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terça-feira, 23 de outubro de 2018

CRÔNICA: MENINO DE CIDADE - PAULO MENDES CAMPOS - COM GABARITO

Crônica: Menino de cidade
                                           Paulo Mendes Campos

    -- Papai, você deixa eu ter um cabrito no meu sítio?
        -- Deixo.
  -- E porquinho-da-índia? E ariranha? E macaco? E quatro cachorros? E duzentas pombas? E um boi? Um rinoceronte?
        -- Rinoceronte não pode.
        -- Tá bem, mas cavalo pode, não pode?
        O sítio é apenas um terreno do estado do Rio, sem maiores perspectivas imediatas. Mas o garoto precisa acreditar no sítio, como outras pessoas precisam acreditar no céu. O céu dele é exatamente o da festa folclórica, a bicharada toda, e ele, que nasceu no Rio e, de má vontade, vive nessa cidade sem animais.
        Aliás, ele mesmo desmente que o Rio seja uma cidade sem bichos, possuindo o dom de descobri-los nos lugares mais inesperados. Se entra na casa de alguém, desaparece ao transpor a porta, para voltar depois de três segundos com um gato ou cachorro na mão. A gente vai andando por uma rua em Copacabana, ele some e ressurge com um pinto em flor. É chegar na Barra da Tijuca, e daí a cinco minutos, já apanhou um siri vivo.
        Localiza eletronicamente todos os animais da redondeza, anda pela rua em disparada, cumprimenta aqui um papagaio, ali um ganso, mais adiante um gato, incansável e frustrado.
        Não distingue marcas de automóvel, em futebol não vai além de Garrincha e Nilton Santos, mas sabe perfeitamente o que é um mastiff, um boxer, um doberman. Dá informações sobre as pessoas de acordo com os bichos que possuam: aquele é o dono do Malhado, aquela é a dona do Lord... Ao telefone, pergunta por patos, gatos, e outros cachorros, centenas, milhares de cachorros, cachorros que prefere aos companheiros, cachorros que o absorvem na rua, na escola, na hora das refeições, cachorros que costumam latir e pular em seus sonhos, cachorros mil.
        Sua literatura é rigorosamente especializada: livros coloridos sobre bichos. Engatinha mal e mal na leitura, mas fala com uma proficiência um pouco alarmante a respeito de répteis, batráquios etc. Filho de mãe inglesa, confunde forke knife, mas sabe o que é seal e walrus. Se pede um pedaço de papel é para desenhar a zebra ou a baleia.
        É claro que sua frustração causa pena. Por isso mesmo, há algum tempo, ganhou como consolo um canarinho-da-terra. Um dia, como lhe dissessem que iam dar o passarinho, caso continuasse a comportar-se mal, correu para a área e abriu a porta da gaiola.
        Deram-lhe um bicudo, mas o bicudo morreu de tanto alpiste. Ganhou, mais tarde, uma tartaruga, pequenina e estúpida, que recebeu na pia do banheiro o nome de Henriqueta. Nunca qualquer outro quelônio deu tanto serviço. Foi ao dentista na cidade, e, ao voltar, disse ao pai, pela primeira vez, uma palavra horrível: estou desesperado. Tinha perdido a tartaruguinha no lotação.
        Ficou o vazio em sua vida. O alívio era ligar o telefone interurbano para a avó e indagar pelos patos que “possuía” em outra cidade. Ou fazer uma visita à futura mãe de Poppy, este é um poodle que deverá nascer daqui a meio ano, prometido de pedra e cal para ele.
        Outro expediente: caçar borboletas, mariposas, grilos, alojar carinhosamente os insetos nas gaiolas vazias, chamar-lhes pelos nomes dos antigos bichos mortos ou desaparecidos.
        Um tio deu-lhe outra vez um canário, o carinho foi demais, o passarinho morreu. Não há nada a fazer, por enquanto, e ele dedicou-se à arte de desenhar bichos. De vez em quando, ainda se anima e entra em casa afogueado, mostrando alguma coisa invisível nas mãos: “Olha que estouro de grilo!”
        Mas os grilos e as borboletas legais morrem ou saem tranquilamente das gaiolas, e ei-lo novamente de mãos e alma vazias.
        Deu um jeito: arranjou alguns pires sem uso e plantou sementes de feijão. O banheiro está cheio de brotos verdes, tímidos. E ele já sabe que possui uma fazenda.
                  Fonte: Mello, M. A., org. 2003. Nossas palavras.
RJ, José Olympio.

Entendendo a crônica:
01 – O interesse do menino pelos animais é retratado logo nos primeiros parágrafos da crônica. O que, na fala do garoto, comprova esse fato?
        -- Papai, você deixa eu ter um cabrito no meu sítio?
        -- Deixo.
        -- E porquinho-da-índia? E ariranha? E macaco? E quatro cachorros? E duzentas pombas? E um boi? Um rinoceronte?
        -- Rinoceronte não pode.

02 – No sexto parágrafo, o narrador afirma que o sítio ao qual o menino se refere é apenas um terreno no estado do Rio de Janeiro.
a)   Levante hipótese: Por que o menino chama o terreno de sítio?
Porque gosta muito de animais e é um sonhador, tem muita imaginação.

b)   Para o narrador, “O garoto precisa acreditar no sítio, como outras pessoas precisam acreditar no céu”. Por que para o menino, o sítio é uma espécie de céu?
É algo que quer muito, por isso sonha com o sítio.

03 – Na crônica lida, o narrador além de relatar fatos, também expressa opiniões.
a)   De quem é a opinião sobre a inexistência de animais na cidade do Rio de Janeiro?
Do autor da crônica.

b)   O menino também tem sua opinião? Por quê?
Não. Porque acredita no sítio e sempre encontra algum animal para fazer companhia.

c)   No penúltimo parágrafo, que trecho expressa, nas palavras do narrador, o sentimento de frustração do menino por não conviver com animais?
“Mas os grilos e as borboletas legais morrem ou saem tranquilamente das gaiolas.”

04 – O narrador se empenha em mostrar a maneira como o garoto vê o mundo.
a)   Que conhecimento o menino tem sobre marcas de automóvel? E sobre raças de cachorro?
O menino não distingue marcas de automóvel, mas sabe perfeitamente o que é um mastiff, um boxer, um doberman.

b)   O menino se refere às pessoas como “o dono do Malhado”, “a dona do Lord”, etc. o que isso revela sobre os interesses dele?
Revela que ele se interessa pelos animais, por isso sabe o nome dos animais e não do dono.

05 – Embora o narrador não informe a idade do menino, é possível notar que se trata de uma criança em fase de aprendizagem de leitura e da escrita. Que elementos do texto comprovam esse dado sobre o garoto?
      Sua literatura é rigorosamente especializada: livros coloridos sobre bichos. “... Engatinha mal e mal na leitura.”

06 – Na realidade, o menino ganha alguns animais, sendo um deles um canarinho-da-terra.
a)   Na sua opinião, por que, diante da ameaça de que, se continuasse a se comportar mal, ia dar o passarinho, o menino resolve soltar a ave?
Ele preferiu dar a liberdade ao passarinho, do que vê-lo preso na gaiola em outra casa onde talvez as pessoas não cuidassem tão bem, como ele.

b)   De que maneira o menino trata os outros animais de estimação que ganha?
Ele dá tanto carinho que os animais morrem.

07 – O menino vive em uma grande cidade e, por isso, não convive com animais tanto quanto gostaria.
a)   Quem é Poppy?
Poppy é um poodle que deverá nascer daqui a meio ano, prometido de pedra e cal para ele.

b)   Que importância tem os insetos para o menino?
Ele adora caçar borboletas, mariposas, grilos e aloja-los nas gaiolas vazias, chamando-os pelos nomes dos antigos bichos mortos ou desaparecido.

c)   As tentativas do garoto de conviver com animais o deixam satisfeito? Por quê?
Não. Porque agora dedicou-se à arte de desenhar bichos.

08 – No final do texto, o menino começa a plantar semente de feijão. Segundo o narrador, os brotos verdes que enchem o banheiro o levam a sentir-se dono de uma “fazenda”.
a)   O que a fazenda de brotos de feijão representa para o menino?
Representa as plantações do sítio.

b)   Do início para o fim do texto, o principal desejo do menino se modifica? Justifique sua resposta.
Sim. A princípio se interessava por animais e no final por plantas.

c)   O título da crônica, “menino de cidade”, é compatível com as características do garoto e com o final da história? Por quê?
Sim, é compatível. A criança criada na idade cria a fantasia dos animais e até das plantações.




terça-feira, 3 de julho de 2018

CRÔNICA: MENDIGO - PAULO MENDES CAMPOS - COM GABARITO

Crônica: Mendigo
                Paulo Mendes Campos


    Eu estava diante de uma banca de jornais na Avenida, quando a mão do mendigo se estendeu. Dei-lhe uma nota tão suja e tão amassada quanto ele. Guardou-a no bolso, agradeceu com um seco obrigado e começou a ler as manchetes dos vespertinos. Depois me disse:
        – Não acredito um pingo em jornalistas. São muito mentirosos. Mas tá certo: mentem para ganhar a vida. O importante é o homem ganhar a vida, o resto é besteira.
        Calou-se e continuou a ler as notícias eleitorais:
        – O Brasil ainda não teve um governo que prestasse. Nem rei, nem presidente. Tudo uma cambada só.
        Reconheceu algumas qualidades nessa ou naquela figura (aliás, com invulgar pertinência para um mendigo), mas isso, a seu ver, não queria dizer nada:
        – O problema é o fundo da coisa: o caso é que o homem não presta. Ora, se o homem não presta, todos os futuros presidentes serão ruínas. A natureza humana é que é de barro ordinário. Meu pai, por exemplo, foi um homem bastante bom. Mas não deu certo ser bom durante muito tempo: então ele virou ruim.
        Suspeitando de que eu não estivesse convencido da sua teoria, passou a demonstrar para mim que também ele era um sujeito ordinário como os outros:
        – O senhor não vê? Estou aqui pedindo esmola, quando poderia estar trabalhando. Eu não tenho defeito físico nenhum e até que não posso me queixar da saúde.
        Tirei do bolso uma nota de cinquenta e lhe ofereci pela sua franqueza.
        – Muito obrigado, moço, mas não vá pensar que eu vou tirar o senhor da minha teoria. Vai me desculpar, mas o senhor também no fundo é igualzinho aos outros. Aliás, quer saber de uma coisa? Houve um homem de fato bom. Chamava-se Jesus Cristo. Mas o senhor viu o que fizeram com ele?

                             Para gostar de ler. Vol. 2. São Paulo: Ática, 1978.

Entendendo a crônica:
01 – Sobre a crônica, assinale a afirmativa correta.
a) Intenciona levar o leitor a refletir sobre a relação homem e qualidade de vida.
b) Aborda um momento na vida do mendigo, leitor de jornais, que se posiciona frente às manchetes.
c) Contrasta características inerentes a presidentes com as inerentes a jornalistas.
d) A fala do mendigo, ao usar a si mesmo como exemplo de sujeito ruim, é um argumento incoerente.
e) O cronista, no final do texto, mantém a mesma percepção do mendigo tida no início.

02 – As frases “Não acredito um pingo em jornalistas.” E “São muito mentirosos.” Guardam implícita uma relação de sentido de causa/consequência. Reescrevendo-as em um único período e conservando esse sentido, ficaria:
a) Não acredito um pingo em jornalistas, embora sejam muito mentirosos.
b) Não acredito um pingo em jornalistas, por serem muito mentirosos.
c) Não acredito um pingo em jornalistas, apesar de serem muito mentirosos.
d) Não acredito um pingo em jornalistas, mas são muito mentirosos.
e) Não acredito um pingo em jornalistas, portanto são muito mentirosos.

03 – Assinale a alternativa que apresenta a mesma ideia contida no seguinte trecho: “Meu pai, por exemplo, foi um homem bastante bom. Mas não deu certo ser bom durante muito tempo: então ele virou ruim.”
a) “Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.”
b) “O homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.”
c) “Um galo sozinho não tece uma manhã;
Ele precisará sempre de outros galos.”
d) “Como dois e dois são quatro
Sei que a vida vale a pena
Embora o pão seja caro
E a liberdade pequena.”
e) “Amigos para sempre
É o que nós iremos ser
Na primavera
E em qualquer das estações”

04 – Leia a frase abaixo:
        “Tirei do bolso uma nota de cinquenta e lhe ofereci pela sua franqueza.”
Com relação a essa atitude do narrador, pode-se afirmar que o mendigo:
a) passa a admirá-lo pelo gesto solidário.
b) começa a enxergá-lo como um ser menos nocivo à
c) sociedade.
d) não o vê melhor do que antes, apesar da doação.
e) se coloca inferior ao narrador ao receber tamanha quantia.



terça-feira, 9 de janeiro de 2018

CRÔNICA: O CARIOCA E A ROUPA - PAULO MENDES CAMPOS - COM GABARITO


CRÔNICA: O CARIOCA E A ROUPA
                       Paulo Mendes Campos

     [...] Deu-se comigo outro dia uma experiência engraçada: fui ao centro da cidade de blusa, coisa que me aconteceu várias vezes, mas só então acrescida de um pormenor que introduziu um caráter inédito à situação: levava debaixo do braço uma pasta de papéis, feita de nylon.
     Sim, pela primeira vez fui à cidade de blusa e pasta. Qualquer um desses fatores quase nada significa isoladamente; reunidos, alteraram radicalmente o tratamento que me deram todas as pessoas desconhecidas.
     Quando tomei um táxi, vi que o motorista torceu a cara, mas não percebi o que se passava, pois experimentei semelhante má vontade em outras circunstâncias. Reparei também certa estranheza do motorista quando lhe dei de gorjeta o troco, mas permaneci opaco ao fenômeno social que se realizava. Em um restaurante comum, sentei-me para almoçar. O garçom, que até então eu não vira mais gordo, tratou-me com uma intimidade surpreendente e, em vez de elogiar os pratos pelos quais eu indagava, entrou a diminuí-los: “aqui a gororoba é uma coisa só; serve para encher o bandulho”. Não sou de raciocínio rápido mas, em súbita iluminação, percebi, com todo o prazer da novidade, que eu estava vestido de mensageiro: pasta e blusa. Ao longo da tarde, fui compreendendo que, até hoje, não tinha a menor ideia do que é ser um mensageiro. Pois eu lhes conto. Um mensageiro é, antes de tudo, um triste. Tratado com familiaridade agressiva pelos epítetos de “amigo”, “chapa” e “garotão”, o que há de afetivo nestes nomes é apenas um disfarce, pois atrás deles o tom de voz é de comando. “Quer deixar o papai trabalhar, garotão”, disse-me o faxineiro de um banco, cutucando-me os pés com a ponta da vassoura.
     Entendi muitas outras coisas humildes: o mensageiro não tem direito a réplica; é barrado em elevadores de lotação ainda não atingida; posto a esperar sem oferecimento de cadeira; atendido com um máximo de lentidão; olhado de cima para baixo; batem-lhe com vigor no ombro para pedir passagem; ninguém lhe diz “obrigado” ou “por favor”; prestam-lhe informações em relutância; as mulheres bonitas sentem-se ofendidas com o olhar de homenagem do mensageiro; os vendedores lhe dizem “não tem” com um deleite sádico.
     Foi uma incursão involuntária à natureza de uma sociedade dividida em castas. Preso à minha classe e a algumas roupas, dizia o poeta, vou de branco pela rua cinzenta. No fim da tarde, eu já procedia como um mensageiro, só me aproximando dos outros com precauções e humildade, recolhendo de meu rosto qualquer veleidade de um sorriso inútil, jamais correspondido. Dentro de mim uma vontade de sofrer. Por todos os mensageiros do mundo, meus irmãos. Por todos os meus irmãos para os quais a humilhação de cada dia é certa como a própria morte. Porque o pior de tudo é que as pessoas não sorriam. O pior é que ninguém sorri para os mensageiros.
               CAMPOS, Paulo Mendes. Crônicas. São Paulo: Ática,1982. (Para gostar de ler,5).

Entendendo o texto:

01 – Esse texto foi escrito há algum tempo. Estar “vestido de mensageiro” corresponde a que profissão hoje em dia?
       Essa profissão corresponde à profissão de office boy, boy (há também a forma aportuguesada “bói”) ou contínuo. Hoje. Normalmente, quem realiza as funções do mensageiro é a motoboy.

02 – Segundo o texto, o motorista do táxi “torceu a cara” ao narrador da história. Em sua opinião, que razões ele teria para fazê-lo?
     Ele, talvez, estivesse imaginando que o “mensageiro” não teria dinheiro para pagar a corrida; ou que ele não iria ganhar gorjeta, pois “mensageiros” não devem ter dinheiro de sobra.

03 – O garçom não destratou o “mensageiro”. Entretanto, o narrador sentiu que o tratamento a ele oferecido era inadequado. O que teria sido desagradável no episódio com o garçom?
     O narrador não gostou da inesperada intimidade do garçom, bem como das palavras desagradáveis que ele utilizou para se referir à comida, como “gororoba” e “bandulho”.

04 – Você acha que o “mensageiro” sofreu discriminação? Justifique sua resposta.
     A discriminação fica explícita no tratamento que o narrador recebe do motorista, do garçom e do faxineiro. No 4º parágrafo, o narrador enumera outras várias situações em que ele viveu o preconceito sofrido pelos mensageiros.

05 – “Entendi muitas outras coisas humildes”, afirma o narrador. De acordo com o texto, quais são elas?
     Foram as situações descritas pelo narrador no 4º parágrafo, como não ter direito a réplica;
      Ser barrado em elevadores; esperar sem que uma cadeira seja oferecida; ser atendido com lentidão; ser olhado de cima para baixo, etc.

06 – Você acha que, nos dias de hoje, os mensageiros sofrem essas mesmas discriminações? Justifique sua resposta.
     Resposta pessoal.

07 – Ao escrever a frase “Pois eu lhes conto”, o autor se refere a quem? Com que intenção ele fez esse tipo de referência?
     Refere-se ao leitor. A intenção é aproximar-se mais do leitor.






quinta-feira, 25 de maio de 2017

CRÔNICA: O "S" DO PROBLEMA - PAULO MENDES CAMPOS - COM GABARITO

CRÔNICA - O "S" DO PROBLEMA
                 Paulo Mendes Campos
O jovem engenheiro, desde estudante, dividira o tempo entre os livros e os exercícios atléticos, do gênero força e saúde. Assim, quando viu que o encarregado da obra era um português que não tinha mais tamanho, gostou. Gostou porque os fortes se entendem e só confiam na força. Mas uma soturna rivalidade foi também se criando entre os dois. Que, entre dois fortes, fica infalivelmente suspensa no ar a tentação de saber quem é o mais forte. Um dia, o engenheiro chamou o encarregado:
– Mande dois homens para arrancar a moldura do concreto da laje.
O português sorriu com menoscabo:
– Dois homens, doutor?! Eu cá num abrir de olhos faço a coisa.
E zás-trás, plac-ploc, o encarregado foi arrancando com violência as peças de madeira que protegiam o concreto, enquanto o doutor o contemplava na faina hercúlea, entre embevecido e safado da vida. Aquilo lhe chegava como um desafio pessoal e ameaça à autoridade.
Três dias depois, parte-se a peça de ferro que prende a caçamba ao guincho. O engenheiro arranjou um bom pedaço de ferro retilíneo e foi ao português:
– Faça um S com este ferro.
O homem foi saindo com a barra na mão.
– Ei, onde você vai?
– Vou fazer o S no torno.
O engenheiro tomou-lhe a barra.
– Torno? Pra que torno?
Zás-trás, plac-ploc, sob o olhar pasmado do português, nosso amigo fez da peça de ferro um S perfeito.
– Tome isto. E fique sabendo que quem manda aqui sou eu! Tá?
(Paulo Mendes Campos)

Marque a única opção correta.
1. “O jovem engenheiro, desde estudante, dividira o tempo entre os livros e os exercícios atléticos, do gênero força e saúde.” Nesta passagem, o narrador nos leva a concluir que ele:
a.( ) critica o jovem engenheiro porque, como estudante, ele só devia estudar.
b.( ) ridiculariza o jovem engenheiro, porque força bruta não vai bem com capacidade intelectual.
c.( ) elogia o jovem engenheiro por fazer a união entre competência profissional e força física.
d.( ) louva o jovem por aproveitar o tempo livre em exercícios atléticos, ao invés de ficar sem fazer nada.
e.( ) considera irrelevante o fato de o jovem engenheiro ter-se dedicado também a exercícios atléticos.
2. “Soturna rivalidade” é o mesmo que rivalidade:
a.( ) permanente
b.( ) aparente
c.( ) ostensiva
d.( ) irracional
e.( ) dissimulada
3. Com a resposta: “… Eu cá num abrir de olhos faço a coisa”, o português revela-se:
a.( ) insubordinado
b.( ) competente
c.( ) orgulhoso
d.( ) prestativo
e.( ) ofendido
4. “Zás-trás, plac-ploc”, a onomatopeia dá ideia de:
a.( ) força
b.( ) rapidez
c.( ) concentração
d.( ) falta de jeito
e.( ) cautela
5. “Tá?”, esta expressão final, típica da linguagem popular, dá a entender que o engenheiro:
a.( ) fazia uma pergunta
b.( ) mostrava dúvidas
c.( ) afirmava categoricamente
d.( ) exclamava contente
e.( ) queria ouvir a opinião de outra pessoa.



sábado, 4 de março de 2017

TEXTO: SER BROTINHO - PAULO M.CAMPOS E TEXTO: SER GAGÁ - MILLÔR FERNANDES - COM GABARITO


  TEXTO I

 Ser brotinho não é viver em um píncaro azulado; é muito mais! Ser brotinho é sorrir bastante dos homens e rir interminavelmente das mulheres, rir como se o ridículo, visível ou invisível, provocasse uma tosse de riso irresistível.
                                                             (CAMPOS, Paulo Mendes. Ser brotinho.
     In: SANTOS, Joaquim Ferreira dos (org.). As cem melhores
 Crônicas brasileiras. Rio de Janeiro: Objetiva, 2005.p.91.)
    
TEXTO II
  
  Ser gagá não é viver apenas nos idos do passado: é muito mais! É saber que todos os amigos já morreram e os que teimam em viver são entrevados. É sorrir, interminavelmente, não por necessidade interior, mas porque a boca não fecha ou a dentadura é maior que a arcada.
                                                       (FERNANDES, Millôr. Ser gagá. In: SANTOS,
 Joaquim Ferreira dos (org.). As cem melhores crônica brasileiras.                                                              Rio de Janeiro: Objetiva, 2005.p.225.) 

     Os textos utilizam os mesmos recursos expressivos para definir as fases da vida, entre eles:
a)     Expressões coloquiais com significados semelhantes.
b)    Ênfase no aspecto contraditório da vida dos seres humanos.
c)     Recursos específicos de textos escritos em linguagem formal.
d)    Termos denotativos que se realizam com sentido objetivo.
e)     Metalinguagem que explica com humor o sentido de palavras.

RESOLUÇÃO: Trata-se, em ambos os textos, de explicar, com ironia e humor, o sentido de expressões como “ser brotinho” e “ser gagá”. Resposta: E