domingo, 23 de abril de 2017

TEXTO:AÍ EU CHAMO A COTA - EURICO DE ANDRADE - COM GABARITO

TEXTO – AÍ EU CHAMO A COTA

        Lá nas entranhas de Tabui tem uma serra. Serra do Urubu. No pé da serra, um rio, o Sorongo. Ladeando o Sorongo, a estrada de ferro. Bem antes da ponte, a estaçãozinha que desmoronou. Restou o desvio, com as alavancas e trilhos enferrujados. Entre as duas – estaçãozinha e ponte -, o corte, com um barranco de uns 30 metros e lá vai pedrada. Lá de cima do barranco, o velho Totonho aprecia o movimento dos trens que passam rápido, 20 a 30 km por hora, no máximo uma vez por dia. Totonho não perde um. Ouve o ronco do bicho, tá lá ele, de cima do barranco, dicocado, fazendo pitinho, vendo o trem passar.
        Turma da estrada de ferro resolve colocar Totonho pra cuidar do que restou da velha estação. Foram fazer teste com o velho.
        --- Totonho, se a ponte do Sorongo cair e o trem tá vindo, o que o senhor faz?
        --- Vô ali e mudo a chave da lavanca do desvio pro trem muda de rumo e pará, uai!
        --- E se a chave estiver estragada?
        --- Aí arranjo um pano vermeio, vô pra riba da linha e fico banano. Aí o maquinista ne vê e para o trem, uai!
        --- Mas, Totonho, e se o maquinista não o vir, se estiver cochilando?
        --- Aí acho que é mais mió eu tê sempre um apito, quinem desses de juiz de futebol, e apitá até o trem pará...
        --- Totonho foi ficando agoniado com tanto perguntamento. Doido pra garantir o emprego e ganhar uns trocados.
        --- Mas, Totonho, e se o trem vier à noite?
        --- Aí só tem um jeito: eu acendo uma fogueira pro maquinista me vê e grito e pulo até ele pará o trem! ...
        --- Mas, fogueira, Totonho!? E se estiver chovendo?
        --- Ai, meu Deus! ... Aí o recurso é ieu tê tamém uma lanterna e fazê pisca-pisca pro maquinista, uai! ...
        --- Tudo bem, Totonho! Suponhamos agora que você tem a lanterna, mas não tem pilha? ... O que você faz?
        Totonho entregou os pontos. Desanimou de ganhar o emprego.
        Oia, meu amigo, aí num tem jeito não! é muita disgraça prum cristão só. Aí eu chamo a Cota!
        --- Chama a cota? Que cota, Totonho?
        --- Oia, moço, Cota é minha muié. Chamo ela, a gente vai pra riba do barranco, acendo meu pitinho e vamo oiá e escuitá o trem disgringolá e virá pedaceira, todo espatifado, ali bem dento do Sorongo! ...

               Eurico de Andrade – Brasília/DF – eurico2002@uol.com.br
                                     Disponível em: http://eptv.globo.com/caipira/.
                                                                    Acesso em: 29 out. 2012.

1 – O ambiente em que acontece a história é urbano ou rural?
      O ambiente descrito é rural.

2 – No texto, alguém faz perguntas para Totonho. Responda:
a)   O modo falar de Totonho é igual ou diferente do falar de quem dialoga com ele?
O modo de falar de Totonho é diferente do falar de quem dialoga com ele.

b)   O falar de Totonho é uma variedade linguística mais característica de alguém que vive na área urbana ou na rural?
O falar de Totonho é uma variedade mais característica de alguém que vive na área rural.

3 – Explique o que você entendeu destas respostas de Totonho:
a)   “- Aí arranjo um pano vermeio, vô pra riba da linha e fico banano. Aí o maquinista me vê e para o trem, uai!”
Totonho arranjará um pano vermelho, irá para cima da linha do trem e ficará abanando o pano para que o maquinista o veja e pare o trem.

b)   “- Aí acho que é mais mió eu tê sempre um apito, quinem desses de juiz de futebol, e apitá até o trem pará...”
Totonho diz que acha melhor ter sempre um apito semelhante ao usado pelo juiz de futebol e apitar até que o trem pare.

c)   Transcreva das alternativas anteriores algumas palavras ou expressões que correspondem a marcas da variedade linguística que se buscou representar por meio da fala do personagem.
“vermeio”; “vô pra riba”; “banano”; “uai”; “mais mió”; “quinem”; “apitá”; “pará”. EDUCADOR: Algumas das palavras transcritas não são usadas exclusivamente por falantes da variedade que se buscou representar. Espera-se que os alunos percebam, por exemplo, que a supressão, na oralidade, do “r” e do “u” final das palavras é comum na fala de parte de falantes brasileiros, como ocorre no uso oral dos verbos vou (vô), apitar (apitá) e parar (pará).

4 – Qual o objetivo das perguntas feitas a Totonho pelo pessoal da estrada de ferro
        Fazer um teste com Totonho para verificar se ele estava preparado para cuidar do que restou da velha estação.

5 – O que o pessoal da estrada de ferro buscava saber de Totonho com essas perguntas
        Buscava saber quais providências Totonho tomaria, em diversas situações de risco, para evitar um acidente com trens que passassem por aquele trecho da estrada de ferro.

6 – Pressionado e já desanimado, Totonho dá uma resposta que provoca grande curiosidade em quem lhe faz perguntas e também no leitor. Que resposta foi essa?
        - Oia, meu amigo, aí num tem jeito não! É muita desgraça prum cristão só. Aí eu chamo a Cota!

7 – O que a última resposta de Totonho provoca no causo?

        A última resposta surpreende pelo seu conteúdo inesperado, revelando uma habilidade cômica com a qual o caipira se sai bem da situação em que estava sendo pressionado. Foi isso que gerou o momento mais engraçado do causo.



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