quinta-feira, 10 de outubro de 2024

ENTREVISTA: "LIVRO PARA CRIANÇA NÃO PRECISA SER EDUCATIVO", DIZ VENCEDORA DO JABUTI -FRAGMENTO - COM GABARITO

 Entrevista: “Livro para criança não precisa ser educativo”, diz vencedora do Jabuti – Fragmento

        A vida da escritora Marina Colasanti, 77, é um livro de histórias. Começa na África, em um país chamado Eritreia, onde nasceu.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjj1I-x1WYJ1tmGVcOdyjc6bUI7UF5GYZl5F6sfl5UXRoTezpe40FvFXUV0gWLuH7O8BHWJleo3EkKAtNjSC-8VFudknZPwHEEFgzYVwHPWpQr-tLR4wNp1ywIGgMwbDXUps8LkZvVdngXsUkHJkeOCUVNeO9ahNq1JL4v-wAa8D4jOwNxeO787rYSjG3E/s320/Marina-Colasanti.jpg


        Depois, vem a Segunda Guerra Mundial e a infância na Itália. Aos dez anos de idade, ela passa a viver no Brasil, em um palacete no Rio.

        Autora de poemas, crônicas e até contos de fadas, Colasanti adicionou um novo capítulo a sua vida: ganhou o Jabuti de melhor livro de 2014 com o infantil “Breve” história de um pequeno amor – seu sétimo Jabuti, um dos prêmios literários mais importantes do Brasil.

        “Não esperava. É raro que um livro para crianças seja considerado o melhor do ano”, disse a escritora à Folhinha. Leia a entrevista a seguir.

        Folhinha: Foi uma surpresa ganhar o Jabuti de melhor livro do ano?

        Marina Colasanti: É muito raro que um livro para crianças vença como o melhor do ano. Foi uma surpresa absoluta.

        Folhinha: O prêmio mostra uma valorização da literatura infantil?

        Marina Colasanti: Gostaria de dizer que sim. Mas há um certo demérito ligado à literatura infantil, como se não fosse necessário ser escritor para escrever livros para crianças. Veja uma coisa: se algum escritor brasileiro ganhasse o Nobel, todos fariam muito barulho, concorda? Porém, o Brasil já ganhou por três vezes o Hans Christian Andersen [considerado o Nobel da literatura infantil], e ninguém fala sobre isso.

        Por outro lado, a literatura infantil e juvenil está na ponta mais valorizada do mercado, que tem altíssimo interesse por esse tipo de livro. Há muita demanda, muito lançamento. Mas muitas vezes sem um cuidado literário.

        Folhinha: Como assim?

        Marina Colasanti: A produção de livros sofre de duas doenças. Uma é o descrédito da inteligência infantil por parte dos adultos. Eles acreditam que qualquer coisa pode ser publicado e que a criança não vai perceber que o livro é ruim. O outro problema é que a literatura infantil tem um pé amarrado na educação, como se ela servisse para carregar conhecimentos, princípios morais, como uma cápsula que tivesse outra coisa dentro. E isso envenena a literatura.

        As grandes obras são grandes porque escaparam disso. Por exemplo, o [Lewis] Carroll, que era educador, não colocou nada de educativo na Alice. Fez um baita sucesso. Toda a produção do [Carlo] Collodi é extremamente educativa, menos uma: Pinóquio, que é uma obra genial. Esse envenenamento pela educação é um problema não só do Brasil. A literatura é formadora e ensina por si, e não por ensinamentos embutidos.

        [...]

        Folhinha: Quando terminei “Breve” história de um pequeno amor, fiquei com a dúvida: É um livro para criança?

        Marina Colasanti: Adoro quando essa pergunta aparece no fim. É o melhor atestado de qualidade que o livro pode ter. Se uma obra infantil não toca um adulto, ele também não vai tocar a criança. Eu nunca escrevi para distrair ninguém. Não sou um palhaço. Eu quero tocar, emocionar, sacudir, fazer refletir. Nada disso é possível se aquilo que você escreve não toca pontos profundos do leitor.

        Folhinha: É possível tocar esses pontos com um pombo como personagem principal?

        Marina Colasanti: A criança não se identifica apenas com o “eu”, como se fosse um espelho. É um erro achar que a melhor chave de leitura é a identificação. A criança busca a identidade no outro, no melhor amigo, no convívio com os irmãos. Achar que livro infantil sempre tem que ter criança é deixar a literatura mais pobre.

        [...]

        Folhinha: A criança de hoje é muito diferente da de sua época?

        Marina Colasanti: A principal mudança foi a valorização do desejo da criança. A gente até podia ter vontades, mas isso não significava que seriam atendidas pelos adultos. Hoje, o desejo da criança é uma ordem. Ela quer algo e ponto. Na minha época, no máximo, a criança gostaria de alguma coisa. Mas ela segue precisando de cuidados, com medo da morte, pavor do escuro. A criança continua a mesma, embora o cotidiano seja muito diferente.

        Folhinha: Outra mudança foi o aparecimento do digital. Como isso se reflete na literatura?

        Marina Colasanti: O livro não vai acabar. O que pode mudar é a chamada sacralização do livro. Ler sempre foi um momento importante. Não sabemos se, com a popularização do digital e livros mais baratos, o valor da leitura não será quebrado. Tudo é muito recente.

MOLINERO, Bruno. Livro para criança não precisa ser educativo, diz vencedora do Jabuti. Folha de S. Paulo. 3 jan. 2015. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/folhinha/2015/01/1568552-livro-para-crianca-nao-precisa-ser-educativo-diz-vencedora-do-jabuti.shtml. Acesso em: 20 abr. 2021.

Fonte: Maxi: Séries Finais. Caderno 2. Língua Portuguesa – 6º ano. 1.ed. São Paulo: Somos Sistemas de Ensino, 2021. Ensino Fundamental 2. p. 23-25.

Entendendo a entrevista:

01 – Qual a principal surpresa para Marina Colasanti ao ganhar o prêmio Jabuti?

      A principal surpresa foi o fato de um livro infantil ter sido considerado o melhor livro do ano, já que é raro que isso aconteça.

02 – Qual a visão de Marina Colasanti sobre a valorização da literatura infantil no Brasil?

      Apesar de haver uma grande demanda e interesse por livros infantis, a autora acredita que há um certo descrédito em relação à literatura infantil, como se não fosse necessário ser um escritor de verdade para escrever para crianças.

03 – Quais os principais problemas que Marina Colasanti identifica na produção de livros infantis atualmente?

      Os principais problemas são o descrédito da inteligência infantil e a tendência de transformar a literatura infantil em um veículo para transmitir ensinamentos morais e educativos, em vez de permitir que as histórias toquem e emocionem as crianças.

04 – Qual a importância de uma obra infantil tocar o adulto leitor?

      Para Marina Colasanti, se uma obra infantil não toca um adulto, ela também não conseguirá tocar uma criança. A literatura infantil deve ser capaz de emocionar e fazer refletir tanto crianças quanto adultos.

05 – Por que Marina Colasanti acredita que a criança não se identifica apenas com personagens que se assemelham a ela?

      A autora acredita que a criança busca a identidade no outro, em personagens diferentes de si mesma, como amigos, irmãos e até mesmo animais.

06 – Como Marina Colasanti vê as mudanças na criança ao longo do tempo?

      A principal mudança que a autora observa é a valorização do desejo da criança, que hoje em dia tem suas vontades mais atendidas. No entanto, as crianças continuam tendo as mesmas necessidades básicas, como medo da morte e do escuro.

07 – Qual o impacto do digital na literatura infantil, na visão de Marina Colasanti?

      A autora acredita que o livro não irá desaparecer, mas que a forma como ele é consumido pode mudar. A popularização do digital pode alterar a valorização da leitura, mas ainda é cedo para saber como isso irá se desenrolar.

08 – Qual a importância de um livro infantil tocar pontos profundos do leitor?

      É fundamental que um livro infantil toque em questões profundas e emocionais, para que possa gerar reflexão e conexão com o leitor.

09 – Por que Marina Colasanti considera a pergunta "É um livro para criança?" um elogio?

      Essa pergunta indica que o livro transcende as barreiras entre o mundo adulto e infantil, sendo capaz de emocionar e envolver leitores de todas as idades.

10 – Qual a mensagem principal que Marina Colasanti quer transmitir com suas obras infantis?

      A autora busca tocar, emocionar, sacudir e fazer refletir seus leitores, independentemente da idade. Ela acredita que a literatura infantil tem o poder de transformar e enriquecer a vida das pessoas.

 

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