quinta-feira, 6 de agosto de 2020

CRÔNICA: NA ESCURIDÃO MISERÁVEL - FERNANDO SABINO - COM GABARITO

Crônica: Na escuridão Miserável

                Fernando Sabino


        
“Eram sete horas da noite quando entrei no carro, ali no Jardim Botânico. Senti que alguém me observava, enquanto punha o motor em movimento. Voltei-me e dei com uns olhos grandes e parados como os de um bicho, a me espiar, através do vidro da janela, junto ao meio-fio. Eram de uma negrinha mirrada, raquítica, um fiapo de gente, encostada ao poste como um animalzinho, não teria mais que uns sete anos. Inclinei-me sobre o banco, abaixando o vidro:

        – O que foi, minha filha? – perguntei, naturalmente pensando tratar-se de esmola.

        – Nada não senhor – respondeu-me, a medo, um fio de voz infantil.

        – O que é que você está me olhando aí?

        – Nada não senhor – repetiu. – Esperando o bonde…

        – Onde é que você mora?

        – Na Praia do Pinto.

        -- Vou para aquele lado. Quer uma carona?

        Ela vacilou, intimidada. Insisti, abrindo a porta:

        – Entra aí, que eu te levo.

        Acabou entrando, sentou-se na pontinha do banco, e enquanto o carro ganhava velocidade, ia olhando duro para a frente, não ousava fazer o menor movimento. Tentei puxar conversa:

        – Como é o seu nome?

        – Teresa.

        – Quantos anos você tem, Teresa?

        – Dez.

        – E o que estava fazendo ali, tão longe de casa?

        – A casa da minha patroa é ali.

        – Patroa? Que patroa?

        Pela sua resposta pude entender que trabalhava na casa de uma família no Jardim Botânico: lavava, varria a casa, servia a mesa. Entrava às sete da manhã, saía às oito da noite.

        – Hoje saí mais cedo. Foi jantarado.

        – Você já jantou?

        – Não. Eu almocei.

        – Você não almoça todo dia?

        – Quando tem comida pra levar, eu almoço: mamãe faz um embrulho de comida para mim.

        – E quando não tem?

        – Quando não tem, não tem – e ela até parecia sorrir, me olhando pela primeira vez. Na penumbra do carro, suas feições de criança, esquálidas, encardidas de pobreza, podiam ser as de uma velha. Eu não me continha mais de aflição, pensando nos meus filhos bem nutridos – um engasgo na garganta me afogava no que os homens experimentados chamam de sentimentalismo burguês.

        – Mas não te dão comida lá? – perguntei, revoltado.

        – Quando eu peço eles me dão. Mas descontam no ordenado, mamãe disse pra eu não pedir.

        – E quanto você ganha?

        – Mil cruzeiros.

        – Por mês?

        Diminuí a marcha, assombrado, quase parei o carro, tomado de indignação. Meu impulso era voltar, bater na porta da tal mulher e meter-lhe a mão na cara.

        – Como é que você foi parar na casa dessa… foi parar nessa casa? – perguntei ainda, enquanto o carro, ao fim de uma rua do Leblon, se aproximava das vielas da Praia do Pinto. Ela disparou a falar:

        – Eu estava na feira com mamãe e então a madame pediu para eu carregar as compras e aí noutro dia pediu à mamãe pra eu trabalhar na casa dela então mamãe deixou porque mamãe não pode ficar com os filhos todos sozinhos e lá em casa é sete meninos fora dois grandes que já são soldados pode parar que é aqui moço, brigado.

        Mal detive o carro, ela abriu a porta e saltou, saiu correndo, perdeu-se logo na escuridão miserável da Praia do Pinto.”

As melhores histórias. Rio de Janeiro: Record, 1986, p. 197-199.

         Fonte: Português – Uma proposta para o letramento – Ensino fundamental – 8ª série – Magda Soares – Ed. Moderna, 2002 – p. 143/8.

Entendendo a crônica:

01 – Ao ver a menina, o narrador pensou que ela queria esmola: “– O que foi, minha filha? – perguntei, naturalmente pensando tratar-se de esmola.”

a)   A menina não era uma pedinte: trabalhava, estava à espera de um ônibus, para voltar para casa; o que leva o narrador a pensar que ela queria esmola?

A aparência da menina: negrinha, mirrada, raquítica. 

b)   Por que o narrador considera natural que aquela menina estivesse pedindo esmola?

Porque negrinha, mirradas, raquíticas em geral estão nas ruas pedindo esmolas.

02 – Observe as comparações:

“... dei com uns olhos grandes e parados como os de um bicho...”.

“... um fiapo de gente, encostada ao poste como um animalzinho...”.

Por que a menina lembra um bicho, um animalzinho?

      Pelo seu aspecto físico (mirrada, raquítica), sua atitude (espiando com olhos grandes e parados), sua solidão (sozinha, junto ao meio-fio), não lembram um ser humano, mas um bicho, um animalzinho.

03 – Compare:

·        Impressão do narrador: “... não teria mais que uns sete anos...”

·        Resposta da menina ao narrador: “Quantos anos você tem, Teresa?” – “Dez”.

·        Como o narrador descreve a aparência da menina: “... suas feições de criança... podiam ser as de uma velha.”

a)   Por que do narrador achou que uma menina de dez anos tinha sete?

Porque era miúda, magrinha, desnutrida.

b)   Se o narrador pensou que a menina tinha set anos, por que acha que sua aparência podia ser a de uma velha?

Porque, embora parecendo uma criança de sete anos, não tinha feições de criança: eram feições pálidas, sem energia, sem viço, como as de pessoas velhas.

04 – Localize este trecho do diálogo em que o narrador quer saber o que acontece, quando a menina não tem comida:

“– E quando não tem?

 – Quando não tem, não tem – e ela até parecia sorrir, me olhando pela primeira vez.”.

        Diante da pergunta, a atitude da menina muda: ela parece sorrir, ela olha pela primeira vez para o narrador. Por que a pergunta desperta na menina essa reação?

      Porque a pergunta lhe parece boba, ingênua, de resposta óbvia – nas condições em que ela vive, é rotina que, quando não se tem o que comer, simplesmente não se come.

05 – Recorde os sentimentos do narrador: “Eu não me continha mais de aflição...”; “... perguntei revoltado.”; “Diminui a marcha, assombrado...”. Localize esses trechos na crônica e explique cada um desses sentimentos:

a)   O que causou aflição?

A menina às vezes não tinha o que comer.

b)   O que causou a revolta?

Não davam comida à menina, no emprego.

c)   O que causou o assombro?

O salário insignificante que a menina ganhava.

06 – Recorde esta outra reação do narrador: “... um engasgo na garganta me afogava no que os homens experimentados chamam de sentimentalismo burguês.” Leia o significado das palavras:

·        Sentimentalismo – excesso de emoção ou sentimento.

·        Burguês – próprio de indivíduo pertencente à classe que tem situação social e econômica confortável.

Escolha a escreva, em seu caderno, a frase que, entre as seguintes, expressa como se sentia o narrador, afogado em sentimentalismo burguês:

·        Constrangido com a diferença entre seus filhos bem nutridos e a menina.

·        Comovido com o contraste entre a sua boa condição de vida e a pobreza da menina.

·        Desgosto por ter de tomar conhecimento da pobreza, da miséria, da fome.

07 – Recorde a reação do narrador, quando soube quanto a menina ganhava:

“Meu impulso era voltar, bater na porta da tal mulher e meter-lhe a mão na cara.

        – Como é que você foi parar na casa dessa… foi parar nessa casa?”

a)   O narrador interrompe a frase: “na casa dessa...”

·        Por que ele não completa a frase?

Não completa a frase porque não quis dizer um palavrão; não quis criar na menina uma atitude negativa em relação à patroa; censurou a crítica à mulher.

·        Complete você a frase: que palavra você acha que ele ia falar?

São várias as palavras que podem completar a frase, desde palavrões até outras como megera, bruxa, desnaturada, exploradora de menores...

b)   Que “culpas” tinha a mulher, para irritar assim o narrador?

Colocar uma criança para trabalhar, pagar um salário insignificante, descontar do salário o que a menina comesse.

08 – Compare as atitudes da menina no início e no fim da história:

        NO INÍCIO = “respondeu-me, a medo”; “vacilou, intimidade”; “acabou entrando, sentou-se na pontinha do banco”; “não ousava fazer o menor movimento”.

        NO FIM = “disparou a falar”; “ela abriu a porta e saltou”; “saiu correndo”.

        O que explica a mudança de atitude da menina, ao aproximar-se do lugar onde morava?

      Mais provável: ânsia de libertar-se do mundo da patroa e do narrador; vontade de voltar para casa, de reencontrar-se em seu próprio meio.

09 – A expressão “na escuridão miserável” aparece duas vezes na crônica:

·        Na frase final – “... perdeu-se logo na escuridão miserável da Praia do Pinto”.

·        No título: Na escuridão miserável.

a)   A que se refere a expressão, quando usada no final da crônica?

À escuridão da praia, da favela, sem iluminação, e à pobreza do local, à miséria dos que ali vivem.

b)   A que se refere a expressão, quando usada como título da crônica?

Às injustas condições de vida dos pobres, dos miseráveis. (O título toma a expressão como uma metáfora: escuridão representa a falta de condições razoáveis de vida, a escuridão em que vivem os miseráveis).

10 – Recorde a definição de crônica:

        Crônica – texto em geral curto, que faz o registro do cotidiano – fatos, sensações, impressões – mostrando ora seu lado pitoresco ou cônico, ora seu lado trágico, ora seu lado comovente, poético.

a)   Que lado do cotidiano o cronista mostra na crônica?

O lado trágico do cotidiano (sombrio, triste, chocante); é também possível ver, na crônica, o lado comovente do cotidiano.

b)   Entre os muitos fatos do cotidiano, o cronista escolhe, para tema de sua crônica, um fato aparentemente comum, trivial: a carona que deu a uma menina. Contando esse fato trivial, o que, na verdade, o cronista quis revelar ao leitor?

Resposta pessoal do aluno. Sugestão: O absurdo do trabalho infantil; a injustiça social; a maldade humana; o contraste entre boas condições de vida e condições miseráveis de vida.

 

 


TEATRO: A VIDA NO PALCO - HILDEGARD FEIST - COM GABARITO

Teatro: A vida no palco

              Hildegard Feist

        A literatura conta histórias. Quando lê um romance, você viaja pelo mundo do autor: imagina aquelas pessoas que ele descreve, as paisagens, os ambientes... Já o teatro mostra histórias. Quando você assiste a uma peça, não precisa imaginar nada. As personagens e os cenários estão materializados diante da plateia.

      O texto no teatro é essencial, mesmo que os atores não abram a boca (nesse caso eles estariam representando com gestos uma história que teve de ser escrita por alguém).

        Mas no teatro o texto não é tudo, como acontece com a literatura. Você pode muito bem ler um livro, sozinho num canto, e imaginar à vontade. Também pode ler uma peça, sozinho do mesmo jeito, porém essa leitura solitária vai lhe dar apenas uma vaga ideia do que você veria no teatro. Porque uma peça só se realiza, só ganha vida, quando chega ao palco.

        Quando escreve para o teatro, o autor já está pensando em todas as pessoas que serão necessárias para dar vida ao seu texto. Seu trabalho de criação não termina no final da história, como no caso de um romance. O autor de um romance precisa de um editor para publicá-lo, de um livreiro para vende-lo e de um leitor para lê-lo, porém o que ele apresenta é uma obra acabada.

        O autor teatral, também chamado dramaturgo, precisa de muito mais gente: na verdade precisa de todo um batalhão de profissionais para mostrar o que escreveu. São atores, diretor, produtor, cenógrafo, figurinista, iluminador... sem falar no público.

        Vamos por parte.

          Os passos do processo

        Depois de escrever uma peça, o dramaturgo a leva para uma pessoa ligada ao teatro, geralmente um ator de prestígio ou um diretor.

        (...)

        Digamos que tudo corre às mil maravilhas. Os atores adoram o texto, identificam-se com suas personagens e no momento não têm nenhum compromisso que os impeça de participar do projeto.

        Agora precisam de um produtor, de alguém que banque o espetáculo, ou seja, que forneça o dinheiro para adquirir móveis, tecidos, roupas, acessórios – enfim, todo o material necessário para a montagem –, além de pagar despesas como o aluguel do teatro, a contratação de carpinteiros, eletricistas, costureiras e outros profissionais indispensáveis, a compra de espaço para publicidade nos jornais, revistas e TV...

        Mais uma vez dá tudo certo, e o trabalho pode começar. Primeiro se faz uma leitura dramática: todo o elenco se reúne, de preferência sentado em torno de uma mesa, e cada ator lê sua parte, já representado com a entonação de voz que pretende dar à personagem.

        O diretor vi corrigindo, vai mostrando a cada um como deve falar. Por exemplo, um simples “Eu te amo” pode ser dito com alegria, com tristeza, com fingimento, com desespero... depende da situação e também da maneira como o diretor imagina a cena.

        O diretor tem a visão geral do espetáculo e sabe qual é o resultado que quer conseguir. Alguns diretores simplesmente impõem sua opinião, porém a maioria conversa com os atores, explica o que tem em mente, escuta o que eles acham e todos chegam a um acordo (ou pelo menos é o que se espera).

        Não é só com os atores que o diretor dialoga. Ele também expõe seus objetivos aos demais membros da equipe, explicando o que espera de cada um. E, como cada um tem uma maneira de ver o espetáculo, seguem-se as discussões e as trocas de ideias. Tudo acertado, o cenógrafo trata de criar os cenários adequados; o iluminador estuda as várias formas de usar a luz; o figurinista concebe as roupas que cada personagem terá de vestir; e assim por diante.

        Depois de muito ensaio e muito trabalho, a peça está pronta para ser apresentada ao público. O dinheiro resultante da venda dos ingressos paga o salário do pessoal envolvido no espetáculo.

        Lance uma ideia em sua escola. Reúna uma turma para montar uma peça. É uma ótima experiência, pois, colocando-se na pele de uma personagem, você sai de si mesmo, esquece seus problemas e aprende a entender melhor essa complicada e maravilhosa criatura humana. Experimente.

    Pequena viagem pelo mundo da arte, Hildegard Feist.

                             Fonte: Livro – Encontro e Reencontro em Língua Portuguesa – 8ª Série – Marilda Prates – Ed. Moderna, 2005 – p. 171/3.

Entendendo o teatro:

01 – Qual é a diferença entre um romance e o texto dramático (texto para ser representado)?

      1° parágrafo. “Quando lê um romance, você viaja pelo mundo do autor: imagina aquelas pessoas que ele descreve, as paisagens, os ambientes... Já o teatro mostra histórias.”

02 – Quando o teatro ganha realmente vida? Por quê? Justifique a partir do texto e de suas experiências e conhecimentos.

      Resposta pessoal do aluno.

03 – Qual é a diferença entre um autor de um romance e um autor de peças teatrais? Por quê? Argumente a partir do texto.

      “O autor de um romance precisa de um editor para publicá-lo, de um livreiro para vende-lo e de um leitor para lê-lo, porém o que ele apresenta é uma obra acabada.”

      “O autor teatral, também chamado dramaturgo, precisa de muito mais gente: na verdade precisa de todo um batalhão de profissionais para mostrar o que escreveu. São atores, diretor, produtor, cenógrafo, figurinista, iluminador... sem falar no público.”

04 – Do que precisa um romancista para que seu livro fique pronto?

      O romancista precisa de um editor para publicar seu livro.

05 – O que é necessário para o autor teatral, também chamado de dramaturgo, expor sua obra?

      O autor teatral precisa de atores, diretor, produtor, cenógrafo, figurinista, iluminador e público.

06 – Fale sobre os passos do processo: desde a criação da peça teatral até sua representação no palco.

      Resumo do texto “Os passos do processo”.

07 – Produtor, material, publicidade são essenciais no teatro. E por quê?

      Resposta pessoal do aluno.

08 – Na região em que você vive, a atividade teatral é comum? Existem escolas de teatro, arte dramática? E a comunidade tem o hábito de frequentar o teatro? Fale a partir da sua realidade de vida e justifique suas respostas.

      Resposta pessoal do aluno.

            

 


CARTA: A MARIA JÚLIA - MARCOS BAGNO - COM GABARITO

Carta: A Maria Júlia

           José Romildo

        Recife, 7 de maio de 1990

        Prezada Maria Júlia,

        Bem que gostaria de ver a cara de surpresa que você deve estar fazendo enquanto lê este meu bilhetinho. Será que você ainda se lembra de mim? Vou ajudar: eu sou aquele pernambucano que falou com você nas férias, lá no Rio de Janeiro, junto da estátua do Cristo Redentor. E então, já se lembrou? A gente conversou durante mais de duas horas. Falamos de muitas coisas, mas, principalmente, de livros. Pois é exatamente por causa de livro que resolvi escrever para você. Hoje de manhã eu decidir dar um pouco d ordem à minha estante, para ver se achava nela algum espaço para uns livros novos que andei comprando. Não sou organizado, sabe, e tenho muita preguiça de colocar os livros em ordem alfabética ou separados por assunto. O resultado é uma confusão dos diabos: história com romance policial, matemática com inglês, álbum de retratos misturado com revista de esportes.

        Pois foi no meio dessa anarquia (como diz minha mãe) que encontrei as Histórias extraordinárias, de Edgar Allan Poe. Ao ver o livro, lembrei logo de você. Quer saber por quê? Você me disse, lá no Rio, que nunca tinha lido uma história policial, e que não tinha o menor interesse por esse tipo de livro. Confesso que, na hora, fiquei muito espantado e pensei assim comigo: “Oxente, como é que alguém diz que gosta de ler e nunca se interessou por histórias policiais?” Eu adoro, simplesmente adoro, uma boa trama (sabe o que é?), um mistério bem misterioso, um segredo bem guardado. Esse livro do Poe (eu acho que a pronúncia é “pôu”) é muito bom, Maria Júlia, mas muito bom mesmo. Como já li e reli mais de dez vezes, achei que podia passar um tempo sem ele. É por isso que estou te mandando o livro. Se você ler e gostar, pode ficar com ele, é um presente. Se ler e não gostar tanto quanto eu, não se aperreie, pode me devolver, foi um empréstimo.

        Na hora de escrever no envelope, pintou a dúvida: eu só sei o teu nome, mas não tenho o teu endereço. Foi aí que me lembrei que você disse que sua mãe trabalha na agência dos Correios de Dores do Indaiá. Espero que minha ideia de escrever para lá tenha funcionado...

        Fico por aqui. Um abraço. Até qualquer dia.

        José Romildo.

BAGNO, M.; RESENDE, S. M. Os nomes do amor. São Paulo: Moderna, 1993, p. 5-6.

       Fonte: Língua Portuguesa. Linguagens no Século XXI. 5ª série. Heloísa Harue Takazaki. Ed. IBEP. 1ª edição, 2002. p. 33-4.

Entendendo a carta:

01 – Quem escreveu a carta? De onde ela foi escrita?

      José Romildo, de Recife. Pernambuco.

02 – Para quem é a carta? Onde mora esse destinatário?

      Para Maria Júlia, da cidade de Dores do Indaiá.

03 – Eles já se conheciam? Explique.

      Sim, encontraram-se uma vez, quando estavam de férias no Rio de Janeiro.

04 – O que levou José Romildo a escrever para ela?

      O fato de ela ter dito que não gostava de histórias policiais. Ele resolveu lhe mandar um livro.

05 – Há palavras ou expressões que você não conhece na carta de José Romildo? Quais?

      Resposta pessoal do aluno.

06 – Que idade você supõe que eles tinham?

      A idade dos dois está, aproximadamente, entre 12 e 18 anos. Isso pode ser comprovado através da linguagem usada (confusão dos diabos, pintou uma dúvida), das referências à escola e aos pais.

07 – Em alguns trechos, José Romildo faz perguntas para Maria Júlia como se ela estivesse conversando diretamente com ele. Em que trechos isso acontece? Copie-os em seu caderno.

      “E então, já se lembrou?”; “Quer saber por quê?”; “Sabe o que é?”

      

 


TEXTO: OS ESPELHOS DE PHANUEL - HARDY GUEDES - COM GABARITO

        Texto: Os espelhos de Phanuel

                    Hardy Guedes

        Conheci um dia, vivendo na mais profunda miséria, o melhor fabricante de espelhos que já houve em todo o mundo.

        Chamava-se Phanuel e era perfeito em seu ofício; um artesão inigualável.

        Dava gosto vê-lo em sua oficina. Os seus olhos experientes, especialistas, não permitiam qualquer imperfeição, nem riscos, nem manchas. Por isso, emprestava à escolha do cristal uma atenção redobrada.

        O mesmo se dava como aço, em cujo polimento gastava horas e horas de paciência e dedicação.

        É desnecessário dizer que o resultado era simplesmente fantástico.

        As imagens refletidas nos espelhos de Phanuel não deixavam escapar os detalhes mais sutis do original, além de não apresentarem quaisquer distorções.

        Mas, apesar de toda a perfeição e cuidado, Phanuel mal conseguia ganhar o suficiente para a sua sobrevivência. As encomendas que recebia eram poucas; pouquíssimas por sinal.

        Nessa ocasião, eu trabalhava como mercador e, por onde passava, procurava apregoar a excelência dos seus espelhos, na esperança de lhe conseguir algumas encomendas a mais.

        A minha ajuda pouco adiantava. Eu não sabia o quê, nem por quê, mas havia algo nos espelhos que, mesmo com toda a arte empregada no seu fabrico, não lhes conferia o sucesso merecido.

        Certa vez, fiz uma longa viagem a um porto distante. Aguardava a chegada de um navio com uma remessa de tecidos e tapetes orientais. Pra meu azar, houve um atraso inesperado e considerável devido ao mau tempo. Uma tempestade obrigou o capitão a desviar a nau de seu destino original.

        Além desse contratempo, fui acometido de uma febre estranha que me deixou acamado por um longo período.

        Assim, fiquei um bom tempo sem ver o meu amigo Phanuel.

        Logo que pude, voltei ao meu ofício de mercador e, ao passar pela cidade onde morava o artesão, qual não foi minha surpresa: a velha oficina não existia mais. Em seu lugar, havia uma outra, moderna, numa atividade febril.

        -- Ora, viva! – exclamei. – Até que enfim o seu talento foi reconhecido!

        -- Bons olhos o vejam, mercador! Andava preocupado, sem notícias suas.

        -- Tive alguns problemas, mas já estão sanados. E você? Conseguiu, finalmente, o sucesso com os seus espelhos?

        -- Não da forma como você está pensando.

        -- Como assim?

        -- Não fabrico mais os espelhos de antigamente.

        -- Não!?

        -- É uma longa história. Vamos combinar o seguinte: hoje à noite, você vai à minha casa. Faço questão de recebe-lo! Durante o jantar, eu lhe contarei tudo o que aconteceu comigo, desde a última vez que nos vimos.

        A minha curiosidade não deu sossego e aumentou à medida que foi se aproximando a hora de me dirigir à casa de Phanuel.

        Lá chegando, fiquei admirado. Era um verdadeiro palacete: jardins, fontes, aves ornamentais... internamente, decorada com bom gosto e requinte.

        Um empregado conduziu-me a uma das salas, onde o artesão me aguardava.

        -- Bem-vindo seja, mercador! Sinta-se, por favor, em sua própria casa!

        -- Obrigado, meu bom amigo! Quero dizer que estou imensamente feliz com a sua prosperidade. Mas, não estou conseguindo controlar a minha ansiedade em saber como você, de um pobre artesão, transformou-se em alguém tão rico.

        Phanuel ordenou que servissem o jantar preparado em minha homenagem; iguarias como jamais havia provado em toda a minha vida.

        Enquanto nos alimentávamos, ele relatou-me a transformação de sua vida.

        -- Após a sua última visita, as encomendas foram rareando, rareando, a ponto de passar dias e dias seguidos sem ter o que fazer. Isso foi me dando um desespero tamanho, em função de não conseguir mais com o meu trabalho o mínimo necessário ao meu sustento. Ao terminar a última de minhas provisões, resolvi dar cabo de minha vida. Pensei, naquela ocasião, que esta saída seria mais nobre do que misturar-me aos indigentes e mendigos da cidade.

        -- Nunca poderia imaginar que a sua situação fosse chegar a esse ponto!

        -- Esperei o dia nascer, fiz uma oração pedindo perdão a Deus pelo ato que iria cometer e caminhei até a ponte na estrada da cidade. O rio que passa debaixo dela é profundo o suficiente para que alguém como eu, que nunca soube nadar, fosse levado pela corrente e desaparecesse sem deixar rastro. Esse era o fim que planejara naqueles dias de aflição. Ao chegar à ponte, porém, notei que havia um ancião, já sentado na amurada, com uma pedra amarrada à mesma corda que estava presa ao seu pescoço. Não sei o que me deu naquela hora. Corri em sua direção, agarrei-o e impedi que ele se suicidasse. Acho que o meu instinto de sobrevivência e o meu amor ao próximo foram mais forte.

        -- “Por que não me deixas morrer, se é tudo que quero?” – perguntou-me.

        Eu lhe contei, então, o meu drama pessoal. Falei de minhas dificuldades e que estava ali, com as mesmas intenções de procurar a morte, até que o vi. Disse-lhe mais: que naquela hora, salvando a vida de um entranho, senti que ainda tinha muito a realizar e, humildemente, agradeci a sua presença naquele lugar. O velhinho, Amazarak era o seu nome, olhou-me comovido e disse: “Não há dúvida que o destino que nos aproximou, de forma tão misteriosa, deve ter lá as suas razões. Eu, também, acabo de descobrir uma nova motivação para continuar vivendo. Esta motivação é ensiná-lo a fabricar espelhos”.

        -- Fabricar espelhos!? Como, se não há ninguém no mundo capaz de superá-lo nesta arte?

        -- Eu acho que, algum dia, eu mesmo cheguei a acreditar nisso. Pura vaidade! Amazarak sabia bem o que estava dizendo. Ensinou-me, então, o principal segredo da fabricação de espelhos. Graças a ele, mudei a minha vida da água para o vinho!

        -- Que segredo é esse, Phanuel? Conte-me logo, porque se eu não tivesse lhe conhecido antes, presenciado a sua transformação; se não ouvisse esta história de sua própria voz, eu jamais acreditaria! Eu que vi a sua dedicação, o amor à arte de fabricar espelhos perfeitos, não consigo crer que alguém tivesse algo a lhe ensinar sobre este ofício!

        -- Na verdade, meu caro amigo, o segredo é bem simples. Eu, realmente, fazia espelhos perfeitos. Por isso não conseguia o sucesso almejado. Isso era o que me faltava aprender.

        -- Não estou entendendo!

        -- É que a maioria das pessoas não deseja, de fato, um espelho perfeito. Porque num espelho assim, elas se veem como realmente são e não como gostariam de se ver. Com os ensinamentos de Amazarak, aprendi a fazer espelhos adequados à vaidade humana. Este é o segredo: quem se olha nos espelhos que faço hoje, vê, apenas, o que deseja ver.

        Saí da casa de Phanuel meditando sobre sua fantástica história, com a certeza de haver aprendido uma grande lição de vida.

        Infelizmente, o segredo de Amazarak se aplica, também, a todo relacionamento humano. A verdade, a sinceridade, a franqueza, nem sempre agradam.

        Por isso não paravam de crescer as encomendas dos novos espelhos de Phanuel!

                                                 Hardy Guedes.

                                Fonte: Livro – Encontro e Reencontro em Língua Portuguesa – 8ª Série – Marilda Prates – Ed. Moderna, 2005 – p. 78-81.

Entendendo o texto:

01 – O que significa ser um artesão inigualável? Justifique sua resposta com um exemplo.

      Ser um indivíduo que exerce, por conta própria, uma arte, um ofício manual e de valor insuperável devido à sua qualidade profissional.

02 – “Os seus olhos experientes, especialistas, não permitiam qualquer imperfeição, nem riscos, nem manchas. Por isso, emprestava à escolha do cristal uma atenção redobrada”.

a)   Identifique o sujeito da primeira e da segunda frases.

Os seus olhos experientes, especialistas / ele (Phanuel).

b)   Se a mesma personagem executou as ações das duas frases, por que cada frase apresenta um sujeito diferente?

Porque a substituição do todo pela parte foi usada para evitar a repetição do sujeito e para aumentar a relação entre o olhar da personagem e o seu ofício.

03 – Reescreva as frases a seguir sem modificar o significado original.

a)   “Não da forma como você está pensando”.

Não do jeito, da maneira como você está pensando. / Não vendendo os espelhos perfeitos de antes.

b)   Resolvi dar cabo de minha vida.

Resolvi me suicidar.

c)   Não sei o que me deu naquela hora.

Não sei o que senti / aconteceu comigo naquela hora.

04 – Reescreva as frases a seguir substituindo os termos em destaque por expressões ou frases que tornem os acontecimentos explícitos.

a)   “Isso foi me dando um desespero tamanho”.

O fracasso de venda dos espelhos foi...

b)   “Pensei, naquela ocasião, que esta saída seria mais nobre...”.

Pensei, naquela ocasião, que me suicidar seria a saída / a solução mais nobre.

05 – Você sabe o que faz um mercador? Consulte o dicionário.

      Um mercador é um comerciante.

06 – Phanuel tinha um amigo. Verdadeiro! Justifique a afirmação.

      Mesmo depois de longa ausência, não houve esquecimento no reencontro, mas o fortalecimento da amizade já existente.

07 – Se Phanuel já conhecia todas as técnicas para fabricar espelhos perfeitos, o que Amazarak ensinou para ele?

      Amazarak ensinou Phanuel a fabricar espelhos que refletissem a imagem das pessoas da maneira que elas queriam ser vistas.

08 – O amigo de Phanuel tira suas próprias conclusões a partir da lição aprendida por Phanuel.

a)   Identifique essa conclusão.

“A verdade, a sinceridade, a fraqueza nem sempre agradam”.

b)   O que você pensa sobre o assunto?

Resposta pessoal do aluno.

09 – Por que a maioria das pessoas não deseja um espelho perfeito? Justifique de acordo com o texto.

      Porque as pessoas preferem se ver no espelho como desejariam ser. Estão insatisfeitas consigo mesmas.

10 – Após a leitura do texto, que conclusões se pode tirar para o nosso cotidiano? Fale indicando o seu ponto de vista.

      Resposta pessoal do aluno.

   

 


terça-feira, 4 de agosto de 2020

MÚSICA(ATIVIDADES): O HOMEM VELHO - CAETANO VELOSO - COM GABARITO

Música(Atividades): O Homem Velho

              Caetano Veloso

O homem velho deixa a vida e morte para trás

Cabeça a prumo, segue rumo e nunca, nunca mais

O grande espelho que é o mundo ousaria refletir os seus sinais

O homem velho é o rei dos animais

 

A solidão agora é sólida, uma pedra ao sol

As linhas do destino nas mãos a mão apagou

Ele já tem a alma saturada de poesia, soul e rock'n'roll

As coisas migram e ele serve de farol

 

A carne, a arte arde, a tarde cai

No abismo das esquinas

A brisa leve traz o olor fulgaz

Do sexo das meninas

 

Luz fria, seus cabelos têm tristeza de néon

Belezas, dores e alegrias passam sem um som

Eu vejo o homem velho rindo numa curva do caminho de Hebron

E ao seu olhar tudo que é cor muda de tom

 

Os filhos, filmes, ditos, livros como um vendaval

Espalham-no além da ilusão do seu ser pessoal

Mas ele dói e brilha único, indivíduo, maravilha sem igual

Já tem coragem de saber que é imortal.

                                    Composição: Caetano Veloso.

Entendendo a canção:

01 – A letra da canção oferece uma reflexão acerca da velhice. Em relação ao tema do envelhecimento, o principal objetivo do poeta é:

a)   Expor seus desafios para a juventude.

b)   Narrar sua história através dos tempos.

c)   Destacar seus efeitos sobre a sociedade.

d)   Descrever sua chegada na vida das pessoas.

02 – A solidão agora é sólida, uma pedra ao sol (v.5) / Os filhos, filmes, ditos, livros como um vendaval (v.17). Os recursos expressivos presentes em cada um dos versos acima são, respectivamente:

a)   Aliteração – assíndeto.

b)   Polissíndeto – antítese.

c)   Hipérbole – eufemismo.

d)   Personificação – metonímia.

03 – O homem velho é o rei dos animais (v.4) / As coisas migram e ele serve de farol (v.8). As metáforas sublinhadas nos dois versos acima veiculam, respectivamente, as ideias de:

a)   Arrogância – magnitude.

b)   Sabedoria – experiência.

c)   Sagacidade – inspiração.

d)   Imponência – orientação.

04 – É possível fazer uma reflexão com a leitura da canção? Você concorda com as afirmações feitas pelo eu lírico?

      Resposta pessoal do aluno.

05 – Identifique a opção que completa corretamente o enunciado a seguir. Pode-se afirmar que o texto cumpre seu objetivo, pois:

a)   Simplesmente passa informações.

b)   Provoca emoções e reflexões.

c)   Serve de diversão.

d)   Modifica o comportamento.

06 – O eu lírico aborda o ema do envelhecimento de forma poética, apresentando argumentos que levam a inferir que seu objetivo é:

a)   Esclarecer que a velhice é inevitável.

b)   Contar fatos sobre a arte de envelhecer.

c)   Defender a ideia de que a velhice é desagradável.

d)   Mostrar às pessoas que é possível aceitar, sem angústia, o envelhecimento.


POEMA: NÃO ME DEIXES! GONÇALVES DIAS - COM GABARITO

Poema: NÃO ME DEIXES!  

Gonçalves Dias

Debruçada nas águas dum regato
A flor dizia em vão
À corrente, onde bela se mirava:
"Ai, não me deixes, não!”

"Comigo fica ou leva-me contigo
"Dos mares à amplidão;
"Límpido ou turvo, te amarei constante;
"Mas não me deixes, não!"

E a corrente passava; novas águas
Após as outras vão;
E a flor sempre a dizer curva na fonte:
"Ai, não me deixes, não!"

E das águas que fogem incessantes
À eterna sucessão
Dizia sempre a flor, e sempre embalde:
"Ai, não me deixes, não!"

Por fim desfalecida e a cor murchada,
Quase a lamber o chão,
Buscava inda a corrente por dizer-lhe
Que a não deixasse, não.

A corrente impiedosa a flor enleia,
Leva-a do seu torrão;
A afundar-se dizia a pobrezinha:
"Não me deixaste, não!"

DIAS, Gonçalves. Não me deixes! In: MILLIET, Sérgio (Seleção e notas). Obras-primas da poesia universal. 3. ed. São Paulo, SP: Livraria Martins Editora, 1957. p. 92-93.

Entendendo o poema:

01 – O lamento da flor representa fielmente o sentimento romântico
de:
     a) Evasão no tempo.

     b) Amor incondicional ao outro;

     c) Supervalorização da natureza;

     d) Exaltação do sonho, da fantasia;

     e) Desejo de morte pelo amor não correspondido.

02 – Observa-se a inversão, como recurso estilístico, no verso:

     a) “A flor dizia em vão”

     b) “Mas não me deixes, não.”

     c) “E a corrente passava”

     d) “Dizia sempre a flor, e sempre embalde”

     e) “Leva-a do seu torrão”.

03 – Leia os versos a seguir, início do poema “Não me deixes!”, de Gonçalves Dias:

“Debruçada nas águas dum regato
A flor dizia em vão
À corrente, onde bela se mirava:
"Ai, não me deixes, não!”

"Comigo fica ou leva-me contigo
"Dos mares à amplidão;
"Límpido ou turvo, te amarei constante;
"Mas não me deixes, não!"

Assinale a alternativa da qual consta a figura de linguagem predominante nos versos:

a)   Metonímia.

b)   Sinestesia.

c)   Metáfora.

d)   Catacrese.

e)   Prosopopeia.

04 – O título do poema motiva a leitura?

      Sim, a ideia de ser abandonado aguça a curiosidade do leitor.

05 – As repetições utilizadas favorecem a construção do poema?

      Sim, a repetição chama a atenção do leitor para a importância e significado que essa palavra tem na construção e interpretação do poema.

06 – Nesse poema a flor está personificada com sentimentos típicos de seres humanos. Como ela se sentia?

      Sentia-se bela; mira-se no espelho d’água; não quer ficar sozinha; fala; promete amor constante ao regato e implora a sua companhia; a flor praticamente morre de amor.