não queria aceitar a sugestão e alegou a promessa que fizera à esposa; então os dignitários da corte expediram mensageiros por todos os lados a fim de descobrir uma mulher que fosse tão linda e prendada como a rainha falecida.

        Mas ninguém conseguia encontrá-la em parte alguma; mesmo que a tivessem encontrado, nenhuma, por mais bela que fosse, tinha aqueles cabelos de ouro. Portanto, os mensageiros voltaram de mãos vazias.

        O rei tinha uma filha, que era o retrato vivo da mãe e de belos cabelos de ouro. Já estava moça e, certo dia, reparando melhor nela, o rei viu que era igualzinha à falecida esposa e apaixonou-se perdidamente por ela. Então declarou aos seus conselheiros:

        -- Quero casar com minha filha; ela é o retrato vivo de minha falecida esposa e, por outro lado, já me convenci de que jamais encontrarei alguém que se lhe assemelhe.

        Ouvindo isso, os conselheiros ficaram horrorizados e disseram:

        -- Deus proíbe que o pai case com a filha; do pecado não pode sair bem nenhum e também o reino sofrerá e será arrastado à ruína.

        A princesa quase desmaiou no ouvir o ignóbil desígnio do rei; lançou-se-lhe aos pés, esperando dissuadi-lo com seus rogos e lágrimas. Mas o rei estava firme no extravagante projeto e nada o podia abalar. Então a princesa disse-lhe:

        -- Antes de consentir no teu desejo, quero que me dês três vestidos: um de ouro como o sol, um de prata como a lua e um cintilante como as estreias; além disso, quero também um manto feito com peles de toda espécie de animais; cada animal de teu reino tem de fornecer um pedaço de pele.

        Assim dizendo, pensava: "É impossível realizar tal desejo, mas com isso desvio meu pai de seu horrível propósito."

        O rei, porém, não desanimou. Reuniu todas as moças mais hábeis do reino que tiveram de confeccionar os três vestidos: um de ouro como o sol, um de prata como a lua e um cintilante como as estrelas. Enquanto isso, os caçadores foram incumbidos de capturar todos os animais do reino e tirar um pedaço de pele de cada um, confeccionando-se assim um manto variegado.

        Finalmente, quando tudo ficou pronto, o rei mandou buscar o manto e exibiu-o à princesa, dizendo:

        -- Amanhã realizaremos as bodas.

        Ao ver que não lhe restava nenhuma esperança de comover o coração paterno, e mudar seus tristes pensamentos, a princesa resolveu fugir.

        Durante a noite, enquanto todos dormiam, ela preparou-se e apanhou três de seus objetos mais preciosos: um anel ricamente cinzelado, uma pequenina roca de ouro e um minúsculo fuso também de ouro. Meteu dentro de uma casca do noz os três vestidos, de sol, de lua e de estreias, envolveu-se no manto de peles de bicho e com fuligem pintou o rosto e as mãos. Depois recomendou-se piedosamente à proteção de Deus e saiu do palácio sem ser reconhecida.

        Andou a noite inteira e muito mais ainda, até que por fim chegou a uma floresta. Sentindo-se muito cansada, meteu-se na toca de uma árvore e adormeceu.

        Ao raiar do sol, ela ainda continuava dormindo a sono solto e assim foi até muito tarde. Justamente nesse dia, um rei, que era o proprietário da floresta, foi caçar; quando os cães chegaram àquela árvore, puseram-se a latir e a saltar de um lado e de outro. O rei disse aos seus caçadores:

        -- Ide ver que animal se esconde lá onde estão os cães.

        Os caçadores obedeceram e, após terem verificado o que havia, voltaram para junto do rei dizendo:

        -- Na cavidade daquela árvore há um estranho animal, como nunca vimos antes: sua pele é coberta de todas as espécies de pelo. Está lá deitado a dormir.

        -- Procurai capturá-lo vivo, amarrai-o bem ao meu carro para ser transportado conosco à cidade.

        Os caçadores foram e agarraram a jovem, que despertou aterrorizada e se pôs a gritar:

        -- Não me façais mal! Sou uma pobre criatura abandonada pelos pais; tende compaixão de mim, levai-me convosco!

        Os caçadores então disseram:

        -- Pele de bicho, tu serves bem para limpar a cozinha; vem conosco, teu serviço será varrer a cinza.

        Meteram-na no carro e regressaram ao castelo real. Lá, deram-lhe para habitação um tugúrio embaixo da escada, triste e escuro, onde nunca penetrava o mais tênue raio de sol.

        -- Pele de bicho, emaranhada e selvagem, passarás a dormir aqui.

        Com isso, mandaram que fosse para a cozinha, com o encargo de baldear água e lenha, acender o fogo, depenar os frangos, limpar a verdura, varrer a cinza, em suma, fazer o trabalho mais grosseiro e penoso.

        Assim, Pele de Bicho passou a viver de maneira mais obscura e miserável. Ah, linda princesa, o que te estará ainda reservado!

        Passou-se muito tempo e, certo dia, o castelo engalanou-se; iam realizar uma grande festa para a qual haviam convidado meio mundo. A pobre criatura, saudosa dos bons tempos passados, pediu ao cozinheiro-chefe:

        -- Posso subir até lá em cima? Ficarei do lado de fora a espiar um pouquinho.

        -- Está bem, – disse mestre-cuca, – mas, dentro de meia hora, deves estar aqui para varrer a cinza.

        Ela pegou na lanterninha, entrou no horrível tugúrio, despiu o manto de peles, lavou a fuligem que lhe cobria o rosto e as mãos e toda a sua esplendorosa beleza reapareceu. Então abriu a casca de noz e tirou dela o vestido cujo tecido parecia feito de raios de sol, vestiu-se e adornou-se; depois foi à festa e todos, ao vê-la, abriam alas, embasbacados ante tamanha beleza. Ninguém a conhecia, mas não duvidavam que fosse alguma princesa incógnita. O rei saiu ao seu encontro, estendeu-lhe a mão e só quis dançar com ela, pensando consigo mesmo: "Criatura tão linda, meus olhos ainda não viram."

        Terminada que foi a dança, ela inclinou-se num gesto de graça encantadora; quando o rei voltou a si da admiração, ela havia desaparecido não se sabe por onde. Chamaram os guardas do castelo e interrogaram-nos, mas todos responderam não ter visto ninguém.

        Ela correu rapidamente para o seu tugúrio e despiu a toda pressa o maravilhoso vestido, pintou o rosto e as mãos com fuligem e tornou a enfiar o manto de peles, voltando a ser a pobre Pele de Bicho. Quando entrou na cozinha para retomar seu trabalho, o cozinheiro disse-lhe:

        -- Deixa isso para amanhã; agora quero que prepares a sopa para o rei, pois também desejo dar uma espiadela lá em cima. Mas toma cuidado, não deixes cair nenhum fio de cabelo dentro, senão para o futuro nunca mais terás nada para comer.

        O cozinheiro saiu e Pele de Bicho preparou uma sopa de pão para o rei; esmerou-se por fazê-la a mais deliciosa possível e, quando ficou pronta, correu ao seu tugúrio e trouxe o anel de ouro, colocando-o na vasilha em que era servida a sopa.

        Findo o baile, o rei ordenou que lhe servissem a sopa. Comeu-a e gostou tanto que declarou nunca ter comido outra melhor.

        Quando, porém, chegou ao fundo do prato, viu o anel de ouro e não conseguiu compreender como viera parar aí. Mandou chamar o cozinheiro. Este, ao receber o recado, ficou preocupado e disse a Pele de Bicho:

        -- Deixaste, certamente, cair um cabelo dentro da sopa; se assim for, levarás o que mereces.

        Apresentou-se diante do rei, cheio de temor. O rei perguntou-lhe quem havia preparado a sopa. O cozinheiro, mais que depressa, respondeu:

        -- Fui eu, Majestade.

        Mas o rei retrucou:

        -- Não é verdade; a sopa estava diferente e muito melhor que de costume.

        O cozinheiro, então, foi obrigado a confessar:

        -- Realmente, Majestade, não fui eu, mas foi Pele de Bicho quem a fez.

        O rei ordenou:

        -- Vai chamar Pele de Bicho.

        Assim que ela compareceu perante o rei, este perguntou-lhe:

        -- Quem és tu?

        -- Sou uma pobre criatura que não tem mais pai nem mãe, – respondeu ela.

        -- E que fazes no meu castelo? – prosseguiu o rei.

        -- Eu não sirvo para coisa alguma, – disse ela, – a não ser para que me atirem os sapatos na cabeça.

        O rei tornou a perguntar:

        -- Quem te deu aquele lindo anel que estava dentro da sopa?

        -- Não sei de que anel se trata, – respondeu ela.

        Por conseguinte, o rei nada pôde descobrir e mandou-a de volta para a cozinha.

        Passado algum tempo, realizou-se no castelo uma outra festa e Pele de Bicho tornou a pedir ao cozinheiro que lhe permitisse dar uma espiada. Ele respondeu:

        -- Podes ir, mas deves voltar dentro de meia hora e fazer aquela sopa de pão que tanto agrada ao rei.

        Pele de Bicho correu ao seu tugúrio, limpou-se e lavou-se cuidadosamente, tirou da noz o lindo vestido prateado como o luar e vestiu-se, adornando-se como da outra vez. Depois subiu as escadarias com o andar esbelto e gracioso de verdadeira princesa.

        O rei saiu-lhe ao encontro, cheio de alegria por tornar a vê-la.

        Também dessa vez, não quis dançar com nenhuma outra dama, só com ela. Mas, assim que acabou a contradança, ela sumiu tão rapidamente, que o rei não conseguiu ver por onde saiu.

        Ela correu para o seu tugúrio e, em breve, voltou a ser o animal peludo de sempre, depois correu à cozinha a fim de preparar a sopa para o rei. Enquanto o cozinheiro estava lá em cima espiando a festa, ela foi buscar a pequenina roca de ouro e meteu-a dentro da vasilha da sopa.

        Mais tarde um pouco, levaram a sopa ao rei que, como da primeira vez, comeu-a com grande satisfação, mandando depois chamar o cozinheiro. Este teve novamente de confessar ter sido preparada por Pele de Bicho, a qual, mais uma vez chamada, teve que comparecer à presença do rei e responder às suas perguntas. Respondeu como da outra vez: que só servia para que lhe atirassem os sapatos na cabeça, e que ignorava completamente, tudo da roca de ouro encontrada na sopa.

        Tudo parecia esquecido e Pele de Bicho continuava os tristes afazeres na cozinha. Eis que, um belo dia, o rei organizou outra festa, talvez com saudade da bela desconhecida. E tudo se processou como das vezes anteriores. O cozinheiro, porém, disse:

        -- Pele de Bicho, tu deves ser uma bruxa; sempre encontras meio de pôr qualquer coisa na sopa, e te sai tão boa que agrada ao rei mais do que a feita por mim.

        A jovem implorou ao cozinheiro que a deixasse ir ver a festa; demorar-se-ia apenas o tempo estabelecido. O severo mestre-cuca não pôde recusar-lhe o que pedia, e ela correu ao seu tugúrio, lavou-se, penteou-se e envergou o vestido cintilante como as estrelas; depois dirigiu-se ao salão de festas. O rei, fascinado, também desta vez, só quis dançar com ela, achando que ainda estava mais bela.

        Enquanto dançavam, sem que ela o percebesse, enfiou-lhe um anel no dedo. Havia previamente ordenado que a contradança demorasse um pouco mais. Acabando de dançar, tentou prendê-la, segurando-lhe a mão, mas ela desvencilhou-se e fugiu tão rapidamente, que ele não pôde ver por onde saiu.

        Pele de Bicho correu para o seu tugúrio; mas como se havia demorado mais que o tempo previsto, não pôde despir o lindo vestido; então cobriu-o com o manto de peles; estava tão apressada que, ao tingir-se com a fuligem, esqueceu um dedo, que ficou branquinho. Correu para a cozinha, preparou a sopa do rei e antes que fosse servida, deitou dentro da vasilha o minúsculo fuso de ouro.

        O rei, ao encontrar o fuso, mandou chamar Pele de Bicho. Ela apresentou-se como sempre, mas não reparou no dedinho que ficara branco; o rei, porém, viu-o e viu também o anel que enfiara nele durante a dança. Então agarrou-lhe a mão e segurou-a firmemente; quando ela tentou desvencilhar-se para fugir, o horrível manto de peles abriu-se um pouco, mostrando uma nesga do vestido cintilante. O rei, com um gesto rápido, arrancou-lhe o manto e, no mesmo instante, rolaram como uma cascata seus cabelos de ouro e ela surgiu magnífica, em todo o esplendor, que já não podia mais ocultar.

        Então lavou a fuligem que lhe cobria o rosto e as mãos e apareceu tal qual era: a criatura mais linda que jamais se vira no mundo. O rei, comovido, disse-lhe:

        -- Serás a minha esposa muito amada; nunca mais nos separaremos.

        Ela aceitou e depois de alguns dias realizaram-se as núpcias. Eram ambos tão felizes que viveram tanto, tanto tempo, até à morte.

Irmãos Grimm.

Entendendo o conto:

01 – Quem era a rainha no início do conto?

      A rainha no início do conto era a esposa do rei, que tinha cabelos dourados e era extremamente bela.

02 – O que a rainha pediu ao rei antes de sua morte?

      A rainha pediu ao rei que, após sua morte, ele se casasse apenas com uma mulher que fosse tão formosa quanto ela, com cabelos dourados como os dela, e que fizesse essa promessa para que ela pudesse morrer em paz.

03 – Por que o rei relutou em se casar novamente após a morte da rainha?

      O rei relutou em se casar novamente porque queria cumprir a promessa feita à sua falecida esposa de encontrar uma mulher tão bela quanto ela, o que ele acreditava ser impossível.

04 – Como a princesa tentou evitar que seu pai cumprisse sua intenção de se casar com ela?

      A princesa pediu ao rei três vestidos (um de ouro, um de prata e um cintilante), bem como um manto feito de peles de animais de todo o reino, acreditando que esses pedidos seriam impossíveis de serem atendidos.

05 – Como o rei conseguiu atender aos pedidos da princesa?

      O rei reuniu as mulheres mais habilidosas do reino para confeccionar os vestidos, e os caçadores capturaram e coletaram peles de animais para fazer o manto.

06 – Como a princesa tentou fugir do rei quando ele expressou o desejo de se casar com ela?

      A princesa tentou fugir durante a noite, preparando-se e saindo do palácio sem ser reconhecida.

07 – O que aconteceu quando a princesa entrou na floresta após fugir do palácio?

      Na floresta, a princesa se refugiou em uma árvore oca e adormeceu.

08 – Como o rei a encontrou na floresta?

      O rei, que era proprietário da floresta, foi caçar e os cães latiram e saltaram ao redor da árvore onde a princesa estava escondida, levando o rei a descobri-la.

09 – Como a princesa foi tratada depois de ser capturada pelo rei?

      Ela foi tratada como "Pele de Bicho", forçada a viver em um tugúrio escuro e a realizar tarefas árduas na cozinha do castelo.

10 – Como a verdadeira identidade da princesa foi finalmente revelada?

      A verdadeira identidade da princesa foi revelada quando, durante uma festa no castelo, o rei a reconheceu como a misteriosa dama que dançou com ele. Ele a segurou pelo dedo, notando o anel que ele havia colocado nela durante a dança, e quando ela não conseguiu mais esconder sua verdadeira aparência, seu disfarce se desfez e sua beleza foi revelada.

 

 

CONTO: O TOURO E O HOMEM - LUÍS DA CÂMARA CASCUDO - COM GABARITO

Conto: O touro e o homem

           Luís da Câmara Cascudo

        Um touro, que vivia nas montanhas, nunca tinha visto o homem. Mas sempre ouvia dizer por todos os animais que era ele o animal mais valente do mundo. Tanto ouviu dizer isto que, um dia, se resolveu a ir procurar o homem para saber se tal dito era verdadeiro.

 Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgPA97t1gf7lboSGTA9AWL8dqAUkd5Zs0BW_4yFJqKtHcMXgYzvMVlIuD8oQSl_-Cc8F3g-_X772MUhePtIczPGZsPTBE3dcdJO9Q7g4fUZrpRT96U1BswS11s-f3foJyfSPLgBCRCWMWhP2B2gJEX99x7hDJLHIbQM_Lu030ouSKPkslpoIJBgdjHCNKM/s320/TOURO.jpeg


        Saiu das brenhas, e, ganhando uma estrada, seguiu por ela. Adiante encontrou um velho que caminhava apoiado a um bastão.

        Dirigindo-se a ele perguntou-lhe:

        — Você é o bicho homem?

        — Não! — respondeu-lhe o velho — já fui, mas não sou mais!

        O touro seguiu e adiante e encontrou uma velha:

        — Você é o bicho homem?

        — Não! — Sou a mãe do bicho homem!

        Adiante encontrou um menino:

        — Você é o bicho homem?

        — Não! — Ainda hei de ser; sou o filho do bicho homem.

        Adiante encontrou o bicho homem que vinha com um bacamarte no ombro.

        — Você é o bicho homem?

        — Está falando com ele!

        — Estou cansado de ouvir dizer que o bicho homem é o mais valente do mundo, e vim procurá-lo para saber se ele é mais do que eu!

        — Então, lá vai! — disse o homem armando o bacamarte, e disparando-lhe um tiro nas ventas.

        O touro desesperado de dor, meteu-se no mato e correu até sua casa, onde passou muito tempo se tratando do ferimento.

        Depois, estando ele numa reunião de animais, um lhe perguntou:

        — Então, camarada touro, encontrou o bicho homem?

        — Ah! meu amigo, só com um espirro que ele me deu na cara, olhe o estado em que fiquei!

Fonte: Contos Tradicionais do Brasil (folclore) de Luís da Câmara Cascudo, Rio de Janeiro, Ediouro:1967. pp 289-90.

Entendendo o conto:

01 – Por que o touro decidiu procurar o homem?

      O touro decidiu procurar o homem porque havia ouvido dizer que o homem era o animal mais valente do mundo e queria verificar se isso era verdade.

02 – Quem o touro encontrou primeiro em sua busca pelo homem?

      O touro encontrou primeiro um velho enquanto procurava o homem.

03 – Qual foi a reação do velho quando o touro perguntou se ele era o bicho homem?

      O velho respondeu que já tinha sido o bicho homem, mas não o era mais.

04 – Quem finalmente se revelou como o bicho homem na história?

      O homem que estava carregando um bacamarte no ombro se revelou como o bicho homem na história.

05 – Qual foi o resultado do encontro do touro com o bicho homem?

      O bicho homem disparou um tiro no touro, causando-lhe grande dor, e o touro fugiu desesperado para sua casa para se tratar do ferimento.

 

 

 

  

CONTO: O CARA DE PAU - LUÍS DA CÂMARA CASCUDO - COM GABARITO

 Conto: O Cara de Pau

           Luís da Câmara Cascudo

        Um rei tinha uma filha tão formosa que, ficando viúvo, quis casar-se com ela. A moça era afilhada de Nossa Senhora e ficou horrorizada com o pensamento do pai, mas esse ameaçou-a de morte se não o recebesse por marido. Não sabendo o que fazer, a moça rezou muito a Nossa Senhora pedindo seu auxílio e ouviu umas vozes dizendo:

        — Pede um vestido cor do campo com suas flores!

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgbQBsWxrgm-lEqViqdkFYBeat-VDX-no2zlsvwtsIHU7lVleWEx6UE3zeD_ZL_8HAFAdlM3zqW68pNJMiqn8Hoz1m649mN4nQKfG2uGoKoKqRQ6Y1Nsye-Kc29voMRiPegQA47BdjbYAo3oRBxAiA2GA_Bm1fFpUN71WLgc0VmaknKmNfkw6AdAIyec20/s320/campo.jpg


        A menina pediu o vestido e o pai mandou fazer e o trouxe feito, tão bonito que era uma maravilha. Outra vez foi a menina chorar e as vozes disseram:

        — Pede um vestido da cor do mar com todos os peixes.

        Feito o pedido, o rei juntou todos os artistas e conseguiu o vestido como era desejado. Novamente a menina correu aos pés de Nossa Senhora e as vozes ensinaram:

        — Pede um “vestido cor do céu com suas estrelas, o sol e a lua”.

        A menina pediu o vestido e o rei, querendo casar com ela, mandou que se fizesse sob pena de morte. O vestido ficou lindo e a princesa chorou muito lembrando-se de que seu pai havia de querer o cumprimento de sua promessa. As vozes voltaram a dizer-lhe:

        — Junta tudo quanto for teu e foge do palácio. Para que ninguém saiba quem és, nunca deverás rir nem achar graça em cousa alguma.

        A moça guardou os vestidos numa maleta e fugiu do palácio, indo pelas estradas o mais longe que lhe foi possível. Andou muito e chegou a uma cidade onde procurou trabalho para viver e só encontrou lugar no palácio do rei como ajudante na cozinha. Aceitou e ficou com as tarefas mais pesadas e humildes da casa. Como vivia sempre sisuda e não achava graça em cousa alguma, chamavam-na Cara de Pau.

        Uma vez o rei preparou festas para os amigos e as moças todas da cidade deviam comparecer aos bailes que durariam três dias consecutivos.

        Quando do primeiro baile, todos foram olhar a festa das salas, e Cara de Pau ficou na cozinha, lavando as panelas. Vendo-se sozinha, correu ao seu quarto e vestiu-se com o vestido da cor do campo com suas flores, e compareceu ao salão, causando admiração a todos. O príncipe veio falar-lhe, prestando muita atenção e convidou-a a dançar com ele várias vezes.

        Antes que o baile terminasse, Cara de Pau abandonou o salão e fugiu para seu quarto onde voltou a vestir as roupas remendadas de criada.

        As criadas e cozinheiras conversaram sobre a moça da noite anterior e Cara de Pau não dava mostras de entender o que diziam. Na noite segunda fez o mesmo e o vestido cor do mar com todos os seus peixes causou admiração ainda maior.

        O príncipe, desde que a viu entrar, não mais a deixou, conversando com ela e dançando, a perguntar seu nome, de onde era, etc. A moça respondia por meias palavras e o príncipe estava verdadeiramente apaixonado por ela. Com habilidade conseguiu fugir antes do baile acabar e tornou às roupas feias com que servia na cozinha.

        Na última noite Cara de Pau foi a rainha da festa, com seu vestido cor do céu, com suas estrelas, o sol e a lua, dançando bem e agradando a todas. O príncipe, enamorado, deu-lhe um anel, pedindo-lhe a mão em casamento. Cara de Pau disse que ia pensar, esperando que o príncipe provasse que a amava deveras. Ainda uma vez pôde fugir sem ser apanhada.

        O príncipe procurou Cara de Pau por todos os recantos e casas da cidade, mandando escrever para outros reinos e ninguém dava notícias. De paixão, adoeceu e não queria comer. Ia enfraquecendo e os pais ficaram tristes porque não havia médico que acertasse em curar o príncipe. A rainha pensou em mandar fazer iguarias por todas as criadas da casa, uma de cada vez, para ver se o filho comia alguma cousa. Fizeram todas as criadas bolos e rebuçados mas o rapaz ia provando e recusava servir-se. Cara de Pau ofereceu-se para fazer um bolo e a cozinheira ficou zangada com o atrevimento: Pois logo você, uma suja e porcaIhona, ir fazer bolos para o príncipe?

        A rainha velha, então, disse que Cara de Pau fizesse um bolo como as outras tinham feito. Cara de Pau fez o bolo com cuidado e meteu dentro da massa o anel que o príncipe lhe havia dado. Cozido o bolo e mandado para a mesa do príncipe este apenas o olhou, mas a rainha tanto pedia que ele provasse que o rapaz cortou uma fatia e levou-a à boca. Logo sentiu um duro, e verificando reconheceu o anel que dera à moça dos três bailes. Ficou logo melhor de saúde, perguntando quem fizera o bolo e que viesse imediatamente à sua presença. A rainha mandou chamar criada que fizera o doce e quando chegou Cara de Pau ao quarto, tirou o vestido sujo e apresentou-se com um dos vestidos da festa. O príncipe beijou-lhe a mão e apresentou-a a todos como sua noiva. Casaram-se e viveram muito felizes.

                      Fonte: Os melhores contos Populares de Portugal. Org. de Câmara Cascudo. Dois Mundos Editora.

Entendendo o conto:

01 – Qual era o desejo do rei em relação à sua filha no início do conto?

      O rei desejava casar-se com sua própria filha.

02 – Como a filha do rei conseguiu escapar dessa situação?

      Ela recebeu orientações de Nossa Senhora para pedir vestidos especiais e depois fugir do palácio.

03 – Por que a filha do rei recebeu o apelido "Cara de Pau"?

      Ela recebeu esse apelido por nunca rir ou demonstrar alegria em nada.

04 – O que aconteceu quando "Cara de Pau" compareceu ao primeiro baile usando o vestido da cor do campo?

      Ela chamou a atenção do príncipe e dançou com ele várias vezes.

05 – Como "Cara de Pau" conseguiu fugir do baile sem ser notada na primeira noite?

      Ela deixou o baile antes do final e voltou às roupas de criada.

06 – O que o príncipe deu a "Cara de Pau" durante o segundo baile?

      O príncipe deu um anel a "Cara de Pau" durante o segundo baile.

07 – O que o príncipe fez quando não conseguiu encontrar "Cara de Pau" após os bailes?

      Ele procurou por ela em toda a cidade e em outros reinos.

08 – O que Cara de Pau fez para curar o príncipe quando ele estava doente?

      Ela fez um bolo especial e colocou o anel que o príncipe lhe deu dentro do bolo.

09 – Qual foi a reação do príncipe quando reconheceu o anel no bolo feito por "Cara de Pau"?

      Ele ficou melhor de saúde e pediu para que a criada que fez o bolo fosse trazida até ele.

10 – Como o conto "O Cara de Pau" termina?

      O príncipe beija a mão de "Cara de Pau", a apresenta como sua noiva e eles se casam, vivendo felizes.