Texto: São
Paulo, 2001
Madrugada, verão de janeiro, ano 2001.
Um carro sai do estacionamento no subsolo de um prédio e, enquanto espera o
sistema eletrônico acionar grades e portões, seu motorista olha para cima e vê
ainda alguns andares iluminados pela luz dos computadores. Na calçada, duas
pessoas estão remexendo o lixo à procura de latas, comida e papelão. O carro
acelera rapidamente, temendo a possível abordagem de um adolescente, cabelo pixaim
quase branco, que se aproxima.
Percorrendo as ruas estreitas do
bairro, o carro ´detido pela enorme fila de táxis e pelo movimento dos
manobristas na saída de uma cada noturna. As mulheres loiras com vestidos
brilhantes justíssimos e saltos agulha se misturam por um átimo aos homens e
mulheres vestidos de jeans e camisetas e carregando sacolas de plástico que
acabam de desembarcar do ônibus.
Finalmente o carro atingi a avenida.
Surpresa: congestionamento às seis e meia da manhã? No rádio, o repórter no
helicóptero avisa: caminhão tombado em tal lugar, árvores caídas e pontos de
alagamento que sobraram da tempestade do dia anterior; evitar rua tal, caminho
tal. Da janela do carro, observa homens e mulheres vestidos com roupas
esportivas, correndo ou caminhando rapidamente pelo canteiro central. Naquele
instante, parecem estar envoltos por sua utopia de saúde, longevidade e beleza,
uma espécie de redoma que os protege de perceber a paisagem onde estão.
São sete e meia da manhã quando o
motorista entra na estrada que o levará ao condomínio onde mora. Do outro lado
da pista, a fila de caminhões e carros entrando na cidade é imensa e os
vendedores de água, suco, eletrônicos e bonecos gigantes de plástico já
instalaram seu drive-in comercial.
Quilômetro 30 – o motorista para no
estacionamento de uma das megalojas do caminho e, atravessando corredores,
chega à padaria estilo country. Entre cestinhas decoradas com renda e flores do
campo, ele escolhe baguettes e croissants. E lembra-se por um segundo de sua
avó, nascida em casa de chão batido no meio do sertão do agreste, e da avó de
sua mulher, que nunca esqueceu o porão do navio que a arrancou, menina, da
aldeia à beira-mar do Japão.
Oito e meia, passa pela guarita, guarda
o carro no estacionamento de casa. Ao lado de seu lugar na mesa já posta, a
pilha de contas para pagar: luz, água, telefone, internet, celular, bip, escola
de inglês, academia, natação, prestação do carro, IPVA, seguro... Na TV, já
ligada pela empregada na cozinha, vê a mesa arrumada do café da manhã e a
família que acorda feliz por poder passar no pão aquela maravilhosa margarina.
Enquanto limpa o barro do sapato, a
empregada faz as contas de quanto vai precisar para comprar a laje para cobrir
o cômodo que acabou de levantar no Jardim Progresso. Fica ali perto, do outro
lado da pista e a apenas 15 minutos de caminhada até o ponto por onde passa o
perueiro.
São Paulo. São Paulo:
Publifolha, 2001. p. 72-74. (Folha explica).
Entendendo o texto:
01 – O texto de Raquel
Rolnik chama-se “São Paulo, 2001”. A partir de sua vivência pessoal e das
informações que tem pelos meios de comunicação, responda: os fatos mostrados no
texto ocorrem exclusivamente na cidade de São Paulo ou poderiam acontecer em qualquer
outra cidade? Justifique sua resposta.
Sim. Todas as
cidade grandes é possível encontrar cenas como as mostradas no texto.
02 – Observe como cada um
dos parágrafos da narrativa se inicia: sempre há palavras ou expressões
indicadoras de tempo (“madrugada”; “finalmente”; “são sete horas da manhã”;
“oito e meia”; “enquanto limpa o barro do sapato”) ou de lugar (“percorrendo as
ruas estreitas do bairro”; “quilômetro 30”). Na sua opinião, por que isso
ocorre?
Resposta pessoal
do aluno. Sugestão: Porque essas palavras ou expressões têm a função de situar
o leitor nos espaços em que ocorre a narrativa e na passagem de tempo, desde a
saída do homem do trabalho até sua chegada a sua casa.
03 – Observando-se as
personagens presentes na narrativa, notam-se modos de vida contrastantes.
Identifique para cada um dos itens apresentados a seguir outro que se oponha a
ele. Observe o exemplo: “Homem que
retorna para casa dirigindo o próprio carro se opõe a empregada que se locomove
para o trabalho transportada por um perueiro.”
a)
Pessoas procurando comida no lixo.
Pães especiais na padaria estilo country.
b)
Pessoas deixando a casa noturna ao amanhecer.
Trabalhadores descendo do ônibus a caminho do trabalho ao amanhecer.
c)
Vendedores ambulantes oferecendo seus produtos
nas estradas e avenidas.
Megalojas.
04 – Compare as contas que o
homem e sua empregada devem pagar. O que elas revelam a respeito do tipo de
vida que levam?
Revelam que,
enquanto o homem pode se dar ao luxo de usar seu dinheiro para academia, natação,
internet; a empregada tem de se preocupar em resolver problemas básicos, como o
de construção de sua moradia.
05 – Das cenas mostradas no
texto, há alguma(s) que jamais correria(m) onde você vive? Quais são elas?
Justifique sua resposta.
Resposta pessoal do aluno.
06 – Esse texto se passa na
cidade de São Paulo:
a)
Empregando dois adjetivos, de que forma você
pode caracterizar a vida na cidade de São Paulo,2001?
Resposta pessoal do aluno. Sugestão: Agitada, injusta, violenta,
desigual, moderna.
b)
Se pudesse escolher, você gostaria de ser
personagem na cidade de São Paulo, 2001?
Resposta pessoal do aluno.