Reportagem: Estudo de gene de linguagem reforça teoria da separação entre homens e chimpanzés
Nicholas Wade (traduzido do jornal The New York Times)
Um estudo dos gnomas dos seres humanos
e chimpanzés forneceu novas ideias sobre a origem da linguagem. Um dos
atributos humanos mais distintos, a linguagem foi um passo fundamental na
cadeia evolutiva. Segundo esse estudo, a linguagem foi, na escala de tempo
evolucionária, um desenvolvimento muito recente, algo que ocorreu nos últimos
100.000 anos.
A descoberta reforça uma teoria
inovadora, proposta pelo Dr. Richard Klein, arqueólogo da Universidade Stanford
(EUA). O pesquisador argumenta que o surgimento do comportamento humano
moderno, há cerca de 50.000 anos, deu-se por importante modificação genética,
provavelmente aquela que levou ao desenvolvimento da linguagem pela espécie.
O novo estudo, desenvolvido pelo Dr.
Svant Paabo e colaboradores, do Instituto Max Planck de Antropologia
Evolucionária (Leipzig – Alemanha), se baseia na descoberta no ano passado do
primeiro gene humano envolvido especificamente na linguagem.
O gene foi identificado por meio de
estudos em uma grande família londrina, famosa entre os linguistas. De seus 29
membros, 14 não conseguem articular a fala, mas são, de outra forma, normais.
Uma equipe de biólogos moleculares,
liderada pelo Dr. Anthony P. Monaco, da Universidade de Oxford (Inglaterra),
identificou, em 2001, o gene que estava causando os problemas da família.
Chamado de Foxp2, o gene regula a atividade de outros genes durante o
desenvolvimento do cérebro. Presume-se, portanto, que tenha um papel no
estabelecimento de um circuito neural para a linguagem, mas o mecanismo ainda
não foi compreendido.
A equipe de Paabo estudou a história
evolucionária do Foxp2. Para isso, comparou sequências de DNA das versões do
gene em camundongos, chimpanzés e outros primatas.
Em artigo publicado on-line, na
quinta-feira 8 de agosto, pela revista Nature, Paabo diz que o gene Foxp2
permaneceu basicamente inalterado durante a evolução dos mamíferos, mas sofreu
súbita mudança nos seres humanos, depois que a linha de hominídeos separou-se
da linha dos chimpanzés.
As mudanças do gene humano, segundo os
autores, afetam em dois pontos a estrutura da proteína que codifica. Um deles
altera ligeiramente a forma da proteína; o outro dá a ela um novo papel no
circuito de sinalização das células humanas.
As mudanças indicam que o gene tem
estado sob forte pressão evolucionária nos seres humanos. A forma humana do
gene, com suas duas modificações, também parece ter se tornado universal na
população, sugerindo que confere alguma vantagem essencial.
Paabo alega que os humanos já deviam
ter alguma forma de linguagem rudimentar antes de o Foxp2 ter sofrido as
mutações. Ao conferir a habilidade de rápida articulação, o gene aprimorado
pode ter se difundido na população, dando o toque final à linguagem verbal.
“Talvez esse gene tenha conferido o aperfeiçoamento final da linguagem,
tornando-a totalmente moderna”, disse Paabo.
Os membros afetados da família londrina
na qual a versão defeituosa do Foxp2 foi descoberta possuem alguma linguagem
rudimentar. Sua principal dificuldade parece estar na falta de controle mais
fino dos músculos da garganta e da boca, necessários para a fala rápida. No
entanto, os membros afetados apresentam muitas dificuldades tanto em testes
escritos, quanto nos orais, sugerindo que o gene defeituoso causa problemas
gramaticais, além dos de controle muscular.
O genoma humano acumula constantemente,
por mutações randômicas, modificações de DNA, que, contudo, raramente afetam a
estrutura dos genes. Quando um novo gene difunde-se pela população, a
diversidade genômica no período é reduzida por certo tempo, já que todo mundo
possui o mesmo pedaço de DNA transferido com o novo gene. Ao medir a
diversidade reduzida e outras características de um gene de vital importância,
Paabo estimou a idade da versão humana do Foxp2 em menos de 120.000 anos.
Paabo diz que sua estimativa aproximada
encaixa-se com a teoria de Klein. Justificando o rápido aparecimento de novos
comportamentos há 50.000 anos, incluindo arte, ornamentação e comércio de longa
distância. Esqueletos humanos desse período são fisicamente iguais aos de
100.000 anos atrás, levando Klein a propor que alguma mudança cognitiva de base
genética deve ter estimulado os novos comportamentos. A única mudança de
magnitude suficiente, em sua opinião, teria sido a aquisição da linguagem pela
espécie.
WADE, Nicholas.
Estudo de gene de linguagem reforça teoria da separação entre homens e
chimpanzés. Disponível em: http://www.uol.com.br/noticias
Acesso em: 15 ago. 2002. Tradução de Deborah Weinberg.
Fonte: Português – Língua e Cultura. Carlos Alberto Faraco. Volume 1. 2. Ed. – Curitiba: Base Editorial, 2010. P. 95-7.
Entendendo a reportagem:
01 – Observe novamente como
o texto é, no geral, bastante cauteloso nas afirmações que faz. Isso decorre
das próprias características do trabalho científico. No fundo, todos os achados
da ciência estão sempre sob o crivo da dúvida, isto é, eles podem ser
modificados ou reinterpretados e até mesmo abandonados com o desenrolar das
pesquisas.
Esse grau de incerteza e de
abertura para novas possibilidades, característico do pensamento cientifico, é
uma grande conquista histórica da humanidade. Com ele, foi possível assentar as
bases de um pensamento não dogmático e definir um dos direitos fundamentais da
pessoa humana – a liberdade de pensamento.
Muitas vezes esse grau de
incerteza do trabalho cientifico não é percebido pelas pessoas. Resultado:
toma-se uma afirmação cientifica como definitiva e inquestionável, como se o
produto da ciência fosse um saber pronto e acabado.
Claro que as afirmações
científicas têm uma certa força. Isso decorre do fato de que, na ciência, as
afirmações têm de ser sustentadas com dados (não basta apenas afirmar). E mais:
temos que apresentar dados que possam ser verificados por outros cientistas
independentemente. Assim, as afirmações valem e sobrevivem (e têm força,
portanto) enquanto é possível sustenta-las.
Isso posto, releia o texto
identificando os vários elementos que expressam a cautela nas afirmações.
2° / 5° / 8° /
10° / 13° parágrafos (provavelmente, presume-se, segundo os autores, parece,
sugerindo, talvez, propor...).
02 – O texto é uma
reportagem e, nesse sentido, é basicamente informativo. Ele nos traz
informações sobre estudos de dois grupos de pesquisadores: o liderado pelo Dr.
Anthony Monaco e liderado pelo Dr. Svant Paabo. Vamos localizar essas
afirmações.
· Sobre o grupo liderado pelo Dr. Anthony Monaco:
a) Em que instituição o grupo trabalha?
5° parágrafo.
b) Que tipo de profissionais compõe o grupo?
5° parágrafo.
c) O grupo estudou uma determinada família londrina. Por quê?
4° parágrafo.
d) Qual o resultado da pesquisa?
5° parágrafo.
e) Que característica tem o gene Foxp2?
10° parágrafo.
f) Em que ano a equipe chegou ao resultado?
5° parágrafo.
· Sobre o grupo liderado pelo Dr. Svant Paabo:
a) Em que instituição trabalha?
3° parágrafo.
b) O grupo, partindo da descoberta da equipe do Dr. Monaco, buscou estabelecer o quê?
6° parágrafo.
c) Como foi feita a pesquisa? E quais foram seus resultados?
6° parágrafo.
d) Como a equipe do Dr. Paabo chegou à estimativa de idade da versão humana do Foxp2?
13° parágrafo.
e) O texto diz que os resultados da pesquisa reforçam uma teoria proposta pelo Dr. Richard Klein. Qual é esta teoria; o que levou o seu autor a propô-la; e de que modo a pesquisa lhe dá reforço?
2° e 13° parágrafos.