quarta-feira, 8 de novembro de 2023

CRÔNICA: RECEITA DE VIVER - PEDRO BLOCH - COM GABARITO

 Crônica: Receita de viver

             Pedro Bloch

        Viver é expandir, é iluminar. Viver é derrubar barreiras entre os homens e o mundo. Compreender. Saber que, muitas vezes, nossa jaula somos nós mesmos, que vivemos polindo as nossas grades, ao invés delas nos libertarmos.

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        Procuro descobrir nos outros sua dimensão universal, única. Sou coletivo. Tenho o mundo dentro de mim. Um profundo respeito humano. Um enorme respeito à vida. Acredito nos homens. Até nos vigaristas. Procuro desenvolver um sentido de identificação com o resto da humanidade. Não nado em piscina se tenho o mar. Por respeito a cada ser humano em todos os cantos da terra, e por gostar de gente — gostar de gostar — é que encontro em cada indivíduo o reflexo do Universo.

        As pessoas chamam de amor ao amor-próprio. Chamam de amor ao sexo. Chamam de amor a uma porção de coisas que não são amor. Enquanto a humanidade não definir o amor, enquanto não perceber que o amor é algo que independe da posse, do egocentrismo, da planificação, do medo de perder, da necessidade de ser correspondido, o amor não será amor.

        A gente só é o que faz aos outros. Somos consequências dessa ação. Não fazer… me deixa extenuado. Talvez a coisa mais importante da vida seja não vencer na vida, não se realizar.

        O homem deve viver se realizando.

        O realizado botou ponto final.

        Não podemos viver, permanentemente, grandes momentos. Mas podemos cultivar sua expectativa.

        Acredito em milagre. Nada mais miraculoso que a realidade de cada instante.

        Acredito no sobrenatural. O sobrenatural seria o natural mal explicado, se o natural tivesse explicação.

        Enquanto o homem não marcar um encontro consigo mesmo, verá o mundo com prisma deformado. E construirá um mundo em que a lua terá prioridade. Um mundo mais lua do que luar…

Pedro Bloch.

Entendendo a crônica:

01 – Qual é o principal conceito sobre o viver que Pedro Bloch enfatiza na crônica?

      Pedro Bloch enfatiza que viver é expandir, iluminar, derrubar barreiras entre os homens e o mundo, e compreender a dimensão universal e única dos outros.

02 – De acordo com o autor, como as pessoas frequentemente confundem o amor na sociedade?

      O autor afirma que as pessoas frequentemente confundem o amor com amor-próprio, sexo e outras coisas que não são amor genuíno, destacando a necessidade de uma definição mais clara do amor.

03 – Qual é a importância que o autor atribui à ação e à realização na vida humana?

      O autor enfatiza a importância da ação e da realização na vida, argumentando que o homem deve viver se realizando e que o ato de realização é mais significativo do que simplesmente "vencer na vida."

04 – O que o autor acredita sobre a natureza dos momentos especiais na vida?

      O autor acredita que, embora não possamos viver permanentemente em grandes momentos, podemos cultivar a expectativa desses momentos especiais.

05 – Qual é a visão do autor sobre o sobrenatural na crônica?

      O autor sugere que o sobrenatural é, na verdade, o natural mal explicado, quando o natural carece de uma explicação adequada, destacando assim a importância do entendimento e da autodescoberta do homem.

 

 

 

NOTÍCIA: RESPONSABILIDADE DO MOTORISTA NO TRÂNSITO - DOM ODILO PEDRO SCHERER - COM GABARITO

 Notícia: Responsabilidade do motorista no trânsito

              Dom Odilo Pedro Scherer

        O trânsito brasileiro ainda faz, todos os anos, muitas vítimas nas rodovias de todo o país. O problema é grave e requer educação e mais rigor na aplicação da lei. No último feriado, muitas pessoas morreram nas estradas; a maioria por uso de bebidas alcoólicas e excesso de velocidade.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjAOqseG5gpUADQmBusGsUJklNzSbhFNVE1PRcyCnaAgXE68sXOUUF_1pvfGCkCi1_AUkJCQ-LNpoP3K04ZiLVj418k_NlHFtAD3EqBQ-G0467kySeeyYZkUpOl5GysHr8W-11cVMn2CVobhTiIA0Yus_Vd41xo74GopZshxHsIRsAOVe4B3-pPLHdAHC4/s320/TRANSITO.png


        Dom Odilo Pedro Scherer falou ao Canção Nova Notícias, recordando que “os acidentes no trânsito são, muitas vezes, causados pela bebida e, por isso mesmo, é preciso fazer de tudo para evitar que esta seja a causa dos acidentes. Evidentemente, é preciso evitar todos os outros motivos que possam causar acidentes".

        Disse ainda que “é uma grave responsabilidade pegar o carro, levar pessoas e colocar em risco as suas vidas por alguma falta de cuidado, por isso, até mesmo a revisão do carro é preciso. De toda maneira, o cuidado com o álcool é importante, porque colocar em risco a própria vida e a vida de outras pessoas é sempre grave”. E recordou que “a Santa Sé, através do Pontifício Conselho Justiça e Paz, divulgou, há algum tempo, os mandamentos do trânsito, e que aqui, no Brasil, também foram divulgados.”

        “Observar os mandamentos no trânsito é muito importante para que nós possamos respeitar a própria vida e respeitar a vida das outras pessoas.”

SCHERER, Dom Odilo Pedro. Responsabilidade do motorista no trânsito. Disponível em: <http://noticias.cancaonova.com/noticia.php?id=243282>. Acesso em: 16 dez. 2010. Adaptado. 

Entendendo a notícia:

01 – Qual é a preocupação central do Dom Odilo Pedro Scherer em relação ao trânsito no Brasil, de acordo com a notícia?

      Dom Odilo Pedro Scherer está preocupado com o alto número de vítimas no trânsito brasileiro, especialmente devido ao uso de bebidas alcoólicas e ao excesso de velocidade nas estradas.

02 – O que o Dom Odilo destaca como uma das principais causas de acidentes de trânsito na notícia?

      Dom Odilo destaca que o uso de bebidas alcoólicas é uma das principais causas de acidentes de trânsito no Brasil.

03 – Qual é a mensagem de Dom Odilo em relação à responsabilidade dos motoristas no trânsito?

      Dom Odilo enfatiza que é uma grave responsabilidade dirigir, transportar pessoas e colocar suas vidas em risco devido à falta de cuidado. Ele destaca a importância de revisar o carro e de evitar o consumo de álcool ao dirigir.

04 – De acordo com a notícia, qual é a importância dos "mandamentos do trânsito" mencionados pelo Dom Odilo?

      Os "mandamentos do trânsito" são considerados importantes para que as pessoas possam respeitar suas próprias vidas e a vida de outras pessoas no trânsito. Eles são divulgados pela Santa Sé através do Pontifício Conselho Justiça e Paz.

05 – O que o Dom Odilo Pedro Scherer enfatiza como o objetivo principal a ser alcançado no trânsito, de acordo com a notícia?

      Dom Odilo Pedro Scherer enfatiza a importância de evitar acidentes no trânsito, protegendo vidas, e promove o respeito pela vida própria e pelas vidas de outras pessoas como objetivo principal no trânsito.

 

 

 

RESENHA DE FILME: DOUTORES DA ALEGRIA - MARA MOURÃO - COM GABARITO

 Resenha de filme:  DOUTORES DA ALEGRIA

                               Uma metáfora para a vida

                             Myrna Silveira Brandão

        Doutores da Alegria é a primeira instituição criada no país para levar solidariedade, humor, carinho e o lirismo da arte do palhaço para crianças e adolescentes que estão internados em hospitais.



Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhROGNSNByom7JRPx48bp9wx-639T3ZcliPaDzAcuAQ5fP_OhGChRZoBTnDpOGO9NjVUpz-l0f4sxQ6hIY3SeqTDrlg1NTEQo2uUBDWB3rXCR7BU2-3sgrT-Gc4ZiS238PN3jX-qDSMi_TpNKzvC8A7UnxPxl_lRcdiHxT9RUA2FS9qKa-fEBj0KvD9rmU/w194-h129/DOUTORES.jpg
        O filme Doutores da Alegria, de Mara Mourão, além de trazer o emocionante universo dos integrantes daquela instituição, mostra como a alegria e brincadeiras engraçadas podem fazer bem e trazer conforto àqueles pequenos seres doentes e com poucos momentos de felicidade em suas vidas.

        Além disso, o comovente filme de Mara mostra o papel do palhaço na sociedade, levando-nos a pensar sobre a sua função social. Os próprios palhaços conduzem esse diálogo e discorrem sobre sua profissão.

        [...] São artistas, que durante anos, vêm alterando a ordem padrão das relações sociais, desmontando, sem qualquer agressividade, hierarquias pré-estabelecidas, fazendo rir e levando a pensar.

        Graças a essa capacidade de, através do raciocínio lateral, olhar as situações por um outro prisma, eles conferem nova dimensão a momentos difíceis, mas inerentes à vida.

        Não há nenhuma pieguice na proposta. O que se vê é um engajamento de corpo e alma de 37 pessoas dispostas a levar sorrisos e felicidade a pequenos, muitas vezes em terrível estado terminal.

        Com sensibilidade e humor, o filme transporta o público para o dia a dia dos hospitais e capta a transformação nesse ambiente provocada a partir do encontro do palhaço com a criança.

        A diretora explica como esse arquétipo pode trazer mudanças para os dias atuais. “O hospital é uma metáfora para a vida, lá estão todas as emoções que também fazem parte do mundo externo, porém colocadas sob uma lente de aumento. E por isso que, quando o palhaço chega a esse ambiente e causa uma modificação, fica claro que é capaz de gerar transformações também em vários outros locais”, afirma.

        O filme tem muitas cenas engraçadas, a partir dos encontros e depoimentos tocantes, de momentos passados ao lado dos jovens pacientes, seus pais e médicos. E vai fundo na forma como os palhaços olham para o outro e compreendem a dor e a perda.

        A filmagem foi feita de forma quase invisível e, para não inibir as crianças, as câmeras foram cobertas com ursinhos de pelúcia. Assim, os pequenos pacientes olham e interagem com os brinquedos sem perceber que estão sendo filmados.

        Através do carinho, a suavidade da ação dos “doutores” permite que, em inúmeros momentos, a própria criança possa liderar a história.

        Inspirada na experiência do palhaço Michael Christien que em 1986 montou a Clowncar Unit, o grupo foi criado pelo ator e palhaço Wellington Nogueira.

        Nogueira explica por que aceitou levar o trabalho do grupo para as telas: “decidimos aceitar o convite para fazer o filme porque todos nós, artistas que trabalham em hospitais, tivemos nosso olhar sobre a vida modificado por essa experiência. Aprendemos o possível e o impossível de maneira mais próxima e real. Assim, tornou-se estratégico para nossa organização dividir com o público esse olhar, ampliar o alcance dessa ação para que mais pessoas possam ter a oportunidade de mudar sua maneira de ver a vida e o mundo”, detalha o artista, que no Grupo interpreta o Dr. Zinho. [...]

        Doutores da Alegria foi o melhor filme do 3º Festival de Cinema Brasileiro de Nova York e o grande vencedor do Festival de Gramado em 2005.

http://www.abrhrj.org.br/typo/index.php?id=106

Entendendo a resenha de filme:

01 – Qual é a principal instituição abordada no filme "Doutores da Alegria" e qual é o seu propósito?

      A principal instituição abordada no filme é "Doutores da Alegria", a primeira organização no Brasil que leva humor e alegria para crianças e adolescentes internados em hospitais.

02 – Qual é a principal mensagem transmitida pelo filme em relação ao papel dos palhaços na sociedade?

      O filme destaca o papel dos palhaços na sociedade, mostrando como eles desafiam hierarquias sociais, fazem as pessoas rirem e levam-nas a refletir sobre a vida.

03 – Como o filme descreve a transformação que ocorre nos hospitais quando os palhaços interagem com as crianças?

      O filme descreve como a presença dos palhaços nos hospitais transforma o ambiente, proporcionando alegria e conforto às crianças, seus pais e médicos.

04 – O que a diretora do filme, Mara Mourão, afirma sobre o hospital em relação à vida?

      A diretora Mara Mourão afirma que o hospital é uma metáfora para a vida, pois nele estão presentes todas as emoções que também fazem parte do mundo externo, mas ampliadas. A chegada do palhaço a esse ambiente pode gerar transformações em outros locais.

05 – Como o filme foi gravado de forma a não inibir as crianças no hospital?

      Para não inibir as crianças no hospital, as câmeras foram cobertas com ursinhos de pelúcia, permitindo que os pequenos pacientes interagissem com os brinquedos sem perceber que estavam sendo filmados.

06 – Quem foi o fundador do grupo "Doutores da Alegria", e por que eles decidiram fazer o filme?

      O grupo "Doutores da Alegria" foi criado pelo ator e palhaço Wellington Nogueira. Eles decidiram fazer o filme para compartilhar a transformação que tiveram ao trabalhar nos hospitais e ampliar o impacto de sua ação, permitindo que mais pessoas mudem sua perspectiva de vida.

07 – Quais prêmios o filme "Doutores da Alegria" recebeu em festivais de cinema?

      O filme "Doutores da Alegria" foi o melhor filme do 3º Festival de Cinema Brasileiro de Nova York e o grande vencedor do Festival de Gramado em 2005.

 

CONTO: SUJE-SE, GORDO! MACHADO DE ASSIS - COM GABARITO

 Conto: SUJE-SE, GORDO!

            Machado de Assis

        UMA NOITE, há muitos anos, passeava eu com um amigo no terraço do Teatro de S. Pedro de Alcântara. Era entre o segundo e o terceiro ato da peça A Sentença ou o Tribunal do Júri. Só me ficou o título, e foi justamente o título que nos levou a falar da instituição e de um fato que nunca mais me esqueceu.

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgb6nUbxAlbsuIGZ2u2FtD0QF2j2_xLDHnv388KfszhQPromsxuIqwVv86wTubsQ4D7EgaRfH2_Kel84A4oEO6TxrxFEvozo5dYCE8THFLJPOzrnBLNRIG7iSmbmskti2TnXuMyIIHSzE7rD8_ZiXMB0XQC9FgulqFnegCpZGVLuQ_s8y_V76hzC7-BVgs/s1600/OURIVES.jpg


        -- Fui sempre contrário ao júri,-- disse-me aquele amigo, não pela instituição em si, que é liberal, mas porque me repugna condenar alguém, e por aquele preceito do Evangelho; "Não queirais julgar para que não sejais julgados". Não obstante, servi duas vezes. O tribunal era então no antigo Aljube, fim da Rua dos Ourives, princípio da Ladeira da Conceição.

        Tal era o meu escrúpulo que, salvo dois, absolvi todos os réus. Com efeito, os crimes não me pareceram provados; um ou dois processos eram mal feitos. O primeiro réu que condenei, era um moço limpo, acusado de haver furtado certa quantia, não grande, antes pequena, com falsificação de um papel. Não negou o fato, nem podia fazê-lo, contestou que lhe coubesse a iniciativa ou inspiração do crime. Alguém, que não citava, foi que lhe lembrou esse modo de acudir a uma necessidade urgente; mas Deus, que via os corações, daria ao criminoso verdadeiro o merecido castigo. Disse isso sem ênfase, triste, a palavra surda. os olhos mortos, com tal palidez que metia pena; o promotor público achou nessa mesma cor do gesto a confissão do crime. Ao contrário, o defensor mostrou que o abatimento e a palidez significavam a lástima da inocência caluniada.

        Poucas vezes terei assistido a debate tão brilhante. O discurso do promotor foi curto, mas forte, indignado, com um tom que parecia ódio, e não era. A defesa, além do talento do advogado, tinha a circunstância de ser a estreia dele na tribuna. Parentes, colegas e amigos esperavam o primeiro discurso do rapaz, e não perderam na espera. O discurso foi admirável, e teria salvo o réu, se ele pudesse ser salvo, mas o crime metia-se pelos olhos dentro. O advogado morreu dois anos depois, em 1865. Quem sabe o que se perdeu nele! Eu, acredite, quando vejo morrer um moço de talento, sinto mais que quando morre um velho... Mas vamos ao que ia contando. Houve réplica do promotor e tréplica do defensor. O presidente do tribunal resumiu os debates, e, lidos os quesitos, foram entregues ao presidente do Conselho, que era eu.

        Não digo o que se passou na sala secreta; além de ser secreta   o que lá se passou, não interessa ao caso particular, que era melhor ficasse também calado, confesso. Contarei depressa; o terceiro ato não tarda.

        Um dos jurados do Conselho, cheio de corpo e ruivo, parecia mais que que ninguém convencido do delito e do delinquente. O processo foi examinado, os quesitos lidos' e as respostas dadas (onze votos contra um); só o jurado ruivo estava inquieto. No fim' como os votos assegurassem a condenação, ficou satisfeito, disse que seria um ato de fraqueza, ou cousa pior, a absolvição que lhe déssemos. Um dos jurados, certamente o que votara pela negativa,-- proferiu algumas palavras de defesa do moço. O ruivo,-- chamava-se Lopes,-- replicou com aborrecimento:

        -- Como, senhor? Mas o crime do réu está mais que provado.

        -- Deixemos de debate, disse eu, e todos concordaram comigo.

        -- Não estou debatendo, estou defendendo o meu voto, continuou Lopes. O crime está mais que provado. O sujeito nega, porque todo o réu nega, mas o certo é que ele cometeu a falsidade, e que falsidade! Tudo por uma miséria, duzentos mil-réis! Suje-se gordo! Quer sujar-se? Suje-se gordo!

        "Suje-se gordo!" Confesso-lhe que fiquei de boca aberta, não que entendesse a frase, ao contrário, nem a entendi nem a achei limpa, e foi por isso mesmo que fiquei de boca aberta. Afinal caminhei e bati à porta, abriram-nos, fui à mesa do juiz, dei as respostas do Conselho e o réu saiu condenado. O advogado apelou; se a sentença foi confirmada ou a apelação aceita, não sei; perdi o negócio de vista.

        Quando saí do tribunal, vim pensando na frase do Lopes, e pareceu-me entendê-la. "Suje-se gordo!" era como se dissesse que o condenado era mais que ladrão, era um ladrão reles, um ladrão de nada. Achei esta explicação na esquina da Rua de São Pedro; vinha ainda pela dos Ourives. Cheguei a desandar um pouco, a ver se descobria o Lopes para lhe apertar a mão; nem sombra de Lopes. No dia seguinte, lendo nos jornais os nossos nomes, dei com o nome todo dele, não valia a pena procurá-lo, nem me ficou de cor. Assim são as páginas da vida, como dizia meu filho quando fazia versos, e acrescentava que as páginas vão passando umas sobre outras, esquecidas apenas lidas. Rimava assim, mas não me lembra a forma dos versos.

        Em prosa disse-me ele, muito tempo depois, que eu não devia faltar ao júri, para o qual acabava de ser designado. Respondi-lhe que não compareceria, e citei o preceito evangélico; ele teimou, dizendo ser um dever de cidadão, um serviço gratuito, que ninguém que se prezasse podia negar ao seu país. Fui e julguei três processos.

        Um destes era de um empregado do Banco do Trabalho Honrado, o caixa, acusado de um desvio de dinheiro. Ouvira falar no caso, que os jornais deram sem grande minúcia, e aliás eu lia pouco as notícias de crimes. O acusado apareceu e foi sentar-se no famoso banco dos réus. Era um homem magro e ruivo. Fitei-o bem, e estremeci, pareceu-me ver o meu colega daquele julgamento de anos antes. Não poderia reconhecê-lo logo por estar agora magro, mas era a mesma cor dos cabelos e das barbas, o mesmo ar, e por fim a mesma voz e o mesmo nome: Lopes.

        -- Como se chama? perguntou o presidente.

        -- Antônio do Carmo Ribeiro Lopes.

        Já me não lembravam os três primeiros nomes, o quarto era o mesmo, e os outros sinais vieram confirmando as reminiscências; não me tardou reconhecer a pessoa exata daquele dia remoto. Digo-lhe aqui com verdade que todas essas circunstâncias me impediram de acompanhar atentamente o interrogatório, e muitas cousas me escaparam. Quando me dispus a ouvi-lo bem, estava quase no fim. Lopes negava com firmeza tudo o que lhe era perguntado, ou respondia de maneira que trazia uma complicação ao processo. Circulava os olhos sem medo nem ansiedade; não sei até se com uma pontinha de riso nos cantos da boca.

        Seguiu-se a leitura do processo. Era uma falsidade e um desvio de cento e dez contos de réis. Não lhe digo como se descobriu o crime nem o criminoso, por já ser tarde; a orquestra está afinando os instrumentos. O que lhe digo com certeza é que a leitura dos autos me impressionou muito, o inquérito, os documentos, a tentativa de fuga do caixa e uma série de circunstancias agravantes, por fim o depoimento das testemunhas. Eu ouvia ler ou falar e olhava para o Lopes. Também ele ouvia, mas com o rosto alto, mirando o escrivão o presidente, o teto e as pessoas que o iam julgar; entre elas eu. Quando olhou para mim não me reconheceu; fitou-me algum tempo e sorriu, como fazia aos outros.

        Todos esses gestos do homem serviram à acusação e à defesa, tal como serviram, tempos antes, os gestos contrários do outro acusado. O promotor achou neles a revelação clara do cinismo, o advogado mostrou que só a inocência e a certeza da absolvição podiam trazer aquela paz de espírito.

        Enquanto os dois oradores falavam, vim pensando na fatalidade de estar ali, no mesmo banco do outro, este homem que votara a condenação dele, e naturalmente repeti comigo o texto evangélico: “Não queirais julgar, para que não sejais julgados". Confesso-lhe que mais de uma vez me senti frio. Não é que eu mesmo viesse a cometer algum desvio de dinheiro, mas podia, em ocasião de raiva, matar alguém ou ser caluniado de desfalque. Aquele que julgava outrora, era agora julgado também.

        Ao pé da palavra bíblica lembrou-me de repente a do mesmo Lopes: "Suje-se gordo!" Não imagina o sacudimento que me deu esta lembrança. Evoquei tudo o que contei agora, o discursinho que lhe ouvi na sala secreta, até àquelas palavras: "Suje-se gordo!" Vi que não era um ladrão reles, um ladrão de nada, sim de grande valor. O verbo é que definia duramente a ação. "Suje-se gordo!" Queria dizer que o homem não se devia levar a um ato daquela espécie sem a grossura da soma. A ninguém cabia sujar-se por quatro patacas. Quer sujar-se? Suje-se gordo!

        Ideias e palavras iam assim rolando na minha cabeça, sem eu dar pelo resumo dos debates que o presidente do tribunal fazia. Tinha acabado, leu os quesitos e recolhemo-nos à sala secreta. Posso dizer-lhe aqui em particular que votei afirmativamente, tão certo me pareceu o desvio dos cento e dez contos. Havia, entre outros documentos, uma carta de Lopes que fazia evidente o crime. Mas parece que nem todos leram com os mesmos olhos que eu. Votaram comigo dois jurados. Nove negaram a criminalidade do Lopes, a sentença de absolvição foi lavrada e lida, e o acusado saiu para a rua. A diferença da votação era tamanha que cheguei a duvidar comigo se teria acertado. Podia ser que não. Agora mesmo sinto uns repelões de consciência. Felizmente, se o Lopes não cometeu deveras o crime não recebeu a pena do meu voto, e esta consideração acaba por me consolar do erro, mas os repelões voltam. O melhor de tudo é não julgar ninguém para não vir a ser julgado. Suje-se gordo! suje-se magro! suje-se como lhe parecer! o mais seguro é não julgar ninguém... Acabou a música, vamos para as nossas cadeiras.

     Texto extraído do livro “Antologia do Humorismo e Sátira”, Editora Civilização Brasileira – Rio de Janeiro, 1957, p. 98, uma seleção de R. Magalhães Júnior.

Entendendo o conto:

01 – Onde se passa a cena inicial do conto?

      A cena inicial do conto se passa no terraço do Teatro de S. Pedro de Alcântara, entre o segundo e o terceiro ato de uma peça.

02 – Por que o amigo do narrador serviu duas vezes no júri, apesar de ser contrário à instituição?

      O amigo do narrador serviu no júri duas vezes porque, embora fosse contrário à instituição em si, sentiu a obrigação de fazê-lo como um serviço gratuito ao seu país.

03 – Qual foi a primeira condenação que o narrador relembra no conto?

      A primeira condenação que o narrador relembra no conto foi a de um moço acusado de furto com falsificação de um papel.

04 – Qual frase proferida por um dos jurados, chamado Lopes, chama a atenção do narrador durante o julgamento?

      A frase que chama a atenção do narrador é "Suje-se gordo!" proferida por Lopes, um dos jurados.

05 – O que a frase "Suje-se gordo!" significa no contexto do conto?

      A frase "Suje-se gordo!" parece indicar que o réu é um criminoso de grande importância ou que só deveria se envolver em crimes de grande valor.

06 – Como o narrador se sentiu ao reconhecer o caixa do Banco do Trabalho Honrado como o mesmo jurado Lopes de um julgamento anterior?

      O narrador se sentiu perturbado e desconfortável ao reconhecer o caixa como o mesmo jurado Lopes do julgamento anterior, refletindo sobre o julgamento passado.

07 – O que fez o narrador pensar sobre a frase "Não queirais julgar, para que não sejais julgados" no contexto do conto?

      O narrador pensou que a frase bíblica "Não queirais julgar, para que não sejais julgados" ganhou um novo significado ao ver o jurado Lopes sendo julgado, pois ele próprio já havia julgado alguém anteriormente.

08 – Qual foi a votação no julgamento do caixa acusado do desvio de dinheiro?

      A votação no julgamento do caixa acusado do desvio de dinheiro foi de nove votos pela absolvição e três votos pela condenação.

09 – Como o narrador encerra o conto, refletindo sobre o ato de julgar?

      O narrador encerra o conto refletindo sobre a incerteza do ato de julgar e afirmando que o melhor é não julgar ninguém para evitar ser julgado, fazendo referência à frase "Suje-se gordo!" como um lembrete das complexidades morais envolvidas no julgamento.

 

CONTO: A ARMADILHA - MURILO RUBIÃO - COM GABARITO

 Conto: A armadilha

           Murilo Rubião

        Alexandre Saldanha Ribeiro. Desprezou o elevador e seguiu pela escada, apesar da volumosa mala que carregava e do número de andares a serem vencidos. Dez.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjucrdK7QgNZke9VLHZpiBrPcv0eny8w6TEOvt7VCEUhWqJdaUSRz1DdoozIAup1NQPU9h2l4tqZmrN2sKK7sOmVMNW6-Y0tcCo2B0hK4rSHSw9_uq5Mo-RT8rrFCUp-WkTwmQWw3om0wIqRsVFz9OGdCxl5AIY012tGrjP_4obmsvkBgG8ate5Fm5P-Ag/s1600/ESCADA.jpg


        Não demonstrava pressa, porém o seu rosto denunciava a segurança de uma resolução irrevogável. Já no décimo pavimento, meteu-se por um longo corredor, onde a poeira e detritos emprestavam desagradável aspecto aos ladrilhos. Todas as salas encontravam-se fechadas e delas não escapava qualquer ruído que indicasse presença humana.

        Parou diante do último escritório e perdeu algum tempo lendo uma frase, escrita a lápis, na parede. Em seguida passou a mala para a mão esquerda e com a direita experimentou a maçaneta, que custou a girar, como se há muito não fosse utilizada. Mesmo assim não conseguiu franquear a porta, cujo madeiramento empenara. Teve que usar o ombro para forçá-la. E o fez com tamanha violência que ela veio abaixo ruidosamente. Não se impressionou. Estava muito seguro de si para dar importância ao barulho que antecedera a sua entrada numa saleta escura, recendendo a mofo. Percorreu com os olhos os móveis, as paredes. Contrariado, deixou escapar uma praga. Quis voltar ao corredor, a fim de recomeçar a busca, quando deu com um biombo. Afastou-o para o lado e encontrou uma porta semicerrada. Empurrou-a. Ia colocar a mala no chão, mas um terror súbito imobilizou-o: sentado diante de uma mesa empoeirada, um homem de cabelos grisalhos, semblante sereno, apontava-lhe um revólver. Conservando a arma na direção do intruso, ordenou-lhe que não se afastasse.

        Também a Alexandre não interessava fugir, porque jamais perderia a oportunidade daquele encontro. A sensação de medo fora passageira e logo substituída por outra mais intensa, ao fitar os olhos do velho. Deles emergia uma penosa tonalidade azul.

        Naquela sala tudo respirava bolor, denotava extremo desmazelo, inclusive as esgarçadas roupas do seu solitário ocupante:

        — Estava à sua espera — disse, com uma voz macia. Alexandre não deu mostras de ter ouvido, fascinado com o olhar do seu interlocutor. Lembrava-lhe a viagem que fizera pelo mar, algumas palavras duras, num vão de escada.

        O outro teve que insistir:

        — Afinal, você veio.

        Subtraído bruscamente às recordações, ele fez um esforço violento para não demonstrar espanto:

        — Ah, esperava-me? — Não aguardou resposta e prosseguiu exaltado, como se de repente viesse à tona uma irritação antiga: — Impossível! Nunca você poderia calcular que eu chegaria hoje, se acabo de desembarcar e ninguém está informado da minha presença na cidade! Você é um farsante, mau farsante. Certamente aplicou sua velha técnica e pôs espias no meu encalço. De outro modo seria difícil descobrir, pois vivo viajando, mudando de lugar e nome.

        — Não sabia das suas viagens nem dos seus disfarces.

        — Então, como fez para adivinhar a data da minha chegada?

        — Nada adivinhei. Apenas esperava a sua vinda. Há dois anos, desta cadeira, na mesma posição em que me encontro, aguardava-o certo de que você viria.

        Por instantes, calaram-se. Preparavam-se para golpes mais fundos ou para desvendar o jogo em que se empenhavam.

        Alexandre pensou em tomar a iniciativa do ataque, convencido de que somente assim poderia desfazer a placidez do adversário. Este, entretanto, percebeu-lhe a intenção e antecipou-se:

        — Antes que me dirija outras perguntas — e sei que tem muitas a fazer-me — quero saber o que aconteceu com Ema.

        — Nada — respondeu, procurando dar à voz um tom despreocupado.

        — Nada?

        Alexandre percebeu a ironia e seus olhos encheram-se de ódio e humilhação. Tentou revidar com um palavrão. Todavia, a firmeza e a tranquilidade que iam no rosto do outro venceram-no.

        — Abandonou-me — deixou escapar, constrangido pela vergonha. E numa tentativa inútil de demonstrar um resto de altivez, acrescentou: — Disso você não sabia!

        Um leve clarão passou pelo olhar do homem idoso:

        — Calculava, porem desejava ter certeza.

        Começava a escurecer. Um silêncio pesado separava-os e ambos volveram para certas reminiscências que, mesmo contra a vontade deles, sempre os ligariam.

        O velho guardou a arma. Dos seus lábios desaparecera o sorriso irônico que conservara durante todo o diálogo. Acendeu um cigarro e pensou em formular uma pergunta que, depois, ele julgaria desnecessária. Alexandre impediu que a fizesse. Gesticulando, nervoso, aproximara-se da mesa:

        — Seu caduco, não tem medo que eu aproveite a ocasião para matá-lo? Quero ver sua coragem, agora, sem o revólver.

        — Não, além de desarmado, você não veio aqui para matar-me.

        — O que está esperando, então?! — gritou Alexandre. — Mate-me logo!

        — Não posso.

        — Não pode ou não quer?

        — Estou impedido de fazê-lo. Para evitar essa tentação, após tão longa espera, descarreguei toda a carga da arma no teto da sala.

        Alexandre olhou para cima e viu o forro crivado de balas. Ficou confuso. Aos poucos, refazendo-se da surpresa, abandonou-se ao desespero. Correu para uma das janelas e tentou atirar-se através dela. Não a atravessou. Bateu com a cabeça numa fina malha metálica e caiu desmaiado no chão.

        Ao levantar-se, viu que o velho acabara de fechar a porta e, por baixo dela, iria jogar a chave.

        Lançou-se na direção dele, disposto a impedi-lo. Era tarde. O outro já concluíra seu intento e divertia-se com o pânico que se apossara do adversário:

        — Eu esperava que você tentaria o suicídio e tomei a precaução de colocar telas de aço nas janelas.

        A fúria de Alexandre chegara ao auge:

        — Arrombarei a porta. Jamais me prenderão aqui!

        — Inútil. Se tivesse reparado nela, saberia que também é de aço. Troquei a antiga por esta.

        — Gritarei, berrarei!

        — Não lhe acudirão. Ninguém mais vem a este prédio. Despedi os empregados, despejei os inquilinos.

        E concluiu, a voz baixa, como se falasse apenas para si mesmo:

        — Aqui ficaremos: um ano, dez, cem ou mil anos.

Murilo Rubião.

Entendendo o conto:

01 – Quem é o protagonista do conto "A Armadilha" de Murilo Rubião?

      O protagonista é Alexandre Saldanha Ribeiro.

02 – Por que Alexandre Saldanha Ribeiro escolheu subir as escadas em vez de usar o elevador?

      Alexandre Saldanha Ribeiro escolheu subir as escadas porque estava determinado a chegar a um destino específico e estava seguro de sua resolução.

03 – O que Alexandre encontra ao entrar no último escritório?

      Ao entrar no último escritório, Alexandre encontra um homem idoso com cabelos grisalhos sentado diante de uma mesa, apontando-lhe um revólver.

04 – Como o homem idoso reage quando Alexandre o acusa de ser um farsante?

      O homem idoso mantém a calma e afirma que estava à espera de Alexandre por dois anos, esperando sua chegada.

05 – Qual é o estado da sala em que os dois personagens se encontram?

      A sala em que os personagens se encontram está em péssimas condições, cheia de poeira, detritos e cheiro de mofo.

06 – Por que Alexandre não pode matar o homem idoso?

      Alexandre não pode matar o homem idoso porque este descarregou toda a carga de sua arma no teto da sala para evitar essa tentação.

07 – O que Alexandre tenta fazer quando percebe que está preso na sala?

      Alexandre tenta atirar-se através de uma janela, mas percebe que ela possui uma fina malha metálica que o impede de escapar.

08 – Qual é a reação do homem idoso ao perceber que Alexandre tentou o suicídio?

      O homem idoso se diverte com o pânico de Alexandre e revela que colocou telas de aço nas janelas para evitar o suicídio.

09 – O que o homem idoso faz para garantir que Alexandre não possa sair do prédio?

      O homem idoso fecha a porta e joga a chave por baixo dela, garantindo que Alexandre não possa sair.

10 – Por que o homem idoso afirma que ficarão naquele local por um tempo indeterminado?

      O homem idoso afirma que ficarão naquele local por um tempo indeterminado porque ele despediu os empregados, despejou os inquilinos do prédio e fez várias modificações para tornar o local inacessível. Eles estão agora presos juntos, sem possibilidade de escapar.

 

 

CONTO: MENINÃO DO CAIXOTE - JOÃO ANTÔNIO - COM GABARITO

 Conto: Meninão do Caixote

           João Antônio

        O conto do escritor paulistano João Antônio, Meninão do Caixote, publicado no livro de contos Malagueta, Perus e Bacanaço, de 1963, apresenta a história de um menino que descobre ser um talento da sinuca. O garoto é fã de seu pai, que dirige um caminhão e o leva para o bairro da Vila Mariana, onde se diverte em uma lagoa. Por outro lado, o relacionamento do menino com a mãe é diferente. Ela vive repreendendo-o, dizendo o que fazer e lhe castigando.

 Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgIUWR2UnydS4x0YTBLgGn9GG_EdsqFA6KpYPkUcxuKtclYahpFGK_DyXxorjq_kD8rsURZ_Rq41_aOVdH6uAY766Pi2BRk858q2jwaM-2bfvwA0DuNNNFvCO6Kbz85vRG2QYM4qP5y8t_wpi8DeeQwVHKbwXYF7RYwE9Gb7yJn47pnB8ijV7g9M-DO3IE/s1600/SINUCA.jpg


        O garoto descobre o talento da sinuca quando, a pedido de sua mãe, vai fazer compras no Bar Paulistinha. Com o início de uma chuva, ele é obrigado a ficar no estabelecimento, onde alguns homens estão jogando sinuca, entre eles Vitorino, que fica amigo do jovem. O menino, mais baixo pela idade, pega um caixote e coloca na beira da mesa, sobe nele para assistir ao jogo. Então tem a oportunidade de jogar, vai aprendendo, jogando, e, aos poucos, se torna um taco, como eram chamados os bons jogadores.

        No seguinte trecho, João Antônio descreve como foi a descoberta do garoto: “Joguei, joguei muito, levado pela mão de Vitorino, joguei demais. Porque Vitorino era um bárbaro, o maior taco da Lapa e uma das maiores bossas de São Paulo. Quando nos topamos Vitorino era um taco. Um cobra. E para mim, menino que jogava sem medo, porque era um menino e não tinha medo, o que tinha era muito jeito, Vitorino ensinava tudo, não escondia nada”.

        Porém, a vida do novo jogador de sinuca entra em confronto com suas obrigações escolares e as preocupações de sua mãe. Ele começa a cabular aulas, tem discussões com a mãe e foge pela janela de casa para jogar. Agora a jogatina vale dinheiro, Vitorino torna-se uma espécie de agenciador do garoto, arrumando adversários, fazendo grana e passando sua fama no boca a boca dos botecos suburbanos.

        O menino tentava largar o “joguinho”, como é descrito no trecho: “Larguei uma, larguei duas, larguei muitas vezes o joguinho. Entrava nos eixos. No colégio melhorava, tornava-me outro, me ajustava ao meu nome”.

        Porém, Vitorino, sedento por mais dinheiro e por ver o menino jogar, voltava para convencer o garoto a retornar ao salão. “Vitorino arrumava um jogo bom, me vinha buscar. Eu desguiando, desguiando, resistia. Ele dando em cima. Se papai estava fora, eu acabava na mesa. Tornava à mesa com fome das bolas, e era: uma piranha, um relógio, um bárbaro. Jogando como sabia”.

        Porém, a preocupação da mãe com o menino é representada em seu ápice quando, em uma das sessões de jogatina no bar, ela aparece com a marmita para o filho. O garoto vê aquela cena, a mãe saindo de cortinhas verdes com sua comida em mãos, não aguenta e começa a chorar. É acudido pelos seus companheiros de sinuca, “Que é? Que é isso? ô Meninão!”. Então promete a si mesmo que vai abandonar o jogo novamente. De forma lírica, João Antônio encerra o conto: “Larguei as coisas e fui saindo. Passei a cortina, num passo arrastado. Depois a rua. Mamãe ia lá em cima. Ninguém precisava dizer que aquilo era um domingo... Havia namoros, havia vozes e havia brinquedos na rua, mas eu não olhava. Apertei meu passo, apertei, apertando, chispei. Ia quase chegando. Nossas mãos se acharam. Nós nos olhamos, não dissemos nada. E fomos subindo a rua”.

Fontes: ANTÔNIO, João. Malagueta, Perus e Bacanaço. São Paulo: Cosac Naify, 2004.

Entendendo o conto:

01 – Qual é o nome do autor do conto "Meninão do Caixote"?

      O autor do conto é João Antônio.

02 – Onde o garoto descobre seu talento na sinuca?

      O garoto descobre seu talento na sinuca no Bar Paulistinha.

03 – Quem se torna amigo do garoto e o ensina a jogar sinuca?

      Vitorino se torna amigo do garoto e o ensina a jogar sinuca.

04 – O que acontece com o garoto em relação à escola e à mãe depois que ele começa a jogar sinuca?

        O garoto começa a cabular aulas, tem discussões com a mãe e foge pela janela de casa para jogar sinuca.

05 – O que a mãe faz que representa sua preocupação com o filho durante uma sessão de jogatina no bar?

      A mãe aparece com a marmita para o filho durante uma sessão de jogatina no bar, demonstrando sua preocupação.

06 – O que o garoto decide fazer após a cena com a mãe no bar?

      O garoto decide abandonar o jogo de sinuca novamente.

07 – Como o conto termina e o que isso representa?

      O conto termina com o garoto e a mãe se encontrando na rua e subindo juntos, em silêncio. Isso representa um momento de reconciliação e a decisão do garoto de deixar o mundo da sinuca para trás, voltando à sua família e suas responsabilidades.

 

CONTO: DOM QUIXOTE - FRAGMENTO - MIGUEL DE CERVANTES - COM GABARITO

 Conto: Dom Quixote – Fragmento

Tremei, gigantes do mundo!

        Com certeza, vocês já ouviram falar de Dom Quixote. Contam que viveu há muitos séculos em uma aldeia de La Mancha, entre campos de trigo e moinhos de vento. O que talvez vocês não saibam é que Dom Quixote não se chamava assim desde criança pois, na verdade, havia sido batizado com o nome de Alonso Quijano. Até fazer cinquenta anos, a ideia de ter outro nome nem passou pela cabeça do senhor Alonso. Porém, um belo dia, decidiu fazer-se cavaleiro andante, e para isso pôs em si mesmo o nome de Dom Quixote de La Mancha. A partir daquele momento, sua vida mudou para sempre.

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg6imJJ0gFX9MEzOZB23zW7soS_CAOqsxgLEkBlE1uVoDVapMx84RkfTPDYpAq5eQGzZPNA4AwV0kWajqF6Y4MTHXE5j2EHwtWbsg5TwxI4M1rgIQppQi0EO5B58AaOApOjsnWpERTqDv0GfhXH67SOY9cCzfJ3JzMofFzVK50WWMLXUC-QYynure9Z37g/s320/DOM%20QUIXOTE.jpg


        Tudo começou por culpa dos livros. O senhor Alonso adorava ler. Gostava de poemas de amor e de romances de pastores, de histórias de viagens e dos versos que falam de mouros e cristãos. Mas o que o punha louco mesmo eram os livros de cavalaria. Hoje, ninguém mais lê esses livros, mas na época de Dom Alonso eram o maior sucesso.

        Os livros de cavalaria contavam as aventuras de sujeitos muitíssimo valentes que se faziam chamar de “cavaleiros andantes”. Iam pelas estradas a cavalo, com uma lança na mão, uma espada pendurada no cinto e um escudo apertado contra o peito. Procuravam criaturas perversas a quem derrotar e órfãos e viúvas a quem defender. Dormiam nos bosques sob um manto de estrelas e sonhavam com lindas princesas a quem haviam jurado amor eterno. E não passavam nem um dia sem lutar contra algum bando de arruaceiros, contra um feiticeiro que os tivesse perseguindo ou contra um dragão cuspidor de fogo. Um bom cavaleiro andante estava disposto a dar a vida pelos outros e não temia nem a morte em pessoa. Certa vez, o cavaleiro Brandibarbado das Brancas Mãos deu de cara no meio do bosque com um gigante alto como uma torre, que lhe disse aos berros:

        –Venha aqui, cavaleiro, e lute comigo se se atreve!

        É claro que ele se atreveu! Brandibarbado sacou a espada, saltou no pescoço do gigante e o despachou para o outro mundo num piscar de olhos. Ah! A vida dos cavaleiros andantes era maravilhosa! Ou, pelo menos, assim pensava o senhor Alonso Quijano.

        [...]

        O fato é que o senhor Alonso gostava tanto dos livros de cavalaria que deixou de comer e de dormir, para ficar só lendo. [...]

        – Serei um cavaleiro andante!

        Me chamarei Dom Quixote de La Mancha e irei pelas estradas em busca de aventuras. Em dois dias, matarei mais gigantes do que o Imperador Carlos Magno em toda sua vida. E os órfãos e as viúvas me beijarão os pés, de tanta ajuda que vou lhes dar!

        Não havia dúvida: Dom Alonso estava louco de pedra! Na idade dele, melhor seria dar uma voltinha no campo, sair para conversar com o padre e com o barbeiro da sua aldeia, tomar sopa quente e dormir muito.

CERVANTES, Miguel de. Era uma vez Dom Quixote. Adaptação de Agustín Sánches Aguilar. Tradução de Marina Colasanti. São Paulo: Global, 2005.

Entendendo o conto:

01 – Quem é o protagonista do conto e qual nome ele adotou quando decidiu tornar-se um cavaleiro andante?

      O protagonista do conto é Alonso Quijano, que adotou o nome de Dom Quixote de La Mancha quando decidiu tornar-se um cavaleiro andante.

02 – O que motivou Alonso Quijano a mudar seu nome para Dom Quixote de La Mancha e se tornar um cavaleiro andante?

      Alonso Quijano mudou seu nome e se tornou Dom Quixote de La Mancha por sua paixão por livros de cavalaria que o inspiraram a buscar aventuras e se tornar um cavaleiro andante.

03 – Qual gênero de livros Dom Quixote mais gostava de ler?

      Dom Quixote mais gostava de ler livros de cavalaria.

04 – O que os livros de cavalaria descreviam sobre os cavaleiros andantes?

      Os livros de cavalaria descreviam os cavaleiros andantes como sujeitos valentes que cavalgavam em busca de aventuras, enfrentavam criaturas perversas, defendiam órfãos e viúvas, sonhavam com princesas e não tinham medo de lutar contra inimigos como gigantes e dragões.

05 – O que aconteceu com Alonso Quijano devido a sua obsessão por ler livros de cavalaria?

      Alonso Quijano deixou de comer e dormir devido à sua obsessão por ler livros de cavalaria.

06 – O que Dom Quixote afirmou que faria como cavaleiro andante?

      Dom Quixote afirmou que iria pelas estradas em busca de aventuras, mataria gigantes e ajudaria órfãos e viúvas. Ele estava disposto a dar a vida pelos outros.

07 – Como os outros reagiram à decisão de Dom Quixote de se tornar um cavaleiro andante?

      As outras pessoas, incluindo o narrador, acharam que Dom Quixote estava louco de pedra devido à sua decisão de se tornar um cavaleiro andante em sua idade, e acreditavam que seria melhor ele cuidar de si mesmo, descansar e conversar com as pessoas da aldeia.