quarta-feira, 10 de janeiro de 2024

CRÔNICA: O PINHEIRO - WALCYR CARRASCO - COM GABARITO

 Crônica: O Pinheiro

                                 Walcyr Carrasco

HÁ MUITOS ANOS TIVE um Natal especialmente feliz. Eu e um grupo de amigos nos reunimos para fazer uma ceia em minha chácara. Cada um ficou encarregado de um detalhe. Uma semana antes dei pela falta:

—- E a árvore?

Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhpkYxB8awXwnvJL-_DT15uL8FgsV8jnRrHNRBkZhn5uyNWcK1R8QEwnNrGTwk-c1eW3bXFRNQaAXsF89d4FJUrHZJ3nGOXHf6kW4jVQHP5Y8nGyB-mOw7MyTj54EDohaHfS_2Yk0PZ3to1ZEUbShTTDZ4QCNScBSD9nni219gyFI95JNbZdzSMQ3lbJ8U/s320/PINHEIRO.jpg 


O bando de gulosos, de tão entusiasmado em discutir cardápio, achar receitas, comprar bebida, nem se preocupara com um detalhe tão prosaico e ao mesmo tempo tão natalino. Houve quem dissesse que árvore não precisava ter.

Insisti:

— Natal sem árvore não dá.

Sou meio romântico, apegado a certas deliciosas, tradições. Quando eu era criança, meus pais tinham uma árvore de penas verdes (acreditem), precursora das de plástico. As bolas coloridas, capazes de quebrar ao menor toque, ficavam guardadas o ano todo, envoltas em papel de seda. Em cima colocava-se um ponteiro brilhante, e em torno dos galhos, festões prateados cobertos com discutíveis pedaços de algodão branco. Uma vizinha fazia um presépio famoso no bairro. As figurinhas de cerâmica, pintadas. Um espelho fazia as vezes de rio. E grama, grama de verdade, colocada sobre uma tênue camada de terra, deixando o presépio cheio de vida. Eu, por mim, continuaria acreditando até em Papai Noel. Seria ótimo bater o pé, anunciar o presente desejado e ficar fazendo caras e bocas até ganhar. Entretanto, a verdade me foi revelada lá pelos sete anos, quando insisti em ganhar um cavalo de corrida. Tanto chorei quando o cavalo não veio que minha mãe não teve alternativa a não ser revelar a triste realidade. O Papai Noel que cabia no orçamento familiar não abarcava cavalos. Mas da árvore eu nunca quis abrir mão.

Um amigo saiu em busca de um pinheiro verdejante. Demorou horas.

Voltou com uma árvore raquítica e torta.

— Mas que pinheiro pavoroso! — reclamei.

— Bati em vários lugares, ninguém mais tinha. Achei este.

Pelo menos o homem deu desconto.

Era uma tristeza enfeitar aquele pinheiro tortinho. Compramos umas bolas, inventamos uns laços de fitas, botamos umas luzinhas. Minha mãe veio, e na véspera, quando todos estavam cozinhando, ela dedicou-se a conferir quantas cervejas cada um bebia.

— Se você continuar bebendo vai deixar o pernil queimar! — anunciava.

O pudim de uma amiga desandou. Inventei uma salada estranhíssima, que todo mundo experimentou por educação, de nariz torcido. Eu mesmo comi para disfarçar. Mas o pernil e a farofa estavam excelentes. Bebemos, comemos e trocamos presentes, e rimos muito!. Para minha surpresa, as pessoas não ficaram o tempo todo correndo de um lado para o outro. Sim, porque na maioria das vezes a ceia de Natal é parecida com uma estação de metrô, com uma porção de gente entrando e saindo. Há quem chegue atrasado porque precisou dar uma "passadinha" na casa de não sei quem. E quem saia voando, sem comer direito, rir ou desfrutar, para ir a outra casa, onde alguém pode ficar "chateado".

No dia seguinte um grupo ainda se encontrou para desfrutar as sobras.

Dias depois o pinheiro continuava lá, com as fitas já meio caídas. Pensei

em jogar no lixo. Hesitei. Afinal estava vivo, não estava?           

Achei que plantar uma árvore era um bom sinal para o Ano-Novo. Decidi. Peguei a enxada. Abri uma cova em frente da casa e botei o pinheiro, cortando o fundo da lata. As raízes quebraram, achei que não fosse para a frente. Para minha surpresa, continuou crescendo bem devagarinho, ano após ano. Certa vez, uma visita comentou:

— Meu avô, dizia que, quando o pinheiro ultrapassa o telhado, o dono da casa morre.

Sou supersticioso. Quase peguei o machado para cortar. Resisti, suspirando:

— Deixo nas mãos do destino!

O pinheiro já está bem mais alto que o telhado e eu continuo aqui. Minha mãe se foi. Muitos daqueles amigos tomaram outros rumos, e o nosso Natal em comum é uma vaga lembrança. Estranhamente o pinheiro cresceu de um jeito torto, com o tronco fazendo uma curva pendendo para um lado. Mesmo assim, encontrou um equilíbrio — como talvez todos nós, em situações de dificuldade. Ficou enorme e majestoso. Ao olhá-lo, sinto sempre um calor no peito. Não só pela lembrança, mas também pelo sentimento de continuidade. Em datas especiais, como Natal e Ano-Novo, é essa a grande sensação. A alegria de enfeitar uma árvore. Os amigos que se foram e os que estão chegando. Os laços. A troca. A felicidade de estar ao lado de quem a gente gosta. E a vida, que se renova.

Entendendo o texto

01. Qual foi o detalhe esquecido pelos amigos na preparação do Natal na chácara?

a) Comprar bebidas.

b) Escolher presentes.

c) Decorar a árvore.

d) Planejar o cardápio.

02. Como o autor descreve a árvore de Natal de sua infância?

      a) De plástico.

      b) De penas verdes.

      c) Feita de algodão.

      d) Com bolas de cerâmica.

03. Por que o amigo teve dificuldades em encontrar um pinheiro para a chácara?

       a) Todos estavam muito caros.

       b) Estava fora de temporada.

       c) Já estavam esgotados.

       d) Ninguém mais tinha em estoque.

04. Como o autor descreveu o pinheiro que o amigo trouxe?

       a) Grande e frondoso.

       b) Raquítico e torto.

       c) Majestoso e retilíneo.

       d) Pequeno e robusto.

05. O que a mãe do autor fez na véspera do Natal enquanto todos estavam cozinhando?

       a) Decorou a árvore.

       b) Preparou presentes.

       c) Conferiu a quantidade de cervejas de cada um.

       d) Fez uma salada estranha.

06. O que aconteceu com o pinheiro depois do Natal?

       a) Foi vendido.

       b) Ficou na chácara.

       c) Foi jogado no lixo.

       d) Foi plantado.

07. Por que o autor hesitou em jogar o pinheiro no lixo?

       a) Porque estava morto.

        b) Porque estava torto.

        c) Porque estava vivo.

        d) Porque estava sem enfeites.

08. Qual a superstição mencionada por uma visita em relação ao pinheiro?

        a) Quando ultrapassa o telhado, traz boa sorte.

        b) Quando ultrapassa o telhado, o dono da casa morre.

        c) Quando ultrapassa o telhado, é sinal de prosperidade.

        d) Quando ultrapassa o telhado, é preciso cortá-lo.

09. O que o autor decidiu fazer quando o pinheiro ultrapassou o telhado?

        a) Cortar o pinheiro.

        b) Ignorar a superstição.

        c) Consultar um adivinho.

        d) Fazer uma cerimônia de proteção.

10. Qual é a sensação que o autor tem ao olhar para o pinheiro nos dias especiais?

        a) Tristeza pela perda dos amigos.

        b) Calor no peito pela lembrança e continuidade.

        c) Arrependimento por não ter cortado o pinheiro.

        d) Alegria apenas pela decoração.

 

 

 

 

 

CRÔNICA: VOCAÇÃO - WALCYR CARRASCO - COM GABARITO

  CRÔNICA: Vocação

                                   Walcyr Carrasco

 UMA DAS ATIVIDADES QUE mais deliciam os adultos é perguntar aos pimpolhos:

— O que você vai ser quando crescer?

Entre meus amigos de infância, a resposta padrão era médico ou advogado.

Algum, mais aventureiro, respondia:

— Vou dirigir caminhão!        

Minha resposta era a mais esquisita:

— Escritor.

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiSmFYwmAeWbcPFJ5P4ww7m2f69jDPtbwcE6EZ0N8ktu_ZPCOjRq4Ret3Z6K-yEdBZpfXD_NnDjCS1eUsqNCYr1AtLnDW5ByoWk6xMy9SAczmA-iPgDwxDApSHryVzJL-GT0Ie3QEQ4RfGA5EJWOl3CaPiIcIE89KYhW4BKRLJdMLOEv7hiRojLcj8wm5Q/s320/ESCRITOR.jpg


Tinha me apaixonado pela ideia de ser escritor, embora não soubesse bem do que se tratava.

— O que faz um escritor? — perguntava minha mãe.

— Escreve! — eu respondia, cheio de razão.

Ao longo da adolescência, a crise explodia nos almoços de domingo:

— Vou prestar bioquímica — avisava meu irmão mais velho.

Mamãe não sabia exatamente do que se tratava, mas parecia respeitável.

Chegava minha vez:

— Quero ser escritor.

— Do que vai viver?

Essa era a questão.

. Segundo todas as informações, artistas em geral passavam fome.

— O certo é você ter uma profissão e escrever nas horas vagas — aconselhava papai.

 Eu teimava, dizendo que o dinheiro não era importante. Mas a satisfação.

— Quero ver a satisfação quando não tiver com que pagar o aluguel!

O almoço se tornava um caos. Mamãe perguntava:

— Onde você estuda para ser escritor?

Eu me calava. Médicos, advogados, engenheiros, estudam em faculdades. Agora... escritores? Como alguém se tornava um?

Tentava seguir o conselho de Monteiro Lobato: ler bastante. Para escrever bem, é preciso ler muito. Eu me afundava nos livros.

Um amigo de escola me aconselhou:

— Só com bastante experiência de vida. Como você vai falar sobre a vida dos outros se não passar por tudo?

Sou do tipo tímido. Seria obrigado a passar noites bebendo, até rolar pela sarjeta? Namorar uma daquelas moças muito maquiadas, de saias bem curtas e botinhas de cano longo que nos meus tempos passeava pela avenida São João? Sem dúvida, elas deviam ter experiência de vida!

Talvez fosse melhor fazer artesanato com couro. Deixei-crescer os cabelos, comprei couro, cola, tesouras. A bolsa ficou pavorosa. Desisti.

Lá pelos vinte anos escrevi minhas primeiras peças. Mostrei a um intelectual.

— Está muito meloso.

Reli. Nada mais pavoroso.

Comprei um livro de culinária. Terminava a faculdade de jornalismo, mas precisava de algo para expressar minha criatividade. Poderia montar um restaurante, se aprendesse algumas receitas sofisticadas. Dediquei-me aos peixes com laranja, frangos com laranja, arroz com laranja... as visitas, que só comiam de vez em quando, adoravam. Eu não suportava mais olhar para uma laranja. Voltei para as omeletes, macarrão... e ao sonho de ser escritor. 

Meu primeiro livro saiu a fórceps. Foi um infantil, Quando Meu Irmãozinho Nasceu, que conta a história de um menino que acompanha a gravidez da mãe. Demorou mais ainda para ser editado. Montar a primeira peça foi bem mais difícil, por causa do dinheiro. Meu Terceiro Beijo acabou fazendo certo sucesso.

Acabei descobrindo que a velha máxima é correta. Para subir uma escada é preciso um degrau de cada vez. O mundo mudou. Agora existe um mercado para autores de livros, roteiristas de cinema e televisão. Às vezes vou dar palestras em escolas e me perguntam qual seria a carreira do futuro. Digo que não sei.

— Na minha juventude, se alguém falasse em trabalhar com computadores, ia ser tachado de maluco — explico.

Como será o mundo de amanhã? O grande negócio é escolher o que se gosta. Quando a gente gosta do que faz, pode ser até pavoroso. Mas insiste. Acaba aprendendo. Quando a gente gosta, tem mais chance de dar certo. Foi isso que aprendi na vida. Foi assim que me tornei escritor.

 Entendendo o texto

01. O que mais delicia os adultos, segundo o autor?

a) Perguntar sobre profissões.

b) Comer em almoços de domingo.

c) Ler livros.

d) Beber café.

02. Qual era a resposta padrão entre os amigos de infância do autor quando questionados sobre o que seriam quando crescessem?

          a) Escritor.

          b) Dentista.

          c) Médico ou advogado.

          d) Motorista de caminhão.

03. Como o autor definia a profissão de escritor quando criança?

          a) Alguém que lê muito.

          b) Alguém que escreve.

          c) Alguém que estuda em faculdades.

          d) Alguém que passa noites bebendo.

04. Qual era o conselho do pai do autor sobre a escolha da profissão de escritor?

          a) Dinheiro não é importante, apenas a satisfação.

          b) Ter uma profissão e escrever nas horas vagas.

          c) Estudar em faculdades renomadas.

          d) Viajar pelo mundo em busca de inspiração.

05. Como o autor tentou seguir o conselho de Monteiro Lobato para se tornar um bom escritor?

         a) Fazendo artesanato com couro.

         b) Estudando jornalismo.

         c) Lendo muito.

         d) Passando noites bebendo.

06. O que o amigo de escola aconselhou o autor sobre ser escritor?

         a) Beber muito e rolar pela sarjeta.

         b) Fazer artesanato com couro.

         c) Ter bastante experiência de vida.

         d) Montar um restaurante.

07. Qual foi a primeira crítica recebida pelo autor em relação às suas peças escritas na juventude?

         a) Estavam muito melosas.

         b) Eram muito realistas.

         c) Faltava criatividade.

         d) Eram muito curtas.

08. O que o autor tentou fazer para expressar sua criatividade antes de se dedicar à escrita?

         a) Montar um restaurante.

         b) Pintar quadros.

         c) Escrever poesias.

         d) Tocar música.

09. Qual foi o título do primeiro livro do autor?

         a) Meu Terceiro Beijo.

         b) Quando Meu Irmãozinho Nasceu.

         c) O Sonho de Ser Escritor.

         d) Peças da Adolescência.

10. Como o autor descreve o caminho para alcançar o sucesso na carreira escolhida?

         a) É preciso ter sorte desde o início.

         b) Subir uma escada de uma vez.

         c) Um degrau de cada vez.

         d) Depender apenas da paixão pelo trabalho.

 

CRÔNICA: SINAL VERMELHO - WALCYR CARRASCO - COM GABARITO

 CRÔNICA: Sinal Vermelho

                   Walcyr Carrasco

 

QUANDO PERGUNTEI SE TINHA dinheiro trocado, minha amiga abriu a bolsa e tirou a carteira. Verificou. Insuficiente. Imediatamente, tirou uma segunda carteira do bolso do casaco, essa repleta de notas. Espantei-me:

— Duas carteiras?

— Uma é para os assaltantes — explicou.

Farta de ter sido roubada várias vezes ao parar no semáforo, ela optou pelo estratagema.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjajfH8A7eafdlTNL09rOOLu2umC9fvbmbiX3hgDZQfiR96pzRxdJJ2TohU_7Imuifv9OoMazhabalarDKRy_T_61Bkgt1u6Vxdzt5W4EVafKPavMpm03RulmToqvZO4QGY_UtZ7A6OfmbtqDvjspqopX8Oe7XOYxRT3_8DnT3Nk6r4XXqweGsBAiuWsNM/s1600/VERMELHO.jpg


Houve época em que os assaltantes eram rápidos. Aproximavam-se, arrancavam um relógio e uma corrente de ouro e saíam correndo como ratos assustados. O assaltante do semáforo, hoje, é um profissional seguro, consciente de ter conquistado um espaço na sociedade. Em certo sentido, tem muito a ver com um dentista. Ambos sabem lidar com o nervosismo alheio. A única diferença é que, enquanto o dentista promete que não vai doer, o ladrão garante o oposto. Está distante de qualquer proposta feminista, pois prefere as mulheres desacompanhadas. Aproxima-se, explica que é um assalto e que quer todo o dinheiro da carteira. Generosamente, dispensa os documentos e as vítimas até agradecem.

— Tive a maior sorte — comentou uma conhecida.

— Ele deixou tudo, menos o dinheiro. Foi muito legal.   

Como se o ladrão fosse um amigo compreensivo!

Seu método, desenvolvido em centenas de semáforos, é o da pressão psicológica pura e simples. Na maior parte das vezes nem arma mostra. Já vi a atuação de um desses assaltantes. Eu estava parado num semáforo próximo à praça Roosevelt. Atrás de mim, em seu Fiat, a sábia amiga das duas carteiras. O profissional, acompanhado de um ajudante, aproximou-se de seu vidro. Vi, pelo meu retrovisor, que conversava com ela cortesmente. "Será um assalto?", refleti. Observei para ver se havia alguma arma. De jeito nenhum. Um bando de rapazes "mal-ajambrados" acompanhava a cena de longe. Já me vi descendo do carro e enfrentando todos a golpes de capoeira. O único problema é que não sei capoeira. Apenas pensei em aprender, duas ou três décadas atrás.

Prudentemente, decidi-me pela versão menos perigosa. "Deve estar pedindo esmola." Vi quando minha amiga ofereceu algumas notas. Achei a esmola grande, mas disfarcei. O sinal abriu, partimos. Mais tarde, no restaurante, onde havíamos combinado nos encontrar, ela revelou: fora um assalto! Gentilmente (e com alguma dor de consciência), fiz questão de pagar o jantar. Ou seja, o assaltado fui eu, porque o menu custou muito mais do que a quantia roubada.

Conheci uma garota que no último mês foi assaltada cinco vezes, em semáforos diferentes. Acha normal. Particularmente, acho que o mais grave é quando uma coisa dessas começa a ser "normal". E inútil revoltar-se. Uma jovem que trabalha na área de moda estava no semáforo do Trianon, na esquina da avenida Paulista, às 4 da tarde. O ladrão aproximou-se, pediu o relógio e o dinheiro. Ela rodopiou o pescoço em busca de ajuda. Foi-se o tempo dos cavaleiros andantes! Parecia ter-se tornado invisível. Nesse instante, farol verde! Os carros se moveram. Ela acelerou. O meliante agarrou seu rabo-de-cavalo. Pior que Rapunzel com suas tranças, ela ficou presa pelos cabelos, com um pé no acelerador, outro no breque e o pulso entregue ao ladrão. Liberou-se só depois de devidamente depenada.

Qualquer motorista sabe quais são os pontos mais perigosos. Então por que ninguém faz nada? Em regiões como a praça Roosevelt e o Trianon sucedem se os assaltos como se fossem terras de ninguém.

Estou começando a desenvolver a síndrome do pânico em cada sinal vermelho. Fecho os vidros, mesmo agora no verão. Fico parado, olhando cautelosamente em todas as direções enquanto o interior do veículo se transforma numa sauna. Logo eu, um tipo capaz de fazer piada de quase todas as coisas da vida. Mas a questão é séria. Seria cômica se não fosse trágica.

Perder peso e entrar em forma?

Para andar na moda já não basta usar esta ou aquela roupa. E preciso ter o corpo certo, com as medidas exatas de um halterofilista para eles, com o padrão de uma ginasta olímpica para elas. Uma tragédia para os barrigudinhos como eu. Tenho um amigo que passa três horas por dia na academia. Sai do trabalho e corre para os abdominais, para os alongamentos, para o levantamento de peso. Está com peito de pombo. Outro malhou tanto que os bíceps parecem dois pernis. A cabecinha fica enterrada nos ombros como uma coruja. Ambos sentem-se orgulhosos como gaviões. Uma conhecida passa os dias malhando. O corpo, enxuto, não combina com os vincos do rosto e com o nariz em forma de guarda-chuva. Às vezes dá a impressão de que fez um implante de cabeça.

Tenho inveja dos tempos em que alguém podia envelhecer tranquilamente. Fazer exercícios não é mau. O duro é que virou obsessão. Há uma amiga que passa as noites pedalando numa bicicleta ergométrica enquanto vê as novelas. Outra comprou uma esteira a prazo, que agora enfeita seu dormitório, com uma porção de roupas dependuradas. Virou cabide. O filho de outro amigo começou a se queixar de gordura. Entrou em pane, até convencer o pai a adquirir a bicicleta mais cara do pedaço. Uma maravilha, colocada no terraço do apartamento. Mal chegou, atirou-se sobre ela e pedalou quinze minutos, feliz. Nunca mais a usou. Está lá, no terraço, tomando chuva.

O pior é que qualquer rapaz bombado, qualquer pantera malhada age como se fosse um ser oriundo das estrelas. Vão às festas de camiseta, com jeans e roupas colantes. Se eu apareço com um paletó folgado para disfarçar o abdome, observam-me, fiscalizando. Eu me sinto como se fosse uma bolsa Chanel na vitrine de uma sex shop. Confesso: resolvi fazer ginástica, recentemente. Tentei o personal trainer. Ou seja, um professor de ginástica particular, até que eu pegasse o ritmo. Mal começamos, ele me deitou numa espécie de cadeira de dentista forrada de preto e me deu uma barra com pesos nas extremidades, a ser erguida vinte vezes.

Ergui uma, foi fácil. Duas, mais ou menos. Na terceira, o coração batia no nariz.

— Estou velho, já não posso mais! — reclamei.

—- Continue erguendo, ou a barra cai no seu queixo — ele avisou, didaticamente.

Nos abdominais foi pior. Eu contava, e logo chegava aos trinta. Quase mordi o joelho, de tanto nervosismo. Depois o instrutor me pendurou num aparelho de alongamento. Fiquei de pernas abertas, barriga para a frente e mãos agarrando uma barra de madeira, logo atrás.

— Esse exercício tira barriga — explicou.

— Você não pode me algemar aqui, até amanhã? — implorei. 

Com um sorriso de desprezo, o crápula terminou a aula.

— Se amanhã você conseguir se mexer, faça alguns exercícios —

despediu-se.

Desde a primeira aula, bastava olhar no espelho para me sentir um atleta. Assim, continuei com o sofrimento. Aulas depois ele começou a colocar pesos nos pés, que eu deveria erguer ritmadamente. Dava a impressão de que os dedos iam cair no chão. Meus amigos, só elogios:

— Agora você vai sentir mais vitalidade. 

Eu sentia sono só de ouvir a palavra vitalidade. Fui me pesar, esperançoso.

Dois quilos extras.

— E a massa muscular — disse o crápula.

Tanto esforço para engordar? Preferia ter devorado quilos de chantili. Mesmo assim, persisti no sacrifício.

Outro dia peguei uma revista de moda internacional. Até agora essas revistas eram pródigas em exibir manequins até quarentões, mas sempre com peitorais e bíceps expressivos. Surpresa! Em todas, modelos longilíneos, magros, cabelos compridos e ar romântico.

— O homem musculoso está saindo de moda! — pontificou uma amiga estilista. — O bonito agora é o tipo dândi, bem magro.

Pensei nos meus amigos nadando, jogando tênis, malhando. O que vão fazer agora? Trocar de corpo? E eu? Corri ao espelho. Examinei: meus braços estavam começando a ficar com aquele jeitinho de quem faz ginástica! Ih!

         É isso aí. Até quando entro em forma dou com os burros n'água.

          

Entendendo o texto

01.  Por que a amiga do narrador carrega duas carteiras?

a) Para se proteger de assaltantes.

b) Porque uma é para os documentos e outra para o dinheiro. c) Para despistar os ladrões.

d) Todas as alternativas estão corretas.

02. Como o assaltante do semáforo é descrito em comparação com os antigos assaltantes?

         a) Rápido e impulsivo.

         b) Profissional e consciente.

         c) Desorganizado e desesperado.

         d) Inofensivo e amigável.

03.Qual é o método mais comum desse tipo de assaltante?

        a) Mostrar a arma imediatamente.

        b) Usar a pressão psicológica.

        c) Roubar apenas documentos.

        d) Agir rapidamente e fugir.

04. O narrador presenciou um assalto próximo à praça Roosevelt. O que ele observou sobre o assaltante?

        a) Ele estava armado e agiu rapidamente.

        b) Ele pedia esmolas educadamente.

        c) Ele estava acompanhado por um grupo de malfeitores.

        d) Ele recusou o dinheiro oferecido pela amiga do narrador.

05. O que aconteceu durante o assalto vivido pela amiga do narrador?

        a) Ela ofereceu notas como esmola.

        b) O assaltante levou tudo, exceto o dinheiro.

        c) Ela conseguiu escapar ilesa.

        d) O narrador pagou o jantar depois de descobrir o assalto.

06. O narrador relata uma experiência no trânsito que o fez sentir como se estivesse numa sauna. O que ele faz para se proteger?

        a) Fecha os vidros do carro.

        b) Liga o ar condicionado.

        c) Desce do carro e enfrenta os ladrões.

        d) Grita por ajuda.

07. Qual é a reclamação do narrador em relação à pressão estética na sociedade?

       a) A obsessão por perder peso.

       b) A exigência de ter o corpo perfeito.

       c) A falta de moda para barrigudinhos.

       d) Todas as alternativas estão corretas.

08. O narrador tenta fazer ginástica com a ajuda de um personal trainer. Como ele se sente após a primeira aula?

       a) Energizado e motivado.

       b) Como um atleta.

       c) Cansado e dolorido.

       d) Deprimido e desencorajado.

09. Qual é a descoberta surpreendente sobre a moda masculina mencionada na crônica?

       a) Homens musculosos estão fora de moda.

       b) Homens magros são os mais desejados.

       c) Modelos masculinos agora usam cabelos compridos.

       d) Homens devem trocar de corpo para se adequar à moda.

10. Como o narrador se sente em relação aos seus esforços para entrar em forma no final da crônica?

      a) Satisfeito e realizado.

      b) Frustrado e desanimado.

      c) Animado para continuar se exercitando.

      d) Surpreso com os resultados positivos.

 

 

 

 

 

sábado, 6 de janeiro de 2024

DOCUMENTÁRIO: MEDO DE SOBRAR, MEDO DE SONHAR - SESC SP - COM GABARITO

 DOCUMENTÁRIO: MEDO DE SOBRAR, MEDO DE SONHAR

              SESC  SP

SINOPSE

Diante das questões de maior relevância social relacionadas ao trabalho e as incertezas sobre o primeiro emprego, foi lançado pelo Sesc SP o documentário Medo de sobrar, medo de sonhar, criado pela produtora Infame durante o Seminário Jovens e Trabalho: Dilemas, Invenções e Caminhos, realizado no Sesc Bom Retiro em setembro de 2017.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgBbj3SckdWcglwmyXjwFNn4oE3pdX5xqRzxz880zpzURmSF6pRHnhcL54RDBQ9qoCo_TEhuNWajBnBstYJucKJVQnKlX5jhpQ02F8geVnaGBMVpEY-2XufPtrvXvoOawjbxF6qp15JmnlyoKLaCnx5uuVoRRfBVwo3dfL4f82toPNhxvWbQWf8QjGQJKE/s320/MEDO.jpg


O documentário apresenta relatos de jovens e adultos da periferia de São Paulo, compartilhando sua trajetória de descoberta, aprendizado e entendimento do que é trabalho e suas possibilidades de realização pessoal. Esse documentário compartilha histórias com a perspectiva de que há futuros possíveis e que eles podem ser a realização de sonhos.

O documentário também conta com depoimentos de pesquisadores e especialistas na temática jovens e trabalho, como Regina Novaes, Andrea Assef, Maria Carla Corrochano, Helena Abramo e Daniel Kafuzo, entre outros.

Entendendo o documentário

01. Qual é a temática principal abordada no documentário?

      a) Arte urbana.

      b) Educação ambiental.

      c) Saúde mental.

      d) Desenvolvimento econômico.

02. Quem são os protagonistas ou personagens centrais do documentário?

     a) Atletas profissionais.

     b) Músicos renomados.

     c) Jovens empreendedores.

     d) Pessoas em situação de rua.

03. Onde ocorre o evento registrado no documentário?

     a) Rio de Janeiro.

     b) São Paulo.

     c) Brasília.

     d) Belo Horizonte.

04. O que o documentário destaca como sendo motivo de medo para as pessoas abordadas?

    a) Perder oportunidades profissionais.

    b) Não alcançar metas esportivas.

    c) Sofrer com problemas de saúde mental.

    d) Enfrentar desafios ambientais.

05. Qual é o tema principal abordado no documentário "Medo de Sobrar, Medo de Sonhar"?

     a) A vida nas grandes metrópoles.
     b) A cultura brasileira.
     c) Os desafios enfrentados por jovens em situação de vulnerabilidade social.
    d) A história do SESC SP.

06. O que o documentário explora em relação aos jovens em situação de vulnerabilidade social?

     a) Suas habilidades artísticas.
     b) Suas trajetórias de superação.
     c) Suas viagens pelo Brasil.
     d) Suas experiências gastronômicas.

07. Quem são os principais personagens ou grupos destacados no documentário?

     a) Políticos locais.
     b) Estudantes universitários.
     c) Jovens em situação de vulnerabilidade social.
     d) Celebridades da televisão.

08. Como o documentário aborda a questão do medo na vida dos jovens retratados?

     a) Explorando seus medos sobrenaturais.
     b) Destacando seus medos em relação ao futuro.
     c) Investigando seus medos de insetos.
     d) Ignorando completamente a temática do medo.

09. Qual é a classificação indicativa do documentário "Medo de Sobrar, Medo de Sonhar"?

     a) Livre.
     b) 10 anos.
    c) 14 anos.
    d) 18 anos.

 

DOCUMENTÁRIO: "NOS, CAROLINAS" - VOZES DAS MULHERES DA PERIFERIA - COM GABARITO

 Documentário: "Nós, Carolinas" – vozes das mulheres da periferia

Sinopse

Uma senhora cheia de memórias sobre o interior de São Paulo. Uma menina que se orgulha de seu cabelo black-power. Uma mulher que voltou a estudar depois dos 50 anos e uma arte-educadora que dribla o tempo para conciliar maternidade e sua vida pessoal. Todas elas unidas por uma mesma geografia: a periferia da cidade de São Paulo. “Nós, Carolinas” traz as vivências e vozes de quatro mulheres que moram em diferentes bairros: Parque Santo Antônio, zona Sul; Jova Rural, zona norte; Perus, região noroeste e Guaianases, na zona leste. Joana Ferreira, Carolina Augusta, Renata Ellen Soares e Tarsila Pinheiro falam o que é ser mulher da periferia em cotidianos particulares, mas conectados pelo recorte de classe, raça e de gênero.  Assim como a escritora Carolina Maria de Jesus, que encontrou na escrita um instrumento para superar sua invisibilidade, essas outras Carolinas também invisíveis aos olhos do centro, usam a potência de sua voz para romper silêncios.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhWUEFvyo0rt9QTI-QgMB2-DLvW8Vj6Ya3G10HPu6cu9foapOv2QIsvIvqCcibygDTSW-vKgdlOInz7w3Sm-3FmBacB8GvApPhGmjoWf0rvQHaIPVDY528ZUZkDNAgkWYCWumh3wPf5f0O3Uv564cc-42Rbhcax6kWSiQrovH0ZbUhrg5UJKRJZ1ca8V64/s320/Nos-mulheres-da-periferia.-Credito-Vinicius-Boppre-_1.jpg


Ficha Técnica
Título Original: Nós, Carolinas
Gênero: Documentário
Tempo de Duração:  17 minutos
Ano de Lançamento (Brasil): 2017
 
Direção/Roteiro/Produção:
Coletivo Nós, mulheres da periferia
Aline Kátia Melo
Bianca Pedrina
Jéssica Moreira
Lívia Lima
Mayara Penina
Regiany Silva
Semayat Oliveira
 
Classificação: Livre

 Entendendo o documentário:

 01.  Que tema é abordado no documentário?

O tema abordado no documentário "Nós, Carolinas" é a vivência das mulheres da periferia de São Paulo, destacando as histórias de quatro mulheres: Joana Ferreira, Carolina Augusta, Renata Ellen Soares e Tarsila Pinheiro. 

02.  Que território é retrato no documentário?

O território retratado no documentário é a periferia da cidade de São Paulo, abrangendo diferentes bairros como Parque Santo Antônio (zona Sul), Jova Rural (zona norte), Perus (região noroeste) e Guaianases (zona leste).

03.  Descreva como é esse lugar.

O lugar é caracterizado por ser uma região periférica, marcada por desafios socioeconômicos, mas também por uma forte comunidade e resiliência. Cada bairro tem suas próprias características, mas todos refletem a realidade da periferia paulistana.

04.  O que as mulheres retratadas no filme têm em comum?

As mulheres retratadas no filme têm em comum a condição de viverem na periferia de São Paulo e enfrentarem desafios relacionados à classe social, raça e gênero.

05.  Qual a relação entre Maria Carolina de Jesus, catadora de lixo, favelada, mãe solteira que se tornou escritora renomada e as personagens do filme?

A relação entre Maria Carolina de Jesus e as personagens do filme está na superação da invisibilidade. Assim como a escritora Carolina Maria de Jesus encontrou na escrita uma forma de romper o silêncio e se tornar visível, as outras Carolinas do documentário também usam a potência de suas vozes para superar a invisibilidade imposta pelo centro.

     06.  Qual trajetória é a mais comovente em sua opinião. Justifique.

A resposta a essa pergunta é subjetiva, já que a comoção varia de pessoa para pessoa. Cada trajetória apresentada no documentário é única e tocante à sua maneira, refletindo as diferentes experiências das mulheres retratadas.

07.  O documentário registra diversas formas de ser mulher, negra e periférica. Que reflexões, levando em conta o debate, o documentário e sua vivência, podemos fazer a respeito dos desafios de ser mulher, negra, periférica?

O documentário registra as diversas formas de ser mulher, negra e periférica, destacando os desafios enfrentados por essas mulheres. A partir disso, podemos refletir sobre a necessidade de combater estereótipos e preconceitos, promovendo a equidade de gênero, raça e classe social. O filme convida a uma reflexão sobre a importância de dar visibilidade às vozes das mulheres que muitas vezes são marginalizadas.

08.  O que o documentário, o debate e a vivência desenvolve na sua aprendizagem?

        O documentário, o debate e a vivência contribuem para uma aprendizagem mais ampla sobre as diferentes realidades enfrentadas por mulheres negras e periféricas. Eles podem despertar uma consciência crítica em relação às questões de gênero, raça e classe, promovendo empatia, compreensão e engajamento em busca de uma sociedade mais justa e igualitária.


 

 

 

sexta-feira, 5 de janeiro de 2024

TIRINHA: JEAN GALVÃO - PAROXÍTONA - COM GABARITO

 Tirinha: Jean Galvão

 

Fonte: Coleção Desafio Língua Portuguesa – 5° ano – Anos Iniciais do Ensino Fundamental – Roberta Vaiano – 1ª edição – São Paulo, 2021 – Moderna – p. MP088.

Entendendo a tirinha:

01 – Na tirinha, o efeito de humor está relacionado à interpretação de uma palavra. Qual é ela?

      É a palavra torta no primeiro quadrinho.

02 – Qual é a diferença entre o que o menino e a menina entendem como torta?

      O garoto provavelmente imaginou que a menina entrou desequilibrada no teatrinho da escola, quando na verdade ela representou uma torta no palco.

03 – A palavra Torta é:

(   ) oxítona.       (X) paroxítona.      (   ) proparoxítona.

04 – Escreva as palavras da tira com essa mesma classificação. Depois, circule a sílaba tónica.

      Teatrinho, escola, pena, nada, aplaudida.