Poema: O
Uraguai – Fragmento
Basílio da Gama
CANTO
PRIMEIRO
Fumam ainda nas desertas praias
Lagos de sangue tépidos e impuros
Em que ondeiam cadáveres despidos,
Pasto de corvos. Dura inda nos vales
O rouco som da irada artilheria.
MUSA, honremos o Herói que o povo rude
Subjugou do Uraguai, e no seu sangue
Dos decretos reais lavou a afronta.
Ai tanto custas, ambição de império!
E Vós, por quem o Maranhão pendura
Rotas cadeias e grilhões pesados,
Herói e irmão de heróis, saudosa e triste
Se ao longe a vossa América vos lembra,
Protegei os meus versos. [...]
CANTO
SEGUNDO
[...]
Prosseguia talvez; mas o interrompe
Sepé, que entra no meio, e diz: Cacambo
Fez mais do que devia; e todos sabem
Que estas terras, que pisas, o céu livres
Deu aos nossos avôs; nós também livres
As recebemos dos antepassados.
Livres as hão de herdar os nossos filhos.
Desconhecemos, detestamos jugo
Que não seja o do céu, por mão dos padres.
As frechas partirão nossas contendas
Dentro de pouco tempo: e o vosso Mundo,
Se nele um resto houver de humanidade,
Julgará entre nós; se defendemos
Tu a injustiça, e nós o Deus e a Pátria.
[...]
GAMA, Basílio da; O
Uraguai. Disponível em: http://objdigital.bn.br/Acervo_Digitl/livros_eletronicos/uraguai.pdf.
Acesso em: 7 ago. 2020.
Fonte: Língua
Portuguesa – Estações – Ensino Médio – Volume Único. 1ª edição, São Paulo, 2020
– editora Ática – p. 301-3.
Entendendo o poema:
01 – De acordo com o poema,
qual o significado da palavra fumam?
Fumegam, expelem
vapores.
02 – Em 1769, o luso-brasileiro
Basílio da Gama escreveu o poema épico “O
Uraguai”, colocando em versos, como tema central, a história da Guerra
Guaranítica, que aconteceu de 1753 a 1756, no sul do Brasil. O título refere-se
ao rio Uruguai, em cujas margens houve a disputa de portugueses e espanhóis
pelo território ocupado pelos jesuítas. Leia os versos de abertura do poema.
Como essa guerra é representada nos cinco primeiros versos do poema e quem são
suas principais vítimas?
É representada como uma guerra sangrenta,
pois os cadáveres estão em um lago de sangue. Esses cadáveres estão despidos, o
que indica serem os indígenas os mortos vitimados pelo conflito.
03 – Em “O Uraguai”, a proposição corresponde a todo o primeiro canto. Que
versos correspondem ao início da invocação e à dedicatória? Qual é a função
dessas partes do poema?
A invocação aparece no verso e que o
poeta chama pela MUSA, ou seja, ele pede inspiração para seu trabalho poético,
ao mesmo tempo que se coloca a serviço dessa inspiração para alcançar seu
objetivo, que é homenagear Mendonça Furtado. A esse, portanto, dirige-se a
dedicatória, em que o poeta o define como herói e irmão de heróis, no caso
alcançando também a louvação a Pombal, como queria.
04 – Por que e como o poeta
se apropriou do gênero épico para escrever o poema?
O gênero épico
foi apropriado pelo poeta porque ele estava seguindo os modelos clássicos, já
que se identificava com a estética do Arcadismo. Assim, ele manteve as partes
básicas do gênero (as divisões internas e a metrificação), mas alterou sua
composição ao não apresentar estrofes nem rimas.
05 – O indígena guarani Sepé
Tiarajú (1723-1756) foi uma das figura histórica reais que se destacaram na
Guerra Guaranítica. Leia, de acordo com parte do Canto segundo “O Uraguai”, em
que ele interrompe o diálogo do cacique Cacambo com os ibéricos e toma a
palavra.
a)
Qual é o principal argumento de Sepé para
encerrar a conversa com seus inimigos?
O principal argumento é que não valeria a pena discutir com os
ibéricos, pois os indígenas sempre seriam livres, não aceitariam a dominação de
nenhum poder a não ser o religioso (do céu), intermediado pelos jesuítas. Como
portugueses e espanhóis não aceitariam isso, o único caminho era o combate, por
meio do qual os indígenas provariam estar do lado certo, lutando por Deus e
pela pátria.
b)
Por que podemos dizer que há heroicidade
nessa fala de Sepé?
Porque Sepé é altivo, tem convicção em seus argumentos (como quando
afirma “detestamos jugo”) e, sobretudo, dispõe-se a colocar a vida em jogo por
seus ideais.
c)
Sepé Tiarajú foi reconhecido oficialmente
como “herói guarani missionário rio-grandense” pela Lei n. 12.366 de 2005 do
estado do Rio Grande do Sul e “Herói da Pátria Brasileira” pela Lei Federal n. 12.032
de 2009. Debata com os colegas e o professor: Qual é a importância de
iniciativas como essa que reconhecem Sepé Tiarajú como herói indígena? Esse
reconhecimento é suficiente para garantir uma visão positiva dos povos
indígenas? Explique.
Resposta pessoal do aluno. Sugestão: Iniciativas como essa são
importantes porque rompem com a tradição de valorizar apenas os colonizadores.
No entanto, somente esse reconhecimento legal não é suficiente, pois pode
ajudar a propagar a ideia de que os indígenas são do passado, que não
contribuem de modo efetivo com a sociedade contemporânea.