quinta-feira, 13 de maio de 2021

MÚSICA(ATIVIDADES): EU GOSTO DELA - EMICIDA - COM GABARITO

 MÚSICA(ATIVIDADES): EU GOSTO DELA

                                                Emicida

Bem leonina, menina, mandona

Linda, sabe da sina, mina valentona

Fina, cheia de razão, rainha, foliona

Ela descortina o novo e bota fim na zona

Teu olhar ilumina, abomina o cafona

Amazona e bailarina, toda bonitona (pá)

Ela é purpurina, skinny e pakitona (tá bem)

9 da matina, um café na poltrona (ó)

Dona da rotina, mamãe corridona

Defina efeito sanfona, se acha esquisitona

Cafeína, Maracujina, moça respondona

Feiona em dia ruim, mas sempre bela dona

Maestrina do lar e popstar, Madona

Sou fina dança, opina, sorri e faz carona

Quer ser minha pequenina e pro mundo grandona

Meu negócio da China, caipira, brigona

 

Eu gosto tanto dela, a ponto de querer

tá perto, pronto

Não tem outro jeito de me ver sorrir

É louco o efeito dela aqui

Eu gosto tanto dela, a ponto de querer

tá perto, pronto

Não tem outro jeito de me ver sorrir

É louco o efeito dela aqui

 

Grita igual buzina em dia nervosona

Santa sem batina, ganha tranquilona

Hipnotiza a retina, flash, figurona

Estrela maior do show, se precisar, machona

Fria igual neblina, alegre e fanfarrona

Brilha igual platina, prima, sabichona

Ave de rapina e musa pras telona

 

No ritmo, atina e lá vai corona

Ela é paz pra Palestina, fé pra Babilônia

Respeito, disciplina, boba e brincalhona

Estriquinina a TPM, vira felizona

Ela abre o circo, ela recolhe a lona

Diz que tá gelatina e malha pegadona

Vira destaque da piscina, satisfeita mona

Messalina, corajosa, do lar e chorona

Faz tudo quando quer

Eita, mulher durona!

Eu gosto tanto dela, a ponto de querer

tá perto, pronto

Não tem outro jeito de me ver sorrir

É louco o efeito dela aqui

 

Eu gosto tanto dela, a ponto de querer

tá perto, pronto

Não tem outro jeito de me ver sorrir

É louco o efeito dela aqui

 

EMICIDA. Eu gosto dela. Intérprete: Emicida. In: Emicidio. Mixtape, selo: Laboratório Fantasma, 2010. 1 CD. Faixa 12.

Fonte: Livro: Língua Portuguesa: linguagem e interação/ Faraco, Moura, Maruxo Jr. – 3.ed. São Paulo: Ática, 2016. p. 118-119.

Glossário:

ave de rapina: designação comum a diversas aves carnívoras, como gaviões, águias, falcões e, por extensão de sentido, pessoa ambiciosa, exploradora.

descortinar: descobrir.

"estriquinina": referência a estricnina, substância estimulante do sistema nervoso central e usada como veneno.

messalina: mulher devassa, sensual; libertina.

mona: pessoa do sexo feminino, mulher; forma de tratamento entre homossexuais.

pakitona: provável referência às paquitas, garotas que faziam parte de um grupo de assistentes de palco e dançarinas de um extinto programa de TV.

skinny: palavra em inglês que significa 'muito magro'.

Entendendo a canção

1.   O verso "Ela abre o circo, ela recolhe a lona" o que o eu lírico quis dizer?

Ele quis dar a ideia de que esse ser amado, que é enaltecido e admirado ao longo de toda a letra, é pessoa disposta a ajudar ou a fazer tudo, mostra-se aplicada em muitas e diferentes tarefas.

A própria repetição do pronome ela contribui para reforçá-la como sujeito das ações verbais. Fim da observação.

      2.Identifique, na primeira estrofe, os trechos descritivos que compõem a figura feminina da canção.

        Leonina, menina, mandona, linda, valentona, fina, cheia de razão, rainha, foliona, amazona, bailarina, bonitona, purpurina, skinny, pakitona.

3.No texto da canção, há três comparações. Identifique-as.

        Grita igual buzina em dia nervosona, fria igual neblina, brilha igual platina.

    4. O que o eu lírico quer dizer quando fala que ela é "Meu negócio da China"?

"Negócio da China" tem o sentido de fazer um negócio muito lucrativo e, por analogia, pode ter o sentido de que a relação amorosa com o ser amado é valiosa, "lucrativa" afetivamente falando.

 5. Qual é o sentido do verso "É louco o efeito dela aqui"?

A palavra louco nesse contexto (de linguagem mais informal, menos elaborada, de gíria) assume o sentido de extraordinário, raro, incomum, o que pode levar à dedução de que a presença (o efeito) dela aqui é extraordinária.

6. Releia o texto atentando para as rimas no fim dos versos e procure explicar a linguagem empregada neste verso: "Ave de rapina e musa pras telona".

As rimas ocorrem com a terminação -ona das palavras no fim dos versos, e telona, que se refere à tela de cinema, rima com a palavra final dos demais versos.

7. Por que podemos dizer que a canção se focaliza uma mulher idealizada

Porque a letra da canção fala das características da mulher que conduzem a uma idealização.

8. Chamamos de vassalagem amorosa o fato de o eu lírico masculino colocar-se em posição subalterna à mulher, como um vassalo, um súdito. Comprove com um verso dessa canção.

O eu lírico confessa: "Eu gosto tanto dela, a ponto de querer tá perto, pronto / Não tem outro jeito de me ver sorrir".

9. Responda qual é o sentido conotativo destes termos destacados:

E o riachinho de água esperta (texto 2, verso 21)

Diz que tá gelatina [...] (texto 3, verso 37)

Esperta: que corre com vigor; gelatina, no contexto, significa flácida.

10. Você já ouviu a expressão efeito sanfona (texto 3, verso 10)? Esse termo é usado com sentido conotativo. Procure explicar o que ele significa.

O efeito sanfona, também conhecido como fenômeno do ioiô, ocorre quando o indivíduo perde peso por meio de dieta (incluindo atividades físicas ou não) e, pouco tempo depois, recupera o peso perdido. Nesse ritmo, a conformação corporal da pessoa sofre frequentes reduções e ganhos de peso. A palavra sanfona, em seu sentido denotativo, designa um "instrumento musical dotado de um fole pregueado que se comprime ou distende movimentando o ar, que, ao ser expelido, faz vibrar as lâminas metálicas da palheta [...]" (Dicionário Aurélio). Por analogia, a perda e o ganho de peso constantes são associados ao movimento típico da sanfona, daí o termo efeito sanfona.

 

MÚSICA(ATIVIDADES): FEITO PRA ACABAR - MARCELO JENECI - COM GABARITO

 MÚSICA(ATIVIDADES): FEITO PRA ACABAR

                                                            Marcelo Jeneci

Quem me diz

Da estrada que não cabe onde termina

Da luz que cega quando te ilumina

Da pergunta que emudece o coração

 

Quantas são

As dores e alegrias de uma vida

Jogadas na explosão de tantas vidas

Vezes tudo que não cabe no querer

 

Vai saber

 Se olhando bem no rosto do impossível

O véu, o vento o alvo invisível

Se desvenda o que nos une ainda assim

 

A gente é feito pra acabar

Ah Aah

 

 A gente é feito pra dizer

Que sim

A gente é feito pra caber

No mar

E isso nunca vai ter fim.

JENECI, Marcelo. Feito pra acabar. Intérprete: Marcelo Jeneci. In: Feito pra acabar. [S.l.]: Som Livre, 2010. 1 CD. Faixa 13. FONTE: Andrea Ebert/Arquivo da editora.

 Fonte: Livro: Língua Portuguesa: linguagem e interação/ Faraco, Moura, Maruxo Jr. – 3.ed. São Paulo: Ática, 2016. p.115/116.

Entendendo a canção

1.   Uma canção é um gênero textual que se parece bastante com outro gênero de texto que você conhece. Qual?

O poema.

2.   Em sua opinião, o que "é feito pra acabar"?

Resposta pessoal.

 

3.  A letra da canção de Marcelo Jeneci é, como muitos textos líricos, marcada pelo emprego intenso de figuras de linguagem. Que figura de linguagem que se destaca nessa canção?

É a antítese: ela consiste em reunir em um só enunciado ideias ou imagens opostas, em geral para ressaltar o contraste entre elas ou criar efeitos de sentido como a contradição.

4.Identifique exemplos de antíteses na letra da canção e tente explicar o significado delas.

As antíteses traduzem o estado de espírito do eu lírico: ao mesmo tempo que se sente cheio de vida (isso é bem marcado na segunda estrofe), parece também perceber que tudo precisa ter fim, inclusive a própria vida (marcado, por exemplo, pelo verso "A gente foi feito pra acabar").

   5.Que outras figuras de linguagem presentes na letra de Feito pra acabar?

A aliteração e a anáfora. As duas estão ligadas principalmente à sonoridade, ao ritmo.

 

 

 

quarta-feira, 12 de maio de 2021

CRÔNICA: VERGONHA PARCELADA - GREGORIO DUVIVIER - COM GABARITO

 CRÔNICA: VERGONHA PARCELADA

                Gregorio Duvivier

NÃO ESTRANHE se você me vir levando as mãos ao rosto no meio da rua e gritando comigo mesmo: "Não! Não, Gregorio! Por que você fez isso, cara?". Sofro de uma síndrome comum: a da vergonha parcelada. Algumas situações me causam tanto embaraço que pago por elas a vida inteira. A cada vez que uma vergonha antiga me vem à cabeça, sofro como se fosse a primeira vez que estivesse sofrendo.

Não parecem vergonhas monumentais, são vergonhas ridículas - mas é isso o que faz delas monumentais. Exemplo: no aeroporto de Congonhas, pedi um café. "Carioca?" - a moça perguntou. "Sou", respondi, achando que ela queria saber minha procedência.

A moça pensou que eu tinha feito uma piadinha péssima e retribuiu. Tive vontade de me esconder debaixo dos bancos do salão de embarque pelo simples fato de que alguém no mundo tinha achado que eu era uma pessoa que faria aquele tipo de piada. Até hoje, só passo em frente à Casa do Pão de Queijo de Congonhas com uma mochila escondendo o rosto.

Outro dia, chovia a cântaros - deve fazer um bom tempo, porque faz um bom tempo que não chove a cântaros. Acenava desesperadamente para os táxis, em frente ao Shopping da Gávea. Eis que um sujeito surge e começa a fazer o mesmo, alguns passos à minha frente. Todo ser humano civilizado sabe que, a partir do momento em que uma pessoa acena para os táxis, os outros candidatos têm que se posicionar atrás dela. Na frente, nunca. Revoltado, intercedi: "Amigo, desculpa, cheguei antes". Ao que ele respondeu, humilde: "Tô chamando táxi pra você. Sou segurança do shopping". E conseguiu um táxi, e abriu a porta pra mim, e eu entrei, e ele bateu a porta, e junto com a porta se abateu sobre mim o peso da miséria humana.

Encontrei um amigo de longa data. Não lembrava seu nome, e ainda hoje não lembro - talvez fosse Marcelo. Consegui disfarçar chamando o amigo de  brother, até que sua namorada me perguntou: "Há quanto tempo você conhece o Marcelo?". Respondi: "Desculpa, não sei de quem você tá falando". O Marcelo em questão, perplexo, me observava com um misto de tristeza pelo esquecimento e espanto pela minha estupidez.

Enquanto escrevo essa crônica, algumas vezes precisei interromper a digitação para levar as mãos ao rosto e exclamar, em voz alta: "Não! Não, Gregorio! Por que você fez isso, cara?".

DUVIVIER, Gregorio. Vergonha parcelada. Folha de S.Paulo, 6 abr. 2015. Caderno Ilustrada, p. E5.

Fonte: Livro: Língua Portuguesa: linguagem e interação/ Faraco, Moura, Maruxo Jr. – 3.ed. São Paulo: Ática, 2016. p.90-1.

 Fonte da imagem -https://www.google.com/url?sa=i&url=http%3A%2F%2Fblog.clubecafe.net.br%2Fvoce-conhece-os-tipos-mais-tradicionais-de-cafezinho%2F&psig=AOvVaw1rx22t8J5d2WeQmqhfemJI&ust=1620944737663000&source=images&cd=vfe&ved=0CAIQjRxqFwoTCPDLxPCXxfACFQAAAAAdAAAAABAD

Entendendo o texto

1. Nessa crônica de Gregorio Duvivier, não narra um único fato.

a) Responda: quantos e quais fatos são narrados ao longo da crônica?

Há três pequenas histórias contadas: o episódio do café, o táxi no dia de chuva e o esquecimento do nome do amigo.

b) O que parece conectar os fatos narrados uns aos outros?

 A conexão é estabelecida pela ideia geral da crônica, que o cronista propõe discutir: a existência de atitudes que tomamos e das quais nos envergonhamos sempre que nos lembramos delas.

c) Você já passou por experiências semelhantes à apresentada na crônica, a de sentir "vergonhas parceladas"? Em caso afirmativo, relate alguma dessas situações.

Resposta pessoal.

2. Em algumas passagens do texto, o enunciador se mostra explicitamente como um "eu". Releia o trecho a seguir e responda às questões.

“Sofro de uma síndrome comum: a da vergonha parcelada. Algumas situações me causam tanto embaraço que pago por elas a vida inteira. A cada vez que uma vergonha antiga me vem à cabeça, sofro como se fosse a primeira vez que estivesse sofrendo.” (linhas 4-8)

a) Que palavras explicitam o enunciador no trecho acima?

 As formas verbais de primeira pessoa do singular (sofro, pago, sofro, estivesse sofrendo) e o emprego do pronome me.

b) No início da crônica há também marcas que se referem explicitamente ao enunciatário (aquele a quem se destina o texto). Localize-as.

No primeiro parágrafo, a forma verbal de imperativo negativo "não estranhe", o pronome você e a forma verbal vir, exatamente no início do texto: "Não estranhe se você me vir [...]".

c) Em sua opinião, o que justificaria o emprego dessas formas que tornam explícito tanto o enunciador quanto o enunciatário? Que efeito de sentido elas provocam no texto?

Resposta pessoal. Sugestão: Perceber que a expressão tanto do enunciador quanto do enunciatário, por meio de formas linguísticas explícitas, constitui um recurso de linguagem que simula o diálogo, cujo objetivo é aproximar autor e leitores. O efeito de sentido é a aproximação entre os dois, o que gera o convite à reflexão, a partir de situações do cotidiano.

3. Costuma-se dizer que a crônica é um gênero ligado ao relato e à representação de situações do cotidiano. De que forma a crônica de Gregorio Duvivier confirma essa ideia?

Resposta pessoal. Sugestão: É por meio de fatos corriqueiros, como pedir um café, chamar um táxi num dia de chuva e não se lembrar do nome de um antigo conhecido, que o autor da crônica procura levar os leitores a refletir sobre a temática central apresentada: as vergonhas parceladas.

 

CRÔNICA: BRILHANTE, ADAMASTOR - ANTONIO PRATA - COM GABARITO

 CRÔNICA: BRILHANTE, ADAMASTOR        

                        Antonio Prata

Este ano o verão demorou a chegar e parece querer compensar o atraso trabalhando dobrado. Subo a Angélica de carro e vejo um amigo a pé, pela calçada. Ele sua, bufa e resmunga qualquer coisa, provavelmente contra o sol, a gravidade, nossa condição bípede, Deus e todos os santos. Dou uma buzinada, abro o vidro, pergunto aonde vai, diz que ao fórum de Pinheiros. Vou para perto, ofereço uma carona. Ele salta pra dentro do carro e logo fico sabendo que sua infelicidade tem menos a ver com verão do que com o vizinho, um sujeito de maus bofes chamado Adamastor.

Meu amigo é educado e pacífico. Não cito seu nome, pois é réu num processo aberto pelo tal Adamastor no Tribunal de Pequenas Causas; não quero prejudicá-lo. Vamos chamá-lo de Ivo, nome que me parece adequado a um sujeito educado e pacífico. Assim como Adamastor cabe perfeitamente a um homem ignorante e agressivo - e vejam a coincidência, pois Adamastor é mesmo o nome do vizinho, que faço questão de citar para que se cubra de infâmia. Adamastor. Adamastor. Adamastor.

Ivo mora numa casa térrea. A casa fica de lado pra rua, de frente pra um jardinzinho comprido e prum muro de quatro metros de altura. Do outro lado do muro vive o Adamastor, mas Ivo nunca se lembra disso ao abrir a porta, todas as manhãs, pois entre o Adamastor e meu amigo, além do muro, há uma enorme trepadeira, uma tela verde de 4 x 10 metros, que o próprio Ivo plantou faz uma década, e ali está a embelezar sua vista e purificar o ar da cidade.

Se todos tivessem trepadeiras como a do Ivo, talvez não fizesse tanto calor. Talvez o verão não demorasse a chegar nem estivesse trabalhando dobrado. Talvez ainda houvesse garoa. Talvez o mundo estivesse salvo. Mas o mundo não está salvo, há menos trepadeiras do que sujeitos feito o Adamastor que, vejam só, encasquetou que a planta deixa sua casa úmida e que o Ivo precisa arrancá-la.

Eu disse que o Ivo era educado e pacífico. Não minto. Quando o Adamastor apareceu, trazendo o cunhado para intimidar, meu amigo ouviu calmamente sua queixa. Disse que ia chamar um engenheiro capaz de dizer se a trepadeira era a culpada pela umidade e, caso se confirmasse a suspeita, ele a cortaria. "É a trepadeira!", afirmou o Adamastor, com aquele pequeno gozo sadomasoquista de quem acredita que o próprio sofrimento é fruto única e exclusivamente do prazer alheio e que, uma vez exterminada a alegria do outro, seu incômodo cessará, na triste matemática dos egoístas, onde só existe a soma zero.

Pois bem, meu amigo chamou não um nem dois, mas três engenheiros. Todos disseram, na frente do Adamastor, que a trepadeira é inocente. Que a umidade vem do chão, do lado da casa do querelante, mas Adamastor não aceita e, 15 dias atrás, ao abrir a porta, Ivo encontrou, além da trepadeira, uma intimação judicial. Adamastor está levando a trepadeira aos tribunais. Não lhe importam a engenharia, a botânica, a lógica. O negócio é pessoal. Com seu nome de gigante e sua alma de gnomo, ele vai até o fim, até arrancar a trepadeira, até deixar o mundo um pouquinho pior e poder gozar, em sua toca úmida e abafada, o triunfo de sua mediocridade. Brilhante, Adamastor.

PRATA, Antonio. Brilhante, Adamastor. Folha de S.Paulo, São Paulo, 8 fev. 2012. Caderno Cotidiano. Disponível em: folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/24685-brilhante-adamastor.shtml. Acesso em: ago. 2015.

Fonte: Livro: Língua Portuguesa: linguagem e interação/ Faraco, Moura, Maruxo Jr. – 3.ed. São Paulo: Ática, 2016. p.82-5. 

"Adamastor é o nome de um gigante mitológico, citado pelo poeta Luís de Camões em seu poema épico Os lusíadas. Nesse poema, que narra uma das primeiras viagens marítimas empreendidas pelos portugueses ao redor do continente africano, o gigante Adamastor tenta destruir os navios portugueses num dos pontos do percurso da viagem. Na mitologia dessa obra poética, Adamastor representa os perigos naturais enfrentados pelos navegadores ao longo de sua jornada. Na crônica de Antonio Prata, o nome Adamastor remete metaforicamente a esse gigante. Veja como Camões descreve Adamastor:

De disforme e grandíssima estatura,

O rosto carregado, a barba esquálida,

Os olhos encovados, e a postura

Medonha e má, e a cor terrena e pálida,

Cheios de terra e crespos os cabelos,

A boca negra, os dentes amarelos."

CAMÕES, Luís Vaz de. Os lusíadas. 13ª ed. São Paulo: Melhoramentos, [s.d].

Glossário:

esquálido: imundo; desalinhado.

LEGENDA: O gigante Adamastor, em escultura de Julio Vaz Júnior (1877-1963) instalada no miradouro de Santa Catarina, em Lisboa.FONTE: © JB-2078/Alamy/Other Images

ENTENDENDO A CRÔNICA

1. Na crônica, qual evento pode ser considerado o motivo que desencadeia a sucessão de ações? Justifique sua resposta.

O encontro entre os dois amigos. É o encontro que desencadeia a história narrada e comentada na crônica.

2. Duas das personagens presentes no texto podem ser consideradas centrais - o protagonista e o antagonista.

a) Quem são elas?

     Ivo e Adamastor.

b) Por que estão em oposição uma à outra?

   Há uma disputa entre elas por causa da trepadeira, o que as coloca em posições antagônicas.

3. Uma das características que o enunciador atribui a Ivo é ser educado e pacífico. Vamos relacioná-la ao desenvolvimento da crônica.

a) Que ações empreendidas por essa personagem poderiam justificar a atribuição dessa característica?

A tentativa de negociar o corte da trepadeira com o vizinho Adamastor.

b) Em pelo menos duas passagens do texto, essa característica é explicitada e reforçada. Releia os trechos:

I.

Meu amigo é educado e pacífico. Não cito seu nome, pois é réu num processo aberto pelo tal Adamastor no Tribunal de Pequenas Causas; não quero prejudicá-lo. Vamos chamá-lo de Ivo, nome que me parece adequado a um sujeito educado e pacífico. [...] (linhas 12-17)

II.

Eu disse que o Ivo era educado e pacífico. Não minto. [...] (linhas 39-40)

Em sua opinião, por que a insistência nessa característica?

Ao insistir nessa característica de Ivo, ressalta-se, por contraste, a característica de Adamastor: a truculência.

4. O desfecho do texto é construído com ironia. Releia-o a seguir, observando especialmente os trechos em destaque:

 [...] Com seu nome de gigante e sua alma de gnomo, ele vai até o fim, até arrancar a trepadeira, até deixar o mundo um pouquinho pior e poder gozar, em sua toca úmida e abafada, o triunfo de sua mediocridade. Brilhante, Adamastor. (linhas 59-64)

a)   Explique a ironia, em destaque.

          A ironia forma-se pelo contraste entre o sentido do enunciado "[...] até deixar o mundo um pouquinho pior [...]" e o elogio que encerra a crônica, "Brilhante, Adamastor".

b) Em sua opinião, o que leva o autor da crônica a esse desfecho irônico?

    Resposta pessoal. Sugestão: Perceber que a atitude irônica se deve ao fato de o autor criticar as ações empreendidas pelo vizinho - mesmo sabendo que a trepadeira não é a responsável pela umidade da casa, ele insiste em que ela seja destruída.

 

 

 

 

 

CONTO: LUZ DE LANTERNA, SOPRO DE VENTO - MARINA COLASANTI - COM GABARITO

 CONTO: LUZ DE LANTERNA, SOPRO DE VENTO

                  Marina Colasanti

         Tendo o marido partido para a guerra, na primeira noite da sua  ausência a mulher acendeu uma lanterna e pendurou-a do lado de fora da casa. “Para trazê-lo de volta”, murmurou. E foi dormir.

        Mas, ao abrir a porta na manhã seguinte, deparou-se com a lanterna apagada. “Foi o vento da madrugada”, pensou olhando para o alto como se pudesse vê-lo soprar.

       À noite, antes de deitar, novamente acendeu a lanterna que, a distância, haveria de indicar ao seu homem o caminho de casa.

      Ventou de madrugada. Mas era tão tarde e ela estava tão cansada que nada ouviu, nem o farfalhar das árvores, nem o gemido das frestas, nem o ranger da argola da lanterna. E de manhã surpreendeu-se ao encontrar a luz apagada.

       Naquela noite, antes de acender a lanterna, demorou-se estudando o céu límpido, as claras estrelas. “Na certa não ventará”, disse em voz alta, quase dando uma ordem. E encostou a chama do fósforo no pavio.

       Se ventou ou não, ela não saberia dizer. Mas antes que o dia raiasse não havia mais nenhuma luz, a casa desaparecia nas trevas.

        Assim foi durante muitos e muitos dias, a mulher sem nunca desistir acendendo a lanterna que o vento, com igual constância, apagava.

        Talvez meses tivessem passado quando num entardecer, ao acender a lanterna, a mulher viu ao longe, recortada contra a luz que lanhava em sangue no horizonte, a escura silhueta de um homem a cavalo. Um homem a cavalo que galopava na sua direção.

       Aos poucos, apertando os olhos para ver melhor, distinguiu a lança erguida ao lado da sela, os duros contornos da couraça. Era um soldado que vinha. Seu coração hesitou entre o medo e a esperança. O fôlego se reteve por instantes entre os lábios abertos. E já podia ouvir os cascos batendo sobre a terra, quando começou a sorrir. Era seu marido que vinha.

          Apeou o marido. Mas só com um braço rodeou- -lhe os ombros. A outra mão pousou na empunhadura da espada. Nem fez menção de encaminhar-se para a casa.

        Que não se iludisse. A guerra não havia acabado. Sequer havia acabado a batalha que deixara pela manhã. Coberto de poeira e sangue, ainda assim não havia vindo para ficar. “Vim porque a luz que você acende à noite não me deixa dormir”, disse-lhe quase ríspido. “Brilha por trás das minhas pálpebras fechadas, como se me chamasse. Só de madrugada, depois que o vento sopra, posso adormecer.”

        A mulher nada disse. Nada pediu. Encostou a mão no peito do marido, mas o coração dele parecia distante, protegido pelo couro da couraça. “Deixe-me fazer o que tem que ser feito, mulher”, disse sem beijá-la. De um sopro apagou a lanterna. Montou a cavalo, partiu. Adensavam-se as sombras, e ela não pôde sequer vê-lo afastar-se recortado contra o céu.

        A partir daquela noite, a mulher não acendeu mais nenhuma luz. Nem mesmo a vela dentro de casa, não fosse a chama acender-se por trás das pálpebras do marido.

       No escuro, as noites se consumiam rápidas. E com elas carregavam os dias, que a mulher nem contava. Sem saber ao certo quanto tempo havia passado, ela sabia porém que era tanto.

       E, passado outro tanto, num final de tarde em que à soleira da porta despedia-se da última luz do horizonte, viu desenhar-se lá longe a silhueta de um homem. Um homem a pé que caminhava na sua direção. Protegeu os olhos com a mão para ver melhor e aos poucos, porque o homem avançava devagar, começou a distinguir a cabeça baixa, o contorno dos ombros cansados. Contorno doce, sem couraça. Hesitou seu coração, retendo o sorriso nos lábios — tantos homens haviam passado sem que nenhum fosse o que ela esperava. Ainda não podia ver-lhe o rosto, oculto entre barba e chapéu, quando deu o primeiro passo e correu ao seu encontro, liberando o coração. Era seu marido que voltava da guerra.

Não precisou perguntar-lhe se havia vindo para ficar. Caminharam até a casa. Já iam entrar, quando ele se reteve. Sem pressa voltou-se, e, embora a noite ainda não tivesse chegado, acendeu a lanterna. Só então entrou com a mulher. E fechou a porta.

 

COLASANTI, Marina. luz de lanterna, sopro de vento. in: ——.

Um espinho de marfim e outras hist—rias. Porto Alegre: l&PM, 1999. p.

165-168.

Fonte: Livro: Língua Portuguesa: linguagem e interação/ Faraco, Moura, Maruxo Jr. – 3.ed. São Paulo: Ática, 2016. p. 78-9.

ENTENDENDO O CONTO

 1.   As situações que você imaginou se concretizaram, de alguma forma, na história criada por Marina Colasanti?

Resposta pessoal.

2.   De que maneira a personagem principal persegue seu objeto de desejo?

Ela tenta manter acesa a chama da lanterna, noite após noite.

      3.O  clímax ocorre quando a mulher reencontra o marido, quando este volta da guerra pela segunda vez. De que maneira o desfecho aproxima a mulher de seu objeto de desejo? Explique.

      O gesto de acender a lanterna, executado agora pelo marido, sugere ao leitor o que acontecerá com ambas as personagens. O fogo, nesse caso, simboliza o calor, o amor, a proximidade entre ambos.

  4.   Como você explica o desfecho do conto?

     O desfecho aponta para a consolidação do amor entre marido e mulher. O fogo aceso mantém o marido “vivo” e “acordado”.

5.   Em sua opinião, que leitores mais se identificam com esse conto? Por quê?

Possivelmente leitores adultos, talvez do sexo feminino, capazes de se identificar com o drama vivenciado pela personagem feminina: a mulher que aguarda o retorno do marido que partiu para a guerra.