sábado, 27 de janeiro de 2024

CRÔNICA: VITÓRIA NOSSA - CLARICE LISPECTOR - COM GABARITO

 Crônica: Vitória nossa

               Clarice Lispector

O que temos feito de nós e a isso considerado vitória nossa de cada dia?

Não temos amado, acima de todas as coisas.
Não temos aceito o que não se entende porque não queremos ser tolos.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEilk6Dm8JbXiJAqqCL30X8nTPuNbpxdsC1Hdi6ts23ZFjTGqbgCEzZsJJ8k0x19CHMaAUI2if35gxg2H1d6pigVqjzZlqJ-NRjNT56MPp3_-zNsBxC1u7cAv-QDO3XI_ris5uhV4GoG4hwlesEYeXEsQS8cDmsmDwEnRKC1fhI4tKSCS8CmOciGfykvuYE/s320/tempo.jpg


Temos amontoado coisas e seguranças por não nos termos, nem aos outros.
Não temos nenhuma alegria que tenha sido catalogada.
Temos construído catedrais e ficado do lado de fora, pois as catedrais que nós mesmos construímos tememos que sejam armadilhas.
Não nos temos entregue a nós mesmos, pois isso seria o começo de uma vida larga e talvez sem consolo.
Temos evitado cair de joelhos diante do primeiro que por amor diga: teu medo.
Temos organizado associações de pavor sorridente, onde se serve a bebida com soda.
Temos procurado salvar-nos, mas sem usar a palavra salvação para não nos envergonharmos de ser inocentes.
Não temos usado a palavra amor para não termos de reconhecer sua contextura de amor e de ódio.
Temos mantido em segredo a nossa morte.
Temos feito arte por não sabermos como é a outra coisa.
Temos disfarçado com amor nossa indiferença, disfarçado nossa indiferença com a angústia, disfarçando com o pequeno medo o grande medo maior.
Não temos adorado, por termos a sensata mesquinhez de nos lembrarmos a tempo dos falsos deuses.
Não temos sido ingênuos para não rirmos de nós mesmos e para que no fim do dia possamos dizer “pelo menos não fui tolo”, e assim não chorarmos antes de apagar a luz.
Temos tido a certeza de que eu também e vocês todos também, e por isso todos sem saber se amam.
Temos sorrido em público do que não sorrimos quando ficamos sozinhos.
Temos chamado de fraqueza a nossa candura.
Temo-nos temido um ao outro, acima de tudo.

E a tudo isso temos considerado a vitória nossa de cada dia...

Entendendo o texto

 01. O que a crônica "Vitória Nossa" de Clarice Lispector destaca como algo que consideramos vitória em nosso cotidiano?

A crônica destaca que consideramos vitória o que temos feito de nós mesmos, especialmente a capacidade de não sermos tolos, acumular seguranças, evitar ser ingênuos e não nos entregarmos completamente.

02. Segundo a crônica, qual é a razão pela qual evitamos cair de joelhos diante do primeiro que, por amor, nos diz "teu medo"?

Evitamos cair de joelhos diante do primeiro que por amor nos diz "teu medo" por medo de nos entregarmos completamente, o que seria o começo de uma vida larga e talvez sem consolo.

03. Quais são algumas das coisas que temos feito para evitar reconhecer a verdadeira natureza de nossos sentimentos, como o amor e o ódio?

Temos evitado usar as palavras "amor" e "salvação" para não reconhecer a contextura de amor e ódio, além de disfarçar a indiferença com angústia e o medo maior com pequenos medos.

04. De acordo com a crônica, por que construímos catedrais, mas ficamos do lado de fora temendo que se tornem armadilhas?

Construímos catedrais, mas ficamos do lado de fora porque tememos que as catedrais que nós mesmos construímos se tornem armadilhas, representando o receio de nos entregarmos completamente.

05. Como a crônica aborda a relação entre a arte e a falta de conhecimento sobre "a outra coisa"?

A crônica destaca que temos feito arte porque não sabemos como é "a outra coisa", sugerindo que a criação artística é uma forma de lidar com a incerteza sobre aspectos desconhecidos da vida.

06. Qual é a atitude destacada na crônica em relação à morte, e por que isso é mencionado como algo que temos mantido em segredo?

A crônica destaca que temos mantido em segredo a nossa morte, indicando uma relutância em encarar ou reconhecer a inevitabilidade da morte, possivelmente como uma forma de evitar confrontar a própria vulnerabilidade.

07. Como a crônica aborda a ideia de reconhecer a inocência, especialmente em relação ao uso da palavra "salvação"?

A crônica menciona que evitamos usar a palavra "salvação" para não nos envergonharmos de ser inocentes, sugerindo uma relutância em aceitar ou reconhecer a simplicidade e pureza, preferindo manter uma postura mais mesquinha e sensata.




sexta-feira, 26 de janeiro de 2024

CRÔNICA: A VIDA NO MATO - WALCYR CARRASCO - COM GABARITO

 Crônica: A Vida no Mato

                Walcyr Carrasco

REALIZEI UM SONHO! Tenho uma casa de campo. É cercada de árvores enormes, restos de uma floresta! Uma delícia, é o que diz quem me visita.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj7S0LbxpI-4ZLqp1ojQa4QOssHhmgFzlo18N89TfIAhuDqY5NaOcBG6FMw4CR0ZtuObTMldkqNauv41pdhk5JuJWWJs9D-nTZ4igs-y9jx3TkZoTqMgxDT9RD2G1QbUkFo6_FzkidIkBOt_j8INf2N9_yO4efpcCsXFDryAsnRnSkr-78rASjoIGiLPhg/s320/CAMPO.png


Bem... às vezes! Mal comprei, ordenei ao recém-contratado caseiro.          

— Erga aquele pedaço da cerca e jogue aquele monte de madeira velha.

Depois, desocupe as caixas da mudança.

— Sim, senhor.

Voltei no fim de semana. A cerca igual, as caixas fechadas e a madeira apodrecendo. Suspirei. Três semanas depois, uma camada de poeira se depositava sobre as caixas. Cogumelos cresciam na madeira, e a cerca caiu de vez. Formigas passeavam no sofá. Rugi. Surpreendeu-se.

— Mas o senhor não disse que tinha pressa.

Partiu bravíssimo! Veio um novo. Rapaz jovem, paranaense. Um dia cheguei, ele não estava. Liguei para uma conhecida.

— Ah, falei com ele. Saiu para cortar o cabelo.

Reapareceu três dias depois, surpreso com meu nervosismo.

— E que aproveitei para comprar cigarros.

Deve haver algum tratado de psicologia que ensine a entender a mente dos caseiros. Mais alguns dias, ele me telefonou.

— Ganhei um galo e uma galinha!

Sorri. Imaginei minha futura granja. Eu, cercado por cestas de ovos brancos e pintinhos piando. Tudo começaria com o casal! Seria o Rei do Frango! Fui ver as duas preciosidades.

Estavam trancadas na lavanderia. Meu cachorro husky uivava do outro lado da porta. A máquina de lavar tinha virado poleiro! São assim os cães caçadores! Ficam pirados com o cheiro das penas.

De madrugada acordei com o interminável canto do galo. Adeus, Rei do Frango!

— Bote os dois na panela! — uivei.

Decepcionado, meu ex-futuro sócio, o caseiro, depenou galo e galinha.

Dois dias depois, apareceu com um vira-lata filhote.

         — Deixaram aqui em frente, em uma caixinha. Fiquei com dó.  

Eu queria ter a mesma capacidade de sedução de um cachorro! Bastou ele lamber minhas mãos, e me apaixonei. Botei no colo e assumi a paternidade! No dia seguinte, senti coceiras. Carrapatos! Chamei o veterinário, que examinou o cãozinho inocente. Tinha tudo que se pode imaginar.

— Vou botar um remédio, e ele vai ficar livre de pulgas e carrapatos!

— Seu veterinário, o senhor não pode me tratar também?

Rejeitado, dedetizei a casa de campo e o apartamento.

— Agora estou livre?

— Carrapatos ficam na grama — explicou o dono da dedetizadora, depois de receber o pagamento.

Passei semanas indo ao campo, mas andando de botas, meias e calças compridas. Belo jeito de aproveitar o verão! Mas, enfim... a paz!

Paz? Acordei com os ganidos lancinantes do husky. Havia atacado um porco-espinho. Nunca tinha, visto esses espinhos de perto. Que farpas! Nem se via o focinho do cachorro, pois parecia uma almofada de alfinetes! Prendi a boca do bicho, segurei a lanterna e o caseiro foi retirando espinho por espinho com um alicate enquanto o herói da noite tentava escapar e nos morder!       .

A luz já acabou por conta das chuvas, o transformador da rua estourou e arrasou com vários aparelhos, o telefone ficou com chiado, o cabo da parabólica arrebentou, a bomba do poço fundiu, o motor da piscina deu problema, e a água parada quase criou dengue... enfim, tudo rotina! A cada item, o fornecedor da hora me consola:

— Pelo menos agora está tudo novo. Nunca mais vai dar problema!

Finalmente, tudo arrumado! De preocupação, só a mania do husky de nadar na piscina e deixar flocos de pêlo boiando. Sento-me para ouvir as cigarras ao entardecer. Começa uma ensurdecedora música caipira.

E o caseiro do vizinho. Aproveita para botar o rádio no último volume quando os patrões estão fora! Respiro fundo! E digo:

— Ah, como é bom estar no mato!

Dá para acreditar?

Entendendo o texto

01. Qual é o tema central abordado na crônica "A Vida no Mato" de Walcyr Carrasco?

a) A vida no campo.
b) As dificuldades com caseiros.
c) As aventuras de ter uma casa de campo.
d) Os animais de estimação do autor.

02. Quem é o narrador da crônica "A Vida no Mato"?

a) Um observador externo.
b) O caseiro do autor.
c) O autor, Walcyr Carrasco.
d) Um visitante da casa de campo.

03. Qual é a função social do caseiro na crônica?

a) Cuidar dos animais.
b) Manter a casa de campo em ordem.
c) Ser sócio do autor.
d) Plantar na horta.

04. O que o caseiro faz com o galo e a galinha que ganha?

a) Coloca na granja.
b) Vende para o autor.
c) Os depena para o autor.
d) Oferece como presente.

05. O que acontece com o cachorro filhote que o caseiro encontra?

a) É adotado pelo autor.
b) É devolvido ao dono.
c) Fica na rua.
d) É doado para o veterinário.

06. Por que o autor decide dedetizar a casa de campo?

a) Por causa das formigas.
b) Por causa dos carrapatos.
c) Por causa das abelhas.
d) Por causa dos mosquitos.

07. O que o veterinário diz sobre os problemas do cachorro filhote?

a) Está saudável.
b) Precisa de cirurgia.
c) Tem pulgas e carrapatos.
d) Está comendo demais.

08. Qual é a rotina de problemas enfrentada pelo autor na casa de campo?

a) Falta de água.
b) Chuvas intensas.
c) Danos em aparelhos.
d) Todas as opções acima.

09. O que o fornecedor da hora consola o autor?

a) Pela falta de luz.
b) Pelos problemas com o cachorro.
c) Pelos danos nos aparelhos.
d) Pela necessidade de dedetização.

10. Como o autor conclui a crônica "A Vida no Mato"?

a) Agradecendo ao caseiro.
b) Expressando seu amor pela vida no campo.
c) Lamentando as cigarras e o rádio do caseiro.
d) Celebrando a tranquilidade do ambiente.

 

 

 

CRÔNICA: MÁS INTENÇÕES - WALCYR CARRASCO - COM GABARITO

 Crônica: Más Intenções

                Walcyr Carrasco

ENTRA ANO, SAI ANO, é sempre a mesma coisa. Começo a delirar com as boas intenções para 1996. Não adianta refletir que se trata de uma data simbólica e que a vida não vira de cabeça para baixo de uma noite para outra. A passagem do ano mexe com a gente. Vejo meus amigos em torno, repletos de resoluções. Lembro do ano passado e tento me acalmar. Um deles me garantiu, na noite do 31, que até o final do ano (este que termina) faria seu primeiro milhão de dólares vendendo ações. Quando o ouvi, fiquei com os neurônios verdes de inveja e pensei: "Por que nunca aprendi a vender ações para também ganhar meu milhãozinho?".

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEirY9_4sJMZ4tqc-XDqHyr4DTdGBFKF_j_yNxuv6fBwIoJPx_s6Vpltr-qOujw80XGuUopMOv-No6CbJPOLNLVYyVbgN0ETseARKSfencC7cxHthCvHfql2BFGU_gVwHX3-A79vCbz2jksTuOWnt3LcNuB2KlTPcrwnxooqsFE88xyYVDTNsNh4qUdGwvQ/s1600/ANO%20NOVO.jpg


Meu amigo está, realmente, próximo dessa quantia. Em saldo negativo no banco. Não passou para a frente uma ação sequer e economiza até nas bitucas de cigarro. Outra amiga, atriz iniciante, falava comigo animada, em fevereiro:

— Li meu mapa astral. Este será o meu ano. Vou ter grande projeção na tevê. Tenho a intuição de que vou virar estrela de novela.

De fato, apareceu na tevê. Como vítima de um assalto, chorando histérica e dando declarações aos gritos. Ganhou, é verdade, seus cinco segundos de fama. Tem crises de nervos cada vez que ouve falar em mapa astral. Há pessoas mais modestas. O sonho de uma amiga é tão simples quanto irrealizável: emagrecer. Já a encontrei, neste final de ano, com um copo de cerveja na mão e um prato repleto de lombo de porco com molho de ameixa. Espantei-me:

— Na semana passada você estava de regime estrito!

— E só desta vez. O ano está acabando mesmo. Fica para o próximo.

Aguarde!

Aguardo, sim! Aguardo o dia em que, em vez de andar, ela vai sair rolando. (Regimes quebrados nas festas são um capítulo à parte. As pessoas nunca se enganam tanto como nesta época.) O aspecto mais trágico dessas resoluções é a despedida. A pessoa resolve deixar de fumar a partir de janeiro e manda ver em dez maços cotidianos até o réveillon, para dar o adeus definitivo. Fica à beira de um ataque e volta a fumar no dia 2. Outra promete nunca mais usar o cheque especial, a partir do Ano-Novo. Corre aos shoppings e torra o que pode, com um fantástico sentimento de autoconfiança. Afinal, aquela fase da vida está terminando e nunca mais ela gastará tanto. Quase é presa por calote. E, logo depois do réveillon, lembra-se de que esquecera de comprar só mais uma coisinha.

Certo ano despenquei numa loja prestes a fechar, batalhei com o gerente e consegui levar um despertador digital. Tudo porque estava decidido a acordar às 6 da manhã para correr no Ibirapuera. Era importante iniciar o ano com o pé direito. Ou melhor, com o relógio certo, começando a correr na exata manha do dia l.. Já me vi atlético e bronzeado, veloz como um puro-sangue, vencendo a próxima São Silvestre. Saí do réveillon de madrugada, preocupado, com a camisa branca marcada de vinho. Senti que não estava na melhor forma para cumprir a resolução. Recorri a um estratagema. Adiantei o relógio quatro horas: "Quando ele tocar, pensarei que são 10. Na verdade, serão 6. Levanto e saio correndo sem tomar café, para não atrasar".

Despertei com o barulho horrendo. Vi que eram 10, mas lembrei que talvez fossem 6. Fiquei em dúvida. Desliguei o relógio com um argumento: "Se já são 10, significa que não cumpri a promessa. Sou um crápula comigo mesmo. Assim nunca serei atlético". Suspirei, virei para o lado e ronquei docemente.

Um fato é inegável: resoluções de Ano-Novo são mais frustrantes do que panetone sem passas. Desta vez, tirei a máscara.

Decidi não virar o ano garantindo que serei tão afável quanto um poodle. Confesso: meu coração pulsa repleto de deliciosas más intenções para 1996. É que as boas intenções de Ano-Novo só servem para provar uma coisa: que ninguém é de ferro. Felizmente. Se todo mundo cumprisse as promessas torturantes desta época, o planeta seria tão chato quanto um réveillon com menu dietético. 

 Entendendo o texto

01.Qual é o tema central abordado na crônica "Más Intenções" de Walcyr Carrasco?

     a) As boas intenções de Ano-Novo.
     b) As resoluções frustrantes.
     c) A importância do réveillon.
     d) O hábito de fumar.

02. Quem narra a crônica "Más Intenções"?

     a) Um observador externo.
     b) O autor, Walcyr Carrasco.
     c) Um personagem fictício.
     d) Um amigo do autor.

03. O que o autor destaca como o aspecto mais trágico das resoluções de Ano-Novo?

     a) A despedida.
     b) A volta ao cheque especial.
     c) A quebra dos regimes nas festas.
     d) A promessa de deixar de fumar.

04. Qual é a resolução da amiga atriz mencionada na crônica?

     a) Deixar de fumar.
     b) Emagrecer.
     c) Aprender a vender ações.
     d) Não usar mais o cheque especial.

05. Como o autor descreve a reação das pessoas em relação aos regimes quebrados nas festas?

     a) As pessoas se enganam mais nesta época.
     b) É um capítulo à parte das festividades.
     c) Todos conseguem manter o regime.
     d) As festas não afetam os regimes.

06. Qual foi a estratégia adotada pelo autor para cumprir a resolução de correr no Ibirapuera?

     a) Comprar um despertador digital.
     b) Adiantar o relógio quatro horas.
     c) Correr sem tomar café.
     d) Deixar de beber vinho no réveillon.

07. O que aconteceu quando o autor despertou na manhã do dia 1º?

      a) Ele correu no Ibirapuera.
      b) Admitiu que não cumpriu a promessa.
      c) Sentiu-se atlético e bronzeado.
      d) Tomou um café reforçado.

08. Como o autor descreve as resoluções de Ano-Novo em relação ao réveillon com menu dietético?

      a) Frustrantes.
      b) Divertidas.
      c) Motivacionais.
      d) Sem graça.

09. O que o autor confessa sobre suas intenções para o próximo ano?

      a) Ter boas intenções.
      b) Cumprir suas promessas.
      c) Ter más intenções.
      d) Mudar radicalmente de estilo de vida.

10. Como o autor caracteriza o planeta se todo mundo cumprisse as promessas de Ano-Novo?

      a) Chato como um réveillon com menu dietético.
      b) Animado como uma festa de carnaval.
      c) Feliz como uma tarde de domingo.
      d) Interessante como uma viagem ao exterior.

 

 

CRÔNICA: CHORO, VELA E CACHAÇA - STANISLAW PONTE PRETA - COM GABARITO

 Crônica: Choro, vela e cachaça

                 Stanislaw Ponte Preta

Enterro de pobre tem sempre cachaça. É para ajudar a velar pelo falecido.

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhazPF6v-ItjZ4X2m-ySW7T5QTofMt5OMQRoB1-szP2dpMwb8D0jzhB6yCOejeHTsBLDWpCXLwl-14jZGvlaYIi07s_jWvSPd87vLsguMXaCWQ9x3npjCpWrniejxaiOs8atUig-Bnm_nNNbKF11ald7EsoxYbmo6jdlxlfAhtFV69BM9JgC3offq_rUFE/s320/CACHA%C3%87A.jpg



Sabem como é; pobre só tem amigo pobre e, portanto, é preciso haver um incentivo qualquer para a turma subnutrida poder aguentar a noite inteira com o ar compungido que o extinto merece.

Enfim, a cachacinha é inevitável, seja numa favela carioca, seja num bairro pobre da cidade do interior.

Agora mesmo, em Minas, me contaram, morreu um tio de um tal de Belarmino. Houve velório com a melhor cachaça daquelas bandas, uma chamada "Suor de Virgem". Quando um desgraçado que não tinha sido convidado pro velório do tio de Belarmino soube que fora servida a cachaça "Suor de Virgem" saiu em procura do sobrinho do extinto e, ao encontrá-lo, lascou a ameaça:

— Belarmino, eu soube que tinha "Suor de Virgem" no velório de seu tio e você não me convidou. Mas num há de ser nada. Faço fé em Deus que inda morra alguém na minha família, que é pra eu gastar um desperdício de "Suor de Virgem" e num convidar safado nenhum da sua.

São fatos como os citados que provam a importância da cachaça nas exéquias de quem morre teso, embora — às vezes — a cachaça, ao invés de ajudar, atrapalhe.

Foi o que aconteceu agora em Ubá (MG), terra do grande Ari Barroso. Morreu lá um tal de Sô Nicolino, numa indigência que eu vou te contar. Segundo o telegrama vindo de Ubá, alguns amigos de Sô Nicolino compraram um caixão e algumas garrafas de cangibrina, levando tudo para o velório.

Passaram a noite velando o morto e entornando a cachaça. De manhã, na hora do enterro, fecharam o caixão e foram para o cemitério, num cortejo meio ziguezagueado e num compasso mais de rancho que de féretro. Mas — bem ou mal — lá chegaram, lá abriram a cova e lá enterraram o caixão.

Depois voltaram até a casa do morto, na esperança de ter sobrado alguma cachacinha no fundo da garrafa. Levaram, então, a maior espinafração da vizinha do pranteado Sô Nicolino.

É que os bêbados fecharam o caixão, foram lá enterrar, mas esqueceram o falecido em cima da mesa.

Entendendo o texto

01. Qual é o tema central abordado na crônica "Choro, vela e cachaça" de Stanislaw Ponte Preta? a) Tradições funerárias em comunidades pobres.
b) O hábito de consumir cachaça em velórios.
c) Enterros improvisados.
d) A importância da cachaça nas exéquias de pessoas pobres.

02. Quem é o narrador na crônica?

a)   Terceira pessoa.
b) Um amigo de Sô Nicolino.
c) Primeira pessoa.
d) Um observador externo.

03. O que justifica a presença de cachaça em enterros de pessoas pobres, segundo o texto?

a)   É uma tradição antiga.
b) Ajuda os amigos a aguentarem a noite de velório.
c) É uma oferta para os falecidos.
d) Todas as opções acima.

04. O que aconteceu no velório do tio de Belarmino em Minas Gerais?

a)   Houve uma briga por causa da herança.
b) Alguém não convidado reclamou por não ter sido servido com a cachaça "Suor de Virgem".
c) O caixão desapareceu misteriosamente.
d) Todos os convidados ficaram embriagados.

05. O que os amigos de Sô Nicolino esqueceram de fazer durante o enterro?

a) Fechar do caixão.

b) Levar o caixão até o cemitério.
c) Velar o morto.
d) Enterrar o caixão.

06. O que os amigos de Sô Nicolino foram fazer após o enterro? a) Voltaram para casa de Sô Nicolino.
b) Procuraram mais garrafas de cangibrina.
c) Foram celebrar em um bar.
d) Todos os convidados foram embora.

07. Qual foi a reação da vizinha de Sô Nicolino após o enterro?

a) Elogiou a organização do velório.
b) Agradeceu pela presença dos amigos.
c) Criticou os bêbados por esquecerem o falecido em cima da mesa.
d) Ofereceu mais cachaça.

    08. O que prova a importância da cachaça nas exéquias de quem morre teso, segundo o autor?

         a) A cachaça ajuda a preservar o corpo do falecido.
         b) Os amigos se reúnem apenas por causa da cachaça.
         c) A cachaça pode atrapalhar em alguns casos.
         d) Os enterros são mais animados com a presença da cachaça.

   09. Onde acontecem os velórios mencionados na crônica?

         a) Em grandes cidades.
         b) Em favelas cariocas.
         c) Em bairros nobres.
         d) Em comunidades rurais.

  10. Qual é a marca de subjetividade presente na crônica?

       a) A visão humorística e irônica do autor em relação aos hábitos funerários.
       b) A tristeza e melancolia expressas pelos personagens.
       c) A neutralidade do autor ao relatar os eventos.
       d) A crítica direta à tradição de consumir cachaça em velórios.

 

MÚSICA (ATIVIDADES): RESPOSTA AO TEMPO - ALDIR BLANC E CRISTÓVÃO BASTOS - COM GABARITO

 Música (Atividades): Resposta ao tempo

                                    Aldir Blanc e Cristóvão Bastos

Batidas na porta da frente

É o tempo
Eu bebo um pouquinho
Pra ter argumento

Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjhi8Lwd9-VmDeTv8-eJh63_8NgFtGPQIudXXdPEn9aB8LXEtgnHfijImRMsO7vrMOvNWf_W1To-4aeu19_CP00mF-crN5vf3nwBBu3RPjIusMZCblL7EfrpdDXSEg8c2nAQT-7Zuqk-TdZSHT9lcn9zj8IRD7vGVfMR19TH43bx6BTS-DZrjfwI4-ayL4/s320/aldir.jpg 


 

Mas fico sem jeito calado e ele ri
Ele zomba do quanto eu chorei
Porque sabe passar e eu não sei

Num dia azul de verão


Sinto o vento
Há folhas no meu coração
É o tempo

Recordo um amor que perdi, ele ri


Diz que somos iguais, se eu notei
Pois não sabe ficar
E eu também não sei

E gira em volta de mim


Sussurra que apaga os caminhos
Que amores terminam no escuro
Sozinhos

Respondo que ele aprisiona


Eu liberto
Que ele adormece as paixões
Eu desperto

E o tempo se rói com inveja de mim


Me vigia querendo aprender
Como eu morro de amor
Pra tentar reviver

No fundo é uma eterna criança


Que não soube amadurecer
Eu posso, ele não vai poder
Me esquecer

No fundo é uma eterna criança


Que não soube amadurecer
Eu posso, ele não vai poder
Me esquecer

Fonte: Musixmatch

Compositores: Aldir Blanc Mendes / Cristovao Da Silva Bastos Filho

Entendendo a canção

01. Qual é o tema principal abordado na música "Resposta ao tempo" de Aldir Blanc e Cristóvão Bastos?

a) O amor perdido.

b) A passagem do tempo.

c) As batidas na porta da frente.

d) A liberdade.

02. O que o eu poético da música menciona fazer para ter argumento quando o tempo bate à porta?

         a) Beber um pouquinho.

         b) Chorar.

         c) Sorrir.

         d) Ignorar o tempo.

03. Qual é a sensação do eu poético em relação ao tempo no verso "Sussurra que apaga os caminhos"?

         a) Alegria.

         b) Desprezo.

         c) Inveja.

         d) Medo.

04. O que o tempo faz em relação aos caminhos e amores, segundo a perspectiva do eu poético?

        a) Aprisiona.

        b) Liberta.

        c) Adormece.

        d) Revive.

05. Como o eu poético caracteriza o tempo em relação às paixões?

        a) Como algo libertador.

        b) Como algo adormecedor.

        c) Como algo invejoso.

        d) Como algo revigorante.

06. O que o tempo faz com os amores, de acordo com a visão do eu poético?

      a) Termina no escuro.

        b) Revive no escuro.

        c) Adormece no escuro.

        d) Inveja no escuro.

07. Qual é a metáfora utilizada para descrever o tempo no verso "E o tempo se rói com inveja de mim"?

       a) Uma criança.

       b) Uma porta.

       c) Uma folha.

       d) Um vento.

quarta-feira, 24 de janeiro de 2024

CRÔNICA: MEDO DA VELHICE - WALCYR CARRASCO - COM GABARITO

 Crônica: Medo da Velhice

                Walcyr Carrasco

 

HÁ POUCOS DIAS EU ESTAVA no aeroporto, prestes a pegar a ponte aérea. Carregava a maleta um tanto pesada, com livros, agendas, remédio para o colesterol e tudo aquilo que dá medo de despachar e perder. Andei até o avião. Meu ombro doía.  De repente me veio a sensação. 

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiCSiELtr-BOTaGTADw_SoMyb0GhaWlNRM9iGc5GzG8d1awpoCFoOAanW0EDL3biFLAaQB2yD7_TvWKN8sE2dDUMJHz_AFxJQG30ZfPxujKLYYX3Q5oQnEPnDdYqNbHxIyU7AqY7S8Sn65KWprAUJ4dJ0EaraNNWn1g48CfiOYifjM9xENIRIpZWCHrbRY/s320/AEROPORTO.jpg


— O que farei quando for idoso e não der conta de levar este peso?

Foi desconfortável. À medida que fico maduro, tomo consciência de que a cidade é feita para quem está no auge da saúde, com força total. Não gosto de chover no molhado, e cair em saudosismo romântico, dizendo que antes era bem melhor. Mas há uns trinta anos eu quebrei o braço direito e andei de tipoia um bom tempo. Nunca havia imaginado que as pessoas pudessem ser tão simpáticas e solidárias. Sempre havia alguém para me ajudar a subir no ônibus ou carregar meus livros escolares. Ofereciam-me o lugar para sentar. Uma colega copiava as anotações da universidade no meu caderno. Agora parece que esse tipo de solidariedade automática, desinteressada, anda em extinção. São frequentes as reportagens sobre as peruas que não param para idosos. Quando saiu a lei do passe livre, minha mãe e minhas tias se divertiam visitando-se mutuamente. Sentiam-se especiais, bem-cuidadas. Hoje me dói o coração quando passo em frente a um ponto de ônibus e vejo um grupo de velhas, muitas vezes no vento e no frio, esperando um tempo absurdo pelo transporte — como se fosse uma esmola. Pior: nem que queiram pagar conseguem. Muitos motoristas fogem diante dos cabelos brancos.

Se entro em uma loja vejo uma senhora idosa examinando um artigo em promoção, invariavelmente a vendedora está com ar impaciente. Prefere atender gente com vontade de comprar mais depressa. Pessoas idosas são muitas vezes solitárias. Gostam de conversar um pouco mais, de ter uma conversa amigável com o vendedor, com o garçom. Soube de uma senhora, de origem norte-americana, que ficou sozinha no mundo. Mudou-se para um hotel médio, no centro da cidade, para sentir-se mais segura e protegida. Eu costumava jantar no restaurante desse hotel. Invariavelmente ouvia queixas de que ela era chata, impaciente, que reclamava muito. Ninguém parecia entender que se tratava de uma mulher sem parentes, em um país estranho, provavelmente assustada. Necessitando, simplesmente, de um pouco de calor humano. Acabou se mudando, nunca soube para onde.

Conversando com um amigo dedicado a causas sociais, descobri que existem muitos voluntários para programas ligados à infância. Um número expressivamente menor para idosos. Como se pelo fato de já terem idade, não tivessem tanta importância assim. Mesmo nas famílias. As pessoas estão o tempo todo muito ocupadas. São poucas as com disposição para passar uma tarde ou uma noite batendo papo, preparando um jantarzinho melhor, trocando afeto. O velho é obrigado a entender que a vida do neto corre depressa, e que ele não tem paciência para seu ritmo mais lento, para suas recordações, para seu modo de ver o mundo. Talvez diferente, talvez conservador, mas nem por isso a troca de experiências seria menos válida.

Penso que nossos ancestrais sabiam lidar melhor com a velhice. Viviam em cidades menores, os vizinhos se conheciam, e um ajudava o outro. Sempre havia alguém para fazer uma sopa, para pedir ajuda em caso de doença. Na cidade grande, é sempre uma correria onde frequentemente se esquecem os valores humanos. É duro olhar para esse mundo e se perguntar:

                  O que será de mim, quando for velho?

Talvez, se todos se fizessem a mesma pergunta, as coisas poderiam melhorar a partir de agora.

Entendendo o texto

01. Qual é o tema central abordado na crônica "Medo da Velhice" de Walcyr Carrasco?

     a) Viagens de avião.
     b) Solidariedade na juventude.
     c) Desafios enfrentados por idosos na sociedade.
    d) A experiência de quebrar um braço.

02. Quem é o narrador na crônica?

      a) Terceira pessoa.
      b) Uma personagem idosa.
      c) Primeira pessoa.
      d) Um observador externo.

03. O que o narrador carregava consigo no aeroporto?

      a) Livros, agendas e remédio para o colesterol.
      b) Roupas e sapatos.
      c) Comida e bebida.
      d) Brinquedos e presentes.

04. Qual é a sensação desconfortável que o narrador sente no aeroporto?

      a) Medo de voar.
      b) Dor no ombro.
      c) Solidariedade.
      d) Nostalgia.

05. O que o narrador destaca como uma experiência de solidariedade automática no passado?

      a) Oferecimento de lugar no ônibus.
      b) Carregar livros escolares.
      c) Copiar anotações na universidade.
      d) Todas as opções acima.

06. Segundo o narrador, o que frequentemente acontece nos dias atuais em relação aos idosos nos pontos de ônibus?

      a) Recebem esmola.
      b) São ignorados pelos motoristas.
      c) Fogem dos cabelos brancos.
      d) Todas as opções acima.

07. O que o narrador percebe ao entrar em uma loja e ver uma senhora idosa examinando um artigo em promoção?

      a) A vendedora está impaciente.
      b) A vendedora está solícita.
      c) A vendedora está sorridente.
      d) A vendedora está desinteressada.

08. O que o narrador destaca como uma dificuldade enfrentada pelos idosos em relação à solidariedade na sociedade?

     a) Falta de voluntários para programas ligados ao idoso.
     b) Falta de disposição das pessoas em passar tempo com idosos.
     c) Apresso das pessoas em relação à vida do neto.
     d) Todas as opções acima.

09. Segundo o narrador, como era a convivência com a velhice em cidades menores no passado?

      a) As pessoas se conheciam e ajudavam umas às outras.
      b) Sempre havia alguém para fazer uma sopa ou ajudar em caso de doença.
      c) Os vizinhos eram mais solidários.
      d) Todas as opções acima.

10. Qual é a reflexão final do narrador em relação à velhice e à sociedade atual?

       a) Todos deveriam se fazer a mesma pergunta para melhorar as coisas.
       b) O narrador não se preocupa com o futuro.
       c) A sociedade moderna é mais solidária com os idosos.
       d) A velhice era melhor no passado.

CRÔNICA: POR ÁGUA ABAIXO... WALCYR CARRASCO - COM GABARITO

 Crônica: Por Água Abaixo...

                Walcyr Carrasco

HÁ ALGUNS MESES eu corria na esteira quando aconteceu uma coisa surpreendente. Um amigo observou o marcador do ritmo cardíaco e comentou.

— O seu ritmo está diminuindo, em vez de aumentar! Devia ser o

contrário! . 

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Respondi, já me sentindo um superesportista:

— Sou um alienígena.

-—Só se guardar a nave na barriga!

Cautelosamente, abaixei os olhos para minha cintura roliça. Pela milésima vez, fiz o voto:

Vou emagrecer!

Bem, o fim de ano se aproximava. Transformei a decisão na minha principal promessa, além das usuais: ser bom, me apaixonar e escrever um grande livro. Entretanto, há uma grande contradição entre as promessas de Ano-Novo e o advento do próprio. Falando claramente: quem faz regime na ceia de Natal, por exemplo?

Fui para a casa de meu irmão, em Campinas. Quando nos encontramos, notei que o próprio estava com uns quilinhos a mais do que da última vez. Mau sinal. Eu estava decidido a me comportar frugalmente. Foi só deixar a valise no quarto de hóspedes para minha cunhada anunciar.

— A fogazza está pronta!

Deliciosa fogazza, feita em casa. Meu irmão acendia o forno a lenha. Abandonamos seu filho embaixo da árvore de Natal e corremos para a mesa. Eram sete horas. Só saímos à meia-noite, depois de devorarmos a. fogazza, um vidro de conserva de pimentões, quatro pratos de gaspacho cada um (para quem não conhece, uma sopa fria de tomate, espanhola), três de risoto de escarola e umas oitenta fatias de pernil de cordeiro assado, completados por pratos de frutas secas, uma torta de maçã, um bolo de pistache e outro de damasco. O pobre garoto tentou nos interromper algumas vezes para mostrar os presentes e falar sobre Papai Noel.

Nós o calávamos enfiando pedaços de pão em sua boca.

         Voltei no dia seguinte, com. o coração sereno.         

— Foi uma exceção... porque a partir do Ano-Novo tudo vai mudar!

Na estrada, parei para comprar três quilos de linguiça, três salames e dois queijos. Evitei o doce de leite, que engorda muito.

Bem, o fato é que não podia deixar as compras estragarem. Passei os dias seguintes chafurdando em linguiça frita, fazendo sanduichinhos rápidos de salame etc. Quando a noite de ano se aproximou; prometi:

— Agora começo o regime!

Mas existe um menu das boas-entradas. Itens essenciais no cardápio, sem o qual o ano pode se tornar um desastre. Lentilha, por exemplo. Fica deliciosa quando preparada com pedaços de carne de porco. Doces são essenciais, para que o ano seja ameno. Uvas. Champanhe, e quanto mais taças, melhor! Ou seja. Já estava quebrando a promessa na própria virada do ano. Não durou um mísero segundo!

Há um fator psicológico importante nos dias que se seguem ao Ano-Novo. Muitas das compras estão lá, intatas. Panetones. Bolos. Doces. Bebidas. Também há quem nos presenteie com mais... panetones, bolos, doces... bebidas! Começar o ano desperdiçando, nem pensar!

Dediquei as últimas duas semanas a aproveitar! Sempre decidido a começar o regime no dia seguinte. Porque, afinal, promessa de Ano-Novo é sagrada! Além do mais, minha vaidade também conta. Havia prometido a mim mesmo estar esbelto para ir à praia. Realmente, há algo de irreconciliável entre fazer bonito no verão e se divertir nas festas!

Suspiro. O carnaval está aí. Carnaval sem cerveja não dá. Cerveja sem batata frita, não dá. Batata frita sem linguiça fritinha no prato para acompanhar... E para que começar agora, se é para quebrar daqui a pouco?

Adiei minha promessa de Ano-Novo para depois do carnaval. Dizem que o país só funciona depois da passagem das escolas de samba. Farei o mesmo com todas as minhas promessas. Incluindo o tal grande livro, que nem comecei a escrever. Depois de tal orgia gastronômica... só aguento dar um cochilo!

Enquanto isso, minha barriga... Se antes abrigava uma nave alienígena, agora é capaz de guardar um aeroporto inteiro! 

Entendendo o texto

01. Qual é o assunto central da crônica "Por Água Abaixo..." de Walcyr Carrasco?

a) Exercícios físicos.
b) Festas de fim de ano.
c) Promessas de Ano-Novo.
d) Dieta e regime.

02. Quem é o narrador na crônica?

        a) Primeira pessoa.
        b) Segunda pessoa.
        c) Terceira pessoa.
        d) Narrador onisciente.

03. Onde o narrador se encontrava quando seu amigo observou o marcador do ritmo cardíaco?

        a) No restaurante.
        b) Na esteira.
        c) Na academia.
        d) Na festa de Ano-Novo.

04. O que o narrador promete fazer no fim de ano, além de emagrecer?

       a) Ser bom.
       b) Se apaixonar.
       c) Escrever um grande livro.
       d) Todas as opções acima.

05. Onde o narrador passa o fim de ano na crônica?

      a) Em sua casa.
      b) Na casa do irmão em Campinas.
      c) Na praia.
      d) No restaurante.

06. Qual é o cardápio descrito na ceia de Natal na casa do irmão do narrador?

       a) Churrasco e quindins.
       b) Gaspacho, risoto de escarola, pernil de cordeiro, frutas secas e sobremesas diversas.
       c) Linguiça, salame, queijo e doce de leite.
       d) Lentilhas e champanhe.

07. O que o narrador decide fazer na virada do ano?

       a) Começar o regime.
       b) Quebrar a promessa.
       c) Fazer exercícios físicos.
       d) Abandonar as promessas.

08. O que o narrador destaca como essencial no menu das boas-entradas?

        a) Linguiça.
        b) Lentilhas.
        c) Doces e bebidas.
        d) Todas as opções acima.

09. O que o narrador decide adiar para depois do carnaval?

        a) Promessa de emagrecer.
        b) Começar o regime.
        c) Escrever um grande livro.
        d) Todas as promessas.

10. Como o narrador descreve o estado de sua barriga no final da crônica?

        a) Abriga uma nave alienígena.
        b) Capaz de guardar um aeroporto inteiro.
        c) Firme e tonificada.
        d) Magra e esbelta.