quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

CONTO: EU NUNCA VOU TE DEIXAR - (FRAGMENTO) - PEDRO BANDEIRA

Conto: Eu nunca vou te deixar - Fragmento
           Pedro Bandeira

       Fazia frio naquela noite. Muito frio.
      Debaixo de um viaduto qualquer, num cantinho mais escuro, Beto e Vô Manduca aconchegavam-se em meio ao monte de papelões que os dois haviam empilhado dentro da carrocinha, depois de todo um dia a empurrá-la pelos quarteirões dos depósitos e dos armazéns, o melhor lugar para encontrar boas pilhas de papelão.
        Logo que amanhecesse, aquilo tudo seria vendido a alguma fábrica de papel e eles teriam dinheiro para sobreviver por mais um dia. Mais um dia para empurrar novamente a carrocinha, catando mais papelão para vender e sobreviver por mais um dia, para catar mais papel...
        No meio do papelão amontoado na carrocinha, o frio quase não penetrava, e Beto começou a adormecer, ouvindo os mesmos sons de todas as noites, o barulho dos carros que passavam, o tempo todo, ao lado e em cima do viaduto sob o qual estava estacionada a carrocinha.
        Em noites como aquela, costumava haver mais um hóspede dentro da carrocinha: um gato. Um gato qualquer, pobre e sujo como eles. Qualquer gato fosco, de indefinida cor e sem nome, que às vezes aparecia para filar uns restos do jantar e acabava pegando uma carona no meio dos trapos, dos papelões e dos dois seres humanos que o acolhiam.
        Quase todas as noites, Beto procurava arranjar um gato como aquele. De manhã ele sumiria, como sempre somem os gatos sem dono. Mas pelo menos durante a noite teria sido uma companhia para ele. Um pedaço vivo, magrelo, quente. Um brinquedo bom de acariciar enquanto o sono não vinha.
        Muitas vezes, principalmente quando fazia frio, abraçado com o gato vagabundo que acolhera, Beto sonhava com um gato só dele:
        – Sabe, vô Manduca? Eu queria um gato que ficasse com a gente. Um gato que aprendesse a me reconhecer. Que todos os dias comesse na minha mão. Que olhasse para mim quando eu o chamasse pelo nome. O nome que eu mesmo daria para ele...
        Vô Manduca sorria seu sorriso sem dentes, acariciava a carapinha do menino e mostrava sua sabedoria das ruas:
        – Durma, Beto. Gatos vagabundos não faltam. Enquanto você tiver algum resto de comida para oferecer, sempre encontrará um gato para comer na sua mão.
        [...]
                               Pedro Bandeira. Eu nunca vou te deixar. In: Byron Stuart Gottfried. Sete faces do destino. São Paulo, Moderna, 1996.
Fonte: Livro – Ler, entender, criar – Português – 6ª Série – Ed. Ática, 2007 – p. 77.

Entendendo o texto:

01 – Releia com atenção as frases em que aparecem as palavras destacadas. Responda as questões abaixo:
a)   O pronome demonstrativo aquela retoma qual ideia exposta anteriormente pelo narrador?
O pronome refere-se à noite fria, com barulho de carros que passavam próximo ao viaduto sob o qual Beto dormia em uma carrocinha cheia de papelão.

b)   O pronome pessoal eles refere-se a quem?
Refere-se ao Beto e ao vô Manduca.

c)   O pronome demonstrativo aquele e os pronomes pessoais ele e o referem-se a um ser já mencionado no texto. Qual?
Esses pronomes referem-se ao gato.


Um comentário:

  1. Debata sobre os recursos empregados por Castro alves e os utilizados por Jorge lima para sensibilizar o leitor em relação aos horrores da escravidão

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