ARTIGO DE OPINIÃO: Os clássicos rebeldes
Fernando de Barros
Algumas peças de roupa foram decisivas
para a transformação de uma geração no século XX. Uma delas foi a calça jeans,
que Jacob Davis criou em 1853 com um pano geralmente usado para cobrir
carroças. Outra foi a minissaia, nascida da imaginação e audácia da estilista
inglesa Mary Quant.
O pano que deu origem ao jeans, começou
a ser fabricado em Nimes, na França, no final do século XVII. No século XVIII,
já era produzido em Halifax, na Inglaterra, onde ficou conhecido como De Nimes,
que deu origem ao seu nome: Denim. Da Europa ele seguiu para os Estados Unidos,
junto com imigrantes, como o alemão Lévi-Strauss, que foi para a Califórnia em
1847 e abriu uma distribuidora de tecidos importados em San Francisco, com seu
cunhado.
Na mesma época, o alfaiate Jacob Davis
fazia calças para os mineiros que trabalhavam nas minas da Califórnia. A
clientela não estava muito satisfeita, pois a roupa se estragava com
facilidade, no seu tipo de trabalho. Para resolver esse problema, Davis foi a
San Francisco procurar um pano mais resistente. Lévi-Strauss então lhe vendeu
um lote de tecido de sarja marrom, usado geralmente para cobrir tendas e
carroças. Foi com ele que Davis fez as novas calças, reforçadas nos bolsos com
rebites e fechadas na braguilha por botões de metal. O negócio foi melhorando
devagar. Faltava a Davis o capital necessário para desenvolvê-lo, com um bom
sistema de fabricação e distribuição. Ele então escreveu a Lévi-Strauss, que
continuava a ser seu fornecedor de tecidos, e propôs lhe dar 50 por cento dos
lucros se a firma fizesse registrar comercialmente o modelo de calça e
fornecesse mais tecido. Strauss aceitou sua proposta. Em 1873 a marca e o
feitio das calças estavam registrados. Assim foi criada a primeira grife de
roupas jeans.
A partir daí começou a existir dois
panos. Como o escritor John Hayes já observava numa obra em 1942, um deles era
o próprio jeans, um pano sarjeado de algodão com fios da mesma cor utilizado em
calças rancheiras, camisas para trabalhar e macacões. O outro era o denim, uma
versão na qual o sarjeado compreendia fios de algodão azuis e fios de algodão
cru, tecido mais caro utilizado nas roupas de trabalho. No século XIX as calças
de Lévi-Strauss já eram de tecido azul com fios de algodão cru e o tecido na
cor marrom tinha sumido de circulação.
No campo, nas indústrias e nas
ferrovias que rasgavam o território americano, o jeans começava a fazer parte
da paisagem. Quem usava uma camisa, um blusão ou uma rancheira jeans era
identificado como trabalhador – não só os mineiros, como os trabalhadores do
campo, os caubóis e os ferroviários. O jeans começou a se popularizar ainda
mais no começo do século XX, com o lançamento dos filmes com o caubói Tom Mix,
que se tornaram sucesso no mundo inteiro. Em No tempo das diligências, do
diretor John Ford, filmado em 1939, John Wayne usava jeans. O filme que mais
lançou o jeans no cinema, contudo, foi As vinhas da ira, 1940. Baseado no
romance de John Steinbeck, tinha como personagem principal Henry Fonda no papel
de um agricultor. A figura dos heróis do cinema com jeans se tornou quase uma
marca nos filmes que Hollywood passou a produzir. Elvis Presley usou jeans em
seu primeiro filme, Ama-me com ternura, 1956. Marlon Brando, em Uma rua chamada
pecado, também. Marilyn Monroe em O rio das almas perdidas, de Otto Preminger,
estava de jeans. James Dean, o astro rebelde do cinema americano, era tão
associado ao jeans que os fabricantes passaram a utilizar sua imagem em
material publicitário.
Na Segunda Guerra, aquelas calças de
sarja grossa deixaram de ser usadas apenas no trabalho das fábricas para ganhar
destaque no dia-a-dia. As mulheres que trabalhavam como operárias não só usavam
roupas jeans como as mesmas roupas jeans dos homens. Descobriram rápido a
praticidade daquela roupa sem grandes pretensões e de preço acessível.
O jeans se tornou o espírito da América
que estava saindo da guerra. Começavam naqueles anos as mudanças que iriam
influenciar as gerações seguintes. Depois disso, as pessoas e o modo como elas
se vestiam nunca mais seriam os mesmos.
Era o princípio também de um período
delirante em que se buscava um novo estilo, e o jeans era o material favorito
para essa transformação.
Não bastava usar calça jeans; era
preciso ser rebelde como ela. Aqueles tempos da moda nos pós-guerra procuravam
novas afirmações. E o jeans, que nada mais era do que uma roupa popular, boa
para o trabalho e o lazer, começou a se transformar em elemento de estilo.
Barros, Fernando de.
O Homem casual. São Paulo: Mandarim, 1998. p. 54-9.
Fonte: Linguagem
Nova. Faraco & Moura. Editora Ática. 8ª série. p. 38-42.
Entendendo o texto:
01 – Na sua origem, as
calças jeans surgiram para resolver uma insatisfação dos clientes do alfaiate
Jacob Davis. Explique.
As calças jeans
surgiram como roupa de trabalho. Por serem confeccionadas num tecido resistente
e muito durável, resolveram o problema do desgaste fácil das roupas, de que se
queixavam os mineiros da Califórnia.
02 – O tecido jeans,
originalmente marrom, deixou de circular em que época?
No século XIX.
03 – Assim como o tecido, os
detalhes metálicos das calças jeans tinham, originalmente, uma finalidade
prática. Qual?
Os detalhes em
metal – rebites dos bolsos e botões – eram um reforço na estrutura da roupa.
04 – O quinto parágrafo do
texto é quase inteiramente dedicado ao papel exercido pelo cinema na divulgação
do jeans.
a)
Que papel foi esse, segundo o texto?
O cinema foi um dos responsáveis pela transformação do jeans em
moda, pois a roupa foi utilizada por personagens de muitos filmes marcantes, representadas por
atores famosos.
b)
A que veículo de comunicação você atribuiria,
hoje, esse papel na divulgação de determinadas modas? Exemplifique.
A televisão sem dúvida.
05 – “O jeans se tornou o espírito da América que estava saindo da guerra.”
Que roupa, na sua opinião, revela o espírito de nossa época?
Resposta pessoal
do aluno.
06 – “Não bastava usar a calça jeans; era preciso ser rebelde como ela.”
Compare essa afirmação com a resposta que você deu à questão 1. A função e o
significado do jeans mudaram ao longo do tempo? Explique.
Sim, pois a
questão da resistência e durabilidade do tecido ficou em segundo plano quando a
roupa adquiriu um significado simbólico: expressar rebeldia.
07 – O uso desse tipo de
roupa tem ainda hoje esse significado social?
Não, pois o uso
muito amplo de determinada moda esvaziam seu significado original, fato que
ocorreu com o jeans.
08 – Há algum tipo de roupa
que você usa não porque “está na moda” simplesmente, mas porque revela seu
estado de espírito diante das pessoas? Descreva essa roupa para os colegas e
explique por que ela expressa sua maneira de ser.
Resposta pessoal
do aluno.
09 – Na sua opinião, nó
somos livres para usar a roupa que quisermos? Justifique.
Resposta pessoal
do aluno. Sugestão: A adequação/ inadequação da vestimenta a determinadas
situações, além das imposições da moda
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