quinta-feira, 7 de setembro de 2023

CONTO: PELE DE BODE - FOLCLORE RUSSO - COM GABARITO

 Conto: PELE DE BODE

                     FOLCLORE RUSSO

        Era uma vez um velho e uma velha. Eram camponeses, e muito pobres. Passaram a vida inteira na maior miséria, comendo pouco num dia e nada nos dois dias seguintes. Até que certa manhã a velha morreu, deixando o velho muito aflito, pois não tinha nem como enterrar a mulher.

 Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEif5B7StI9_PLhfT8AR2bnh7OrZs1m3YVDxSYw_cLzoZVCo6whzaocUBU1w2LNf0zUoOkSaHlJs11GNvqYB2exi9cWXOMjzww2GgYLO3kmV8ZdrRtbPZRvqqLBQ5h16HRjNfRxEe3e5rVuwchmXu5nKA76HBXxbCeuxwasOeyrfJzWmzqvbrJe-YQjFE7g/s1600/BODEE.jpg


        Então o velho mujique se arrastou até a casa do cura da aldeia, um Pope conhecido pela sua avareza, Cumprimentou-o humildemente e pediu, com lágrimas nos olhos.

        Ajuda-me, padre, paizinho espiritual: tenho de enterrar minha velha, que morreu esta manhã.

        Ao que o Pope respondeu:

        -- Tens dinheiro para pagar pelo enterro? Não faço fiado, nem parcelado. Tens de pagar antecipadamente.

        -- Lamento, santo paizinho, mas não tenho nem um copeque furado. Vou trabalhar com afinco, e tudo o que te for devido, pagarei com o meu trabalho.

        -- Nada feito, meu filho – respondeu o Pope avarento. – Só com pagamento adiantado. Se não, tens dinheiro, podes voltar para o lugar de onde vieste.

        -- E o pobre velho saiu da casa do cura.

        “O que fazer?”, pensava ele, desanimado. “Acho que terei de enterrar minha velha sozinho, com minhas próprias e velhas mãos, sem a ajuda do Pope!”

        E o velho voltou para casa pegou a pá e se arrastou para o cemitério. Escolheu um local e começou a cavar. Cava que cava, eis que de repente sua pá bateu em algo duro, que ressoou forte. O velho olhou e, vejam só, lá estava um pote de ferro, cheio até a borda de reluzentes moedas de ouro, brilhando e faiscando debaixo do sol. O velho mal podia acreditar nos seus próprios olhos – mas teve de acreditar: “Isto aqui dá até para um enterro de rico, mais o almoço de homenagem à falecida, como é de nossa praxe. E ainda vai sobrar muito dinheiro!”.

        O velho acabou de cavar a sepultura, pegou o pote cheio de ouro e voltou para a sua isbá. Chegando em casa, ele guardou o seu tesouro, tendo antes retirado dele a maior moeda de ouro, e voltou à casa do Pope.

        O cura avarento recebeu-o muito mal:

        -- Para que voltaste aqui, velho impertinente? Eu já te disse que, sem dinheiro adiantado, nada de enterro.

        -- Não te zangues, santo paizinho, aceita esta moedinha e faz para a minha velha um enterro como se deve.

        E estendeu a pesada moeda de ouro para o Pope avarento, cujos olhos, ao vê-la, brilharam mais do que a própria moeda. E imediatamente a sua voz irritada ficou suave e doce, e ele se desdobrava em mesuras e amabilidades diante do velho mujique.

        -- Não queres – disse ele agarrando a moeda –, não queres, meu filho, sentar-te aqui no banco? Tu sabes que a minha missão é espiritual, este é o meu trabalho, e tua velha terá um enterro como ela merece, o mais bonito, para ninguém botar defeito.

        -- Obrigado, paizinho – disse o velho mujique.

        Fez uma curvatura e foi-se embora, enquanto o Pope ia correndo mostrar a moeda à sua mulher.

        -- Olha só, mulher, para isto. Aquele traste velho chegou aqui se fingindo de pobre coitado, querendo que eu enterrasse a sua velha de graça. Metido a esperto, não é? Ainda bem que eu recusei: quando viu as coisas mal paradas, resolveu voltar com esta moeda de ouro. Olha que eu já fiz muito enterro de rico e até de nobre, mas um pagamento assim como este, nunca recebi.

        E o Pope mandou chamar todos os seus auxiliares, o diácono, o salmista, os acólitos, e realizou um enterro como nunca antes foi visto na aldeia. E o viúvo agradecido convidou o Pope com todos os outros para o almoço de homenagem à falecida, segundo a velha praxe russa.

        Quando o Pope entrou na isbá do velho, arregalou os olhos de espanto. De onde teria surgido tudo aquilo na casa do velho e pobre campônio? Vinho e mel, salgadinhos e tira-gostos, pratos diversos, bolos e doces – a mesa vergava debaixo de tanta e rica comida!

        O Pope esperou que o último convidado se retirasse, farto e agradecido, e dirigiu-se ao velho viúvo:

        -- Escuta, caríssimo filho meu, confessa-te com o teu pai espiritual, que sou eu, não guardes pecado no teu coração. Sempre foste pobre como um rato de igreja, pode-se dizer que eras o mais pobre dos meus paroquianos, e de repente, não se sabe como, apareces com toda esta fartura. Conta-me a verdade meu filho: quem sabe cometeste um crime, mataste e roubaste alguém?

        O velho ficou ofendido:

        -- O que é isso? Eu te digo toda a verdade, juro sobre a santa cruz: não roubei, não matei ninguém. Este ouro veio sozinho parar nas minhas mãos. Ouve só o que aconteceu.

        E o velho contou ao Pope como encontrara o tesouro, ao começar a cavar a sepultura da sua velha.

        O Pope escutou tudo, verde de espanto e inveja. Chegou em casa tremendo e de pernas bambas, só pensando na sorte do velho viúvo. A mulher estranhou o jeito dele e começou a fazer perguntas. Então ele lhe contou o que acontecera, e os dois puseram-se a pensar em como tomar posse do tesouro do velho.

        Finalmente o Pope teve uma ideia:

        -- Escuta, mulher, já sei o que vamos fazer. O próprio velho vai nos entregar seu ouro, sem qualquer violência.

        -- Como assim – perguntou a mulher.

        -- Eu já te explico. Mas teremos de sacrificar o nosso único bode. Concordas em ficar sem ele? Não terás dó de matá-lo?

        -- Para que ter dó de um velho bode? – disse a mulher. – Quando tivermos as moedas de ouro, poderemos comprar quantos bodes quisermos. Conta qual é a tua ideia.

        O Pope contou à mulher o que pensara, e em seguida pegou o facão, saiu, matou o bode, arrancou-lhe a pele, e vestiu-a no seu próprio corpo, com cabeça, barba, chifres e tudo. E entrou em casa.

        -- Pega, mulher, uma agulha grossa e uma linha forte, e costura a pele do bode no meu corpo, bem justa, para que não escorregue e nem caia quando eu andar.

        A mulher fez o que o Pope mandou. E no mesmo dia, quando bateu meia-noite, o Pope saiu e dirigiu-se sorrateiro à isbá do viúvo. Lá chegando, começou a golpear e a arranhar a janela do casebre.

        O velho acordou, levantou-se e foi até a janela.

        -- Quem está batendo? – perguntou.

        -- É o diabo! – respondeu o Pope, com voz disfarçada e ameaçadora.

        -- Deus me livre e guarde! – gritou o velho, e começou a rezar, persignando-se apavorado.

        -- Não adianta persignar-se nem rezar, que de mim não existe escapatória! – rosnou o Pope atrás da janela. – É melhor que me entregues logo o pote de ouro, por bem, ou será pior para ti. Fui eu que te ajudei, te mostrei o tesouro na cova. Pensei que ias tirar um pouco, só para o enterro, mas tu carregaste tudo! Agora devolve!

        O velho, meio desconfiado, espiou pelo reposteiro, e quase desmaiou de susto: lá estava o “diabo” em pessoa, sacudindo a sua cabeça de bode. Cabeça de diabo, cara de bode, barba, chifres e tudo!

        Apavorado o velho disse consigo: “O diabo que vá para o inferno, com o seu ouro impuro! Se até agora eu vivi sem dinheiro, posso terminar minha vida sem o ouro do diabo!”

        E mais que depressa pegou o pote de ouro e o colocou do lado de fora da porta de sua isbá.

        -- Para o diabo com este ouro maldito!

        O Pope disfarçado agarrou o pote e saiu correndo. Chegou em casa esbaforido e falou para a mulher:

        -- Olha só, mulher, enganei o velho bobalhão! Está aqui o dinheiro todo, todinho, só ouro puro! Pega e esconde bem escondido!

        A mulher foi esconder o pote debaixo das tábuas do assoalho. Ao voltar, o Pope, já aflito dentro da pele do bode, lhe disse, apressado:

        -- Pega a faca, mulher, corta as costuras e livra-me desta pele de bode, que já está fedendo, antes que alguém me veja.

        A mulher apanhou o facão na cozinha e começou a cortar uma costura – e o Pope soltou um berro de dor:

        -- Ai, ui! Está doendo! Pára, pára!

        E de fato, começou a escorrer sangue no lugar do corte da linha. A mulher tentou cortar uma outra costura – e o sangue brotou também ali.

        -- Ai, ui! Dói! Ai, que eu não aguento! – uivava o Pope.

        E onde quer que a mulher tentasse cortar a linha, o sangue espirrava, e o Pope urrava de dor. O couro do bode tinha grudado, inteirinho, na pele do Pope avarento, e não havia como tirá-lo!

        Vendo as coisas pretas, e apesar de lamentar ter de separar-se do dinheiro mal ganho, o Pope, gemendo, falou para a mulher:

        -- Vai depressa, mulher, leva de volta ao velho este ouro amaldiçoado! Quem sabe assim eu me livro desta pele de bode fedida!

        A mulher obedeceu. Pegou o pote com o dinheiro, levou para o viúvo, confessou-lhe o truque do Pope, pediu perdão e voltou para casa.

        Mas nem o arrependimento salvou o Pope avaro e mentiroso. E assim ele viveu escondido na sua casa fechada, deitado sobre a estufa, costurado dentro da pele de bode, sem poder mostrar-se a ninguém, até o fim da sua vida.

Tatiana Belink.

Entendendo o conto:

01 – Como vivia o casal de camponeses?

      Viviam em uma situação difícil e humilde, eles estavam passando por um período de escassez e pobreza.

02 – O que fez o “Pope” ao ser solicitado pelo camponês para realizar o funeral de sua esposa:

a)   Quando o camponês não tinha como pagar?

Recusou a fazer o enterro, pois não fazia fiado, nem parcelado.

b)   Quando o camponês lhe entregou a moeda de ouro?

Ele se desdobrou em mesuras e amabilidades diante do velho.

03 – Como se disfarçou o Pope para enganar o velho?

      Matou um bode e se vestiu com a pele dele, dizendo ser o diabo e que tinha vindo buscar o pote de ouro.

04 – O que você achou da atitude do “Pope”?

      Resposta pessoal do aluno.

05 – Qual o desfecho dessa história?

      O Pope avaro e mentiroso não conseguiu tirar o couro do bode, arrependido devolve o pote de ouro e viveu escondido na sua casa fechada, deitado sobre a estufa, sem poder mostrar-se a ninguém, até o fim da sua vida.

06 – Que outro final você daria para o conto?

      Resposta pessoal do aluno.

 

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