terça-feira, 9 de junho de 2020

CRÔNICA: NASCER NO CAIRO, SER FÊMEA DE CUPIM - RUBEM BRAGA - COM GABARITO

Crônica: Nascer no Cairo, ser fêmea de cupim

              Rubem Braga

   Conhece o vocábulo escardinchar? Qual o feminino de cupim? Qual o antônimo de póstumo? Como se chama o natural do Cairo?

    O leitor que responder “não sei” a todas estas perguntas não passará provavelmente em nenhuma prova de Português de nenhum concurso oficial. Aliás, se isso pode servir de algum consolo à sua ignorância, receberá um abraço de felicitações deste modesto cronista, seu semelhante e seu irmão.

        Porque a verdade é que eu também não sei. Você dirá, meu caro professor de Português, que eu não deveria confessar isso; que é uma vergonha para mim, que vivo de escrever, não conhecer o meu instrumento de trabalho, que é a língua.

        Concordo. Confesso que escrevo de palpite, como outras pessoas tocam piano de ouvido. De vez em quando um leitor culto se irrita comigo e me manda um recorte de crônica anotado, apontando erros de Português. Um deles chegou a me passar um telegrama, felicitando-me porque não encontrara, na minha crônica daquele dia, um só erro de Português; acrescentava que eu produzira uma “página de bom vernáculo, exemplar”. Tive vontade de responder: “Mera coincidência” — mas não o fiz para não entristecer o homem.

        Espero que uma velhice tranquila – no hospital ou na cadeia, com seus longos ócios — me permita um dia estudar com toda calma a nossa língua, e me penitenciar dos abusos que tenho praticado contra a sua pulcritude. (Sabem qual o superlativo de pulcro? Isto eu sei por acaso: pulquérrimo! Mas não é desanimador saber uma coisa dessas? Que me aconteceria se eu dissesse a uma bela dama: a senhora é pulquérrima? Eu poderia me queixar se o seu marido me descesse a mão?).

        Alguém já me escreveu também — que eu sou um escoteiro ao contrário. “Cada dia você parece que tem de praticar a sua má ação — contra a língua”. Mas acho que isso é exagero.

        Como também é exagero saber o que quer dizer escardinchar. Já estou mais perto dos cinquenta que dos quarenta; vivo de meu trabalho quase sempre honrado, gozo de boa saúde e estou até gordo demais, pensando em meter um regime no organismo — e nunca soube o que fosse escardinchar. Espero que nunca, na minha vida, tenha escardinchado ninguém; se o fiz, mereço desculpas, pois nunca tive essa intenção.

        Vários problemas e algumas mulheres já me tiraram o sono, mas não o feminino de cupim. Morrerei sem saber isso. E o pior é que não quero saber; nego-me terminantemente a saber, e, se o senhor é um desses cavalheiros que sabem qual é o feminino de cupim, tenha a bondade de não me cumprimentar.

        Por que exigir essas coisas dos candidatos aos nossos cargos públicos? Por que fazer do estudo da língua portuguesa unia série de alçapões e adivinhas, como essas histórias que uma pessoa conta para “pegar” as outras? O habitante do Cairo pode ser cairense, cairei, caireta, cairota ou cairiri — e a única utilidade de saber qual a palavra certa será para decifrar um problema de palavras cruzadas. Vocês não acham que nossos funcionários públicos já gastam uma parte excessiva do expediente matando palavras cruzadas da “Última Hora” ou lendo o horóscopo e as histórias em quadrinhos de “O Globo?”.

        No fundo o que esse tipo de gramático deseja é tornar a língua portuguesa odiosa; não alguma coisa através da qual as pessoas se entendam, ruas um instrumento de suplício e de opressão que ele, gramático, aplica sobre nós, os ignaros.

        Mas a mim é que não me escardincham assim, sem mais nem menos: não sou fêmea de cupim nem antônimo do póstumo nenhum; e sou cachoeirense, de Cachoeiro, honradamente — de Cachoeiro de Itapemirim!

                                Rio, novembro, 1951. Texto extraído do livro “Ai de Ti, Copacabana”, Editora do Autor – Rio de Janeiro, 1960, pág. 197.

Entendendo a crônica:

01 – Na crônica, o cronista defende uma ideia. Que ideia é essa?

      Que há certos conhecimentos da língua que não tem serventia e só servem para tornar a língua odiosa.

02 – Um traço característico da crônica lida é:

a)   Temática atual.

b)   Prosa poética.

c)   Estrofação regular.

d)   Método dialético.

e)   Exposição imparcial.


03 – O título do texto – “Nascer no Cairo, ser fêmea de cupim” – justifica-se pelo fato de:

a)   Pôr em relevo um conhecimento vital ao domínio da língua portuguesa no Brasil.

b)   Apontar fenômenos linguísticos aos quais o autor arroga grande importância.

c)   Destacar um conteúdo necessário a plena interação entre os falantes do português.

d)   Fazer referência a conhecimentos linguísticos que motivam as reflexões do autor.

e)   Exemplificar o uso que o autor faz do idioma em suas interações cotidianas.


04 – Há um momento do texto em que o autor dialoga com um leitor específico. Em que parágrafo isso ocorre?

a)   Primeiro.

b)   Terceiro.

c)   Quarto.

d)   Quinto.

e)   Oitavo.


05 – Segundo o autor, o que, provavelmente, acontecerá com o leitor que não souber responder às perguntas feitas no primeiro parágrafo?

a)   Atrairá a simpatia de outros leitores que também não sabem as respostas.

b)   Receberá felicitações dos professores de português.

c)   Perceberá a efemeridade de uma página do bom vernáculo.

d)   Gastará muito tempo decifrando palavras.

e)   Não passará em nenhuma prova de concurso.


06 – Que ideia o cronista defende?

a)   É essencial o conhecimento enciclopédico da língua.

b)   O gramático torna acessível a língua portuguesa.

c)   A profissão de cronista exige conhecimento linguístico.

d)   Há certos conhecimentos da língua que não têm serventia.

e)   A língua portuguesa se alimenta da opressão dos gramáticos.


07 – O que o autor confessa no quarto parágrafo?

      Confessa não conhecer a gramática normativa que é um “conjunto de regras que devem ser seguidas” e que provoca, segundo ele, críticas de leitores cultos através de telegramas, muitos até mandam recortes da crônica escrita por ele, apontando erros de português.

08 – O autor faz algumas críticas. Cite-as.

      Faz crítica a respeito dos funcionários públicos, e o pior é que generaliza, ou seja, inclui professores e outros trabalhadores que cumprem seu papel frente à sociedade.

      Critica também os gramáticos por tornarem a Língua Portuguesa odiosa.

 

 

 


CONTO: FLOR, TELEFONE, MOÇA - CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE - COM GABARITO

Conto: Flor, telefone, moça

           Carlos Drummond de Andrade

     Não, não é conto. Sou apenas um sujeito que escuta algumas vezes, que outras não escuta, e vai passando. Naquele dia escutei, certamente porque era a amiga quem falava, e é doce ouvir os amigos, ainda quando não falem, porque amigo tem o dom de se fazer compreender até sem sinais. Até sem olhos.

        Falava-se de cemitérios? De telefones? Não me lembro. De qualquer modo, a amiga – bom, agora me recordo que a conversa era sobre flores – ficou subitamente grave, sua voz murchou um pouquinho.

        – Sei de um caso de flor que é tão triste!

        E sorrindo:

        – Mas você não vai acreditar, juro.

        Quem sabe? Tudo depende da pessoa que conta, como do jeito de contar. Há dias em que não depende nem disso: estamos possuídos de universal credulidade. E daí, argumento máximo, a amiga asseverou que a história era verdadeira.

        – Era uma moça que morava na rua General Polidoro, começou ela. Perto do cemitério São João Batista. Você sabe, quem mora por ali, queira ou não queira, tem de tomar conhecimento da morte. Toda hora está passando enterro, e a gente acaba por se interessar. Não é tão empolgante como navios ou casamentos, ou carruagem de rei, mas sempre merece ser olhado. A moça, naturalmente, gostava mais de ver passar enterro do que de não ver nada. E se fosse ficar triste diante de tanto corpo desfilando, havia de estar bem arranjada.

        Se o enterro era mesmo muito importante, desses de bispo ou de general, a moça costumava ficar no portão do cemitério, para dar uma espiada. Você já notou como coroa impressiona a gente? Demais. E há a curiosidade de ler o que está escrito nelas. Morto que dá pena é aquele que chega desacompanhado de flores – por disposição de família ou falta de recursos, tanto faz. As coroas não prestigiam apenas o defunto, mas até o embalam. Às vezes ela chegava a entrar no cemitério e a acompanhar o préstito até o lugar do sepultamento. Deve ter sido assim que adquiriu o costume de passear lá por dentro. Meu Deus, com tanto lugar para passear no Rio! E no caso da moça, quando estivesse mais amolada, bastava tomar um bonde em direção à praia, descer no Mourisco, debruçar-se na amurada. Tinha o mar à sua disposição, a cinco minutos de casa. O mar, as viagens, as ilhas de coral, tudo grátis. Mas por preguiça, pela curiosidade dos enterros, sei lá por quê, deu para andar em São João Batista, contemplando túmulo. Coitada!

        – No interior isso não é raro…

        – Mas a moça era de Botafogo.

        – Ela trabalhava?

        – Em casa. Não me interrompa. Você não vai me pedir a certidão de idade da moça, nem sua descrição física. Para o caso que estou contando, isso não interessa. O certo é que de tarde costumava passear – ou melhor, “deslizar” pelas ruinhas brancas do cemitério, mergulhada em cisma. Olhava uma inscrição, ou não olhava, descobria uma figura de anjinho, uma coluna partida, uma águia, comparava as covas ricas às covas pobres, fazia cálculos de idade dos defuntos, considerava retratos em medalhões – sim, há de ser isso que ela fazia por lá, pois que mais poderia fazer? Talvez mesmo subisse ao morro, onde está a parte nova do cemitério, e as covas mais modestas. E deve ter sido lá que, uma tarde, ela apanhou a flor.

        – Que flor?

        – Uma flor qualquer. Margarida, por exemplo. Ou cravo. Para mim foi margarida, mas é puro palpite, nunca apurei. Apanhou com esse gesto vago e maquinal que a gente tem diante de um pé de flor. Apanha, leva ao nariz – não tem cheiro, como inconscientemente já se esperava –, depois amassa a flor, joga para um canto. Não se pensa mais nisso.

        Se a moça jogou a margarida no chão do cemitério ou no chão da rua, quando voltou para casa, também ignoro. Ela mesma se esforçou mais tarde por esclarecer esse ponto, mas foi incapaz. O certo é que já tinha voltado, estava em casa bem quietinha havia poucos minutos, quando o telefone tocou, ela atendeu.

        – Alooô…

        – Quede a flor que você tirou de minha sepultura?

        A voz era longínqua, pausada, surda. Mas a moça riu. E, meio sem compreender:

        – O quê?

        Desligou. Voltou para o quarto, para as suas obrigações. Cinco minutos depois, o telefone chamava de novo.

        – Alô.

        – Quede a flor que você tirou de minha sepultura?

        Cinco minutos dão para a pessoa mais sem imaginação sustentar um trote. A moça riu de novo, mas preparada.

        – Está aqui comigo, vem buscar.

        No mesmo tom lento, severo, triste, a voz respondeu:

        – Quero a flor que você me furtou. Me dá minha florzinha.

        Era homem, era mulher? Tão distante, a voz fazia-se entender, mas não se identificava. A moça topou a conversa:

        – Vem buscar, estou te dizendo.

        – Você bem sabe que eu não posso buscar coisa nenhuma, minha filha. Quero minha flor, você tem obrigação de devolver.

        – Mas quem está falando aí?

        – Me dá minha flor, eu estou te suplicando.

        – Diga o nome, senão eu não dou.

        – Me dá minha flor, você não precisa dela e eu preciso. Quero minha flor, que nasceu na minha sepultura.

        O trote era estúpido, não variava, e a moça, enjoando logo, desligou. Naquele dia não houve mais nada.

        Mas no outro dia houve. À mesma hora o telefone tocou. A moça, inocente, foi atender.

        – Alô!

        – Quede a flor…

        Não ouviu mais. Jogou o fone no gancho, irritada. Mas que brincadeira é essa! Irritada, voltou à costura. Não demorou muito, a campainha tinia outra vez. E antes que a voz lamentosa recomeçasse:

        – Olhe, vire a chapa. Já está pau.

        – Você tem que dar conta de minha flor, retrucou a voz de queixa. Pra que foi mexer logo na minha cova? Você tem tudo no mundo, eu, pobre de mim, já acabei. Me faz muita falta aquela flor.

        – Esta é fraquinha. Não sabe de outra?

        E desligou. Mas, voltando ao quarto, já não ia só. Levava consigo a ideia daquela flor, ou antes, a ideia daquela pessoa idiota que a vira arrancar uma flor no cemitério, e agora a aborrecia pelo telefone. Quem poderia ser? Não se lembrava de ter visto nenhum conhecido, era distraída por natureza. Pela voz não seria fácil acertar. Certamente se tratava de voz disfarçada, mas tão bem que não se podia saber ao certo se de homem ou de mulher. Esquisito, uma voz fria. E vinha de longe, como de interurbano. Parecia vir de mais longe ainda… Você está vendo que a moça começou a ter medo.

        – E eu também.

        – Não seja bobo. O fato é que aquela noite ela custou a dormir. E daí por diante é que não dormiu mesmo nada. A perseguição telefônica não parava. Sempre à mesma hora, no mesmo tom. A voz não ameaçava, não crescia de volume: implorava. Parecia que o diabo da flor constituía para ela a coisa mais preciosa do mundo, e que seu sossego eterno – admitindo que se tratasse de pessoa morta – ficara dependendo da restituição de uma simples flor. Mas seria absurdo admitir tal coisa, e a moça, além do mais, não queria se amofinar. No quinto ou sexto dia, ouviu firme a cantilena da voz e depois passou-lhe uma bruta descompostura. Fosse amolar o boi. Deixasse de ser imbecil (palavra boa, porque convinha a ambos os sexos). E se a voz não se calasse, ela tomaria providências.

        A providência consistiu em avisar o irmão e depois o pai. (A intervenção da mãe não abalara a voz.) Pelo telefone, pai e irmão disseram as últimas à voz suplicante. Estavam convencidos de que se tratava de algum engraçado absolutamente sem graça, mas o curioso é que, quando se referiam a ele, diziam “a voz”.

        – A voz chamou hoje? indagava o pai, chegando da cidade.

        – Ora. É infalível, suspirava a mãe, desalentada.

        Descomposturas não adiantavam, pois, ao caso. Era preciso usar o cérebro. Indagar, apurar na vizinhança, vigiar os telefones públicos. Pai e filho dividiram entre si as tarefas. Passaram a frequentar as casas de comércio, os cafés mais próximos, as lojas de flores, os marmoristas. Se alguém entrava e pedia licença para usar o telefone, o ouvido do espião se afiava. Mas qual. Ninguém reclamava flor de jazigo. E restava a rede dos telefones particulares. Um em cada apartamento, dez, doze no mesmo edifício. Como descobrir?

        O rapaz começou a tocar para todos os telefones da rua General Polidoro, depois para todos os telefones das ruas transversais, depois para todos os telefones da linha dois-meia… Discava, ouvia o alô, conferia a voz – não era –, desligava. Trabalho inútil, pois a pessoa da voz devia estar ali por perto – o tempo de sair do cemitério e tocar para a moça – e bem escondida estava ela, que só se fazia ouvir quando queria, isto é, a uma certa hora da tarde. Essa questão de hora também inspirou à família algumas diligências. Mas infrutíferas.

        Claro que a moça deixou de atender telefone. Não falava mais nem para as amigas. Então a “voz”, que não deixava de pedir, se outra pessoa estava no aparelho, não dizia mais “você me dá minha flor”, mas “quero minha flor”, “quem furtou minha flor tem de restituir” etc. Diálogo com essas pessoas a “voz” não mantinha. Sua conversa era com a moça. E a “voz” não dava explicações.

        Isso durante quinze dias, um mês, acaba por desesperar um santo. A família não queria escândalos, mas teve de queixar-se à polícia. Ou a polícia estava muito ocupada em prender comunista, ou investigações telefônicas não eram sua especialidade – o fato é que não se apurou nada. Então, o pai correu à Companhia Telefônica. Foi recebido por um cavalheiro amabilíssimo, que coçou o queixo, aludiu a fatores de ordem técnica…

        – Mas é a tranquilidade de um lar que eu venho pedir ao senhor! É o sossego de minha filha, de minha casa. Serei obrigado a me privar de telefone?

        – Não faça isso, meu caro senhor. Seria uma loucura. Aí é que não se apurava mesmo nada. Hoje em dia é impossível viver sem telefone, rádio e refrigerador. Dou-lhe um conselho de amigo. Volte para sua casa, tranquilize a família e aguarde os acontecimentos. Vamos fazer o possível.

        Bem, você já está percebendo que não adiantou. A voz sempre mendigando a flor. A moça perdendo o apetite e a coragem. Andava pálida, sem ânimo para sair à rua ou para trabalhar. Quem disse que ela queria mais ver enterro passando. Sentia-se miserável, escravizada a uma voz, a uma flor, a um vago defunto que nem sequer conhecia. Porque – já disse que era distraída – nem mesmo se lembrava da cova de onde arrancara aquela maldita flor. Se ao menos soubesse…

        O irmão voltou do São João Batista dizendo que, do lado por onde a moça passeara aquela tarde, havia cinco sepulturas plantadas.

        A mãe não disse coisa alguma, desceu, entrou numa casa de flores da vizinhança, comprou cinco ramalhetes colossais, atravessou a rua como um jardim vivo e foi derramá-los votivamente, sobre os cinco carneiros. Voltou para casa e ficou à espera da hora insuportável. Seu coração lhe dizia que aquele gesto propiciatório havia de aplacar a mágoa do enterrado – se é que os mortos sofrem, e aos vivos é dado consolá-los, depois de os haver afligido.

        Mas a “voz” não se deixou consolar ou subornar. Nenhuma outra flor lhe convinha senão aquela, miúda, amarrotada, esquecida, que ficara rolando no pó e já não existia mais. As outras vinham de outra terra, não brotavam de seu estrume – isso não dizia a voz, era como se dissesse. E a mãe desistiu de novas oferendas, que já estavam no seu propósito. Flores, missas, que adiantava?

        O pai jogou a última cartada: espiritismo. Descobriu um médium fortíssimo, a quem expôs longamente o caso, e pediu-lhe que estabelecesse contato com a alma despojada de sua flor. Compareceu a inúmeras sessões, e grande era sua fé de emergência, mas os poderes sobrenaturais se recusaram a cooperar, ou eles mesmos eram impotentes, esses poderes, quando alguém quer alguma coisa de sua última fibra, e a voz continuou, surda, infeliz, metódica. Se era mesmo de vivo (como às vezes a família ainda conjeturava, embora se apegasse cada dia mais a uma explicação desanimadora, que era a falta de qualquer explicação lógica para aquilo), seria de alguém que houvesse perdido toda noção de misericórdia; e se era de morto, como julgar, como vencer os mortos? De qualquer modo, havia no apelo uma tristeza úmida, uma infelicidade tamanha que fazia esquecer o seu sentido cruel, e refletir: até a maldade pode ser triste. Não era possível compreender mais do que isso. Alguém pede continuamente uma certa flor, e essa flor não existe mais para lhe ser dada. Você não acha inteiramente sem esperança?

        – Mas, e a moça?

        – Carlos, eu preveni que meu caso de flor era muito triste. A moça morreu no fim de alguns meses, exausta. Mas sossegue, para tudo há esperança: a voz nunca mais pediu.

                 Carlos Drummond de Andrade. No livro “Contos de aprendiz”. São Paulo: Companhia das Letras, 2012.

Entendendo o conto:

01 – A respeito de que trata o texto?

      Trata-se da relação da vida e da morte.

02 – O texto enquadra-se no gênero conto. Justifique a afirmativa.

      Sim. Conto psicológico, onde as reflexões são mais importantes do que os fatos / as ações do personagem.

03 – Qual o conflito pelo qual passou a personagem?

      Uma moça viu uma flor amarela plantada numa sepultura no cemitério, apanhou a flor e, em seguida jogou-a fora. A partir desse fato, a moça começou a receber telefonemas perguntando onde estava a flor que tirou de minha sepultura.

04 – Qual a solução encontrada pela família para resolver o conflito?

      Ofereceram flores, missas, e o pai jogou a última cartada: espiritismo, mas nada resolveu.

05 – Que tipo de narrador o texto apresenta? Onisciente ou onipresente?

     O narrador é onisciente.

06 – O personagem diz que “Hoje em dia é impossível viver sem telefone, rádio e refrigerador”. Levando-se em consideração o fato de que o texto foi escrito em 1951, que objetos são imprescindíveis nos dias de hoje?

      Celular, internet, TV, etc.

07 – Identifique os elementos da narrativa no conto.

      -- É uma narrativa curta, escrita na 1ª pessoa do singular.

      -- É uma narrativa centrada no eu interior da personagem.

08 – Em que época foi escrito o texto? Levante hipóteses sobre a provável idade do narrador.

      O texto foi escrito no ano de 1951.

      O autor/narrador nasceu em 1902, portanto, ele tinha quarenta e nove anos.

09 – A que período literário pertence Carlos Drummond de Andrade? Que características do período literário podem ser observadas no conto?

      Pertence ao Modernismo.

      -- Renovação das formas de expressão literária.

      -- Linguagem coloquial.

10 – Que noção de tempo está expressa no texto? Presente, passado ou futuro? Retire passagens que possam comprovar.

      A noção de tempo é passado.

      “Era uma moça que morava na Rua General Polidoro, começou ela”.

11 – Qual é a tipologia predominante no conto?

a)   Narrativa.

b)   Argumentativa.

c)   Descritiva.

12 – Por que este conto é considerado um conto psicológico?

      Porque tem ambientes frios, escuros e vazios; cenas de violência, medo e sedução; situações de desequilíbrio, dor e angústia.

13 – Qual o desfecho (epílogo ou conclusão) da história?

      A moça morreu no fim de alguns meses, exausta, e a voz nunca mais pediu.


TEXTO: ESTÃO DELETANDO O PORTUGUÊS - HÉLIO TEIXEIRA - COM GABARITO


Texto: Estão deletando o português
           
Hélio Teixeira

 “Lenta e gradualmente o idioma nacional vai sendo devorado pela aversão à leitura”

        Um casal de nerds foi ao shopping, ficou em dúvida sobre o snack bar ou o fast food, e decidiu dar um look em um novo point para o happy hour. A frase anterior quer dizer que dois maluquinhos por computador foram a um centro comercial, não sabiam se tomavam uma cervejinha nos botecos disponíveis ou uma comidinha rápida, e resolveram cair fora rumo a um novo local para curtir o final de tarde. Pobre português.
        Janeiro é o mês. Junto como verão surge o vestibular e com ele a imprensa mostrando atrocidades cometidas nas redações, resultantes das dezenas de cursinhos que vendem o sonho da universidade. É a hora e a vez de exceção com dois “esses”. História com o “i” substituindo o “h”, idiota com “n” antes do “d”.  Preciosidades como “Fernando Enrike Cardozzo é o presidente do Brasil” ou “meu çonho é ser enjeiero”. A maioria da ilustrada “galera” que vem vindo aí atrás, a chamada juventude ou nova geração, trafega ao largo das mais elementares regras do bom português. Até porque não tem o saudável hábito da leitura. Paulo Francis morreu, mas deixou uma verdade: “Quem não lê, não pensa, vira servo”.
        Lenta e gradualmente o bravo idioma nacional vai sendo devorado pela aversão à leitura das queridas novas gerações, cujo vocabulário vai se resumindo a chavões da moda que, sem perceber, mutilam cérebros repletos de neurônios sequiosos de serem ativados. São especialistas em “Wing Commander”, “Rise of the Triad” ou adoram o “Gold Monkey”, este joguinho onde se dá o caminho das bananas aos macacos.
        Não se pense que este escriba tem saudades da Olivetti, aquela velha e querida senhora, companheira inseparável de um jornalista com mais de 30. Não, mas esta era da informática repleta de expressões está catapultando o vernáculo.
        A secretária não copia a carta. Ela printa um letter. O garotão diante do Windows95 não salva o arquivo, dá um save. Não se tem mais endereço, mas um e-mail. Qualquer hora dessas, a “gata” vai perguntar ao seu “gato”: “Qual o disco que você quer do meu drive, o A ou o B?” E ele responderá que seu disquete não está formatado para invadir o drive.
        Num panorama desses, defender o idioma pátrio está virando coisa de “animal”, de subdesenvolvido, à medida que a propaganda nas emissoras de rádio propõe um test-drive a compradores de automóveis do que simplesmente “dar uma voltinha no bólido pretendido”. José Wilker, no “Jornal do Brasil”, indagou porque MTV vira emi-ti-ví em vez de MTV, como se lê. Noutro dia, o Sandro Dalpíccolo fez uma belíssima matéria na Globo sobre as diferentes palavras utilizadas no sul, sudeste e nordeste do país e que traduzem a mesma coisa. A raia que é pipa ou papagaio, o piá curitibano que é guri, o menino, garoto em outros cantos, o semáforo que vira sinaleira ou sinal, o meio fio que é guia, e a singela tradução de um simpático senhor explicando aos telespectadores o que é vinawurst (salsicha de Viena no curitibês).
        Nem vinte por cento das palavras existentes no dicionário do Aurélio são de uso habitual. Portanto, botemos a calipígia de molho. Do contrário, além de engolir as telecomunicações, a energia, a mídia e, de quebra, a Vale do Rio Doce, o Big Brother vai acabar deletando a língua pátria.
Paraná & Cia, ano III, n.28, 26 mar. 1997.
                        Fonte: Livro – Encontro e Reencontro em Língua Portuguesa – 8ª Série – Marilda Prates – Ed. Moderna, 2005 – p. 21, 22, 24.
Entendendo o texto:

01 – Em seu texto, Hélio Teixeira afirma que estão deletando o português. Você sabe o que ele quis dizer e por que escolheu “deletando” para se expressar?
      Deletar: apagar, eliminar. Estão “acabando” com a Língua Portuguesa. Usou “deletando” justamente para exemplificar seu ponto de vista.

02 – É comum usarmos expressões em inglês, mesmo que existam palavras na nossa língua para dizer o que pretendemos. Isto é modismo, “gíria” importada ou o quê? Pense e comente.
      Resposta pessoal do aluno.

03 – Comente a frase: “A maioria da ilustrada ‘galera’ que vem vindo aí atrás, a chamada juventude ou nova geração, trafega ao largo das mais elementares regras do bom português”.
      Resposta pessoal do aluno.

04 – Comente a frase de Paulo Francis: “Quem não lê, não pensa, vira servo”.
      Resposta pessoal do aluno.

05 – “Do contrário, além de engolir as telecomunicações, a energia, a mídia e, de quebra, a Vale do Rio Doce, o Big Brother vai acabar deletando a língua pátria”. Big Brother, ou Grande Irmão, é personagem de 1984, uma obra de George Orwell. Nessa história, o Grande Irmão é um terrível ditador que governa o mundo após catástrofes políticas e sociais. Ele vigia constantemente pensamentos e ações e mantém o mundo sob um regime de terror e de miséria. No texto, Big Brother é uma referência às potências internacionais que, gradativamente, vão aumentando o seu poder econômico e cultural sobre países subdesenvolvidos como o Brasil. Considerando essas informações, responda: Por que o Big Brother vai acabar deletando a língua pátria?
      Porque, à medida que a influência econômica das potências internacionais vai aumentando, a cultura brasileira vai também sofrendo essa influência.



quinta-feira, 4 de junho de 2020

MÚSICA(ATIVIDADES): COISAS DO BRASIL - GUILHERME ARANTES - COM GABARITO


Música(Atividades): Coisas do Brasil

                                            Guilherme Arantes

Foi tão bom te conhecer, tão fácil te querer
Triste não te ver por tanto tempo
É bom te encontrar, quem sabe feliz
Com a mesma alegria
De no ... vo
Mais uma vez, amor
Te abraçar, de verdade
Há sempre um novo amor
E uma no ... va saudade

Coisas do Brasil, coisas do amor
Luzes da cidade acendendo o fogo das paixões
Num bar à beira-mar
No verde-azul do Rio
De Janei ... ro
Mais uma vez, amor
Te abraçar, de verdade
Há sempre um novo amor
E uma no ... va saudade

Coisas do Brasil, coisas do amor
Luzes da cidade acendendo
O fogo das paixões
Num bar à beira-mar
No verde-azul do Rio
De Janei ... ro

Coisas do Brasil, coisas do amor
Luzes da cidade acendendo o fogo das paixões
Num bar à beira-mar
No verde-azul do Rio.
                        Compositores: Guilherme Arantes e Nelson Motta.

Entendendo a canção:

01 – De que trata esta canção?
      O eu lírico fala da saudade de sua amada.

02 – Qual o cenário que a canção apresenta?
      Bar à beira-mar no Rio de Janeiro.

03 – Retire um par de rima da canção.
      Verdade / saudade.

04 – O título é sempre o primeiro a levantar expectativas quanto ao seu conteúdo. A partir dele fazemos uma série de suposições iniciais que depois podem ser modificadas ou confirmadas. Que emoções e ideias foram despertadas pela leitura da letra dessa canção?
      O eu lírico conta que foi bom ter conhecido a sua amada, sente saudade, mas o importante é que ela esteja feliz, ou seja, a vida que segue... “coisas do Brasil”, amores que vão e que vem.

05 – No verso: “Luzes da cidade acendendo / O fogo das paixões”, que figura de linguagem há?
      Personificação ou prosopopeia.

06 – Você acha que o eu lírico está amando ou apenas apaixonado?
      Resposta pessoal do aluno.


MÚSICA(ATIVIDADES): ELA É CARIOCA - TOM JOBIM - COM GABARITO

Música(Atividades): Ela É Carioca

                                                  Tom Jobim

Ela é carioca
Ela é carioca
Basta o jeitinho dela andar
Nem ninguém tem carinho assim para dar

Eu vejo na luz dos seus olhos (na cor dos seus olhos)
As noites do Rio ao luar
Vejo a mesma luz
Vejo o mesmo céu
Vejo o mesmo mar

Ela é meu amor, só me vê a mim
A mim que vivi para encontrar
Na luz do seu olhar
A paz que sonhei

Só sei que sou louco por ela
E pra mim ela é linda demais
E além do mais
Ela é carioca
Ela é carioca

Só sei que sou louco por ela
E pra mim ela é linda demais
E além do mais
Ela é carioca
Ela é carioca
                      Composição: Tom Jobim / Vinícius de Moraes.
Entendendo a canção:

01 – Segundo a letra da canção podemos afirmar que o eu lírico enaltece especificamente a beleza:
a)   Da luz do luar.
b)   Da paz que ele sonhou.
c)   Da mulher do Rio de Janeiro.
d)   Da mulher brasileira.

02 – O verso que indica o sentimento do eu lírico em relação a mulher amada é:
a)   “Ela é meu amor!”.
b)   “Só sei que sou louco por ela”.
c)   “Ela é carioca”.
d)   “Basta o jeitinho dela andar”.

03 – Que figura de linguagem há nos seguintes versos:
“Eu vejo na luz dos seus olhos (na cor dos seus olhos).
As noites do Rio ao luar
Vejo a mesma luz
Vejo o mesmo céu
Vejo o mesmo mar”.
      A figura de linguagem é anáfora.

04 – O eu lírico diz que vê o que nos olhos de sua amada?
      Ele vê as noites do Rio ao luar.

05 – Que estrofe da canção expressa mais claramente o entusiasmo e paixão do eu lírico pela pessoa amada?
      Na terceira estrofe.

06 – O eu lírico da canção é masculino ou feminino? Cite um verso da canção que justifique sua resposta.
      É masculino.
      “Só sei que sou louco por ela”.




POEMA: DESTINO DE PIPA - MÁRCIA BRAGA - COM GABARITO

Poema: Destino de Pipa
           
                                                  Márcia Braga

Voa pipa, tenta voar no céu
Tua cauda é frágil, é feita de papel.
O cerol é uma ameaça, um carrasco a te esperar
Num mergulho descuidado, como lâmina vai cortar...

Sem graça, sem cor, voa sem jeito
Dá de bico e balança num balé imperfeito.
Um golpe de vento pode te fazer desistir.
A linha é fina, vai arrebentar, tu vai cair...
E tu vais S U M I R ...

Entendendo o poema:

01 – A pipa tem nomes diferentes nas diversas regiões do Brasil. Escreva outro nome dado à pipa.
      Pandorga, papagaio, quadrado ou cafifa.

02 – Copie do poema o que se pede:
·        Três palavras que apresentam sílabas terminadas com L com som U.
Frágil, papel, cerol.

·        Duas palavras que apresentam sílabas terminadas em U.
Céu, tu.

03 – Sublinhe no texto palavras que apresentam sílabas terminadas em ai e ei.
      Feita, vai, jeito, imperfeito.

POEMA: AMIGOS DO PEITO - CLÁUDIO THEBAS - COM GABARITO

Poema: Amigos do Peito
        
       Cláudio Thebas    
                                                             
Todo dia eu volto da escola
Com a Ana Lúcia da esquina.
Da esquina não é sobrenome,
É endereço da menina.


O irmão dela é mais velho
E mesmo assim é meu amigo.
Sempre depois do almoço,
Ele joga bola comigo.

Já o Carlos Alberto, do lado,
(Do lado não é nome também)
Tem uma bicicleta legal,
Mas não empresta pra ninguém.

O bairro onde eu moro é assim,
Tem gente de tudo que é jeito.
Pessoas que são chatas,
E um monte de amigos do peito:

O Bruno do prédio da frente,
O Ricardo do sétimo andar,
O irmão da Lúcia da esquina,
O filho do dono do bar.

O nome completo deles
Eu nunca sei, ou esqueço.
Amigo não tem sobrenome:
Amigo tem endereço.
                                 Cláudio Thebas
Entendendo o poema:

01 – Qual é o título do texto?
      Amigos do Peito.

02 – Quem é o seu autor?
      Cláudio Thebas.

03 – Como é chamado um texto que vem organizado em versos e estrofes?
      Poema.

04 – Nesse texto tem quantos versos? E quantas estrofes?
      Tem vinte e quatro versos e seis estrofes.

05 – Como sabemos quando começa um novo verso?
      Quando começa no início de cada linha.

06 – O que separa uma estrofe da outra?
      As estrofes são separadas por uma linha em branco.

07 – O que significa a expressão “Amigos do Peito”?
      Amigos que gostamos muito, em quem confiamos.

08 – Quem são as personagens desse texto?
      Ana Lúcia, Carlos Alberto, Bruno, Ricardo e o irmão da Lúcia.

09 – Qual é o endereço de Ana Lúcia?
      Ela mora na esquina.

10 – Que tipos de pessoas moram no mesmo bairro do narrador desse texto?
      Lá tem gente de tudo que é jeito, pessoas chatas e um monte de amigos do peito.

11 – Esse texto está escrito em 1ª ou 3ª pessoa? Justifique com um trecho do texto.
      Está escrito em 1ª pessoa. “Todo dia eu volto da escola...”.

12 – Explique o que o autor quis dizer na última estrofe do poema.
      Que não importa o sobrenome, que amigo é aquele que convive com a gente, ou seja, amigo tem endereço.