sábado, 4 de maio de 2019

MÚSICA: MEU BEM QUERER - DJAVAN - COM QUESTÕES GABARITADAS


Música: Meu Bem Querer
                                  Djavan
Meu bem querer
É segredo, é sagrado
Está sacramentado
Em meu coração

Meu bem querer
Tem um quê de pecado
Acariciado
Pela emoção

Meu bem querer
Meu encanto
Estou sofrendo
Tanto, amor

E o que é o sofrer
Para mim que estou
Jurado pra morrer
De amor?
                                   Composição: Djavan

Entendendo a canção:
01 – Na canção acima pode-se afirmar que:
I – O substantivo composto bem-querer é formado por um advérbio (bem) e um verbo (querer).
II – A palavra (que) normalmente funciona como pronome ou conjunção e aparece no texto substantivada.
III – A forma verbal sofrer, no texto, é também um substantivo.

Marque a resposta CORRETA:
a)   Todas estão corretas.
b)   Somente I está correta.
c)   Somente II está correta.
d)   Somente III está correta.
e)   Todas estão incorretas.

02 – As ideias presentes na música se organizam estabelecendo relações que atuam na construção do sentido e na identificação com as concepções de vida de cada um. Djavan, em Meu Bem-Querer, traça uma estratégia para aproximar o leitor da música. Essa estratégia se pode verificar em:
a)   Expressar os sentimentos do eu lírico em relação à amada.
b)   Explicitar o ponto de vista do enunciador em relação ao amor.
c)   Descrever detalhadamente o sentimento de amor.
d)   Relatar como é o amor e a mulher amada.
e)   Convencer o leitor sobre a beleza daquela mulher e daquele amor.

03 – Sobre a letra de Djavan, é possível afirmar que:
a)   Predomina a função conativa da linguagem, na medida em que se evoca o interlocutor através de vocativos que expressam convite.
b)   Predomina a função poética da linguagem, na medida em que se privilegia a forma em detrimento do conteúdo.
c)   Predomina a função emotiva da linguagem, na medida em que se destaca mais o emissor – apresentado como eu-lírico – do que o receptor – apresentado como objeto de desejo do emissor.
d)   Predomina a função conativa da linguagem, na medida em que o receptor, chamado de “Meu bem-querer”, é o centro da mensagem.
e)   Predomina a função emotiva da linguagem, na medida em que se faz referência unicamente ao emissor da mensagem em todo o texto.

04 – Encontre na música uma marca da oralidade que a aproxima dos falares populares.
      “... tem um quê de pecado”.

05 – O que quis dizer o músico com a expressão “Está sacramentado no meu coração”?
      Significa um juramento, um ritual sagrado.

06 – A leitura interpretativa permite dizer que:
I – A canção de Djavan é um retrato do romantismo ideal vivido por casais apaixonados. O tema é muito explorado pelos poetas do Romantismo e pela mídia contemporânea.
II – O amor traz no seu bojo a dualidade do encantamento e sofrimento; tornando o sofrer, quase sempre, parte integrante do viver um grande amor.
III – No verso “Jurado pra morrer de amor”, o eu lírico refere-se a não concretização do amor.
a)   Somente I está correta.
b)   Somente II está correta.
c)   Somente III está correta.
d)   Somente I e II estão corretas.
e)   Somente II e III estão corretas.

07 – Nos versos: “Meu bem querer
                            É segredo, é sagrado
                            Está sacramentado
                            Em meu coração”.

        Qual é a função de linguagem?
      É emotiva, já que, predomina a utilização de pronomes na primeira pessoa, que torna um texto mais subjetivo.



ROMANCE: O QUINZE I -(FRAGMENTO) - RACHEL DE QUEIROZ - COM GABARITO

Romance: O Quinze I – (Fragmento)
                 Rachel de Queiroz

  Eles tinham saído na véspera, de manhã, da Canoa.
   Eram duas horas da tarde.
        Cordulina, que vinha quase cambaleando, sentou-se numa pedra e falou, numa voz quebrada e penosa:
        -- Chico, eu não posso mais... Acho até que vou morrer. Dá-me aquela zoeira na cabeça!  
        Chico Bento olhou dolorosamente a mulher. O cabelo, em falripas sujas, como que gasto, acabado, caia, por cima do rosto, envesgando os olhos, roçando na boca. A pele, empretecida como uma casca, pregueava nos braços e nos peitos, que o casaco e a camisa rasgada descobriam.
        (...)
        No colo da mulher, o Duquinha, também só osso e pele, levava, com um gemido abafado, a mãozinha imunda, de dedos ressequidos, aos pobres olhos doentes.
        E com a outra tateava o peito da mãe, mas num movimento tão fraco e tão triste que era mais uma tentativa do que um gesto.
        Lentamente o vaqueiro voltou as costas; cabisbaixo, o Pedro o seguiu.
        E foram andando à toa, devagarinho, costeando a margem da caatinga.
        (...)
        De repente, um bé!, agudo e longo, estridulou na calma.
        E uma cabra ruiva, nambi, de focinho quase preto, estendeu a cabeça por entre a orla de galhos secos do caminho, aguçando os rudimentos de orelha, evidentemente procurando ouvir, naquela distensão de sentidos, uma longínqua resposta a seu apelo.
        Chico Bento, perto, olhava-a, com as mãos trêmulas, a garganta áspera, os olhos afogueados.
        O animal soltou novamente o seu clamor aflito.
        Cauteloso, o vaqueiro avançou um passo.
        E de súbito em três pancadas secas, rápidas, o seu cacete de jucá zuniu; a cabra entonteceu, amunhecou, e caiu em cheio por terra.
        Chico Bento tirou do cinto a faca, que de tão velha e tão gasta nunca achara quem lhe desse um tostão por ela.
        Abriu no animal um corte que foi de debaixo da boca até separar ao meio o úbere branco de tetas secas, escorridas.
        Rapidamente iniciou a esfolação. A faca afiada corria entre a carne e o couro. Na pressa, arrancava aqui pedaços de lombo, afinava ali a pele, deixando-a quase transparente. Mas Chico Bento cortava, cortava sempre, com um movimento febril de mãos, enquanto Pedro, comovido e ansioso, ia segurando o couro descarnado. Afinal, toda a pele destacada estirou-se no chão. E o vaqueiro, batendo com o cacete no cabo da faca, abriu ao meio a criação morta.
        Mas Pedro, que fitava a estrada, o interrompeu:
        -- Olha, pai!
        Um homem de mescla azul vinha para eles em grandes passadas. Agitava os braços em fúria, aos berros:
        -- Cachorro! Ladrão! Matar minha cabrinha! Desgraçado!
        Chico Bento, tonto, desnorteado, deixou a faca cair e, ainda de cócoras, tartamudeava explicações confusas.
        O homem avançou, arrebatou-lhe a cabra e procurou enrolá-la no couro.
        Dentro da sua perturbação, Chico Bento compreendeu apenas que lhe tomavam aquela carne em que seus olhos famintos já se regalavam, da qual suas mãos febris já tinham sentido o calor confortante.
        E lhe veio agudamente à lembrança Cordulina exânime na pedra da estrada... o Duquinha tão morto que já nem chorava...
        Caindo quase de joelhos, com os olhos vermelhos cheios de lágrimas que lhe corriam pela face áspera, suplicou, de mãos juntas:
        -- Meu senhor, pelo amor de Deus! Me deixe um pedaço de carne, um taquinho ao menos, que dê um caldo para a mulher mais os meninos! Foi pra eles que eu matei! já caíram com a fome! ...
        -- Não dou nada! Ladrão! Sem-vergonha! Cabra sem-vergonha!
        A energia abatida do vaqueiro não se estimulou nem mesmo diante daquela palavra.
        Antes se abateu mais, e ele ficou na mesma atitude de súplica.
        E o homem disse afinal, num gesto brusco, arrancando as tripas da criação e atirando-as para o vaqueiro:
        -- Tome! Só se for isto! A um diabo que faz uma desgraça como você fez, dar-se tripas é até demais! ...
        A faca brilhava no chão, ainda ensanguentada, e atraiu os olhos de Chico Bento.
        Veio-lhe um ímpeto de brandi-la e ir disputar a presa, mas foi ímpeto confuso e rápido. Ao gesto de estender a mão, faltou-lhe o ânimo.
        O homem, sem se importar com o sangue, pusera no ombro o animal sumariamente envolvido no couro e marchava para a casa cujo telhado vermelhava, lá além.
        Pedro, sem perder tempo, apanhou o fato que ficara no chão e correu para a mãe.
        Chico Bento ainda esteve uns momentos na mesma postura, ajoelhado.
        E antes de se erguer, chupou os dedos sujos de sangue, que lhe deixaram na boca um gosto amargo de vida.

            O Quinze, Rachel de Queiroz. Rio de Janeiro: J. Olympio, s.d. p. 72-5.
Entendendo o romance:

01 – De acordo com o texto, qual o significado das palavras abaixo:
·        Brandir: agitar de modo repetido e ameaçador.
·        Estridulou: soou agudo e penetrante.
·        Exânime: desfalecido.
·        Falripas: cabelos muito ralos na cabeça.
·        Jucá: pau-ferro.
·        Orla: borda, beira, margem.

02 – Chico Bento e sua família são retirantes. Qual é a condição física deles no momento retratado pelo texto? Comprove sua resposta com trechos do texto.
      Eles estavam degradados fisicamente, conforme comprovam nos trechos: “Cordulina, que vinha quase cambaleando”; “O Duquinha, também só osso e pele”.

03 – Chico Bento, antes da seca, não era vagabundo nem bandido; era um trabalhador rural. Levante hipóteses:
a)   Como deve ter se sentido ao ser xingado pelo proprietário da cabra?
Deve ter se sentido humilhado, atingido moralmente, pois não era ladrão; roubara por necessidade.

b)   Por que não reagiu aos insultos?
Por reconhecer as razões do homem e, talvez, por pensar na família.

04 – Ao ver que sua presa seria levada, Chico Bento chegou a sentir vontade de lutar por ela com sua faca, “mas foi ímpeto confuso e rápido. Ao gesto de estender a mão, faltou-lhe o ânimo”. Embora esse seja apenas um fragmento da obra, é possível extrair algumas conclusões importantes desse fato.
a)   O sertanejo, no texto, é visto como um ser resignado à sua condição ou como um ser transformador, responsável por seus próprios destinos?
Resignado. Exausto e desesperançoso, Chico Bento sente-se sem ânimo para lutar contra sua sorte.

b)   Nesse fragmento, como é vista a condição de miséria e até de eventual violência (que acabou não se concretizando) em que vivem as personagens: como fatalidade ou como resultado de políticas governamentais ou de relações sociais inadequadas?
Como fatalidade; no episódio não há nenhuma referência a fatores de ordem social, também responsáveis pela condição das personagens.

05 – O Quinze é um bom exemplo de como os romancistas da década de 1930 lidam com a linguagem literária. Observe a linguagem empregada no texto quanto a: vocabulário (mais culto ou mais popular, regionalismos), construções sintáticas (mais prolixas ou mais próximas da fala), períodos (longos ou curtos), etc. Em seguida, caracterize-a.
      A linguagem é culta, porém direta, com vocabulário acessível, por vezes incluindo algum termo regional. Os períodos são curtos e buscam maior proximidade com a linguagem oral.

POEMA: AOS VÍCIOS - GREGÓRIO DE MATOS - COM GABARITO

Poema: Aos vícios
       
Fonte de imagem -  https://www.blogger.com/blog/post/edit/7220443075447643666/4904817813717004629#
    Gregório de Matos

Eu sou aquele que os passados anos
Cantei na minha lira maldizente
Torpezas do Brasil, vícios e enganos.
E bem que os descantei bastantemente,


Canto segunda vez na mesma lira
O mesmo assunto em pletro diferente.

Já sinto que me inflama e que me inspira
Talía, que anjo é da minha guarda
Des que Apolo mandou que me assistira.

Arda Baiona, e todo o mundo arda,
Que a quem de profissão falta à verdade
Nunca a dominga das verdades tarda.

Nenhum tempo excetua a cristandade
Ao pobre pegureiro do Parnaso
Para falar em sua liberdade

A narração há de igualar ao caso,
E se talvez ao caso não iguala,
Não tenho por poeta o que é Pégaso.

De que pode servir calar quem cala?
Nunca se há de falar o que se sente?!
Sempre se há de sentir o que se fala.

Qual homem pode haver tão paciente,
Que, vendo o triste estado da Bahia,
Não chore, não suspire e não lamente?

Isto faz a discreta fantasia:
Discorre em um e outro desconcerto,
Condena o roubo, increpa a hipocrisia.

O néscio, o ignorante, o inexperto,
Que não eleje o bom, nem mau reprova,
Por tudo passa deslumbrado e incerto.

E quando vê talvez na doce treva
Louvado o bem, e o mal vituperado,
A tudo faz focinho, e nada aprova.

Diz logo prudentaço e repousado:
- Fulano é um satírico, é um louco,
De língua má, de coração danado.

Néscio, se disso entendes nada ou pouco,
Como mofas com riso e algazarras
Musas, que estimo ter, quando as invoco?

Se souberas falar, também falaras,
Também satirizaras, se souberas,
E se foras poeta, poetizaras.

A ignorância dos homens destas eras
Sisudos faz ser uns, outros prudentes,
Que a mudez canoniza bestas feras.

Há bons, por não poder ser insolentes,
Outros há comedidos de medrosos,
Não mordem outros não - por não ter dentes.

Quantos há que os telhados têm vidrosos,
e deixam de atirar sua pedrada,
De sua mesma telha receosos?

Uma só natureza nos foi dada;
Não criou Deus os naturais diversos;
Um só Adão criou, e esse de nada.

Todos somos ruins, todos perversos,
Só os distingue o vício e a virtude,
De que uns são comensais, outros adversos.

Quem maior a tiver, do que eu ter pude,
Esse só me censure, esse me note,
Calem-se os mais, chitom, e haja saúde.

                                     Gregório de Matos. Op. cit. vol. II, pág. 468.
Entendendo o poema:
01 – De o significado das palavras abaixo:
·        Canonizar: considerar santo, incluir no rol dos santos.
·        Quem maior a tiver: quem tiver virtude maior.
·        Chitom: silêncio!

02 – Releia a terceira estrofe. Como o poeta justifica as suas críticas?
      Segundo ele, a lamentável situação da Bahia prova que suas críticas são justas.

03 – Quantas estrofes e quantos versos possui o poema?
      Possui 20 estrofes e 60 versos.

04 – Segundo ele, por diversos motivos as pessoas deixam de exercer o direito de criticar. Mencione alguns desses motivos.
      A incapacidade. A ignorância. A Falsidade e o Temor.

05 – Releia as três últimas estrofes. Podemos ver nelas o pessimismo contra reformista do homem barroco? Por quê?
      Sim. Porque, segundo o autor, a natureza humana é essencialmente má.

MENSAGEM: CARIDADE TRANSFERIDA -DIVALDO FRANCO(JOANNA DE ÂNGELIS) - O LIVRO DOS ESPÍRITOS - ALLAN KARDEC - SOBRE OS ESPÍRITOS - ANJOS E DEMÔNIOS - REFLEXÃO



Mensagem: CARIDADE TRANSFERIDA
DIVALDO FRANCO PELO ESPÍRITO JOANNA DE ÂNGELIS


    Ninguém objeta quanto à qualidade dos elevados propósitos.
        Não se faz qualquer restrição à nobreza de tais sentimentos.
        A caridade é sempre uma luz acesa vencendo trevas.
        Por isso mesmo não é lícito eximir-se alguém de clarificar-se com a luminescência que dela emana.
       Quem conduz uma luz beneficia-se primeiro.



        Generaliza-se uma prática que, embora edificante, tem assumido um caráter passadista.
        Pessoas generosas, que desejam auxiliar, sempre se eximem de fazê-lo, justificando-se falta de tempo, de saúde, poucas possibilidades econômicas… E encaminham os necessitados que lhe buscam o concurso a outras que lhes parecem bem aquinhoadas, valorosas, sem problemas…Mas que os têm, igualmente, só que se não queixam, fomentando o comércio do desânimo e da insensatez.
        São criaturas bem formadas, sem dúvida, as que assim procedem, no entanto, se recusam a alegria de servir, a bênção de socorrer, a felicidade de amar.
        Claro que ante à impossibilidade real de fazer-se o bem, a atitude encaminhar o aflito a uma fonte abençoada é correta.
        Não, porém, como um hábito constante, transferindo-se a caridade de domicílio e de mãos…
*
        Quando alguém te chegar em sofrimento, sempre poderás auxiliar, se o quiseres.
        Não mensurando tempo nem examinando valores, deves repartir dádivas e repartir-te no ministério da caridade com Jesus.
        Caridade transferida ¾ socorro tardio.
*
        Conhecendo alguém que se afadiga no labor santificante da caridade, corre em seu auxílio, ao invés de o sobrecarregares com novas incumbências e maior soma de responsabilidades.
        Detendo-te a meditar na Parábola do Bom Samaritano, compreenderás a necessidade de fazeres, tu mesmo, a caridade.
        Não mandes outrem realizá-la em teu lugar.
        Não postergues o teu momento de felicidade.
        Jesus jamais se poupava, transferindo labores. Inclusive na cruz, quando solicitado pelo atormentado bandido, que Lhe rogava ajuda, distendeu-lhe a mão generosa da esperança, em nome da excelsa caridade de Nosso Pai.
(De Oferenda, de Divaldo P. Franco Joanna de Ângelis)

Mensagens Espírita: O livro dos Espíritos

ALLAN KARDEC – Tradução Matheus R. Camargo
Perguntas e respostas
                      Livro Segundo
MUNDO ESPÍRITA OU DOS ESPÍRITOS
                       Capítulo I
        SOBRE OS ESPÍRITOS
ANJOS E DEMÔNIOS

128 – Os seres que chamamos de anjos, arcanjos e serafins formam uma categoria especial, de uma natureza da dos outros Espíritos?
      -- Não, eles são os Espíritos puros: aqueles que estão no mais alto grau da escala e reúnem todas as perfeições.
      A palavra anjo geralmente revela a ideia da perfeição moral; entretanto, é frequentemente aplicada a todos os seres bons e maus que estão fora da humanidade. Diz-se: o anjo bom e o mau; o anjo de luz e o anjo das trevas. Nesse caso, ele é sinônimo de Espírito ou de gênio. Aqui, nós a usamos no seu sentido positivo.

129 – Os anjos passaram por todos os graus?
      -- Percorreram todos os graus, mas, como dissemos, alguns aceitaram sua missão sem reclamar, e chegaram mais depressa; outros levaram um tempo mais ou menos longo para chegar à perfeição.

130 – Se a opinião que admite seres criados perfeitos e superiores a todas as outras criaturas é errônea, como se explica que ela apareça na tradição de quase todos os povos?
      -- Deves saber que teu mundo não existe desde sempre e que, muito tempo antes de ele existir, já havia Espíritos que tinham alcançado o grau supremo. Os homens então acreditaram que eles sempre foram assim.

131 – Há demônios, no sentido que é atribuído a essa palavra?
      -- Se houvesse demônios, eles seriam obra de Deus. E Deus seria justo e bom se tivesse criado seres eternamente votados ao mal e desgraçados? Se há demônios, eles residem no teu mundo inferior ou em outros semelhantes. São estes homens hipócritas que fazem de um Deus justo um Deus maldoso e vingativo, e que julgam ser-lhe agradáveis pelas abominações que cometem em Seu nome.
      A palavra demônio está ligada à ideia de Espírito mau apenas em sua acepção moderna, pois a palavra grega daimôn, a partir da qual é formada, significa gênio, inteligência, e foi aplicada a seres incorpóreos, bons ou maus, sem distinção.
      A ideia dos demônios, na acepção vulgar da palavra, supõe seres essencialmente malfeitores; como todas as coisas, seriam criação de Deus. Ora, Deus, que é soberanamente justo e bom, não pode ter criado seres naturalmente propensos ao mal e eternamente condenados. Se não fossem obra de Deus, seriam eternos como Ele, e então haveria diversas forças soberanas.
      A primeira condição de toda doutrina é ser lógica. Ora, a dos demônios, no sentido absoluto, falha nesse ponto essencial. Que na crença de povos atrasados, que não conhecem os atributos de Deus, admita-se a existência de divindades malfeitoras, ou também demônios, é compreensível; mas para todo aquele que faz da bondade de Deus um atributo por excelência, é ilógico e contraditório supor que Ele possa ter criado seres voltados ao mal e destinados a praticá-lo perpetuamente, pois seria negar a Sua bondade. Os partidários dos demônios se apoiam nas palavras do Cristo; certamente não seremos nós quem contestaremos a autoridade de seu ensinamento, que gostaríamos de ver mais nos corações que nas bocas dos homens. Mas será que se está bem certo do sentido que ele atribuía à palavra demônio? Não se sabe que a forma alegórica é umas das marcas distintivas de sua linguagem, e que tudo o que está no Evangelho não deve ser levado ao pé da letra? Não precisamos de outra prova além desta passagem:
      “Logo após esses dias de aflição, o sol escurecerá e a lua não mais derramará a sua luz, as estrelas cairão do céu e as forças celestes serão abaladas. Em verdade vos digo que esta geração não passará antes que todas essas coisas se cumpram.”
      Não vimos a forma do texto bíblico ser contradita pela Ciência, no que diz respeito à criação e ao movimento da Terra? Não poderia ocorrer o mesmo com certas figuras empregadas pelo Cristo, que deveria falar de acordo com seu tempo e região? Cristo não poderia ter conscientemente dito uma falsidade. Portanto, se em suas palavras há coisas que parecem chocar a razão, é porque não as compreendemos ou as interpretamos mal.
      Os homens fizeram dos demônios o mesmo que fizeram dos anjos. Da mesma forma que acreditaram na existência de seres perfeitos desde sempre, tomaram os Espíritos inferiores por seres perpetuamente maus. A palavra demônio deve ser entendida, portanto, como relativa aos Espíritos impuros, que frequentemente não são melhores que aqueles designados com o nome de demônios, mas com a diferença de que seu estado é apenas transitório. São os Espíritos imperfeitos que reclamam das provações que sofrem e que, por isso mesmo, as sofrem por mais tempo, mas que chegarão por sua vez à perfeição, quando tiverem essa vontade. Portanto, poder-se-ia aceitar a palavra demônio com essa restrição; mas como agora ela é entendida num sentido exclusivo, isso poderia induzir ao erro, levando a acreditar na existência de seres especiais criados para o mal.
      Quanto a Satanás, ele é evidentemente a personificação do mal sob uma forma alegórica, pois não se poderia admitir um ser mau lutando de igual poder contra a Divindade, e cuja única preocupação fosse contrariar os desígnios divinos. Como o homem precisa de figuras e imagens para impressionar sua imaginação, representou os seres incorpóreos sob uma forma material, com atributos que lembram suas qualidades ou defeitos. Foi assim que os antigos, na tentativa d personificar o tempo, representaram-no sob a figura de um ancião com uma foice e uma ampulheta; a figura de um jovem teria sido um contrassenso. O mesmo se deu com as alegorias da fortuna, da verdade, etc. Os modernos representam os anjos ou Espíritos puros sob uma figura radiante, com asas brancas, símbolo da pureza; Satanás com chifres, garras e os atributos da bestialidade, símbolos das paixões vis. O ignorante, que toma as coisas ao pé da letra, viu nesses símbolos individualidades reais, como outrora tinha visto Saturno na alegoria do Tempo.




TEXTO: A VIDA IMITA UM LIVRO - FERNANDO MEIRELLES - COM QUESTÕES GABARITADAS

Texto: A vida imita um livro
        
   Fernando Meirelles

        Nessa noite houve novamente leitura e audição, não tinham outra maneira de se distraírem, lástima que o médico não fosse, por exemplo, violinista amador, que doces serenatas poderiam então ouvir-se nesse quinto andar, os vizinhos invejosos diriam, Aqueles, ou lhes corre bem a vida, ou são uns inconscientes e julgam poder fugir à desgraça rindo-se da desgraça dos mais. Agora não há outra música senão a das palavras, e essas, sobretudo as que estão nos livros, são discretas, ainda que a curiosidade trouxesse a escutar à porta alguém do prédio, não ouviria mais do que um murmúrio solitário, este longo fio de som que poderá infinitamente prolongar-se, porque os livros do mundo, todos juntos, são como dizem que é o universo, infinitos. Quando a leitura terminou, noite adentro, o velho da venda preta disse, A isto estamos reduzidos, a ouvir ler, Eu não me queixo, poderia ficar assim para sempre, disse a rapariga dos óculos escuros,  Nem eu estou a me queixar, só digo que apenas servimos para isto, para ouvir ler a história de uma humanidade que antes de nós existiu, aproveitamos o acaso de haver aqui ainda uns olhos lúcidos, os últimos que restam, se um dia eles se apagarem, não quero nem pensar, então o fio que nos une a essa humanidade partir-se-á, será como se estivéssemos a afastar-nos um dos outros no espaço, para sempre, e tão cegos eles como nós, Enquanto puder, disse a rapariga dos óculos escuros, manterei a esperança, a esperança de vir a encontrar meus pais, a esperança de que a mãe deste rapaz apareça, Esqueceste-te de falar da esperança de todos, Qual, a de recuperar a vista, Há esperanças que é loucura ter, pois eu digo-te que se não fossem essas eu já teria desistido da vida, Dá-me um exemplo, Voltar a ver, Esse já conhecemos, dá-me outro, Não dou, Porquê, Não te interessa, E como sabes que não me interessa, que julgas tu conhecer de mim para decidires, por tua conta, o que me interessa e o que não me interessa, Não te zangues, não tive a intenção de magoar-te,  Os homens são todos iguais, pensam que basta ter nascido de uma barriga de mulher para saber tudo de mulheres, Eu de mulheres sei pouco, de ti nada, e quanto a homem, para mim, ao tempo que isso vai, agora sou um velho, e zarolho, além de cego, Não tens mais nada para dizeres contra ti, Muito mais, nem tu imaginas quanto a lista negra das auto-recriminações vai crescendo à medida que os anos passam, Nova sou eu, e já estou bem servida, Ainda não fizeste nada de verdadeiramente mau, Como podes sabê-lo, se nunca viveste comigo, Sim, nunca vivi contigo, Por que repetiste nesse tom as minhas palavras, Que tom, Esse, Só disse que nunca vivi contigo, O tom, o tom, não finjas que não compreendes, Não insistas, peço-te, Insisto preciso saber, Voltamos às esperanças, Pois voltemos, O outro exemplo de esperança que me recusei a dar era esse, Esse, qual, A última auto-recriminação da minha lista, Explica-te, por favor, não entendo de charadas, O monstruoso desejo de que não venhamos a recuperar a vista, Porquê, Para continuarmos a viver assim, Queres dizer, todos juntos, ou tu comigo, Não me obrigues a responder, Se fosses só um homem poderias fugir à resposta, como todos fazem, mas tu mesmo disseste que és um velho, e um velho, se ter vivido tanto tem algum sentido, não deveria virar a cara à verdade, responde, Eu contigo, E por que queres tu viver comigo, Esperas que o diga diante de todos eles, Fizemos uns diante dos outros as coisas mais sujas, mais feias, mais repugnantes, com certeza não é pior o que tens para me dizer-me, Já que o queres, então seja, porque o homem que eu ainda sou gosta da mulher que tu és, Custou assim tanto a fazer a declaração de amor, Na minha idade, o ridículo mete medo, Não foste ridículo, Esqueçamos isto, peço-te, Não tenciono esquecer nem deixar que esqueças, É um disparate, obrigaste-me a falar, e agora, E agora é a minha vez, Não diga nada de que te possas arrepender, lembra-te da lista negra, Se eu estiver a ser sincera hoje, que importa que tenha de arrepender-me amanhã, Cala-te, Tu queres viver comigo e eu quero viver contigo, Estás doida, Passaremos a viver juntos aqui, como um casal, e juntos continuaremos a viver se tivermos de nos separar dos nosso amigos, dois cegos devem poder ver mais do que um, É uma loucura, tu não gostas de mim, Que é isso de gostar, eu nunca gostei de ninguém, só me deitei com homens, Estás a dar-me razão, Não estou, Falaste de sinceridade, responde-me então se é mesmo verdade gostares de mim, Gosto o suficiente para querer estar contigo, e isto é a primeira vez que digo a alguém, Também não mo dirias a mim se me tivesses encontrado antes por aí, um homem de idade, meio calvo, de cabelos brancos, com uma pala num olho e uma catarata no outro, A mulher que eu então era não o diria, reconheço, quem o disse foi a mulher que sou hoje, Veremos então o que terá para dizer a mulher que serás amanhã, Pões-me à prova, Que ideia, quem seria eu para pôr-te à prova, a vida é que decide essas coisas, Uma ela já decidiu.
        Tiveram esta conversa frente a frente, os olhos cegos de um fitos nos olhos cegos do outro, os rostos encendidos e veementes, e quando, por tê-lo dito um deles e pôr o quererem os dois, concordaram que a vida tinha decidido que passassem a viver juntos, a rapariga dos óculos escuros estendeu as mãos, simplesmente para as dar, e não para saber por onde ia, tocou as mãos do velho da venda preta, que a atraiu suavemente para si, e assim ficaram sentados os dois, juntos, não era a primeira vez, claro está, mas agora tinham sido ditas as palavras de recebimento. Nenhum dos outros fez comentários, nenhum deu parabéns, nenhum exprimiu votos de felicidade eterna, em verdade o tempo não está para festejos e ilusões, e quando as decisões são tão graves como esta parece ter sido, não surpreenderia até que alguém tivesse pensado que é preciso ser-se cego para comportar-se desta maneira, o silêncio ainda é o melhor aplauso. O que a mulher do médico fez foi estender no corredor uns quantos coxins dos sofás, suficientes para improvisar uma cama, depois levou para lá o rapazinho estrábico e disse-lhe, A partir de hoje passas a dormir aqui. Quanto ao que aconteceu na sala, tudo indica que nesta primeira noite terá ficado finalmente esclarecido o caso da mão misteriosa que lavou as costas do velho da venda preta naquela manhã em que correram tantas águas, todas elas lutrais.”

                            Ensaio sobre a cegueira. São Paulo:
Companhia das Letras, 1995. p. 289-92.
Entendendo o texto:

01 – Releia este trecho da narrativa: “Quando a leitura terminou, noite dentro, o velho da venda preta disse, A isto estamos reduzidos, a ouvir ler, Eu não me queixo, poderia ficar assim para sempre, disse a rapariga dos óculos escuros”.

a)   Identifique nesse trecho a fala do narrador e a adas personagens.
Do narrador: “Quando [...] disse” e “disse a rapariga dos óculos escuros”; do velho: “A isto estamos reduzidos, a ouvir ler”; da moça: “Eu não me queixo, poderia ficar assim para sempre”.

b)   De que recursos o autor se valeu para delimitar as falas de cada um?
Emprega apenas a vírgula, deixando de lado o travessão e as aspas. Apesar disso, alguns verbos dicendi são mantidos: “disse”.

02 – No diálogo entre o velho da venda preta e a rapariga dos óculos escuros, o velho, referindo-se aos olhos da mulher do médico, que ainda podem ver, afirma: “se um dia eles se apagarem, não quero nem pensar, então o fio que nos une a essa humanidade partir-se-à, será como se estivéssemos a afastar-nos uns dos outros no espaço, para sempre, e tão cegos eles como nós”.

a)   Explique essa afirmação do velho.
A cegueira definitiva significaria um hiato que afastaria para sempre esses dois momentos das história da humanidade (antes e depois da cegueira), pois sem a visão não haveria transmissão da experiência e do saber acumulados, de modo que o saber de um grupo não serviria para o outro.

b)   A condição de cegueira absoluta, pela perspectiva do velho, pode ser vista como a era da desrazão? Por quê?
Sim, seria o mesmo que barbárie: o homem teria de reaprender a viver nessa nova condição, como se fossem todos primitivos.

03 – No diálogo das duas personagens, o velho diz que tem um monstruoso desejo: o de que as pessoas não recuperem a vista. Qual é a razão de tal desejo?
      O fato de ele se sentir atraído pela moça de óculos escuros e não querer separar-se dela.

04 – A cegueira de que quase todos são vítimas por um lado brutaliza o ser humano, levando-o à condição de animal irracional; por outro, pode aproximar as pessoas. Explique por que, com base no relacionamento entre o velho e a moça.
      Conforme o texto, se eles enxergassem, ela o veria velho e calvo, e talvez não se interessasse por ele. Cegos os dois, a aproximação de ambos se dá pela essência de cada um, e não pela aparência.

05 – No final dessa obra, as personagens voltam a recuperar a visão, mas estão agora irremediavelmente modificadas, pois, depois daquela experiência, já não podem ver o mundo da mesma forma que antes.
a)   Ao abrirmos a obra, deparamos com a seguinte epígrafe: “Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara”. Estabeleça diferenças entre olhar, ver e reparar.
Enquanto olhar sugere uma percepção mais genérica do mundo, ver sugere uma percepção mais seletiva e demorada do objeto. Reparar sugere um estágio ainda mais aprofundado e detido de percepção, que busca enfocar o detalhe.

b)   A visão que se tem da realidade está associada diretamente à consciência de cada indivíduo. No poema “Tabacaria”, Álvaro de Campos diz: “Se eu casasse com a filha da minha lavadeira / Talvez fosse feliz”. Considerando esse dado, responda: Por que a mulher do médico é a personagem que mais sofre na obra?
Porque é a única pessoa que, por conseguir olhar, pode ver tudo o que acontece. Só ela tem a real dimensão da tragédia que se abateu sobre a cidade.

c)   As personagens, depois de recuperarem a visão, passam a perceber a realidade de modo diferente. O leitor da obra, por sua vez, é conduzido pelo narrador ao mundo da cegueira para emergir dele com uma visão cada vez mais clara e ampla da realidade. Com qual dos verbos mencionados na epígrafe (olhar, ver e reparar) essa visão se relaciona?
Com o verbo reparar, pois o leitor, ao final da obra, pode ter da condição humana e de nossas contradições uma visão mais crítica e apurada.