segunda-feira, 6 de maio de 2019

TEXTO: FOLIA DE REIS - SÁVIA DUMONT - COM QUESTÕES GABARITADAS


Texto: Folia de Reis
          
Sávia Dumont

      Chegam os meses de dezembro e janeiro, e com eles as cantorias entoadas pelos foliões, pessoas simples que louvam a vinda do Deus Menino com violas, sanfonas, rabecas, violões, caixas, danças, brincadeiras e rimas.
        É de madrugada. Estamos nas redondezas de alguma cidadezinha do Brasil. Na porta da casa os foliões entoam uma música:
               “... Vinte e cinco de dezembro, ai, ai, ai, ai,
               Não se dorme no colchão, ai, ai, ai, ai,
               Nasceu o Deus Menino, ai, ai, ai, ai,
               Nas folhas secas do chão, ai, ai, ai, ai,
               Para a nossa salvação, ai, ai...”
        A gente acorda com a cantoria, a viola: brincadeiras e rimas entram no nosso coração e nunca mais são esquecidas. É a Folia de Reis que vem chegando de mansinho. Na frente dos foliões, vemos logo a bandeira. Ela é toda linda, enfeitada com fitas, flores, papel de seda, espelhos, e estampada com a imagem dos três Reis Magos. A bandeira é beijada por todos respeitosamente. Dá sorte beijá-la.
        A folia, cortejo religioso, passa de casa em casa pedindo esmola, cantando e rezando um uma grande oração coletiva, pedindo proteção aos Santos Reis Magos. Percorre a região a pé, indo de roça em roça nas fazendas e de uma casa à outra nas cidades, desde o dia 31 de dezembro até o dia 6 de janeiro. Para acordar os donos de casa, entoa uma canção de chegada:
                “... Ai que hora abençoada
                Que a bandeira aqui chegou.
                Ai, ela veio fazer visita a esse nobre morador.
                A folia aqui chegou,
                Santos Reis vêm visitar,
               Está pedindo a sua esmola.
               Veja lá o que pode dar...”
        Os foliões trajam roupas simples e no pescoço levam uma toalha alvinha para limpar o suor de uma noite inteira de andança e cantoria.
        Os palhaços, alegres e debochados, são divertidíssimos. Um é o Bastião, o outro é o Tião. Rimam os nomes só para dar confusão! Eles usam uma roupa toda colorida e uma máscara que pode ser feita com lata, peles de animais ou pano. A máscara costuma ter dentes, olhos, chifres e orelhas bem grandes; é bem feia. Na mão eles levam um chocalho peso num pau, que faz um barulho danado ao bater no chão. Dançam agachados, na ponta dos pés, para a frente e para trás, de quatro, de ponta-cabeça, põem a barriga para a frente, fazem rodopios, sapateiam, pintam e bordam com animação. Porém, os palhaços não podem cantar as músicas em louvor a Jesus e aos Santos Reis nem tocar na bandeira, porque dizem que eles têm “parte com diabo”. Mas bem que todos gostam deles. Principalmente as crianças.
        A folia de reis homenageia os três Reis do Oriente, ou Reis Magos (de Sabá, da Pérsia e da Babilônia): Belchior, Gaspar e Baltasar. Eles viraram santos porque souberam que alguém muito especial estava nascendo para salvar a humanidade. Seguiram a Estrela do Oriente, enviada por Deus, que pousou em Belém, bem em cima da gruta onde encontraram o menino Deus nascido, a quem ofereceram ouro, incenso e mirra. Eles o adoraram.
        Os séculos se passaram, os símbolos e as cantigas sobrevivem e se multiplicam pelo mundo afora. No Brasil, em forma de folias, o povo canta e alegra as noites de janeiro em uma verdadeira devoção popular. É o jeito de revive a viagem desses três reis do Oriente. Os palhaços representam os soldados de Herodes, que queriam matar Jesus, por isso não podem cantar, tocar a bandeira, nem entrar nas casas que a folia visita na hora das rezas e pedidos.
        Depois da cantoria inicial, os foliões são convidados a entrar. Os palhaços ficam do lado de fora da casa, fazendo brincadeiras com as crianças. A bandeira é a primeira a entrar. Fica ao lado do presépio ou nas mãos do dono da casa, e todos a beijam para ter saúde, felicidade e ser abençoados.
               “Entremos, cantores, entremos
               Por este salão dourado.
               Eu vou entrando, eu vou salvando,
               E para sempre sejas louvado.
               Os três reis do Oriente
               Na sombra do seu telhado
               Estamos fazendo adoração
               Que de Deus somos mandados.
               Na minha bandeira eu trago
               Santo de grande virtude;
               Ele vem lhe visitar
               E vem lhe trazer saúde.”
        O dono da casa oferece cachaça, comida e uma esmola em dinheiro para os foliões. Comida é pecado recusar. Cachaça então, nem se fala. É hora de comer e beber em paz. Até os palhaços são convidados a comemorar.
        Antes da despedida final, os palhaços entram em ação. Imitam o Embaixador, chefe do grupo e a quem todos devem obediência. Fazem gracejos e convencem o dono da casa visitada a dar uma boa esmola.
        --- Ô patrão, o que é que vós achou de nossa cantoria? – Pergunta o palhaço bem matreiro.
        --- Boa – responde o dono da casa.
        --- Uai, o senhor não falou nada. Fala ligeiro senão eu esqueço o que é que eu falei. Fala ligeiro, o que é que o senhor achou da cantoria?
        --- Boa! – Repete o dono da casa em alto e bom som.
        --- Ah! Então o senhor me dê uma leitoa?
        Entre rimas engraçadas e embaraçosas o palhaço pede cigarro, anima com brincadeiras e danças. Clama todos a dançar o lundu, a catira, a dança dos quatro. Em todas essas danças só participam os homens. Cada dançarino procura sapatear mais bonito do que o outro. A competição é de brincadeira, e o sapateado cadenciado com batidas de caixa e palmas é apreciado e faz todos entrarem na folia.
        Na despedida, recebida a boa oferta, é feita a promessa de regressar no próximo ano. E voltam mesmo! Não só porque são devotos e fizeram promessa aos Santos Reis, mas também porque aprenderam que ser um folião de verdade é cantar, dançar, rezar e repetir com fé essa festa, desde pequenos, acompanhando os pais, que também acompanharam seus avós, desde crianças.
               “Minha bandeira se despede,
               Vai no giro de Belém.
               Adeus, senhores e senhora,
               Até para o ano que vem.”
        Com mais essa cantoria os foliões se despedem e continuam a peregrinação.
        No dia 6 de janeiro, cumpridas as obrigações de rezas, cantorias, andança de sete noites em total devoção, acontece a festa de Santos Reis na casa do mestre da folia, que é realizada com o dinheiro arrecadado e as prendas oferecidas. Fogos, fartura de comida, pétalas de flores, papel picado, cachaça e violas se misturam. O festeiro, dono da casa onde se desenrola a festança, passa a bandeira para o próximo folião, que vai comandar a folia do ano seguinte. É chegada a hora de a gente dormir de novo com o coração cheio de cantoria e sonhar com a vinda dos foliões no ano que vem.
                                  Sávia Dumont. O brasil em festa. São Paulo:
Companhia das Letrinhas, 2003.
Entendendo o texto:
01 – O que caracteriza a folia de reis, segundo o texto de Sávia Dumont?
      A presença de pessoas fantasiadas que tocam instrumentos musicais como rabeca, viola e sanfona, as músicas típicas, as danças e certo ritual.

02 – As personagens dessa festa representam determinados papéis em relação à história do nascimento de Jesus Cristo. Segundo o texto, que papéis são esses?
      Os palhaços representam os soldados de Herodes, e os demais foliões representam os Reis Magos.

03 – De acordo com o texto, no Brasil a folia de reis não ocorre em qualquer lugar. Em que lugares ela acontece?
      Ocorre em pequenas cidades do interior do Brasil.

04 – Você já participou de uma manifestação festiva semelhante a essa? Em caso afirmativo, conte como ela ocorre, tente descrevê-la.
      Resposta pessoal do aluno.

05 – Faça uma pesquisa (você pode recorrer a fontes variadas, como internet, livros, enciclopédias, etc.) e descubra em quais regiões do Brasil ainda há manifestações da folia de reis.
      Resposta pessoal do aluno.

06 – Em sua região, que festas populares tradicionais são comemoradas?
      Resposta pessoal do aluno.

07 – Observe: “O dono da casa oferece cachaça, comida e uma esmola em dinheiro para os foliões. Comida é pecado recusar. Cachaça então, nem se fala. É hora de comer e beber em paz. Até os palhaços são convidados a comemorar.”

a)   Que sentido tem a expressão nem se fala, empregada no trecho relido?
A expressão retoma a ideia anteriormente expressa no trecho (a de que não se pode recusar), intensificando seu sentido.

b)   Em seu caderno, produza um pequeno texto utilizando a expressão nem se fala.
Resposta pessoal do aluno.

08 – Em alguns trechos do texto, a autora utiliza uma mistura de níveis de linguagem. Observe determinados casos, em que se destacam expressões usuais na linguagem oral informal, mas não na linguagem escrita formal:
I – A máscara costuma ter dentes, olhos, chifres e orelhas bem grandes; é bem feia. Na mão eles levam um chocalho preso num pau, que faz um barulho danado ao bater no chão.

II – A gente acorda com a cantoria, a viola; brincadeiras e rimas entram no nosso coração e nunca mais são esquecidas. É a folia de reis que vem chegando de mansinho.

a)   Que efeito de sentido ela obtém ao fazer essa mistura de níveis de linguagem?
Ela aproxima o texto de seus passíveis leitores, que são crianças e adolescentes.

b)   Localize, no texto, outros trechos em que isso ocorre.
Resposta pessoal do aluno.

c)   Na sua opinião, o que aconteceria com o texto se a autora optasse por não fazer essas combinações de níveis de linguagem?
O texto perderia em expressividade, e talvez não ficasse adequado ao público a que se destina.


domingo, 5 de maio de 2019

MÚSICA: PELADOS EM SANTOS - MAMONAS ASSASSINAS - QUESTÕES GABARITADAS


Música: Pelados Em Santos
                     Mamonas Assassinas

Mina, seus cabelo é da hora
Seu corpão violão
Meu docinho de coco
Tá me deixando louco

Minha Brasília amarela
Tá de portas abertas
Pra mode a gente se amar
Pelados em Santos

Pois você, minha pitchula
Me deixou legalzão
Não me sintcho sozinho
Você é meu chuchuzinho

Music, is very good
(Oxente ai, ai, ai!)
Mas comigo ela não quer se casar
Na Brasília amarela com roda gaúcha
Ela não quer entrar

É feijão com jabá
Desgraçada num quer compartilhar
Mas ela é lindia
Muitcho mais do que lindia
Very, very beautiful

Você me deixa doidão
Oh, yes! Oh, nos!
Meu docinho de coco

Music, is very porreta
(Oxente Paraguai!)
Pos Paraguai ela não quis viajar
Comprei um Reebok e uma calça Fiorucci
Ela não quer usar

Eu não sei o que faço
Pra essa mulé eu conquistchar
Por que ela é lindia
Muito mais do que lindia
Very, very beautiful

Você me deixa doidão
Oh, yes! Oh, nos!
Meu chuchuzinho

Oh, yes! No, no, no, no!
Eu te I love youuuuu!
Pera aí que tem mais
Um poquinho de "u" Uuuuuuuuuu...
                                                           Composição: Dinho

Entendendo a canção:
01 – De que se trata esta canção?
      Ela traz uma letra romântica, na verdade um pedido para que uma mulher aceite ir até Santos em uma Brasília amarela, carro que fez sucesso nos anos 80.

02 – Com que intenção o eu lírico usa gírias, palavrões e estrangeirismo na canção?
      Com a intenção de dar um humor diferente de tudo o que já se tinha visto em uma canção.

03 – Qual o objetivo do eu-lírico (aquele que se expressa na música) em “Pelados em Santos”?
      Despertar no público a beleza da moça (mina).

04 – Quais meios ele usa para atingir esse objetivo?
      Dando exemplos de situações ocorridas.

05 – Pode-se afirmar que essa canção é de amor? Justifique.
      Sim. Pois fala que é doidão pela moça.

06 – Considerando a última resposta, o que torna a música diferente das tradicionais?
      Com certeza, a linguagem coloquial, gírias.

07 – Identifique na fala do eu-lírico 4 diferentes variedades linguísticas regionais ou estrangeiras (ex.: “mina” – paulistas).
·        Mulé = mulher (regionalismo).

·        Pitchula = moça (gíria).

·        Lindia = linda (regionalismo).

·         Beautiful = bonita (regionalismo).

08 – Explique, por meio de uma análise gramatical, a estranheza na construção “Eu te I love you”?
      O uso dos idiomas, o português, depois o inglês em uma mesma frase. Isto causou estranheza.

09 – Faça uma ilustração da música “Pelados em Santos”.
      Resposta pessoal do aluno.


ROMANCE: SÃO BERNARDO 2 - (FRAGMENTO) - GRACILIANO RAMOS - COM GABARITO

Romance: São Bernardo 2 – (Fragmento)     
                  Graciliano Ramos

        Conheci que Madalena era boa em demasia, mas não conheci tudo de uma vez. Ela se revelou pouco a pouco, e nunca se revelou inteiramente. A culpa foi minha, ou antes, a culpa foi desta vida agreste, que me deu uma alma agreste.
        E, falando assim, compreendo que perco o tempo. Com efeito, se me escapa o retrato moral de minha mulher, para que serve esta narrativa? Para nada, mas sou forçado a escrever.
        Quando os grilos cantam, sento-me aqui à mesa da sala de jantar, bebo café, acendo o cachimbo. Às vezes as ideias não vêm, ou vêm muito numerosas – e a folha permanece meio escrita, como estava na véspera. Releio algumas linhas, que me desagradam. Não vale a pena tentar corrigi-las. Afasto o papel.
        Emoções indefiníveis me agitam – inquietação terrível, desejo doido de voltar, tagarelar novamente com Madalena, como fazíamos todos os dias, a esta hora. Saudade? Não, não é isto: é desespero, raiva, um peso enorme no coração.
        Procuro recordar o que dizíamos. Impossível. As minhas palavras eram apenas palavras, e as dela tinham alguma coisa que não consigo exprimir. Para senti-las melhor, eu apagava as luzes, deixava que a sombra nos envolvesse até ficarmos dois vultos indistintos na escuridão.
        Lá fora os sapos arengavam, o vento gemia, as árvores do pomar tornavam-se massas negras.
        -- Casimiro!
        Cassimiro Lopes estava no jardim, acocorado ao pé da janela, vigiando.
        -- Casimiro!
        A figura de Cassimiro Lopes aparece à janela, os sapos gritam, o vento sacode as árvores, apenas visíveis na treva. Maria das Dores entra e vai abrir o comutador. Detenho-a: não quero luz.
        O tique-taque do relógio diminui, os grilos começam a cantar. E Madalena surge no lado de lá da mesa. Digo baixinho:
        -- Madalena!
        A voz dela me chega aos ouvidos. Não, não é aos ouvidos. Também já não a vejo com os olhos.
        Estou encostado à mesa, as mãos cruzadas. Os objetos fundiram-se, e não enxergo sequer a toalha branca.
        -- Madalena...
        A voz de Madalena continua a acariciar-me. Que diz ela? Pede-me naturalmente que mande algum dinheiro a mestre Caetano. Isto me irrita, mas a irritação é diferente das outras, é uma irritação antiga, que me deixa inteiramente calmo. Loucura estar uma pessoa ao mesmo tempo zangada e tranquila. Mas estou assim. Irritado contra quem? Contra mestre Caetano. Não Obstante ele ter morrido, acho bom que vá trabalhar. Mandrião!
        A toalha reaparece, mas não sei se é esta toalha sobre que tenho as mãos cruzadas ou a que estava aqui há cinco anos.
        Rumor do vento, dos sapos, dos grilos. A porta do escritório abre-se de manso, os passos de seu Ribeiro afastam-se. Uma coruja pia na torre da igreja. Terá realmente piado a coruja? Será a mesma que piava há dois anos? Talvez seja até o mesmo pio daquele tempo.
      Agora seu Ribeiro está conversando com Dona Glória no salão. Esqueço que eles me deixaram e que esta casa está quase deserta.
        -- Casimiro!
        Penso que chamei Casimiro Lopes. A cabeça dele, com o chapéu de couro de sertanejo, assoma de quando em quando à janela, mas ignoro se a visão que me dá é atual ou remota.
        Agitam-se em mim sentimentos inconciliáveis: encolerizo-me e enterneço-me; bato na mesa e tenho vontade de chorar.

                                   São Bernardo. Rio de Janeiro, Record, 1983.

Entendendo o romance:
01 – De acordo com o texto, o que significa as palavras abaixo:
·        Arengar: discursar.
·        Mandrião: preguiçoso, vadio.
·        Assomar: aparecer.

02 – Nessa passagem de São Bernardo, o narrador-personagem, Paulo Honório, sente-se bloqueado para continuar sua história e, ao mesmo tempo, não consegue parar de escrever. Na sua opinião:
a)   Por que não consegue prosseguir?
Por lhe escapar o retrato moral de sua mulher, Madalena.

b)   Por que não consegue parar?
Por um estado emocional pesado e confuso, repleto de lembranças que precisam se externar.

03 – Que frase do texto sintetiza o sentimento de culpa de Paulo Honório?
      “A culpa foi minha, ou antes, a culpa foi desta vida agreste, que me deu uma alma agreste.”

04 – De acordo com o texto:
a)   Do que Paulo Honório sente-se culpado?
Paulo Honório sente-se culpado por não ter compreendido Madalena e por ter provocado o seu suicídio.

b)   Que características de Paulo Honório apontam sua culpabilidade, tendo em vista as diferenças entre ele e Madalena? Cite uma passagem do texto que exemplifique sua resposta.
O autoritarismo e a prepotência, diante da bondade e da solidariedade de Madalena. Uma passagem do texto que exemplifica esta resposta é a referência a mestre Caetano, a quem ela lhe pede que ajude, mas que ele manda trabalhar.

c)   No trecho onde se encontra a referência a mestre Caetano, há fragmentos que indicam a confusão mental do narrador-personagem, perdido entre o passado e o presente, entre reafirmar o seu autoritarismo e reconhecer-lhe a estupidez. Identifique esses fragmentos.
Paulo Honório se diz irritado, mas é uma “irritação antiga”, que o deixa “inteiramente calmo”. Em seguida diz que, embora mestre Caetano tenha morrido, acha “bom que vá trabalhar”.

05 – Ao longo do texto, qual a função das menções à noite, ao barulho dos sapos, ao vento sacudindo as árvores e ao pio da coruja, enfim, aos elementos da natureza, tendo em vista o caráter de rememoração da narrativa de Paulo Honório?
      A função das menções aos elementos da natureza é trazer o passado ao presente, fazer com que aquele reapareça por meio da reprodução mental dos mesmos rumores, da mesma atmosfera, vivenciados no passado.

06 – Identifique no texto lido:
a)   Duas personagens que ainda se encontram no presente de Paulo Honório.
Casimiro Lopes e Maria das Dores.

b)   Três personagens que só existem no passado e nas lembranças de Paulo Honório.
Madalena, mestre Caetano e seu Ribeiro.

c)   A personagem que atravessa ambos os tempos. Caracterize o seu estado de espírito e cite dois momentos do texto em que fica mais explicita a confusão que estabelece entre o presente e o passado.
A personagem que atravessa ambos os tempos é Paulo Honório; seu estado de espírito é de saudade, remorso, raiva, solidão, angustia, confusão mental. Os momentos podem ser: “A voz dela me chega aos ouvidos. Não, não é aos ouvidos...”; “Os objetos fundiram-se...”; ou “Terá realmente piado a coruja? Será a mesma que piava há dois anos?”

07 – Releia o trecho que se inicia com a exclamação: “--- Madalena!”, até o momento em que Paulo Honório chama por Casimiro. Comente a presença de Madalena e de seu Ribeiro, considerando a frase “Os objetos fundiram-se, e não enxergo sequer a toalha branca”.
      Em seu desespero e solidão, Paulo Honório evoca tão intensamente as personagens de seu passado que elas se tornam presentes, como fantasmas que o visitassem. A voz de Madalena parece chegar aos ouvidos, e a imagem, aos olhos, mas são alucinações. A toalha branca representa a realidade atual, que se apaga em sua visão. Mesmo quando reaparece, ele não sabe se é a toalha que está sob suas mãos ou a que ali estivera há cinco anos.

08 – Transcreva duas passagens metalinguísticas do texto.
      “Com efeito, se me escapa o retrato moral de minha mulher, para que serve esta narrativa? Para nada, mas sou forçado a escrever”; “Às vezes as ideias não vem, ou vem muito numerosas – e a folha permanece meio escrita, como estava na véspera.” Etc.


POEMA: SATURAÇÃO - AUTOR DESCONHECIDO - COM QUESTÕES GABARITADAS


Poema: SATURAÇÃO


Qualquer dia viro fera,
faço a trouxa
e ganho asas, ganho o mundo.
Não aguento mais discurso de mãe,
caretice de pai
e tortura de irmãos.

Não aguento ver cadernos, livros, provas.
Hora certa de dormir e de dormir e de acordar.
Deveres todos, direitos poucos,
asas cortadas, meias nos pés
e asas na cabeça.

Se não fosse o medo
- não do medo, mas da saudade,
- pegaria o primeiro avião,
ônibus ou trem, mas ...

Qualquer  dia viro a mesa.
Viro fera e me dissolvo no ar ...

Quero ver só quem vai chorar
de saudades.

Entendendo o poema:
01 – O nome do poema é “Saturação”.

a) Quem é o eu lírico do poema?
      Provavelmente um adolescente.

b) Que idade você imagina que o eu lírico tenha? Justifique sua resposta.
      Entre uns 14 a 17 anos. Pois é uma época em que nos sentimos presos por regras e nos revoltamos.     

c) De que ele se sente saturado?

      Ele se sente preso, cansado das regras impostas pelos pais, cansado de estudar, de ter muitos deveres e poucos direitos.

02 – Na terceira estrofe o eu lírico revela uma momento de fraqueza em sua revolta, mas novamente volta a ameaçar.
a) Do que o eu lírico tem medo?
      Ele tem medo da saudade que pode sentir da sua casa, de sua família.

b) O que ele quer dizer com as expressões “viro a mesa, viro fera e me dissolvo no ar...”?
      Que um dia ele cria coragem, e vai embora.

c) Você acha que o eu lírico está avaliando adequadamente suas condições para se “dissolver no ar” de forma responsável? Por quê?
     Não. Pois ele está agindo na emoção do momento, sem pensar como será sua vida quando ele saí de sua casa.

03 – Na última estrofe, o eu lírico faz uma última ameaça com a frase quero ver só quem vai chorar / de saudades.
a) Em quem você acha que ele pensa, ao fazer essa ameaça?
      Aos seus pais.

b) Ele é coerente com o que revelou na terceira estrofe? Por quê?
      Sim, pois todos nós temos medo e saudades de ficarmos longe dos nossos pais e parentes.

TEXTO: MANIFESTO FUTURISTA - RICHARD HUMPHREYS - COM GABARITO

Texto: Manifesto Futurista
        
            Richard Humphreys

        Queremos cantar o amor do perigo, o hábito à energia e à temeridade.
        A coragem, a audácia e a rebelião serão elementos essenciais da nossa poesia.
        Até hoje a literatura tem exaltado a imobilidade pensativa, o êxtase e o sono. Queremos exaltar o movimento agressivo, a insônia febril, a velocidade, o salto mortal, a bofetada e o murro.
        Afirmamos que a magnificência do mundo se enriqueceu de uma beleza nova: a beleza da velocidade. Um carro de corrida adornado de grossos tubos semelhantes a serpentes de hálito explosivo... um automóvel rugidor, que parece correr sobre a metralha, é mais belo que a Vitória de Samotrácia.
        Queremos celebrar o homem que segura o volante, cuja haste ideal atravessa a Terra, lançada a toda velocidade no circuito de sua própria órbita.
        O poeta deve prodigalizar-se com ardor, fausto e munificência, a fim de aumentar o entusiástico fervor dos elementos primordiais.
        Já não há beleza senão na luta. Nenhuma obra que não tenha um caráter agressivo pode ser uma obra-prima. A poesia deve ser concebida como um violento assalto contra as forças ignotas para obrigá-las a prostrar-se ante o homem.
        Estamos no promontório extremo dos séculos!... Por que haveremos de olhar para trás, se queremos arrombar as misteriosas portas do Impossível? O Tempo e o Espaço morreram ontem. Vivemos já o absoluto, pois criamos a eterna velocidade omnipresente.
        Queremos glorificar a guerra - única higiene do mundo -, o militarismo, o patriotismo, o gesto destruidor dos anarquistas, as belas ideias pelas quais se morre e o desprezo da mulher.
        Queremos destruir os museus, as bibliotecas, as academias de todo o tipo, e combater o moralismo, o feminismo e toda vileza oportunista e utilitária.
        Cantaremos as grandes multidões agitadas pelo trabalho, pelo prazer ou pela sublevação; cantaremos a maré multicor e polifônica das revoluções nas capitais modernas; cantaremos o vibrante fervor noturno dos arsenais e dos estaleiros incendiados por violentas luas elétricas: as estações insaciáveis, devoradoras de serpentes fumegantes: as fábricas suspensas das nuvens pelos contorcidos fios de suas fumaças; as pontes semelhantes a ginastas gigantes que transpõem as fumaças, cintilantes ao sol com um fulgor de facas; os navios a vapor aventurosos que farejam o horizonte, as locomotivas de amplo peito que se empertigam sobre os trilhos como enormes cavalos de aço refreados por tubos e o voo deslizante dos aviões, cujas hélices se agitam ao vento como bandeiras e parecem aplaudir como uma multidão entusiasmada.
In: Richard Humphreys. Futurismo. São Paulo: Cosac & Naify, 2001. p. 11.
Entendendo o texto:
01 – O Manifesto Futurista é apresentado sobre a forma de itens. Segundo o item 3 do Manifesto, até aquele momento, início do século XX, a literatura tinha exaltado "a imobilidade, o êxtase e o sono pensativos".
a)   De acordo com esses atributos conferidos à literatura, como esta era vista por Marinetti?
Como estática, contemplativa, interior, reflexiva.

b)   De acordo com os quatro primeiros itens, que elementos da modernidade se contrapõem ao perfil da literatura e da época anterior?
Basicamente, a ação e a velocidade.

02 – O automóvel, uma novidade na época que o manifesto foi publicado, é comparado por Marinetti à Vitória de Samotrácia, uma das mais importantes obras da cultura clássica.
a)   Que significado tem a comparação feita por Marinetti?
Ao pôr por terra uma vasta e rica tradição cultural de 2 mil anos, a comparação constitui um exemplo claro de irreverência e ousadia em relação aos valores vigentes na época.

b)   Dos fragmentos que seguem, qual (ou quais) traduz(em) o mesmo espírito iconoclasta da comparação?
·        “Por que olhar para trás se o que queremos é arrombar as portas misteriosas do impossível?".

·        "O poeta deve consumir-se de ardor, esplendor e generosidade".
·        "Destruiremos os museus, as bibliotecas, as academias de toda sorte".

03 – O Futurismo italiano capta o espírito de efervescência política da época e de certa forma antevê os grandes acontecimentos políticos da época, como a primeira guerra mundial (1914-1918) e a Revolução Russa(1917).
a)    Qual é o ponto de vista a respeito da guerra expresso no manifesto?
O de que a guerra é saudável, pois é uma forma de higiene.

b)    Identifique no último item elementos que apontam para a valorização das revoluções populares.
“Multidões entusiasmadas pela insurreição”; “Ondas multicolores e polifônicas da revolução”.

04 – No momento em que o texto foi publicado, a Itália ainda era pouco industrializada e pouco desenvolvida economicamente. Com o manifesto, Marinetti pretendia ajudar a levar o país à modernidade. Identifique, no último parágrafo, elementos da modernidade que Marinetti gostaria de ver estabelecida na Itália.
      Estaleiros, luz elétrica, fumaça, pontes, navios, trens, aviões.

05 – Não foi por acaso que, na década de 1920, o Futurismo tornou-se a arte oficial do fascismo italiano. Do ponto de vista ideológico, o movimento defendia algumas posições que hoje seriam recriminadas e consideradas politicamente incorretas. Além da defesa da guerra, que outra posição você incluiria entre as ideias “politicamente incorretas”?
      O desprezo à mulher e o combate ao feminismo, a destruição de bibliotecas e museus, etc.

POESIA: VOLTAS PARA CASA - FERREIRA GULLAR - COM QUESTÕES GABARITADAS

Poesia: Voltas para casa
           Ferreira Gullar


Depois de um dia inteiro de trabalho
voltas para casa, cansado.
Já é noite em teu bairro e as mocinhas
de calças compridas desceram para a porta
após o jantar.
Os namorados vão ao cinema.
As empregadas surgem das entradas de serviço.
Caminhas na calçada escura.

Consumiste o dia numa sala fechada,
lidando com papéis e números.
Telefonaste, escreveste,
irritações e simpatias surgiram e desapareceram
no fluir dessas horas. E caminhas,
agora, vazio,
como se nada acontecera.

De fato, nada te acontece, exceto
talvez o estranho que te pisa o pé no elevador
e se desculpa.
Desde quando
tua vida parou? Falas dos desastres,
dos crimes, dos adultérios,
mas são leitura de jornal. Fremes
ao pensar em certo filme que vista: a vida,
a vida é bela!

A vida é bela
mas não a tua. Não a de Pedro,
de Antônio, de Jorge, de Júlio,
de Lúcia, de Miriam, de Luísa…

Às vezes pensas
com nostalgia
nos anos de guerra,
o horizonte de pólvora,
o cabrito. Mas a guerra
agora é outra. Caminhas.

Tua casa está ali. A janela
acesa no terceiro andar. As crianças
ainda não dormiram.
Terá o mundo de ser para eles
este logro? Não será
teu dever mudá-lo?

Apertas o botão da cigarra.
Amanhã ainda não será outro dia.

Ferreira Gullar. Toda poesia. Rio de Janeiro, Jose Olympio, 1980.
Entendendo o texto:
01 – Considerando as palavras trabalho e desculpa:
a)   Indique suas respectivas classes gramaticais.
Trabalho: substantivo. Desculpa: verbo.

b)   Crie duas frases em que cada uma dessas palavras exerça papel gramatical diferente do que exerce no texto.
Resposta pessoal do aluno. Sugestão: Atualmente eu trabalho no interior. Ele sempre inventa uma desculpa para não participar das reuniões.

02 – No texto, jantar e fluir funcionam como verbos ou como substantivos? Justifique.
      Essas formas, por se apresentarem precedidas de artigo (o jantar; [n]o fluir), funcionam como substantivos. Trata-se de casos de substantivação.

03 – A primeira estrofe descreve uma cena em que praticamente todos os fatos ocorrem simultaneamente.
a)   Aponte as formas que exprimem fatos de ocorrência simultânea e indique em que tempo verbal elas se apresentam.
Voltas, é, vão, surgem, caminhas. Essas formas estão no presente do indicativo.

b)   Que efeito – ou impressão – essas formas verbais procuram causar no leitor?
Causa a impressão de que as formas do presente dão a impressão de que o leitor está no local da cena, vendo seu desenrolar.

c)   Que fato referido na estrofe é apresentado como totalmente concluído? Em que tempo verbal apresenta-se a forma que exprime esse fato?
Desceram – pretérito perfeito do indicativo.

04 – Considere estas formas da segunda estrofe:
        CONSUMISTE, TELEFONASTE, ESCREVESTE, SURGIRAM, DESAPARECERAM, CAMINHAS, ACONTECERA.

a)   Indique suas respectivas pessoa gramaticais.
Consumiste, telefonaste, escreveste e caminhas – 2ª pessoa do singular (tu).

Surgiram e desapareceram – 3ª pessoa do plural (elas – irritações e simpatias).

Acontecera – 3ª pessoa do singular (nada – coisa alguma).

b)   Quais dessas formas verbais seriam modificadas se o poeta falasse a respeito de si próprio? Quais seriam as novas formas?
Consumiste: consumi; Telefonaste: telefonei. Escreveste: escrevi. Caminhas: caminho.

c)   As formas em estudo fazem parte de um mesmo tempo verbal? Justifique.
Não. Consumiste, telefonaste, escreveste, surgiram e desapareceram são formas do pretérito perfeito. Caminhas é do presente do indicativo. Acontecera é do pretérito mais-que-perfeito do indicativo.

d)   Sem alterar o tempo verbal expresso por acontecera, substitua-o por uma forma verbal composta.
Acontecera: tivesse acontecido.