Crônica: Botando pra quebrar
Dona Neném viu o anúncio na televisão e
se entusiasmou: duro na queda, cai sem quebrar. Não era de hoje que esse
problema vinha infernizando a sua vida doméstica: pratos trincados, xícaras sem
pires, sopeiras sem tampas, peças desfalcadas inutilizando o jogo inteiro. Ela
própria sendo a principal desastrada, ao ensinar a nova cozinheira como lavar a
louça sem quebrar uma só peça, acabava quebrando duas.
Agora vinha aquela novidade: a louça
inquebrável. Só que desta vez não era pirex, nem plástico: tinha todo o aspecto
de louça de verdade.
— O senhor garante que não quebra
mesmo? — perguntou no supermercado, diante da novidade em exibição na
prateleira.
O empregado lhe estendeu um prato com
um sorriso superior:
— Se não acredita, pode experimentar.
Dona Neném é dessas que pagam para ver:
atirou no chão o prato e o prato se espatifou em mil pedaços. O homem tentou
recolher o sorriso agora desapontado:
—
É porque bateu de quina.
— Posso experimentar outro?
Dona Neném pegou outro prato e jogou no
chão, com o mesmo resultado. O homem coçava a cabeça com ar de parvo:
— Não sei como explicar...
— Este não bateu de quina.
— Devia estar com defeito.
Um senhor gordo, que se detivera para
assistir à cena, afastou polidamente o empregado com o braço e se adiantou, ar
suficiente:
— Não quebram mesmo, eu conheço o
produto. É que a senhora jogou assim... — pegou um prato e ergueu-o no ar
como se fosse atirá-lo com força: — Ao passo que a senhora devia ter deixado
cair assim.
Deixou delicadamente que o prato se
escapasse de suas mãos. Ao bater no chão, o prato se espatifou.
— Então, está bem, estou satisfeita —
disse dona Neném, e foi saindo.
— Espere! — saltou o homem do
supermercado, ferido nos seus brios: — Eu asseguro à senhora que não quebra
mesmo, quer ver?
Deixou cair um prato, que saiu
saltitando pelo chão, sem se quebrar.
— Eu não disse? — tornou ele, mostrando
os dentes, vitorioso: — É uma questão de jeito. Uma simples questão de jeito.
— Uma simples questão de jeito —
repetiu ela: — Quer dizer que para quebrar é preciso deixar cair com jeito.
— É isso mesmo! — desafiou uma
mulherzinha que se detivera junto a eles, interessada: — Com ele não quebra,
mas com a gente quebra.
— Então experimente a senhora — e o
homem lhe estendeu o prato.
— Prefiro a sopeira, se o senhor não se
incomoda.
Ela tinha cara de uma grande quebradora
de louça. Pegou a sopeira e deixou cair: caco para todo lado. Estimulada pelo
exemplo, uma menina desgarrou-se da mãe; passou a mão numas xícaras e atirou ao
chão. Quebraram-se todas. O senhor gordo chamou-lhe a atenção:
— Assim não, minha filha. Tem de deixar
cair.
Pegou uma pilha de pires e deixou cair.
O chão se cobria de cacos de louça. A menina, entusiasmada, se servia na
prateleira, atirando ao chão tudo que suas mãos alcançavam. A mulherzinha
completou a obra largando no ar, delicadamente como queria o outro, a tampa da
sopeira que lhe ficara nas mãos.
— Parem! Parem! — pedia o homem,
desesperado: — Assim vocês me quebram a louça inteira! Alguém vai ter que pagar
por isso.
Voltou-se
para dona Neném, ameaçador:
— A senhora vai ter que pagar. Foi
quem começou.
— Pagar, eu? Tinha graça! Devagar com
a louça! Não é inquebrável? — e dona Neném botou pra quebrar, reduzindo a
pedaços as últimas peças que restavam em exibição.
A essa altura a confusão já se
generalizava e o gerente acorria, mobilizando os guardas de segurança da casa:
— Que está acontecendo? Que loucura é
essa?
O empregado tentava se explicar,
nervoso, até que o gerente o fez calar-se, botando também pra quebrar:
— Seu idiota! Cretino! Imbecil! — e
apontou outra prateleira de louças: — A inquebrável é aquela! Quem vai ter que
pagar é você. E está despedido.
Voltou-se para os fregueses, procurando
se conter:
— Desculpem, ele é novo na casa... A
louça não é esta, é aquela ali. São realmente inquebráveis, venham ver.
Dona Neném se adiantou, interessada:
— Posso experimentar?
Sem esperar resposta, pegou um dos
pratos realmente inquebráveis e deixou cair. O prato esfarelou-se no chão.
Fernando Sabino. Revista
Ícaro, n. 54.
Fonte: Livro – Encontro
e Reencontro em Língua Portuguesa – 5ª Série – Marilda Prates – Ed. Moderna,
2005 – p. 230-3.
Entendendo a crônica:
01 – Você conhece a
expressão “duro na queda”? Ela já serviu até como título de filme de aventura.
Qual o significado dessa expressão no texto?
No texto,
refere-se a pratos difíceis de quebrar, em alusão ao seu significado original,
ou seja, refere-se a tudo o que é resistente.
Querer comprovação dos fatos.
03 – “O vendedor coçava a
cabeça com ar de parvo”.
a)
Qual o significado de parvo?
Indivíduo tolo, pouco inteligente.
b)
Por que o vendedor ficou com ar de parvo?
Porque não fazia sentido para ele os pratos quebrarem.
04 – A confiança do vendedor
vai sendo quebrada lentamente, à medida que os pratos vão se espatifando. De
que maneira identificamos, no texto, essa mudança na atitude do vendedor?
O vendedor
primeiro exibe um sorriso, depois recolhe o sorriso, desapontado, fica com ar
de parvo, e, finalmente, fica desesperado.
05 – O texto é uma narração
em terceira pessoa. Identifique:
a)
A situação inicial.
Dona Neném vai ao supermercado comprar pratos inquebráveis.
b)
O conflito ou a crise.
O teste dos pratos não dá certo.
c)
O clímax, ponto mais grave do conflito.
As duas mulheres e a menina quebram a louça.
d)
Solução do conflito.
A louça quebrada não era a oferecida como inquebrável.
e)
Início de uma nova situação.
A louça oferecida na propaganda foi localizada e começou a ser
testada.
06 – De acordo com as
respostas do exercício 5, responda: a solução do conflito foi a solução do
problema de Dona Neném?
Não, pois o
problema de Dona Neném era adquirir pratos inquebráveis e a solução do conflito
foi a descoberta de que os pratos testados não eram os da propaganda.
07 – No texto, a propaganda
parece ter iludido os consumidores.
a)
Você acha que propaganda enganosa é crime?
Justifique sua resposta.
Resposta pessoal do aluno.
b)
Você acredita em tudo o que as propagandas
prometem? Por quê?
Resposta pessoal do aluno.
De que forma a atitude de dona neném cria o humor da crônica?
ResponderExcluirBotando pra quebrar
ExcluirOlá
ExcluirEu que estou perguntando isso é ñ pra mim responder
ExcluirFoi eu que te fiz essa pergunta pra vc
ExcluirAs quebras dos pratoss
ExcluirMuito bom
ResponderExcluirO brigada
ExcluirQuerp saber todos os elementos narrativos
ResponderExcluirajudou a fazer minha lição
ResponderExcluirQuem são todos os personagens do texto
ResponderExcluirQual foi a primeira providência dela chegar ao supermercado ?
ResponderExcluirSe informar sobre os pratos que ela viu no anúncio
ExcluirOiii
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