NOTÍCIA: MINHA LÍNGUA, MINHA PÁTRIA
Estudante
de Letras da UFSCar, o indígena Luciano Ariabo Quezo decidiu escrever um livro
didático para evitar o desaparecimento da língua que era falada em sua aldeia,
o umutina-balatiponé
Por Marcelo Toledo
De Ribeirão Preto
A cada dia, o estudante Luciano Ariabo Quezo, 25,
percebia que a língua portuguesa ocupava mais espaço na aldeia indígena onde
nasceu e "engolia" sua língua materna, o umutina-balatiponé.
Preocupado com a situação, especialmente após a morte de um ancião - um dos
poucos que só falava o idioma nativo -, ele resolveu escrever um livro bilíngue
para tentar evitar o desaparecimento da língua de sua família.
Quezo é natural de uma reserva na região de Barra
do Bugres (MT), onde cerca de 600 pessoas falam o idioma.
Aluno do último ano do curso de Letras da UFSCar (Universidade
Federal de São Carlos) em São Carlos, no interior paulista, ele trabalha no
tema desde 2012, quando obteve uma bolsa da Fapesp (Fundação de Amparo à
Pesquisa do Estado de São Paulo) para sua pesquisa.
Só existem duas escolas indígenas no território
umutina e, segundo ele, aprender a língua dependia do interesse individual.
Após a morte do ancião, diz, não há mais idosos que dominem completamente a
língua. E nem todos os jovens a conhecem.
Um esboço do projeto foi lançado em 2013, com 40
páginas e 180 exemplares, para ser testado e aprovado pela comunidade.
"Língua e Cultura Indígena Umutina no Ensino
Fundamental" é destinado a alunos das séries iniciais das escolas de sua
aldeia. Um irmão de Quezo trabalha em uma delas e utiliza o material com os
estudantes.
Agora, a ideia do autor é aprimorar o material produzido e aprofundar os temas abordados,
chegando a pelo menos 200 páginas.
Dividido em quatro partes, o livro aborda as
narrativas do povo, o artesanato, a história da comunidade e o corpo humano. As
ilustrações são do próprio Quezo.
"Os mais velhos tinham o conhecimento, mas,
entre os mais jovens, poucos falam o umutina. Quando o ancião morreu, em 2004,
vi que o idioma poderia sumir se não fosse feito nada", afirma.
Segundo sua orientadora no projeto, a docente do
departamento de Letras da UFSCar Maria Silvia Cintra Martins, Quezo teve a
preocupação de consultar a comunidade sobre todo o processo de produção da
obra.
"Sempre que propunha algo, ele dizia que tinha
de conversar com seu povo. Como orientadora, aprendi muito. Foi uma troca, com
ele aprendendo nossos padrões acadêmicos e eu conhecendo as exigências de uma
comunidade indígena", diz.
Para compreender como são os textos, as questões e as ilustrações de obras destinadas ao ensino
fundamental, Quezo consultou material em português.
"Seu livro é resultado de um diálogo com
outras obras de ensino de línguas. Ainda é a versão inicial, em fase de
aplicação na aldeia, com vistas a uma nova edição", diz a orientadora.
A obra ampliada não foi concluída ainda justamente
por precisar de aprovação dos índios da aldeia de Quezo.
"O tempo da aldeia é diferente do nosso, não
indígena", afirma Maria Silvia.
Além do livro, Quezo é pesquisador de um grupo de
linguagens e etnicidades do departamento de Letras.
Cotas
A UFSCar criou um vestibular específico para alunos
de comunidades indígenas a partir do primeiro semestre de 2008, após aprovação,
no ano anterior, da medida pelo Conselho Universitário.
Cada um dos 61 cursos de graduação da universidade,
nos campi de São Carlos, Araras, Sorocaba e Buri, municípios do interior
paulista, oferece uma vaga específica para índios de etnias brasileiras.
O pré-requisito é que os candidatos tenham
concluído o ensino médio na rede pública ou em escolas indígenas reconhecidas.
Glossário Umutina-Português
xotáxicanã - boa tarde
taykuria - como vai?
haré - peixe
kui - anta
pó - rio
olaripó - rio Paraguai
abiolô - crianças
xipá - casa
TOLEDO, Marcelo. Minha língua, minha pátria. Folha de S.Paulo. São Paulo, 15 abr. 2015. Cotidiano. p. C4. Acesso em: out. 2015.
Glossário:
etnicidade: estudo das características de determinada etnia,
povo ou cultura.
Para entender o texto
1. Essa notícia foi publicada em um jornal, em 15 de
abril de 2015. Por que a indicação da
data de publicação é importante em uma notícia de jornal, seja ele impresso ou
digital?
A data é importante numa notícia de
jornal porque é a principal função da notícia é informar sobre fatos da atualidade.
2. Por causa da credibilidade que se confere a esse
tipo de órgão de imprensa, é possível afirmar que as informações do texto são
verídicas. Explique o porquê.
Os fatos são verdadeiros, pois trata-se
de um veículo que não pode correr o risco de ter sua credibilidade posta em
dúvida por veicular informação falsa.
3. O público a que se destina o texto interfere, de
alguma forma, na maneira como o texto foi redigido?
O público constituído por leitores do
jornal é conhecido apenas genericamente. Não é possível precisar exatamente o
público que lerá a notícia. Consequentemente, o redator da notícia procura
produzir um texto conciso, sintético, de fácil compreensão.
4. Responda: você teve alguma dificuldade em entender
essa notícia? Por quê?
Resposta pessoal. Sugestão: Espera-se
resposta negativa. O fato relatado é de fácil compreensão e a linguagem
utilizada é simples, direta.
5. O título da notícia lida, Minha língua, minha pátria,
fornece alguma pista mais concreta sobre o fato noticiado? Explique.
Não, o título tem um caráter mais
genérico.
6. A notícia costuma apresentar a linha fina,
texto curto que aparece logo abaixo do título para completar seu sentido ou
ampliar a informação. Na linha fina usa-se letra menor que o título e maior que
o texto. Identifique na linha fina estes componentes da notícia:
a) Quem fez?
O estudante Luciano Ariabo Quezo.
b) O que ele fez?
Escreveu um livro didático.
c) Para quê?
Para evitar o desaparecimento da língua
umutina-balatiponé falada anteriormente em sua aldeia.
7. Explique o título da notícia.
O título estabelece uma relação entre a
língua e a nacionalidade do indivíduo.
8. O que parece ter impressionado mais a orientadora
do indígena, a professora Maria Silvia Cintra Martins, no seu trato com esse
aluno?
O fato de ele só tomar decisões depois de
conversar com toda a sua comunidade.
9. Nem tudo o que acontece no mundo merece virar
notícia. No meio jornalístico, costuma-se dizer:
Não é notícia um cão morder um
homem; mas, se um homem morder um cão, isso é notícia.
a) Com base nessa informação, explique por que o
fato relatado virou notícia.
Porque só o que é novo e relevante - ou,
ainda, surpreendente - é noticiável. Nesta notícia o fato relatado remete a um
acontecimento nada corriqueiro: um estudante indígena que escreveu um livro
didático para evitar o desaparecimento da língua que era falada em sua aldeia.
b) Todas as notícias veiculadas pelo jornal
impresso, pelo rádio, pela televisão ou pela internet são necessariamente
impactantes?
Nem sempre são impactantes. Nem todas as
notícias são surpreendentes.
10. Compare estes dois trechos da notícia:
Quezo é natural de uma reserva na região de Barra
do Bugres (MT), onde cerca de 600 pessoas falam o idioma.
Existem duas escolas indígenas no
território umutina e, segundo ele, aprender a língua dependia do interesse
individual. Após a morte do ancião, diz, não há mais idosos que dominem
completamente a língua.
O que você poderia dizer sobre o estado de
preservação do idioma indígena da reserva de Barra do Bugres?
O estado de preservação do idioma era
crítico e podia se extinguir, já que ficou constatado que ninguém mais domina
completamente essa língua, e compreendam também que a segunda frase justifica a
preocupação e a atitude dele.
11. Em sua opinião, o jornalista opina sobre o fato
noticiado ou limita-se a relatar esse fato?
Resposta pessoal. Sugestão: O jornalista
não opina sobre o fato, não emite nenhum juízo de valor, como, por exemplo, se
a tarefa que o indígena se propôs a realizar é importante ou não.