Conto: Depressa
João Anzanello Carrascoza
Eu ia correndo à vida. Aos sete, a
gente é assim. Pula de um doce pra um brinquedo. De um brinquedo pra uma
tristeza. Tudo rápido, no demorado da infância. O pai chegava, Olha o que eu
trouxe pra você!, e abria a mão: um punhado de balas Chita! O mundo, então, era
aquele sabor em minha boca, eu concentrado em mastigar, querendo outra, e mais
outra, satisfeito de estar ali, fiel ao meu instante. [...]
Assim era um dia, o outro também: eu
despertava, me enfiava no uniforme e no menino que me cabia, o café da manhã
vinha a mim, eu e meu irmão indo pra escola, o caminho um sobe e desce que
andava em nós; na rua pensávamos no encontro com os amigos no portão; no portão
já íamos rascunhando o que aprenderíamos na sala de aula; na sala de aula já
recolhendo o tempo, como uma corda, pra trazer mais rápido o recreio – e nele
viver pequenas alegrias. [...]
Então, numa manhã, veio do Rio de
Janeiro a tia Imaculada e com ela a prima Teresa, que eu não conhecia. Chegamos
da escola, a tia na cozinha ajudava a mãe a fazer o almoço, Oi, oi, beijo em
mim, beijo em meu irmão, ele já indo guardar a mochila, eu ali, e lá no quintal
ela, Teresa, menina. Vi, feliz, a novidade, mas, em seguida, desvi.
la pegar a direção do quarto, quando a
tia disse, Vai falar com a sua prima, e a mãe, Deixa de ser bicho do mato, e aí
eu fui, meio resignado, meio à vontade. A Teresa estava lá, calada, à sombra da
mangueira. Tão calada que eu pensei, mesmo sem sermos íntimos, Ela tá triste.
Eu nem sabia ler a tristeza nas pessoas. Eu ainda errava no meu olhar. Mas aí
eu me acerquei, no máximo de meu quieto, como se dizendo, Oi, eu tô aqui. Ela
mirava o chão, sincera com as formigas. Ergueu a cabeça. Sorriu. Na minha
impaciência, eu ia correr com as palavras, oferecendo um assunto pra nós. Mas,
estranhamente, senti uma calmaria, quase de sono. Olhei bem pra ela. Pra ver
tudo, nos detalhes. A cor dos olhos, o nariz arrebitado, a boca bonita, os
dentes brancos clarinhos, tudo o que, pra mim, era o jeito dela. E, foi aí, de
repente, que eu perdi toda a pressa do mundo.
CARRASCOZA, João Anzanello.
Depressa. Em: Aos 7 e aos 40. Rio de Janeiro: Alfaguara, 2016. p. 7-10.
Entendendo o conto:
01 – Qual é a principal característica da infância
retratada no início do conto?
A principal
característica da infância retratada é a rapidez e a constante mudança de
interesses, pulando de uma atividade para outra, como de um doce para um
brinquedo.
02
– Como o narrador descreve a rotina matinal dele e de seu irmão?
O narrador descreve
a rotina matinal dele e de seu irmão como algo repetitivo: acordar, vestir o
uniforme, tomar café da manhã e ir para a escola, onde já pensam nos amigos e
nas atividades do dia.
03
– Quem são as novas personagens introduzidas na história e qual é a reação
inicial do narrador?
As novas
personagens introduzidas são a tia Imaculada e a prima Teresa. A reação inicial
do narrador à chegada de Teresa é de curiosidade seguida por um desvio,
indicando uma certa hesitação ou desconforto.
04
– Qual foi a reação da tia Imaculada e da mãe do narrador ao perceberem sua
hesitação em falar com Teresa?
A tia Imaculada e
a mãe do narrador encorajaram-no a falar com Teresa, com a tia dizendo para ele
ir falar com a prima e a mãe pedindo para ele deixar de ser "bicho do
mato".
05 –
Como o narrador descreve a prima Teresa quando ele finalmente se aproxima dela?
O narrador descreve Teresa
como uma menina calada, à sombra da mangueira, olhando para as formigas, com
uma expressão que ele interpretou como tristeza, embora ele não soubesse ao
certo como ler as emoções das pessoas.
06
– Qual mudança ocorre no narrador quando ele começa a observar Teresa de perto?
Quando o narrador
começa a observar Teresa de perto, ele sente uma calma inesperada, quase como
se estivesse sonolento, e perde toda a pressa que normalmente sentia.
07
– Qual é o significado do título "Depressa" no contexto do conto?
O título
"Depressa" reflete a rapidez com que o narrador vivia sua infância,
sempre apressado em suas atividades. No entanto, ao conhecer Teresa, ele
experimenta um momento de calma e desaceleração, contrastando com sua pressa
habitual.
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