Texto: Inteligência é fundamental
Você abriria mão da sua inteligência para ser mais bonito? Tem gente que sim, numa boa. Vaidade descontrolada, consumismo, culpa da mídia, que expõe padrões estéticos irreais, ou intolerância? Pense um pouco – e, para isso, beleza não ajuda.
Bia Santanna
“Apesar de saber que a inteligência é o
que conta no final, certamente trocaria um pouco da minha por beleza. Acho que
teria menos conflitos, melhoraria minha autoestima. Na balada, por exemplo, não
tem jeito: todo mundo procura gente bonita”, assume Alexandre Ribeiro, de 19
anos, que diz estar sempre de regime e preocupado com a pele e o cabelo.
Do outro lado do front, o estudante
Ivan Petrich, de 17 anos, acredita que “de cara, a beleza ajuda muito mais que
o fato de ser inteligente”. E completa: “Já consegui várias coisas na vida por
ser ‘mais ajeitadinho’, por pior que isso possa soar. Na noite, por exemplo,
sempre pego umas meninas mais bonitas e levo a melhor numa disputa com um cara
considerado mais feio”.
Verdade seja dita: a garota que tem a
pele malcuidada ou o cara com vários quilinhos a mais despertam menos interesse
numa festa, por exemplo. Mas a obsessão da rapaziada com a beleza e a vaidade
descontrolada não estão virando loucura? Não é exagero, pra dizer o mínimo,
aceitar de bom grado trocar inteligência por beleza, ainda mais sabendo que a
beleza estética é limitada pelo tempo e a inteligência não? E se alguém parasse
pra conversar com a garota espinhuda ou com o cara gordinho na festa não
poderia se surpreender com outro tipo de beleza – aquela que não se põe na
mesa?
Na versão de 2005 do Dossiê Universo
Jovem, uma pesquisa da MTV com brasileiros de 15 a 30 anos para detectar
tendências e entender comportamentos, 60% dos 2.359 entrevistados acreditam que
pessoas bonitas têm mais oportunidade na vida. Mais que isso: cerca de 350
delas abririam mão de 25% do conhecimento acumulado para serem 25% mais
bonitos. Numa interpretação livre dos dados, dá pra dizer, entre aspas mesmo,
que “eles preferem ser bonitos e burros a inteligentes e feios”.
A busca por um visual mais descolado,
magro e malhado parece ter mais importância do que ser inteligente, acumular
conhecimento, se embrenhar em cursos legais e aprender línguas pelo mundo. Numa
espécie de Teoria da Evolução às avessas, vivemos num mundo onde,
aparentemente, só os bonitos sobrevivem. E a vaidade estética ganha de lavada
da vaidade intelectual, como se ninguém mais pensasse em ler um bom livro,
fazer uma faculdade legal ou aprender a tocar um instrumento. O negócio é ser
bonito, custe o que custar, e ponto. Há dezenas de reality shows mundo afora
que, quanto maior a mudança estética dos candidatos, maior o ibope. Mas não há
nenhum em que você possa ficar enfurnado numa casa durante um mês, que seja,
alimentando a alma com informação, lendo livros incríveis, tendo palestras com
filósofos inspiradores, conversando com poetas e escritores escolhidos a dedo e
escutando só sonzeira da boa.
“Infelizmente, beleza abre muitas
portas. Pode ver, todo mundo é pressionado por essa ditadura da magreza, está
sempre fazendo mil dietas, se acabando na academia. Eu já fiz plástica pra
reduzir os seios. Não tinha problema de coluna nem nada, mas achava que assim
ia ficar mais bonita”, conta Regiane Ferreira, de 21 anos, que entrou
tranquilamente em uma concorrida universidade pública do interior paulista.
“Claro que não queria ficar burra, mas acho que, sei lá, se trocasse um pouco
da minha inteligência por um pouco de beleza não ia ter que ficar me matando
por um monte de coisas, estudando feito louca. Eu ia ser modelo e pronto!”.
“A beleza pode ser um caminho mais
fácil para você mostrar que é também inteligente. Quando se é bonito todo mundo
parece mais interessado nas coisas que você tem a dizer”, afirma o estudante de
Engenharia Elétrica Lucas Micheletto Sobral, de 22 anos, que emagreceu 20 Kg e
viu tudo a sua volta mudar. “O mundo dá muito mais chances e atenção a quem é
magro ou bonito. A forma como os outros me tratam mudou junto com o meu corpo.
Até quando vou comprar roupa as vendedouras são mais atenciosas do que eram”.
Afinal, beleza é mesmo fundamental?
Sim, pra muita gente é. No Orkut, por exemplo, existem pelo menos 11
comunidades (com quase 3 mil participantes) que defendem esse mundo “mais
belo”. Até aí tudo bem. O problema é a busca pelo padrão de beleza se torna o
único projeto de vida de uma pessoa. Porque as loucuras, doenças e obsessões
que vêm como efeito colateral não costumam ser nada belas.
Em 2003, depois de ser recusada na
última etapa de uma entrevista de emprego porque “meu perfil de beleza não se
encaixava no da empresa”, a paulista Viviane Vicente entrou em depressão. Não
teve dúvidas: largou a faculdade e se internou num SPA. “Até então meus 80 Kg
não incomodavam, mas depois de ouvir que meus cursos, estudos e até os testes
da entrevista não bastavam para conseguir a vaga, fiquei neurótica”, conta. Tão
neurótica que ganhou mais 70 Kg e se juntou aos mais de 800 mil pacientes por
ano que recorrem à cirurgia plástica no Brasil. “Fiz várias cirurgias, redução
da mama, reconstrução de umbigo, dez lipos nas costas, lipoescultura e até
redução de estômago. Não pensava em mais nada, parei de sair com meus amigos.
Só queria ser magra e bonita”. Depois de quase ficar bulímica, ela acredita que
são os próprios jovens que se impõem essa neurose de ser bonito. “A menina vê
uma outra mais bonita na praia, e ainda o namorado olha para essa outra também,
pronto: já quer ser igual. Só pensa nisso”.
Hoje, com 60 Kg a menos, Viviane
retomou os estudos e botou na cabeça a real: o que importa é estar bem consigo
mesmo – essa é uma vaidade positiva, que não tem nada a ver com padrões
estabelecidos ou com o que os outros pensam sobre você.
Revista MTV, set.
2005.
Fonte: Língua Portuguesa. Viva
Português. 9° ano. Editora Ática. Elizabeth Campos. Paula Marques Cardoso.
Silvia Letícia de Andrade. 2ª edição. 2011. P. 159-62.
Entendendo o texto:
01 – De acordo com o texto,
qual o significado das palavras abaixo:
·
Bulímico: que sofre de bulimia.
·
De
bom grado: com satisfação.
·
Dossiê: conjunto de documentos e informações a respeito de uma
pessoa, um grupo, uma instituição, etc.
·
Front: campo de batalha.
·
Embrenhar-se: aprofundar-se, estudar com dedicação.
02 – Faça em seu caderno, um
quadro colocando as respostas dadas pelos entrevistados, com relação a estas
três perguntas:
·
Beleza
ou inteligência?
·
Que
reocupações tem ou teve para ficar mais bonito(a)?
·
Qual
a vantagem de ser bonito(a)?
a)
Alexandre Ribeiro, 19 anos.
Beleza; Está sempre de regime e preocupa-se com a pele e com o
cabelo; Quem é bonito tem menos conflitos, melhora a autoestima e se dá bem nas
baladas.
b)
Ivan Petrich, 17 anos.
Beleza; O texto não apresenta nenhuma; A beleza facilita as coisas
muito mais do que a inteligência.
c)
Regiane Ferreira, 21 anos.
Beleza; Fez plástica para reduzir os seios; Se fosse bonita seria
modelo e não precisaria se esforçar por mais nada.
d)
Lucas Micheletto Sobral, 22 anos.
Beleza; Emagreceu 20 Kg; As pessoas ficam mais interessadas no que
as pessoas bonitas têm a dizer.
e)
Viviane Vicente.
Beleza; Redução da mama, reconstrução do umbigo, dez lipos nas
costas, lipoescultura e redução de estômago; Atende-se ao padrão autoimposto
pelos jovens.
03 – Nas situações abordadas
pela reportagem, a preocupação dos jovens entrevistados é com a satisfação
pessoal ou com a opinião dos outros? Justifique sua resposta.
Com exceção de
Viviane, que aprendeu que o que importa é estar bem consigo mesma, os demais
pensam na beleza como forma de conquistar as demais pessoas, seja essa
conquista profissional ou afetiva.
04 – De 1 a 5, que grau de
importância você atribui a beleza?
1 = nenhuma; 2 = alguma; 3 =
moderada; 4 = grande; 5 = excessiva.
Resposta pessoal
do aluno.
05 – Ao longo da reportagem,
verificamos que a autora apresenta um contraponto a cada depoimento, a fim de
questionar algumas ideias comuns entre os jovens. Indique no caderno os trechos
em que ela rebate cada um dos depoimentos transcritos a seguir:
Depoimento
1: “Claro que não queria ficar burra, mas acho que, sei lá, se trocasse um
pouco da minha inteligência por um pouco de beleza não ia ter que ficar me
matando por um monte de coisas [...]” (Regiane Ferreira).
a) Opinião da autora.
“Não é exagero, pra dizer o mínimo, aceitar de bom grado trocar
inteligência por beleza, ainda mais sabendo que a beleza estética é limitada
pelo tempo e a inteligência não?”.
b) O que pensa o grupo? É um “bom negócio” trocar inteligência por beleza?
Resposta pessoal do aluno. Sugestão: O mais importante é que os
alunos relacionem os dados e formem uma opinião sobre o assunto, ainda que
limitada a princípio.
Depoimento
2: “Pode ver, todo mundo é pressionado por essa ditadura da magreza, está
sempre fazendo mil dietas, se acabando na academia”. (Regiane Ferreira).
a) Opinião da autora.
“A busca por um visual mais decolado, magro e malhado parece ter
mais importância do que ser inteligente, acumular conhecimento, se embrenhar em
cursos legais e aprender línguas pelo mundo.”
b) O que pensa o grupo? A busca por um visual bonito é mais importante que a busca pelo conhecimento, pelo desenvolvimento da inteligência?
Resposta pessoal do aluno. Sugestão: É possível aliar beleza e
conhecimento/inteligência. O problema é quando a beleza passa a tomar todos os
espaços da vida da pessoa.
Depoimento
3: “Fiz várias cirurgias, redução de mama, reconstrução de umbigo, dez
lipos nas costas, lipoescultura e até redução de estômago. Não pensava em mais
nada, parei de sair com meus amigos. Só queria ser magra e bonita”. (Viviane
Vicente).
a) Opinião da autora.
“O problema é a busca pelo padrão de beleza se tornar o único
projeto de vida de uma pessoa. Porque as loucuras, doenças e obsessões que vêm
como efeito colateral não costumam ser nada belas.”
b) O que pensa o grupo? Vale tudo para ser mais bonito?
Resposta pessoal do aluno.
06 – No quarto parágrafo são
apresentadas informações que reforçam as constatações dos três parágrafos
anteriores. Em que se baseiam as informações do quarto parágrafo?
Na versão 2005 do Dossiê Universo Jovem,
uma pesquisa da MTV feita com brasileiros de 15 a 30 anos.
07 – De acordo com os dados
do Dossiê Universo Jovem, mais de 50% dos jovens abriria mão de 25% da
inteligência para ser 25% mais bonito?
Não. Segundo o
Dossiê, 350 dos 2.359 entrevistados fariam isso, ou seja, cerca de 15%.
08 – Copie no caderno a(s)
alternativa(s) correta(s): A reportagem “Inteligência é fundamental” apresenta
os seguintes elementos:
·
As causas da valorização da beleza.
·
Um histórico sobre o assunto.
·
Depoimentos de pessoas que nunca se
preocuparam com o padrão de beleza vigente e nunca foram infelizes por isso.
·
Depoimentos de pessoas que jamais trocariam a
inteligência pela beleza.
·
Provas de que as consequências da busca
desenfreada pelo padrão de beleza não são nada agradáveis.
Resposta pessoal
do aluno. Sugestão: Nenhuma das alternativas estão corretas.
09 – Com base na sua
resposta ao exercício anterior, copie no caderno a afirmativa correta.
a)
O texto trata o tema de forma aprofundada,
mostram-se resultados de uma rigorosa pesquisa sobre o assunto, confronto de
ideias, depoimentos de especialistas.
b)
O texto trata o tema de forma
superficial, restringindo-se a apresentar depoimentos com praticamente o mesmo
ponto de vista.