Artigo de opinião: Evento esportivo não é lugar de manifestação política
Um
evento como um jogo de futebol serve a manifestações políticas? Eu acho que não
Eu não gosto da obrigação de tocar o
Hino Nacional antes de eventos esportivos. Na Copa São Paulo de Futebol Júnior,
no mês passado, os caras tocavam o hino inteiro antes do jogo. Tipo cinco
minutos de música. Não vejo necessidade, não acho que patriotismo funciona
enfiando um hino goela abaixo de torcedores. Me incomoda também saber que o
hino é uma lei estadual, uma interferência da Assembleia Legislativa no rito
esportivo.
Quando política e esporte se misturam
dá ruim. Vou poupá-los dos detalhes, mas basta olhar nossos últimos grandes
eventos para entender que essas duas substâncias não devem ser consumidas ao
mesmo tempo. O que me leva à minha primeira grande preocupação de 2018: é ano
eleitoral.
Nos Estados Unidos, Colin
Kaepernick, jogador da NFL, a liga de futebol americano, resolveu se ajoelhar
durante o hino americano para protestar contra a forma como a polícia trata os
negros. Trump ficou pistola, os torcedores conservadores também, considerando
um desrespeito ao hino. Independentemente do que você, leitor, ache, Kaepernick
está desempregado. Nenhum time quis esse “troublemaker” no elenco. Como eu
estava dizendo, quando esporte e política se misturam…
Será que o evento esportivo é um local
apropriado para manifestações políticas? Eu acho que não. Olhando por todos os
lados, não vejo motivos para politizar o esporte.
Do ponto de vista do atleta: ele veste
uma camisa que não é dele (que, aliás, ele largará por um salário melhor), uma
camisa que representa torcedores que caem por todo o espectro político. A
câmera e o microfone só estão apontados para aquele jogador por causa da camisa
que ele está vestindo e de sua performance esportiva.
Não acho justo ele hackear esse
momento, pelo qual está sendo pago, para levar adiante causas pessoais. É para
isso que existe a rede social: ali, o jogador faz o que quiser. No campo? Ele
está para entreter e representar até mesmo os torcedores que votam e pensam
diferente.
Acho também que temos de respeitar os
espaços destinados à diversão, senão nosso mundo vai ficar ainda mais maluco. Imagine
só: você chega em casa cansado, abre uma garrafa de vinho e ela grita “Fora,
Temer!”. O catupiry da pizza veio em forma de letras “Lula preso amanhã”, e
ainda usaram uma calabresa para fazer a letra O. A gente precisa respirar.
Você liga no basquete, no vôlei, no
futebol para ter umas duas horas de paixão, suspense, humor.
Do mesmo jeito que você escolhe uma
série no Netflix ou assiste a uma novela. É um desligamento da realidade; nosso
cérebro precisa dessa quase meditação para aguentar o dia seguinte. E aí você
senta para ver um jogo e esfregam um hino na sua cara, como se aqui fosse uma
“república popular”, e seu jogador favorito resolve lacrar na hora de comemorar
o gol do título do seu time. É justo? Não.
Tem muita coisa contaminada por aí.
Precisamos imunizar o pouco espaço que ainda temos de diversão. Textão é no
Facebook. Deixem o esporte em paz.
LEIFERT, Tiago. GQ
Brasil, 226 fev. 2018. Disponível em: https://gq.globo.com/Colunas/Tiago-Leifert/noticia/2018/02/evento-esportivo-não-e-lugar-de-manifestacao-politica.html.
Acesso em: 27 mar. 2020.
Fonte: Língua
Portuguesa – Se liga nas linguagens – Área do conhecimento: Linguagens e suas
Tecnologias – Ensino Médio – 1ª edição – São Paulo, 2020 – Moderna – p. 36-8.
Entendendo o artigo de
opinião:
01 – Tiago Leifert defende a
tese de que “quando política e esporte
se misturam dá ruim”.
a) Você concorda com a tese defendida pelo autor? Por quê?
Resposta pessoal do aluno.
b) Como argumento para reafirmar sua tese, o autor sugere aos leitores que se lembrem de eventos esportivos anteriores. Considerando o momento histórico em que o texto foi escrito (ano de 2018), faça uma pesquisa rápida e descubra: a quais grandes eventos o autor estaria se referindo?
Á Copa do Mundo FIFA de futebol masculino, realizada em 2014 no
Brasil, e aos Jogos Olímpicos, realizados no Rio de Janeiro (RJ) em 2016.
c) Por qual motivo o autor elege esses eventos como ilustrações de sua tese de que política e esporte não devem se misturar?
Por se tratarem de eventos esportivos caracterizados por decisões
políticas que levaram a denúncias de superfaturamento e desvios de recursos.
d) Elabore uma contra argumentação a essa tese, buscando estabelecer contrapontos que indiquem aspectos positivos da realização dos megaeventos esportivos no país.
Resposta pessoal do aluno.
02 – No quinto parágrafo, o
autor afirma que o atleta “veste uma
camisa que não é dele [...], uma camisa que representa torcedores que caem por
todo o espectro político”.
a) Em sua opinião, o fato de o atleta representar torcedores com diferentes posições políticas justifica a negação de sua manifestação política em campo? Por quê?
Resposta pessoal do aluno.
b) Colin Kaepernick se manifestou, em campo, contra a violência policial dispensada aos negros de seu país. Qual é a sua opinião sobre esse tipo de protesto?
Resposta pessoal do aluno.
c) Tiago Leifert se posiciona contrariamente à manifestação política do atleta estadunidense. Quais são os argumentos utilizados pelo jornalista para sustentar sua opinião?
O autor defende que o atleta é contratado para entreter torcedores
de todas as posições políticas, incluindo aqueles que votam e pensam diferente
dele, e que, por isso, não deve se aproveitar da exposição midiática para expor
ou defender causas próprias ou pessoais.
d) Levando em consideração os motivos de Kaepernick para realizar o protesto, como você avalia a opinião do jornalista?
Resposta pessoal do aluno.
03 – O artigo de opinião de
Tiago Leifert expressa seu posicionamento sobre as relações entre política e
esporte. Retome a leitura e identifique expressões que estejam introduzindo
juízos de valor.
Sugestão: “Eu não
gosto da”, “Não vejo necessidade”, “Me incomoda também", “minha primeira
grande preocupação”, “Não acho justo”.
04 – Analise a posição
social ocupada por Tiago Leifert. Qual é o impacto dessa posição no poder de
convencimento de sua argumentação e na formação da opinião pública?
O autor era
apresentador de um programa esportivo de grande audiência e, dessa forma, suas
declarações acabam tendo muita repercussão e poder de convencimento na formação
da opinião pública.
05 – Leifert afirma que o
presidente americano Donald Trump “ficou pistola” e que considerou o protesto
de Kaepernick um desrespeito ao hino do país.
a) Qual é o significado dessa gíria no texto?
“Ficar pistola”, no texto, tem o significado de “ficar bravo”,
“reprovar o protesto”.
b) Identifique outras gírias ou expressões informais usadas pelo autor. Em sua opinião, qual é o papel delas no texto?
“Os caras”; “goela abaixo”; “dá ruim”, “hackear”; “mais maluco”;
“lacrar”; “textão”; entre outras. O uso das gírias estabelece um vínculo
afetivo com o leitor e cria uma imagem de um locutor descolado, menos careta e
informal.
06 – Identifique a relação
de causa e consequência estabelecida por Leifert ao relator o caso do protesto
de Kaepernick.
O jogador
protestou, o presidente e os torcedores conservadores desaprovaram e
consideraram um desrespeito ao hino e, por isso, Kaepernick foi demitido.
07 – Com qual propósito
Leifert construiu essa relação?
Ao estabelecer
uma relação direta entre a empregabilidade do atleta e a expectativa de atuação
acrítica, Leifert confirma sua opinião de que não é boa a mistura entre
política e esporte e legítima a punição.
08 – No sexto parágrafo, o
autor faz a seguinte afirmação: “Não
acho justo ele hackear esse momento, pelo qual está sendo pago, para levar
adiante causas pessoais”.
a) Qual é o significado, no contexto, atribuído à expressão “hackear esse momento”?
Refere-se ao ato de sequestrar dos espectadores e torcedores a
possibilidade de apreciarem o esporte de uma forma tida como legítima.
b) Qual é a sua opinião a respeito dessa afirmação?
Resposta pessoal do aluno.
c) Suponha, por exemplo, que as manifestações políticas dos atletas sejam proibidas para evitar esse “hackeamento”. Tente imaginar quais seriam as consequências dessa proibição para os atletas.
Resposta pessoal do aluno. Sugestão: Uma suposta censura política,
no sentido de coibir o “hackeamento” da experiência do “consumidor” do
espetáculo esportivo, implicaria o apagamento das identidades políticas desses
atletas, de sua liberdade de expressão e do exercício de sua plena cidadania.