Notícia: Adolescentes que engravidam sofrem maior risco de problemas físicos, psicológicos e sociais
Juliana
Conte
Publicado
em: 26 de março de 2019
Revisado
em: 11 de agosto de 2020
Taxa de filhos de mães adolescentes
no Brasil é maior que a média mundial. Adolescentes que engravidam têm alto
risco de uma série de danos, e as mulheres mais pobres são as mais atingidas.
Os índices de gravidez na adolescência
no Brasil servem para nos lembrar de que ainda temos muitas dificuldades a enfrentar
nessa área. Dados do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (Sinasc)
mostram que dos quase 3 milhões de nascidos em 2016, 480 mil eram filhos de
mães entre 15 e 19 anos, compondo uma taxa de 16% de todos os nascimentos.
Apesar de ter havido uma queda de aproximadamente 20% nesse número em dez anos,
ainda temos 68 bebês de mães adolescentes para cada mil meninas entre 15 e 19
anos, enquanto a taxa mundial é estimada em 46 para cada mil meninas dessa
faixa etária.
Explicar o motivo que levam a esse
cenário não é tão simples, mas os especialistas consultados para esta
reportagem foram unânimes em duas hipóteses: independentemente da classe
social, os adolescentes estão transando cada vez mais cedo. Ao mesmo tempo,
falta educação sexual.
A
preocupação com o uso de método contraceptivo sempre recai sobre a mulher, e
geralmente elas têm conhecimento sobre a importância de se prevenir. “A grande
maioria das gestantes adolescentes tem noção da necessidade de usar métodos
contraceptivos. Sabe que existe camisinha, pílula ou DIU. Mas entre saber e
usar, há um abismo”, afirma a dra. Fernanda Surita, ginecologista do Hospital
da Mulher de Campinas-SP. Os profissionais apontam, ainda, para um fenômeno
chamado “pensamento mágico”. O casal dificilmente acredita que a gravidez vá de
fato acontecer com eles. Muitos pensam que “é só uma vez, então não vai
acontecer nada”.
A ginecologista dra. Beatriz Barbosa
trabalha no Hospital Maternidade Vila Nova Cachoerinha, na zona norte de São
Paulo, desde 2003. Às quartas-feiras ela atende no ambulatório somente
gestantes, muitas delas adolescentes. A médica expressa seu desânimo com a
situação, dizendo que muitas vezes se sente como se “enxugasse gelo”. Apesar do
esforço que toda equipe faz para aconselhar as pacientes, principalmente no
pós-parto, ela conta que o risco de atender uma grávida reincidente é
alta. Ela se recorda de um episódio de uma menina que engravidou 10 meses após
o primeiro parto. Conta que levou um susto quando viu a ficha dela em cima da
mesa e achou que era um erro. “Mas não era. Foi muito rápido. Mal tinha dado
tempo de ela se recuperar e já ia enfrentar tudo de novo.”
No breve tempo em que fiquei aguardando
para entrevistar a médica, encontrei duas garotas que não deviam ter mais que
15 anos. Tentei conversar com uma delas, que estava acompanhada da mãe, mas sem
sucesso. “Aqui é assim praticamente toda semana. Atendo uma média de 20
pacientes, a grande maioria adolescentes. Já cheguei a atender uma de 12 anos.
Apesar dos índices do Ministério apontarem para uma queda nos índices de
gravidez precoce, na prática clínica não é isso que notamos”, comenta Beatriz.
Muitos ginecologistas acreditam que é
preciso reforçar a orientação sobre a necessidade de usar métodos contraceptivos,
principalmente os de longa duração. Isso ajudaria bastante nos casos em que a
jovem se esquece de tomar a pílula. “O SUS oferece o DIU de cobre, mas a adesão
é muito baixa e o produto chega até a vencer nas unidades de saúde”, comenta
César Eduardo Fernandes, presidente da Federação Brasileira das Associações de
Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo).
Adolescentes
grávidas sofrem com falta de estrutura
Ser mãe adolescente, sem nenhum tipo
de planejamento nem apoio familiar, ocasiona diversos problemas na vida da
gestante e perpetua um ciclo de pobreza e exclusão social difícil de ser
quebrado. Adolescentes pobres têm cinco vezes mais risco de engravidar que as
mais ricas. Com filhos, dificilmente elas conseguirão conciliar os estudos,
entrar no mercado de trabalho e ter independência financeira.
Muitas atrasam o pré-natal (momento
extremamente importante para garantir a integridade física do bebê) porque não
se sentem preparadas para contar para a família que estão grávidas. Dessa
maneira, a janela para identificar e resolver algum problema de saúde
potencialmente grave, como sífilis, fica limitada, o que aumenta ainda
mais o risco de instabilidade dali em diante. Ao mesmo tempo, elas ainda são
muito jovens, então elas demonstram preocupações quase infantis. “Elas chegam
assustadas e com algumas dúvidas que não condizem com a situação. Perguntam
‘mas como esse bebê vai sair daqui?’”, afirma Beatriz Barbosa.
Tanto o Hospital Cachoeirinha, em São
Paulo, como o Hospital da Mulher, em Campinas, promovem atendimento
especializado multidisciplinar para dar suporte a essas gestantes. As áreas de
nutrição (a maioria chega abaixo do peso e desnutrida), de assistência social e
de psicologia são as mais acionadas. Apesar de cada uma abordar uma vertente,
todas procuram identificar se a garota não foi vítima de violência sexual.
“Estabelecemos um acolhimento para entender, primeiramente, a dinâmica familiar
em que a jovem está inserida. Depois disso, tentamos inseri-la em políticas
públicas como bolsa família, cesta básica emergencial, cursos para gestante
etc.”, explica Dalva Rossi, assistente social do Hospital da Mulher de
Campinas.
Gravidez
na adolescência e pouco diálogo em casa
Nem todos os adolescentes que têm
filhos muito cedo apresentam histórico de desestruturação familiar, mas é muito
comum serem prole de gerações que também tiveram filhos antes dos 20 anos. A
falta de conversa sobre sexo em casa também costuma ser tradição nessas famílias.
Eles não conversam sobre o assunto em
casa e, provavelmente, nem na escola. Na verdade, o ensino sobre os temas
sexualidade e prevenção da gravidez sofreu grande retrocesso no país em meados
de 2011, quando se instaurou uma polêmica envolvendo o material educativo
Escola sem Homofobia (que ficou tachado de “kit gay”). Na época, todo o suporte
didático que era distribuído desde 2003 para crianças a partir dos 12 anos foi
recolhido sob a justificativa de que “incentivavam o homossexualismo (sic) e a
promiscuidade”. “Falta espaço para discutir sexualidade porque ainda a
encaramos como tabu. Os pais acham que se falarem com os filhos sobre o assunto
vão estimular a relação sexual precoce, o que é um mito”, afirma Rossi.
Riscos
de uma gravidez na adolescência
Além do aspecto social, a gravidez na
adolescência está associada a uma série de riscos à saúde da mulher e do bebê.
Elevação da pressão arterial (eclampsia e pré-eclâmpsia) com risco
de crises convulsivas são alguns dos problemas que podem acometer a
grávida muito jovem com maior frequência que em outras faixas etárias.
Entre os agravos mais comuns no bebê,
estão a prematuridade e o baixo peso ao nascer. “O índice de mortalidade entre
filhos de mães adolescentes é muito alto. Cerca de 20% da mortalidade infantil
no Brasil decorrem do óbito precoce de bebês nascidos de mães entre os 15 e 19
anos”, destaca a dra. Evelyn Eisenstein, membro do Departamento Científico de
Adolescência da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP).
Outro
problema muito comum é a deficiência nutricional, com riscos de anemia.
Por isso, muitas vezes, é necessário haver suplementação de cálcio e ferro para
as gestantes.
Qualquer pessoa consegue imaginar a
desorganização que ter filhos de forma não planejada pode provocar na vida. No
caso específico de mulheres jovens, cada uma dessas condições é um agravante
com alto impacto no futuro de famílias que provavelmente já se encontram em
situação vulnerável. Como acontece na maioria das vezes quando tratamos
questões envolvendo pessoas socialmente mais vulneráveis, o mais eficaz é
concentrar os esforços em políticas públicas na prevenção.
CONTE, Juliana. Adolescente que engravidam sofrem maior risco de
problemas físicos, psicológicos e sociais. Drauzio Varella. UOL, 26 mar. 2019.
Disponível em: https://drauziovarella.uol.com.br/reportagens/adolescentes-que-engravidam-sofrem-maior-risco-de-problemas-fisicos-psicologicos-e-sociais. Acesso em: 8 jun. 2020.
Fonte: Práticas de
Língua Portuguesa – Ensino Médio – Volume Único – Faraco – Moura – Maruxo – 1ª
ed., São Paulo, 2020. Ed. Saraiva. p. 138-140.
Entendendo a notícia:
01 – Após a leitura da
reportagem, discuta com os colegas e o professor: Você conhece alguém que já
tenha passado pela situação reportada no texto? Ela vivenciou os problemas
apontados na reportagem?
Resposta pessoal
do aluno. Sugestão: É importante que os alunos façam a relação entre o texto e
algo que eles já tenham vivenciados na família, entre os amigos, na própria
escola.
02 – Reúna-se com um colega
para analisar o texto em seus termos mais globais.
a) Acessem o site em que está o texto. Qual é o objetivo desse portal? O texto lido está alinhado com esse objetivo? Por quê?
Nesse portal, são divulgadas textos sobre saúde e qualidade de vida,
com uma linguagem acessível a toda a população. A reportagem está alinhada com
esse objetivo geral do site em que circula, pois aponta possíveis problemas de
saúde a que se expõe uma adolescente grávida.
b) Quem pode se interessar por textos dessa natureza?
Qualquer pessoal que esteja em busca de informações sobre o tema
tratado nele.
c) O texto foi organizado som subdivisões. Com que propósito isso foi feito?
As subdivisões sinalizadas por subtítulos, têm o propósito de
indicar subtemas.
d) Considerando o que você já sabe dos gêneros do campo jornalístico, por que o texto é exemplo de uma reportagem?
Resposta pessoal do aluno. Sugestão: Porque possui elementos
característicos da reportagem: o lide; a investigação jornalística acerca de um
assunto específico; o levantamento de dados; o tratamento do assunto de maneira
mais subjetiva, quando comparado à notícia; a função de informar o leitor sobre
determinado assunto; possíveis entrevistas com especialistas.
03 – A reportagem apresenta
diversos dados de uma pesquisa.
a) No primeiro parágrafo, qual é a importância do uso desse tipo de informação em uma reportagem?
Esse tipo de informação ajuda a dar credibilidade para aquilo que
está sendo apresentado ao longo do texto.
b) Considerando o segundo parágrafo, para que fatos esses dados apontam?
Os adolescentes iniciam a vida sexual cada vez mais cedo, falta
educação sexual entre eles.
c) No terceiro parágrafo, um desses dados se mostra mais complexo do que se pode pensar. Qual é e por quê?
É a questão da falta de educação sexual e expliquem que nesse parágrafo
a jornalista indica que os jovens têm informação, mas não acreditam que a
gravidez vá acontecer com eles especificamente.
04 – Os hospitais Cachoeirinha
(São Paulo - SP) e da Mulher (Campinas – SP) oferecem à população atendimento
especializado multidisciplinar. E na região em que você mora, como é o
atendimento às mulheres nos hospitais públicos e/ou em unidades básicas de
saúde?
Resposta pessoal do aluno.
05 – No quarto parágrafo, a
médica entrevistada aponta que, diante da situação, ela se sente como se
“enxugasse gelo”. Qual é o sentido dessa expressão? Que fato a leva a se sentir
assim?
Sentido de insistir
em algo que parece ser inútil. A expressão sugere que por mais que a médica
esteja se esforçando para orientar as pacientes grávidas, esse trabalho parece
não surtir efeito, pois elas não a ouvem. A profissional sente-se desanimada,
porque a taxa de reincidência de gravidez na adolescência no local onde ela
trabalha é constantemente alta.
06 – De acordo com o texto, as
adolescentes pobres têm cinco vezes mais risco de engravidar do que as mais
ricas. Qual é a justificativa apresentada para essa afirmativa?
Isso provavelmente
acontece porque as adolescentes mais pobres têm menos informação sobre os
métodos contraceptivos em comparação com as jovens economicamente mais
favorecidas.
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