Crônica: Pedestres à Vista!
Walcyr Carrasco
Espero ao volante. O semáforo parece demorar horas.
Finalmente, vem o amarelo. Engato a primeira.
Vira para verde. Boto o pé no acelerador. Nesse instante, uma senhora pula da
calçada para a faixa, correndo com uma criança na mão. Breco ruidosamente. O
carro de trás buzina, furioso. Ela corre para aproveitar o último instante
antes de os veículos darem a largada. Mostro a luz verde. Olha-me como se eu
fosse um alienígena. Pior ainda, um ser sem coração, incapaz de compreender sua
pressa em atravessar aquela faixa.
Compreendo, sim. É a mesma que eu tinha enquanto
aguardava o semáforo. Dá vontade de sair do carro e armar um barraco. Não foi
só a vida dela e a do filho que ela botou em risco. Como vou me sentir se
atropelar alguém? Até poderia ser absolvido nos tribunais. Mas me sentiria
péssimo pelo resto da vida. O novo Código de Trânsito tem ajudado a botar os
motoristas na linha. E os pedestres?
Já se falou em multar quem anda a pé. Deve ser
impraticável. O policial sairia correndo atrás da pessoa, pegaria o número do
RG? No cruzamento de qualquer grande avenida, é uma loucura. Vendedores,
pedintes, bichos da universidade, distribuidores de folhetos se atiram na
frente dos carros com o semáforo fechado. Quando abre, saem em debandada, num
salve-se-quem-puder. A polícia multa os carros. Nem liga para o. que vê.
Durante muitos anos morei numa chácara próximo a São Paulo. Pegava a Raposo
Tavares todas as noites. A maior preocupação que eu tinha era evitar as pessoas
que atravessavam a estrada no escuro. Minha baixa velocidade funcionava como
uma deixa. Sempre alguém corria na minha frente, cruzando para o outro lado.
Dava um frio na barriga! Detalhe: isso acontecia nas áreas próximas a bairros
onde existem passarelas. Sei muito bem que passarelas são desconfortáveis. Mas
é melhor correr risco de vida?
Sair da garagem também não é fácil. Outro dia,
estava dando ré. Um casal correu por trás do carro, como se não pudesse perder
um único segundo. Brequei.
Botei a cabeça para fora, reclamei:
— Ei, não viram que eu estava saindo?
O rapaz revidou de boca cheia:
— A rua é de todos!
Continuou vitorioso, como se tivesse
conquistado um campeonato. Eu me pergunto: que pressa é essa? O que ganham com
esse. mísero segundo? Dia desses eu estacionava na rua Pamplona. Subida.
Tráfego intenso. No exato momento em que embiquei na vaga, um sujeito surgiu na
traseira. Enfiei o pé no breque. O motor morreu. Um carro que descia quase
levou minha dianteira. Xingaram minha mãe. O responsável nem notou o barulho..
Continuou adiante, feliz da vida. Muitas vezes, ao embicar numa garagem em
calçadas movimentadas, vejo um batalhão se atirar no espaço mínimo entre o para-choque
e a entrada. Um amigo me aconselhou:
-— Você é tonto. O negócio é acelerar, que eles
saem correndo.
Sei que funciona. Também ando a pé. Já vi atirarem carros em cima dos pedestres. Mas que é isso, uma selva? O motorista sempre é visto como agressor. O pedestre, como vítima. No fundo, no fundinho, isso cheira à velha visão da luta de classes. O rico, que tem carro, é o malfeitor. O pobre pedestre, a vítima. Não é por possuir um automóvel que alguém deve ser encarado como um serial killer. Bem que está na hora de os pedestres darem a contrapartida, tornando a vida na cidade um pouco menos selvagem.
Entendendo o texto
01. Qual é a cena inicial descrita no texto?
a) Um semáforo
ficando verde.
b) Uma senhora
correndo com uma criança na mão.
c) Um carro buzina
furiosamente.
d) Um
motorista aguardando no volante.
02. O que a senhora faz que causa a reação
do motorista?
a) Ela atravessa correndo a rua.
b) Ela acelera quando o semáforo abre.
c) Ela bloqueia a passagem do carro.
d) Ela olha para o motorista como se
ele fosse um alienígena.
03. Como o motorista se sente ao ver a
senhora correndo com a criança?
a) Com raiva.
b) Com compreensão.
c) Com medo.
d) Com impaciência.
04. Qual
é a preocupação do motorista ao dirigir próximo a grandes avenidas?
a) A alta velocidade dos carros.
b) A presença de vendedores e pedintes
na rua.
c) A necessidade de atravessar
passarelas desconfortáveis.
d) O risco de atropelar pedestres.
05. Como o motorista descreve a reação das
autoridades em relação aos pedestres no trânsito?
a) Multam os pedestres imprudentes.
b) Ignoram os problemas dos pedestres.
c) Estão sempre presentes nas ruas.
d) Ajudam os pedestres a atravessar.
06. O que o motorista observa ao sair da
garagem?
a)
Um carro em alta velocidade.
b) Um casal
correndo atrás do carro.
c) Um pedestre distraído.
d) Um semáforo fechado.
07. Qual é a atitude do rapaz quando o
motorista reclama da pressa dele?
a) Ele se desculpa.
b) Ele ri da situação.
c) Ele responde de forma rude.
d)
Ele acelera ainda mais.
08. O que o amigo aconselha o motorista a
fazer ao sair da garagem?
a) Acelerar para afastar os pedestres.
b) Parar e aguardar pacientemente.
c) Ignorar os pedestres.
d) Usar buzina para afastar as
pessoas.
09. Qual é o sentimento do motorista em
relação à situação descrita no texto?
a) Indiferença.
b) Raiva.
c) Compreensão.
d) Impaciência.
10. Qual é a crítica principal do autor
sobre o comportamento no trânsito?
a) A falta de fiscalização sobre os
pedestres.
b) O desrespeito dos pedestres em
relação aos motoristas.
c) A falta de passarelas seguras para
pedestres.
d) A visão injusta da sociedade sobre
motoristas e pedestres.
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