terça-feira, 21 de julho de 2020

CRÔNICA: O LIXO - LUÍS FERNANDO VERÍSSIMO - COM GABARITO

Crônica: O lixo  

                  Luís Fernando Veríssimo

Encontram-se na área de serviço. Cada um com seu pacote de lixo.

É a primeira vez que se falam.

-- Bom dia...

-- Bom dia.

-- A senhora é do 610.

-- E o senhor do 612

-- É.

-- Eu ainda não lhe conhecia pessoalmente...

-- Pois é...

-- Desculpe a minha indiscrição, mas tenho visto o seu lixo...

-- O meu quê?

-- O seu lixo.

-- Ah...

-- Reparei que nunca é muito. Sua família deve ser pequena...

-- Na verdade sou só eu.

-- Mmmm. Notei também que o senhor usa muito comida em lata.

-- É que eu tenho que fazer minha própria comida. E como não sei cozinhar...

-- Entendo.

-- A senhora também...

-- Me chame de você.

-- Você também perdoe a minha indiscrição, mas tenho visto alguns restos de comida em seu lixo. Champignons, coisas assim...

-- É que eu gosto muito de cozinhar. Fazer pratos diferentes. Mas, como moro sozinha, às vezes sobra...

-- A senhora... Você não tem família?

-- Tenho, mas não aqui.

-- No Espírito Santo.

-- Como é que você sabe?

-- Vejo uns envelopes no seu lixo. Do Espírito Santo.

-- É. Mamãe escreve todas as semanas.

-- Ela é professora?

-- Isso é incrível! Como foi que você adivinhou?

-- Pela letra no envelope. Achei que era letra de professora.

-- O senhor não recebe muitas cartas. A julgar pelo seu lixo.

-- Pois é...

-- No outro dia tinha um envelope de telegrama amassado.

-- É.

-- Más notícias?

-- Meu pai. Morreu.

-- Sinto muito.

-- Ele já estava bem velhinho. Lá no Sul. Há tempos não nos víamos.

-- Foi por isso que você recomeçou a fumar?

-- Como é que você sabe?

-- De um dia para o outro começaram a aparecer carteiras de cigarro amassadas no seu lixo.

-- É verdade. Mas consegui parar outra vez.

-- Eu, graças a Deus, nunca fumei.

-- Eu sei. Mas tenho visto uns vidrinhos de comprimido no seu lixo...

-- Tranquilizantes. Foi uma fase. Já passou.

-- Você brigou com o namorado, certo?

-- Isso você também descobriu no lixo?

-- Primeiro o buquê de flores, com o cartãozinho, jogado fora.

Depois, muito lenço de papel.

-- É, chorei bastante, mas já passou.

-- Mas hoje ainda tem uns lencinhos...

-- É que eu estou com um pouco de coriza.

-- Ah.

-- Vejo muita revista de palavras cruzadas no seu lixo.

-- É. Sim. Bem. Eu fico muito em casa. Não saio muito. Sabe como é.

-- Namorada?

-- Não.

-- Mas há uns dias tinha uma fotografia de mulher no seu lixo. Até bonitinha.

-- Eu estava limpando umas gavetas. Coisa antiga.

-- Você não rasgou a fotografia. Isso significa que, no fundo, você quer que ela volte.

-- Você já está analisando o meu lixo!

-- Não posso negar que o seu lixo me interessou.

-- Engraçado. Quando examinei o seu lixo, decidi que gostaria de conhecê-la. Acho que foi a poesia.

-- Não! Você viu meus poemas?

-- Vi e gostei muito.

-- Mas são muito ruins!

-- Se você achasse eles ruins mesmo, teria rasgado. Eles só estavam dobrados.

-- Se eu soubesse que você ia ler...

-- Só não fiquei com eles porque, afinal, estaria roubando. Se bem que, não sei: o lixo da pessoa ainda é propriedade dela?

-- Acho que não. Lixo é domínio público.

-- Você tem razão. Através do lixo, o particular se torna público. O que sobra da nossa vida privada se integra com a sobra dos outros. O lixo é comunitário. É a nossa parte mais social. Será isso?

-- Bom, aí você já está indo fundo demais no lixo. Acho que...

-- Ontem, no seu lixo...

-- O quê?

-- Me enganei, ou eram cascas de camarão?

-- Acertou. Comprei uns camarões graúdos e descasquei.

-- Eu adoro camarão.

-- Descasquei, mas ainda não comi. Quem sabe a gente pode...

-- Jantar juntos?

-- É.

-- Não quero dar trabalho.

-- Trabalho nenhum.

-- Vai sujar a sua cozinha?

-- Nada. Num instante se limpa tudo e põe os restos fora.

-- No seu lixo ou no meu?

                                           Luís Fernando Veríssimo

Entendendo a crônica:

01 – É possível concluir, a partir da leitura do texto que:

a)   O lixo produzido pelas pessoas é um dos maiores causadores dos problemas ambientais urbanos.

b)   É preciso acondicionar corretamente o lixo para evitar os problemas ambientais.

c)   O lixo pode ser uma fonte de informação sobre as pessoas que o produzem.

d)   É possível apaixonar-se pelo lixo do outro.

02 – O texto é uma crônica porque:

a)   É um texto leve e bem humorado, com linguagem acessível e marcas da oralidade.

b)   É um texto leve e bem humorado, rico em vocabulário elevado e cheio de expressões antigas.

c)   É um texto elaborado para ser publicado em livro e, por isso, apresenta uma ligação com o momento em que foi realizado.

d)   É um texto literário e repleto de recursos poéticos, como metáforas e metonímias.

03 – Há identificação do tempo e do lugar de onde acontecem os fatos narrados?

      A identificação de tempo e de lugar também é muito vaga, pois podemos apenas identificar trata-se de um prédio de apartamentos, pela forma como os personagens se referem (a senhora do 610, o senhor do 612).

04 – Onde aconteceu o primeiro encontro das personagens?

a)   Dentro do apartamento.

b)   Na área de serviço.

c)   Na cozinha.

d)   No quarto do senhor do 612.

05 – Em “Isso” é incrível! Como você adivinhou? O elemento destacado retoma qual informação no texto?

a)   Envelopes no lixo da senhora.

b)   Família da senhora.

c)   Indiscrição do senhor.

d)   Pai da senhora.

06 – De acordo com o texto, qual elemento que faz o senhor chegar à conclusão que a senhora tina brigado com o namorado?

a)   Buquê de flores jogado no lixo.

b)   Carteira de cigarros amassados no lixo.

c)   Fotografia rasgada.

d)   Telegrama amassado no lixo.

07 – Qual a finalidade do texto?

a)   Anunciar a importância do lixo.

b)   Informar um fato acontecido na rua.

c)   Relatar conflitos entre vizinhos.

d)   Relatar um início de um relacionamento.

08 – O rompimento do namoro do homem foi revelado:

a)   Pela fotografia.

b)   Pelas cartas amassadas.

c)   Pelo buquê de flores.

d)   Pelos poemas escritos.

09 – Qual foi o pretexto utilizado pelos personagens para o início da conversa?

a)   A família.

b)   O lixo.

c)   O namorado.

d)   O pai.

10 – Na oração “Na verdade sou só eu”, o “eu” se refere a quem?

a)   Lixeiro.

b)   Senhor.

c)   Serviçal.

d)   Senhora.

11 – Todo o diálogo revela uma característica muito comum entre os habitantes das grandes cidades. Qual característica é essa?

a)   Amor aos bens materiais.

b)   Medo da violência.

c)   Poluição das grandes cidades.

d)   Solidão e ausência da família.

12 – Pelo texto, o que fez a mulher perceber que o homem recomeçou a fumar?

a)   A distância do pai.

b)   A morte do pai.

c)   O fim do romance.

d)   Os comprimidos.

13 – O diálogo introduz aos poucos, muitas informações sobre as personagens. Isso revela que:

a)   Eles já se conheciam há muito tempo.

b)   Eles não simpatizavam um com outro.

c)   Eles possuíam hábitos em comum.

d)   Eles sabiam muito da vida um do outro.

14 – De acordo com o que você compreendeu acerca da crônica, é possível afirmar que:

a)   Um texto só pode ser considerado crônica se ele estiver publicado em um jornal ou em uma revista.

b)   Um texto pode ser considerado crônica por apresentar algumas características peculiares a esse gênero, como a ligação a algum fato do cotidiano, as marcas de subjetividade do autor, entre outros.

c)   Um texto pode ser considerado crônica sempre que for narrativo, apresentar marcas de oralidade e determinações do tempo e do lugar onde foi produzido.

15 – Observe o trecho em destaque abaixo e explique, de acordo com a sua opinião e baseado na leitura do texto, por que o autor afirma que o lixo é comunitário e social. “Através do lixo, o particular se torna público. O que sobra da nossa vida privada se integra com a sobra dos outros. O lixo é comunitário. É a nossa parte mais social”.

      Resposta pessoal do aluno.

16 – O texto é construído com base nas informações que o cronista colhe nos lugares que percorre cotidianamente. Que fato desencadeou os acontecimentos narrados na crônica?

      Nessa crônica em especial, vemos como o autor parte de um fato bem comum, do dia-a-dia, o fato de ir colocar o lixo fora, para elaborar um enredo em que os personagens acabam por interessar-se um pelo outro à partir de seu diálogo sobre o lixo.

17 – Existe marcas de oralidade nessa crônica? Confirme com um trecho do texto.

      Nesta crônica, o diálogo é o elemento mais marcante de todo o texto, o que implica em uma grande presença da oralidade, através não só de marcas estruturais, como a pontuação.

      Ex.: “-- Eu sei. Mas tenho visto uns vidrinhos de comprimido no seu lixo...

              -- Tranquilizantes. Foi uma fase. Já passou.”

 

 

 

 

 


TEXTO: BRASIL COVID 19 - O GLOBO, UOL, FOLHA DE S.PAULO, G1 - COM GABARITO

Texto: BRASIL COVID 19

          11 de março de 2020

OMS declara pandemia de novo coronavírus

        A Organização Mundial da Saúde (OMS) disse nesta quarta-feira (11) que a epidemia de Covid-19, que infectou mais de 110.000 pessoas em todo mundo desde o final de dezembro, pode ser considerada uma "pandemia", mas que pode ser "controlada".

        Nas duas últimas semanas, o número de casos fora da China multiplicou 13 vezes e o número de países afetado triplicou, segundo a OMS.

        "Estamos profundamente preocupados com os níveis alarmantes de propagação e de gravidade, bem como com os níveis alarmantes de inação" no mundo, declarou o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, em entrevista coletiva em Genebra.

        "Consideramos, então, que a Covid-19 pode ser caracterizada como uma pandemia", afirmou.

        O chefe da OMS estimou que, "nos próximos dias e semanas", o número de casos, mortes e países afetados aumentará. A organização voltou a pedir aos países, porém, que atuem para "conter" a epidemia, que já matou mais de 4.000 pessoas no mundo inteiro.

        "Devemos ser mais agressivos", insistiu Tedros Adhanom Ghebreyesus, enfatizando que essa "pandemia" pode "ser controlada".

        Aparecido em dezembro na China, o coronavírus afeta todos os continentes, exceto a Antártica, e atrapalha a vida cotidiana e econômica em um número crescente de países.

        "O Irã e a Itália estão na linha de frente, estão sofrendo", disse o diretor-executivo do Programa de Emergência da OMS, Michael Ryan, assegurando que outros países enfrentariam a mesma situação.

        "No momento, no Irã, há escassez de aparelhos respiratórios, de oxigênio", completou ele.

        O diretor-geral da OMS afirmou que "o Irã está fazendo seu melhor".

        "Eles precisam de muito equipamento. Estamos tentando mobilizar mais apoio ao Irã", frisou.

Fontes: O Globo, UOL, Folha de S. Paulo, G1. Extraído de https://WWW.jornaljoca.com.br/ oms-declara-pandemia-de-coronovirus / em 30 março de 2020.

Entendendo o texto:

01 – Escreva o título e subtítulo da notícia a seguir:

a)   Título (manchete): Brasil covid 19

b)   Subtítulo: 11 de março de 2020 – OMS declara pandemia de novo coronavírus.

02 – A partir da leitura do texto, responda:

a)   O que aconteceu?

A pandemia do COVID 19.

b)   Quando aconteceu?

No dia 30 de março de 2020.

c)   Quem está envolvido na ação?

O diretor da Organização Mundial de Saúde (OMS) Tedros Adhanom Ghebreyesus e o Ministro da Saúde do Brasil, Luiz Henrique Mandetta.

03 – Às vezes, para poder dar mais credibilidade à informação o jornalista usa, no texto, a fala de algum especialista. Leia o trecho a seguir: “Estamos profundamente preocupados com os níveis alarmantes de propagação e de gravidade, bem como com os níveis alarmantes de inação no mundo”, declarou o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, em entrevista coletiva em Genebra.

a)   Sublinhe, no trecho destacado, a fala de alguém que cumpra o papel de dar mais credibilidade ao texto.

OMS.

b)   De quem é essa fala? Qual é a função dessa pessoa?

A fala é de Tedros Adhanom Ghebreyesus. Sua função é diretor-geral da OMS.

04 – A notícia explica o que é surto, epidemia, endemia e pandemia. Com suas palavras, sintetize essas informações:

·        Surto – Aparecimento rápido ou aumento súbito de casas de doença.

·        Epidemia – Doença que, numa localidade ou região, ataca simultaneamente muitas pessoas.

·        Pandemia – Surto de uma doença com distribuição geográfica internacional.

·        Endemia – Doença frequente nos habitantes de uma região ou localidade.

05 – Explique, com base nas informações coletadas no texto e em outras que você tenha, por que o coronavírus (COVID 19) é considerado uma Pandemia?

      Porque é uma doença que infectou pessoas em todo o mundo.

 

 

 

 


quarta-feira, 15 de julho de 2020

MÚSICA(ATIVIDADES): MARGINÁLIA II - GILBERTO GIL - COM GABARITO

Música(Atividades): Marginália II

                Gilberto Gil

Eu, brasileiro, confesso

Minha culpa, meu pecado

Meu sonho desesperado

Meu bem guardado segredo

Minha aflição

 

Eu, brasileiro, confesso

Minha culpa, meu degredo

Pão seco de cada dia

Tropical melancolia

Negra solidão

 

Aqui é o fim do mundo

Aqui é o fim do mundo

Aqui é o fim do mundo

 

Aqui, o Terceiro Mundo

Pede a bênção e vai dormir

Entre cascatas, palmeiras

Araçás e bananeiras

Ao canto da juriti

 

Aqui, meu pânico e glória

Aqui, meu laço e cadeia

Conheço bem minha história

Começa na lua cheia

E termina antes do fim

 

Aqui é o fim do mundo

Aqui é o fim do mundo

Aqui é o fim do mundo

 

Minha terra tem palmeiras

Onde sopra o vento forte

Da fome, do medo e muito

Principalmente da morte

Olelê, lalá

 

A bomba explode lá fora

E agora, o que vou temer?

Oh, yes, nós temos banana

Até pra dar e vender

Olelê, lalá

 

Aqui é o fim do mundo

Aqui é o fim do mundo

Aqui é o fim do mundo

Composição: Gilberto Gil / Torquato Neto.

                              Fonte: Livro – Encontro e Reencontro em Língua Portuguesa – 8ª Série – Marilda Prates – Ed. Moderna, 2005 – p. 107/8.

Entendendo a canção:

01 – Identifique no texto pelo menos duas palavras que possam ser relacionadas à religião católica.

      Confesso, pecado, culpa, bênção.

02 – Qual o significado de degredo?

      Exílio, afastamento voluntário ou compulsório.

03 – Procure no dicionário ou nos livros de História ou de Geografia a definição de Terceiro Mundo.

      Conjunto de nações ou de países que, devido a suas condições sociais, culturais, políticas e econômicas, não pode ser incluído entre os países mais desenvolvidos do mundo.

04 – “Aqui o Terceiro Mundo pede a bênção e vai dormir”.

a)   O que é pedir a bênção?

Pedir auxílio, autorização, permissão, aprovação. No texto, é curvar-se perante as grandes potências.

b)   A quem o Terceiro Mundo poderia estar pedindo a bênção?

O Terceiro Mundo, mais especificamente o Brasil, pede a bênção aos países desenvolvidos.

c)   A expressão “pedir a bênção” no texto tem um significado positivo ou negativo? Por quê?

Negativo, pois refere-se à submissão dos países subdesenvolvidos em relação aos países desenvolvidos.

05 – Os versos que iniciam a Canção do exílio, de Gonçalves Dias, poeta brasileiro do século XIX, foram aproveitados no poema por Torquato Neto. Gonçalves Dias estava estudando em Portugal e, saudosamente comparando-o ao Brasil, escreveu:

“Minha terra tem palmeiras,

Onde canta o Sabiá;

As aves que aqui gorjeiam,

Não gorjeiam como lá”.

Torquato Neto, ao escrever Marginália II em plena ditadura militar, via o Brasil de maneira diferente.

a)   Identifique no texto os versos que fazem referência ao poema de Gonçalves Dias.

Versos 27 e 30.

b)   O Brasil de hoje, para você, é mais parecido com a visão de Gonçalves Dias ou de Torquato Neto? Por quê?

Resposta pessoal do aluno.

06 – Marginália podem ser as anotações feitas à margem de um livro. Essa palavra pode também significar conjunto de marginais. Marginal é aquele que, de forma geral, fica à margem.

a)   De acordo com o texto, por que “Aqui é o fim do mundo”?

Para o eu lírico, o Brasil é o fim do mundo, uma vez que aqui há fome, abandono, aflição.

b)   A partir das reflexões feitas até agora, identifique: quem seria a marginália mencionada no título do poema?

A marginália seria o povo brasileiro, à margem do desenvolvimento.

 


POEMA: ARTISTA E OPERÁRIO - HARDY GUEDES - COM GABARITO

Poema: Artista e operário

             Hardy Guedes

Eu faço versos

Como quem trança uma rede

Como quem ergue a parede

Como quem prepara o pão.

 

Eu faço versos

Como quem cedo madruga

E nem sempre Deus ajuda

Como quem semeia o chão.

 

Eu faço versos

Como quem vai p’ra oficina

Quando a estrela matutina

Nem rompeu a escuridão.

 

Eu faço versos

E também a melodia

Trocando noite por dia

Como quem faz serão.

 

Acredito que meus versos

Tenham por esta razão

Cheiro de corpo suado

Calos na palma da mão.

 

E que eu sou, na verdade,

Quando faço uma cantiga

Artista e operário

Sou cigarra e dou formiga.

Hardy Guedes.

                              Fonte: Livro – Encontro e Reencontro em Língua Portuguesa – 8ª Série – Marilda Prates – Ed. Moderna, 2005 – p. 184/6.

Entendendo o poema:

01 – Na 1ª estrofe do poema “Artista e operário”, o eu lírico compara seu trabalho de compor com palavras (sem instrumento) com o trabalho braçal: trançar, construir e preparar o alimento. Que ligação existe entre cada um dos trabalhos citados e o ato de fazer versos? Argumente.

      O ato de compor versos e melodia exige um trabalho tão intenso como, o duro trabalho braçal do operário. Ou como o trabalho de preparar o pão...

02 – Na 2ª e 3ª estrofes, o eu lírico fala de uma dificuldade. Qual é ela? E por que a comparação?

      A dificuldade de trabalhar dia e noite, até de madrugada. Resposta pessoal do aluno.

03 – Há um velho ditado popular que diz: “Deus ajuda a quem cedo madruga”. No texto, o eu lírico afirma que nem sempre Deus ajuda a quem cedo madruga. Por quê?

      Porque muitos trabalhadores levantam cedo e ainda assim experimentam muitas dificuldades.

04 – Ao afirmar que troca a noite pelo dia como quem faz serão, a quem o eu lírico está se comparando?

      Ao trabalhador que faz horas extras.

05 – Conclua: Por que os versos do eu lírico teriam cheiro de corpo suado e calos na palma da mão?

      Porque são fruto de pesado trabalho, como o fruto de uma atividade braçal.

06 – Você conhece a fábula da cigarra e da formiga? Lembra que na história a formiga só trabalhava e a cigarra só cantava? O último verso. “Sou cigarra e sou formiga” conclui a mensagem construída desde o início do texto. Identifique essa mensagem.

      Mensagem: O poeta é artista e trabalhador, pois a tarefa de elaborar poesia é árdua e requer esforço e dedicação como qualquer outra tarefa.

 


CRÔNICA: O RELÓGIO - RUBEM ALVES - COM GABARITO

Crônica: O relógio

            Rubem Alves

        Eu tinha medo de dormir na casa do meu avô. Era um sobradão colonial enorme, longos corredores, escadarias, portas grossas e pesadas que rangiam, vidros coloridos nos caixilhos das janelas, pátios calçados com pedras antigas… De dia, tudo era luminoso. Mas quando vinha a noite e as luzes se apagavam, tudo mergulhava no sono: pessoas, paredes, espaços. Menos o relógio… De dia, ele estava lá também. Só que era diferente. Manso, tocando o carrilhão a cada quarto de hora, ignorado pelas pessoas, absorvidas por suas rotinas. Acho que era porque durante o dia ele dormia. Seu pêndulo regular era seu coração que batia, seu ressonar, e suas músicas eram seus sonhos, iguais aos de todos os outros relógios. De noite, ao contrário, quando todos dormiam, ele acordava, e começava a contar estórias. Só muito mais tarde vim a entender o que ele dizia: “Tempus fugit”. E eu ficava na cama, incapaz de dormir, ouvindo sua marcação sem pressa, esperando a música do próximo quarto de hora. Eu tinha medo. Hoje, acho que sei por quê: ele batia a Morte. Seu ritmo sem pressa não era coisa daquele tempo da minha insônia de menino. Vinha de muito longe. Tempo de musgos crescidos em paredes húmidas, de tábuas largas de assoalho que envelheciam, de ferrugem que aparecia nas chaves enormes e negras, da senzala abandonada, dos escravos que ensinaram para as crianças estórias de além-mar “dinguele-dingue que eu vou para Angola, dingue-ledingue que eu vou para Angola” de grandes festas e grandes tristezas, nascimentos, casamentos, sepultamentos, de riqueza e decadência… O relógio batera aquelas horas – e se sofrera, não se podia dizer, porque ninguém jamais notara mudança alguma em sua indiferença pendular. Exceto quando a corda chegava ao fim e o seu carrilhão excessivamente lento se tomava num pedido de socorro: “Não quero morrer… “Aí, aquele que tinha a missão de lhe dar corda – (pois este não era privilégio de qualquer um. Só podia tocar no coração do relógio aquele que já, por muito tempo, conhecesse os seus segredos) – subia numa cadeira e, de forma segura e contada, dava voltas na chave mágica. O tempo continuaria a fugir… Todas aquelas horas vividas e morridas estavam guardadas. De noite, quando todos dormiam, elas saíam. O passado só sai quando o silêncio é grande, memória do sobrado. E o meu medo era por isto: por sentir que o relógio, com seu pêndulo e carrilhão, me chamava para si e me incorporava naquela estória que eu não conhecia, mas só imaginava. Já havia visto alguns dos seus sinais imobilizados, fosse na própria magia do espaço da casa, fosse nos velhos álbuns de fotografia, homens solenes de colarinho engomado e bigode, famílias paradigmáticas, maridos assentados de pernas cruzadas, e fiéis esposas de pé, ao seu lado, mão docemente pousada no ombro do companheiro. Mas nada mais eram que fantasmas, desaparecidos no passado, deles, não se sabendo nem mesmo o nome. “Tempus fugit”. O relógio toca de novo. Mais um quarto de hora. Mais uma hora no quarto, sem dormir… Sentia que o relógio me chamava para o seu tempo, que era o tempo de todos aqueles fantasmas, o tempo da vida que passou. Depois o sobradão pegou fogo. Ficaram os gigantescos barrotes de pau-bálsamo fumegando por mais de uma semana, enchendo o ar com seu perfume de tristeza. Salvaram-se algumas coisas. Entre elas, o relógio. Dali saiu para uma casa pequena. Pelas noites adentro ele continuou a fazer a mesma coisa. E uma vizinha que não suportou a melodia do “Tempus fugit” pediu que ele fosse reduzido ao silêncio. E a alma do relógio teve de ser desligada.

        Tenho saudades dele. Por sua tranquila honestidade, repetindo sempre, incansável, “Tempus fugit”. Ainda comprarei um outro que diga a mesma coisa. Relógio que não se pareça com este meu, no meu pulso, que marca a hora sem dizer nada, que não tem estórias para contar. Meu relógio só me diz uma coisa: o quanto eu devo correr, para não me atrasar. Com ele, sinto-me tolo como o Coelho da estória da Alice, que olhava para seu relógio, corria esbaforido, e dizia: “Estou atrasado, estou atrasado…”.

        Não é curioso que o grande evento que marca a passagem do ano seja uma corrida, corrida de São Silvestre?

        Correr para chegar, aonde?

        Passagem de ano é o velho relógio que toca o seu carrilhão.

        O sol e as estrelas entoam a melodia eterna: “Tempus fugit”.

        E porque temos medo da verdade que só aparece no silêncio solitário da noite, reunimo-nos para espantar o tenor, e abafamos o ruído tranquilo do pêndulo com enormes gritarias. Contra a música suave da nossa verdade, o barulho dos rojões…

        Pela manhã, seremos, de novo, o tolo Coelho da Alice: “Estou atrasado, estou atrasado…”.

        Mas o relógio não desiste. Continuará a nos chamar à sabedoria:

        Quem sabe que o tempo está fugindo descobre, subitamente, a beleza única do momento que nunca mais será…

Rubem Alves. Tempus fugit. São Paulo: Paulinas, 1990, p. 8-11.

              Fonte: Português – Uma proposta para o letramento – Ensino fundamental – 8ª série – Magda Soares – Ed. Moderna, 2002 – p. 91-4.

Entendendo a crônica:

01 – O narrador conta que, na infância, tinha medo de dormir na casa do avô. Que relação tinha relógio com esse medo?

      No escuro e no silêncio da noite, só o relógio não dormia, continuava batendo as horas.

02 – Só mais tarde o narrador entende por que o relógio lhe causava medo, na infância. Explique as causas que ele dá para esse medo.

a)   “Eu tinha medo. Hoje, acho que sei por quê: ele batia a Morte”. Leia o trecho que se segue a essa frase e explique: por que o bater do relógio lembrava a Morte?

Porque ele já batia em tempos passados, na época de fatos e pessoas que já tinham desaparecido, já tinham morrido.

b)   Identifique na crônica esta frase que introduz outra causa para o medo: “E o meu medo era por isto:” Isto o quê?

O bater do relógio levava a criança a perceber que fazia parte de uma história passada que ela não conhecia.

03 – O narrador declara que só mais tarde entendeu o que relógio dizia: “Só muito mais tarde vim a entender o que ele dizia: “Tempus fugit”.

a)   Relógio não fala... como o relógio dizia: “Tempus fugit”?

Batendo regularmente seu pêndulo, tocando o carrilhão a cada quarto de hora.

b)   Por que o que o relógio dizia era “Tempus fugit”?

Porque suas batidas indicam que o tempo estava passando, estava fugindo.

04 – Localize este trecho na crônica: “Todas aquelas horas vividas e morridas estavam guardadas. De noite, quando todos dormiam, elas saíam.”

a)   A expressão “horas vividas” se refere a que acontecimento? E a expressão “horas morridas”?

Horas vividas – as horas em que as pessoas tinham vivido fatos, acontecimentos (festas e tristeza, nascimentos, casamentos, sepultamentos...).

Horas morridas – as horas de acontecimentos que já tinham passado.

b)   O que fazia que as “horas vividas e morridas” saíssem, quando todos dormiam?

No silêncio da noite, o bater do relógio trazia a lembrança das horas que ele tinha marcado, no passado – lembrança das horas durante as quais as pessoas tinham vivido, fatos tinham acontecido, e lembrança das horas que tinham desaparecido no passado, tinham morrido.

05 – Localize esta frase na crônica: “Já havia visto alguns dos seus sinais imobilizados...”.

a)   “... seus sinais” – sinais de quem?

Sinais da estória passada, que a criança não conhecia.

b)   Que sinais o narrador, quando criança, já havia visto?

Marcas do passado que tinham ficado na casa, fatos de pessoas que já tinham desaparecido.

c)   Por que esses sinais estavam imobilizados?

Porque eram sinais estáticos, parados, já não tinham vida, movimento.

06 – Recorde este trecho em que o narrador explica sua saudade do relógio da casa de seu avô: “Tenho saudades dele. Por sua tranquila honestidade, repetindo sempre, incansável, ‘Tempus fugit’.” Por que o narrador considera que o relógio era honesto?

      Porque ele informava escrupulosamente, francamente, que o tempo estava fugindo.

07 – Segundo o narrador, o relógio de pulso, ao contrário do relógio da casa de seu avô, “marca a hora sem dizer nada”. Por que o relógio de pulso não diz nada?

      Porque ele é silencioso, não bate as horas, não marca com sons a passagem do tempo.

08 – Por que “é curioso” que o grande evento que marca a passagem do ano seja a corrida de São Silvestre?

      Porque, tal como a corrida de São Silvestre é um correr em direção a algum lugar, também a passagem do ano é vista como o tempo correndo em direção ao ano seguinte.

09 – Quando criança, o narrador tinha medo – recorde as duas primeiras questões. No final da crônica, o narrador fala de novo de medo, um medo que todos temos: localize este trecho: “E porque temos meda da verdade que só aparece no silêncio solitário da noite...”.

a)   Que verdade é essa de que temos medo?

O tempo está sempre fugindo.

b)   Por que esse medo aparece na noite de passagem de ano?

Porque é uma ocasião em que prestamos atenção no relógio, na passagem do tempo, esperando a meia-noite que vai marcar a chegada de outro ano.

c)   Segundo o narrador, o que fazemos para espantar esse medo?

Fazemos barulho, gritamos, soltamos rojões.

10 – Recorde este trecho no final da crônica: “Mas o relógio não desiste. Continuará a nos chamar à sabedoria.”

a)   O relógio não desiste de quê?

Não desiste de dizer que o tempo está fugindo.

b)   Que mensagem sábia nos dá o relógio?

Sabendo que o tempo está fugindo, devemos descobrir a beleza do momento presente, que é único, pois logo fugirá, logo deixará de existir.

 


CRÔNICA: BALADA DO APOSENTADO - JÔ SOARES - COM GABARITO

Crônica: Balada do aposentado

  Jô Soares

 

Depois de trabalhar toda uma vida

E descontar por mês do seu salário,

Ao ver aquela soma recolhida,

Saindo do seu bolso para o erário,

Reflete o brasileiro conformado:

“No fundo esse dinheiro volta um dia,

Isso é pra quando eu for aposentado”.

Mas saibam da verdade nua e fria:

 

Hoje, não há mais quem se aposente

Como se aposentava antigamente.

 

Por onde andam os bancos de praça

Onde os velhinhos contavam vantagem?

Já perderam de vez a sua graça,

Viraram camas para a vadiagem.

 

Se agora vai à rua o aposentado

E escapa aos golpes de uma patinete,

Acaba seu passeio, injuriado,

Sendo assaltado por algum pivete.

 

Hoje, não há mais quem se aposente

Como se aposentava antigamente.

 

Onde andarão as mesas das esquinas

Tão frequentadas por nossos avós,

Que, enquanto olhavam pernas das meninas,

Jogavam damas, cartas, dominós?

Viraram bocas de fumo, e o bondoso

Senhor que ali ficar na contramão,

Além de ser carente e bem idoso,

Ainda leva fama de doidão.

 

Hoje, não há mais que se aposente

Como se aposentava antigamente.

 

E as praias em que a areia, o sol e o sal,

Num mágico e perfeito sintetismo,

Curavam de uma forma natural

Lumbago, asma, tosse, reumatismo?

Agora, ao frequentar um balneário,

Corre risco de vida o ancião:

Lá vai ao longe o afoito octogenário

Levado pela turba do arrastão.

 

Hoje, não há mais quem se aposente

Como se aposentava antigamente.

 

E quando além de tudo ele ainda pensa

Que a aposentadoria é uma benesse,

Descobre em sobressalto pela imprensa

Que vai ter que brigar com o INSS,

Pois quando tudo indica que é direito

Os cento e quarenta e sete por cento,

Lhe dizem logo na raça e no peito

Que nunca ele verá tamanho aumento.

 

Hoje, não há mais quem se aposente

Como se aposentava antigamente.

 

É certo que ministro, funcionário,

Deputado com oito anos de plenário,

Senador ou chefes de secretaria

Têm outro tipo de aposentadoria,

Que vai ser paga, é claro, com o dinheiro

Do pobre aposentado verdadeiro.

 

São os únicos, não há dúvida, minha gente,

Que se aposentam igualzinho a antigamente.

 Jô Soares em revista Veja, de 29.04.1992.

                        Fonte: Livro – Encontro e Reencontro em Língua Portuguesa – 8ª Série – Marilda Prates – Ed. Moderna, 2005 – p. 130/1.

Entendendo a crônica:

01 – O que pensa cada trabalhador ao ter, ao final de todo mês, no seu pagamento, uma quantia descontada com a função de um retorno no período da aposentadoria?

      Resposta pessoal do aluno.

02 – Por que Jô Soares diz que hoje não mais se aposenta como se aposentava antigamente? Procure saber e comentar.

      Resposta pessoal do aluno.

03 – Quando o homem e a mulher brasileiros podem aposentar-se no Brasil? Informe-se e comente.

      Resposta pessoal do aluno.

04 – Como viviam e por onde viviam os aposentados de antigamente? Eles era felizes? Conclua pelo texto.

      Resposta pessoal do aluno.

05 – O que acontece com os aposentados hoje, no Brasil? Como funciona o pagamento? Por que há diferenças no recebimento? Pesquise e responda.

      Resposta pessoal do aluno.

06 – Jô Soares termina a balada melancólica com uma crítica. Qual é ela? Comente-a.

      Resposta pessoal do aluno.