sábado, 23 de novembro de 2019

ROMANCE: CAPITÃES DE AREIA -(FRAGMENTO) - JORGE AMADO - COM GABARITO

Romance: Capitães de Areia - Fragmento               
                  Jorge Amado

         O romance Capitães da Areia, de Jorge Amado, é um documento sobre a vida dos meninos de rua de Salvador. A sua primeira edição (1937) foi apreendida e queimada em praça pública pouco depois de implantada a ditadura de Getúlio Vargas. No trecho a seguir, o narrador nos conta como Pedro Bala, aos quinze anos, assumiu a liderança de um grupo que dormia num velho armazém abandonado do cais do porto.
        "É aqui também que mora o chefe dos Capitães da Areia: Pedro Bala. Desde cedo foi chamado assim, desde seus cinco anos. Hoje tem quinze anos. Há dez que vagabundeia nas ruas da Bahia. Nunca soube de sua mãe, seu pai morrera de um balaço. Ele ficou sozinho e empregou anos em conhecer a cidade. Hoje sabe de todas as suas ruas e de todos os seus becos. Não há venda, quitanda, botequim que ele não conheça. Quando se incorporou aos Capitães da Areia (o cais recém-construído atraiu para suas areias todas as crianças abandonadas da cidade) o chefe era Raimundo, o Caboclo, mulato avermelhado e forte.
        Não durou muito na chefia o caboclo Raimundo. Pedro Bala era muito mais ativo, sabia planejar os trabalhos, sabia tratar com os outros, trazia nos olhos e na voz a autoridade de chefe. Um dia brigaram. A desgraça de Raimundo foi puxar uma navalha e cortar o rosto de Pedro, um talho que ficou para o resto da vida. Os outros se meteram e como Pedro estava desarmado deram razão a ele e ficaram esperando a revanche, que não tardou. Uma noite, quando Raimundo quis surrar Barandão, Pedro tomou as dores do negrinho e rolaram na luta mais sensacional a que as areias do cais jamais assistiram. Raimundo era mais alto e mais velho. Porém Pedro Bala, o cabelo loiro voando, a cicatriz vermelha no rosto, era de uma agilidade espantosa e desde esse dia Raimundo deixou não só a chefia dos Capitães da areia, como o próprio areal. Engajou tempos depois num navio.
        Todos reconheceram os direitos de Pedro Bala à chefia, e foi dessa época que a cidade começou a ouvir falar nos Capitães da areia, crianças abandonadas que viviam do furto."

Jorge Amado, Capitães da Areia, 50. ed. Rio de Janeiro: Record, 1980, p. 26-7.
Fonte: Livro- Português – Série – Novo Ensino Médio – Vol. único. Ed. Ática – 2000- p. 344-5

Entendendo o romance:

01 – Pela leitura do texto, pode-se concluir que o romance pretende denunciar que tipo de problema?
      Um problema social (a questão do menor abandonado).

02 – Que fato da vida de Pedro Bala pode ser considerado como o elemento desencadeador de sua vida de menino de rua?
      Não ter pai nem mãe (nem a solidariedade do Estado).

03 – Que características de Pedro Bala fizeram dele líder do grupo?
      Era ativo, planejador, sabia tratar os outros e trazia na voz e nos olhos a autoridade de chefe.

04 – Mesmo sendo um grupo de marginalizados, os meninos demonstravam senso de justiça entre os membros do grupo. Que fato narrado comprova essa afirmação?
      Os meninos reprovaram a atitude de Raimundo de usar uma navalha contra o jovem desarmado.



ROMANCE: JECA TATU - FRAGMENTO - MONTEIRO LOBATO - COM GABARITO

ROMANCE: Jeca Tatu – Fragmento
           Monteiro Lobato

        Pobre Jeca Tatu! Como és bonito no romance e feio na realidade!
        Jeca mercador, Jeca lavrador, Jeca filósofo...
        Quando comparece às feiras, todo mundo logo adivinha o que ele traz: sempre coisas que a natureza derrama pelo mato e ao homem só custa o gesto de espichar a mão e colher (...) Nada mais.
        Seu grande cuidado é espremer todas as consequências da lei do menor esforço – e nisto vai longe.
        Começa na morada. Sua casa de sapé e lama faz sorrir aos bichos que moram em toca e gargalhar ao joão-de-barro. Pura biboca de bosquímano. Mobília, nenhuma. A cama é uma espipada esteira de peri posta sobre o chão batido.
        Às vezes se dá ao luxo de um banquinho de três pernas – para os hóspedes. Três pernas permitem equilíbrio; inútil, portando, meter a quarta, o que ainda o obrigaria a nivelar o chão. Para que assentos, se a natureza os dotou de sólidos, rachados calcanhares sobre os quais se sentam?
        Nenhum talher. Não é a munheca um talher completo – colher, garfo e faca a um tempo?
        Seus remotos avós não gozaram maiores comodidades. Seus netos não meterão quarta perna ao banco. Para quê? Vive-se bem sem isso.
        Se pelotas de barro caem, abrindo seteiras na parede, Jeca não se move a repô-las. Ficam pelo resto da vida os buracos abertos, a entremostrarem nesgas de céu.
        Quando a palha do teto, apodrecida, greta em fendas por onde pinga a chuva, Jeca, em vez de remendar a tortura, limita-se, cada vez que chove, a aparar numa gamelinha a água gotejante...
        Remendo... Para quê? Se uma casa dura dez anos e faltam “apenas” nove para que ele abandone aquela? Esta filosofia economiza reparos.

      LOBATO, Monteiro. Urupês. São Paulo, Brasiliense, 1948. p. 245-6.
Fonte: Livro- Português – Série – Novo Ensino Médio – Vol. único. Ed. Ática – 2000- p. 298-9.

Entendendo o texto:

01 – De acordo com o texto, qual o significado das palavras abaixo:
·        Biboca: Casa humilde, com cobertura de palha.

·        Bosquímano: Indivíduo dos bosquímanos, povo sul-africano.

·        Espipar: Esticar, estender.

·        Peri (ou piri): Espécie de jungo do qual se fazem esteiras; piripiri.

·        Munheca: Mão.

·        Remoto: Antigo, distante.

·        Seteira: fresta.

·        Nesga: Pequeno espaço.

·        Gretar: Rasgar.

·        Gamela: Vasilha de madeira ou barro.

02 – O que podemos concluir ao compararmos a personagem de Monteiro Lobato com o índio Peri, de José de Alencar, e os bravos e orgulhosos caboclos dos romances regionalistas do mesmo período?
      Aquelas personagens eram idealizadas, enquanto o Jeca, de Monteiro Lobato, é real.

03 – Em Jeca Tatu, Monteiro Lobato investe contra a idealização do caboclo, apontando algumas das suas características negativas. Qual delas é a mais criticada no texto?
      A preguiça (relacionada ao conformismo).

04 – Jeca mercador, Jeca lavrador, Jeca filósofo...” Este parágrafo refere-se ao Jeca de Monteiro Lobato ou aos caboclos dos romances românticos?
      Aos caboclos dos romances românticos.

05 – Você crê que Monteiro Lobato queria chamar a atenção para uma realidade que deveria ser invertida ou pretendeu apenas ridicularizar o caboclo? Por quê?
      Resposta pessoal do aluno. Sugestão: A intenção de Lobato de chamar a atenção de seus leitores para aspectos importantes da realidade brasileira.
     



sexta-feira, 22 de novembro de 2019

POEMA: VAGA EM REDOR DE TI... - ALPHONSUS GUIMARAENS - COM GABARITO


Poema: Vaga em redor de ti...
         

     Alphonsus Guimaraens

"Vaga em redor de ti uma fulgência
Que tanto é sombra quanto mais fulgura
O teu sorriso, que é divino, vence-a,
E ela, que é luz de estrela, pouco dura. 

De outra não sei que tenha a etérea essência
Que nos teus olhos brilha: nem a pura
Linha de arte de tal magnificência,
Como a que rosto de anjo te emoldura. 

Na candidez ebúrnea do semblante
Tens um lis de ternura, que desliza
À flor da pele em mágoa suavizante. 

Não sei que manto celestial arrastas...
És como a folha do álamo que brisa
Beija e balança ao luar das noites castas. "
                                                                                                     Alphonsus de Guimaraens. “Vaga em redor de ti...”. In: Andrade Muricy, Panorama do movimento simbolismo brasileiro. 2 Ed. Brasília, Conselho Federal de Cultura-INP, 1973. v. l. p. 452.
Fonte: Livro- Português – Série – Novo Ensino Médio – Vol. único. Ed. Ática – 2000- p. 286.

Entendendo o poema:

01 – De acordo com o texto, qual o significado das palavras abaixo:          
·        Fulgência: Brilho, cintilação.             
·        Candidez: Pureza, inocência, candura.
·        Ebúrnea: De marfim.                         
·        Lis: De lírio, plantas de cores alvas, amplas e perfumadas.  

02 – Por que dura pouco a fulgência ao redor do ser a que se refere o eu lírico?
      Porque “o sorriso, que é divino, vence-a”.

03 – Destaque do texto as palavras que divinizam o ser descrito pelo eu lírico.
      Divino, anjo, celestial.

04 – Retire do texto um exemplo de aliteração.
      “A música antes de qualquer coisa”.

05 – Todo esse soneto exemplifica uma característica marcante na obra de Alphonsus de Guimaraens. Qual é essa característica?
      A idealização e divinização da mulher.

06 – Indique, no caderno, os autores das obras a seguir:
a)   Câmara ardente: Alphonsus Guimaraens.

b)   Faróis: Cruz e Sousa.

c)   Setenário das dores de Nossa Senhora: Alphonsus Guimaraens.

d)   Kiriale: Alphonsus Guimaraens.


CARTUM: MORDILLO - COM QUESTÕES GABARITADAS


Cartum: Mordillo
                           
       Mordillo. Opus 4. Grenoble: Glénat, 1990.
Fonte: Livro- PORTUGUÊS: Linguagens – Willian R. Cereja/Thereza C. Magalhães – 6ª Série – Atual Editora -2002 – p.162-3.
Entendendo o cartum:

01 – Observe, na 1ª cena, a paisagem e o tipo de atividade que a personagem pratica.
a)   Que nome se dá a esse tipo de esporte?
Alpinismo.

b)   Pela imagem da 1ª cena, realizar essa atividade parece estar sendo fácil ou difícil? Justifique com elementos da cena.
Difícil: a montanha é muito íngreme e sua escalada está fazendo o alpinista suar.

02 – Na 2ª cena, a personagem está no topo da montanha. Que sentimentos ela expressa? Justifique com dois elementos da cena.
      Satisfação e alegria, pois abre os braços e grita uma expressão que tradicionalmente é associada a esses sentimentos.

03 – Na 3ª cena, há uma surpresa: alguém acerta uma bota na cabeça da personagem.
a)   De onde vem essa bota?
Vem do alto.

b)   Que significado tem esse fato para a personagem?
Que existe uma montanha ainda mais alta e que alguém conseguiu chegar ao topo dela.

c)   Provavelmente, qual será a próxima aventura da personagem?
Escalar a outra montanha, pois chegar ao seu topo será seu novo desafio.

04 – Imagine que esse cartum seja uma representação da conquista do espaço. Nesse caso, a que corresponderia:
a)   Escalar a montanha?
Os preparativos para a viagem e a viagem em si.

b)   Chegar ao topo da montanha?
A conquista, no espaço, do objetivo traçado.

c)   A terceira cena?
O recomeço de tudo, o aparecimento de novos desafios no espaço.

05 – Qual ou quais dos itens seguintes correspondem a ideia central do cartum de Mordillo?
a)   Querer superar os inimigos é um dos desejos humanos.
b)   A ação humana é impulsionada pelo desejo de desvendar e dominar o desconhecido.
c)   Constantemente estabelecemos novas metas a serem alcançadas.
d)   O ser humano é frágil diante dos obstáculos.

ENTREVISTA: O CONTADOR DE HISTÓRIAS - ROBERTO CARLOS RAMOS - COM GABARITO

Entrevista: O CONTADOR DE HISTÓRIAS 

                    Roberto Carlos Ramos

        O pedagogo Roberto Carlos Ramos emergiu do submundo da violência e das drogas para uma carreira de sucesso. Ex-interno da Febem, ele ganha a vida contando a própria história em palestras para executivos.
        Mineiro de Belo Horizonte, Roberto Carlos Ramos não aceitou o destino que parecia estar reservado para ele. Negro, analfabeto até os 13 anos, drogado, envolvido com assaltos e protagonista de 132 fugas espetaculares da Febem, cansou de ouvir que seu caso era irrecuperável. O curso de sua vida começou a mudar quando foi adotado por uma francesa. Hoje, aos 35 anos, Roberto Carlos é uma prova de que é possível virar o jogo. Ele formou-se em Pedagogia, fez mestrado na Universidade Estadual de Campinas e pós-graduação em Literatura Infantil na França. Sua atividade profissional é contar histórias para crianças, gravadas também em CDs, e dar palestras a executivos das empresas Skol, Petrobras, Companhia Vale do Rio Doce, entre outras. Ele concedeu esta entrevista em Ibirité, região metropolitana de Belo Horizonte, onde divide um casarão inacabado com doze filhos adotivos e a enfermeira Marly, com quem está para se casar.

        CLAUDIA – Como você foi parar na Febem?

       ROBERTO CARLOS – Eu morava com minha família numa casa de dois cômodos na favela. Tínhamos uma vida simples, porém com comida na mesa. Até que meu pai ficou desempregado e começou a faltar tudo. Minha mãe ouviu falar que na Febem havia ensino de qualidade, pomar, piscina e esportes. Eu era o caçula e, como minha mãe trabalhava, não tinha com quem ficar. Aos 6 anos fui para lá.

        CLAUDIA – Como foi sua adaptação?

     ROBERTO CARLOS – Muito difícil, eu chorava sem parar. Ficava na creche, sem contato com os meninos maiores e com os infratores, mas era desprezado e maltratado. Fugi pela primeira vez aos 7 anos. Naquela época existia na TV o Programa da Tia Dulce. Ela era a Xuxa de Belo Horizonte. Prometeram que, no Dia das Crianças, ela faria um show para a gente na Febem. Passei noites em claro esperando. No dia aguardado, mandaram uma tia Dulce falsa. Re- solvi não continuar num lugar onde não me queriam e ainda por cima me enganavam.
        [...]
        "Sorte não existe. A pessoa tem de estar preparada para perceber as oportunidades e agarrá-Ias. Cada um faz a própria sorte. Eu fiz a minha"

          CLAUDIA – Você queria ser adotado?

        ROBERTO CARLOS – Apareciam alguns casais procurando meninos para adotar. Nós ficávamos enfileirados no pátio, ansiosos. Demorou, mas um casal me escolheu. A tia da Febem me disse que, se eu fosse bem-educado, não comesse muito e não fizesse coisa feia, teria chance de ser adotado. Fiquei três dias em jejum e sem fazer xixi e cocô. Me devolveram achando que eu estava doente. Cheguei a morar com outras famílias, mas não deu certo. Teve até um homem que tentou me estuprar. Depois disso, não quis mais ser adotado.

        CLAUDIA – Quando você teve o primeiro contato com as drogas?

        ROBERTO CARLOS – Aos 10 anos já usava cola de sapateiro. Depois, experimentei maconha e gostei. Passei a roubar cada vez mais para sustentar o vício.

        CLAUDIA – Algumas vezes você quis morrer?

     ROBERTO CARLOS – Sempre desejei fazer parte da turma do Cabelinho de Anjo, o cara mais temido da cidade. Fui procurá-lo. Para entrar no grupo, eu teria que passar por uma espécie de batismo de tortura. Eles me bateram até eu desmaiar. Quando acordei, ensanguentado, fui tomado por uma depressão tão profunda que decidi me matar. Deitei no trilho e fiquei esperando o trem. Mas ele passou ao lado.

        CLAUDIA – Quando você voltou a ter esperanças?

        ROBERTO CARLOS – Tinha 12 anos quando uma pedagoga francesa chamada Marguerit Duvas foi conhecer o trabalho da Febem. Ela ouviu alguém dizendo que eu era irrecuperável e quis conversar comigo. Enquanto falávamos, vi que ela usava uma correntinha no braço e pensei em roubá-Ia, mas em vez de esconder o ouro como todo mundo fazia, ela acariciou meu rosto e me convidou para passar uma temporada em sua casa. Achei que ela também ia querer transa r comigo. Aceitei pensando em roubar a casa e depois me mandar. Mas, conforme o tempo ia passando, ela se mostrava cada vez mais generosa. Acabei tirando a ideia da cabeça.

        CLAUDIA – Como era a sua relação com Marguerit?

     ROBERTO CARLOS – Ela era carinhosa, mas rígida, impunha limites. Queria que eu fosse alguém na vida. Contratou dois professores particulares e em seis meses eu aprendi a ler e a escrever em francês e em português. Fiz o Primeiro Grau numa escola particular e o Segundo em Marselha, na França. Sempre discutíamos os meus objetivos, a curto e a longo prazo. Pela primeira vez, tinha uma perspectiva de futuro. Voltei para prestar vestibular para Pedagogia.

        CLAUDIA – Qual foi a maior lição que aprendeu com Marguerit?

       ROBERTO CARLOS – Estávamos de férias e ela disse que eu tinha que experimentar as fantásticas uvas de uma região da França. Antes, viajamos pela Europa, nos divertimos como nunca. Mas eu não tirava as uvas da cabeça. Até que chegamos no tal vinhedo e, finalmente, coloquei um bago na boca. Fiquei muito decepcionado. Marguerit perguntou: "Você não gostou?" E eu: "Ah... gostei, só que são iguais às do Brasil". Ela me disse que naquele momento eu tinha entendido a essência da vida. Que a felicidade nem sempre está em alcançar um objetivo, e sim no caminho da conquista.
        [...] ·
          "Não sentia prazer algum em roubar as pessoas. Pelo contrário. Mas, como me negavam, me ignoravam, me desprezavam, achava justo tirar à força"

        CLAUDIA – Logo depois de se formar você foi estagiar na Febem. Por quê?

        ROBERTO CARLOS – Para provar que o menino irrecuperável tinha vencido.

        CLAUDIA – Foi ali que resolveu iniciar seu trabalho com crianças?

        ROBERTO CARLOS – Depois do expediente, estava saindo da Febem quando um garoto de 9 anos, que roubava, cheirava cola e cocaína, me pediu dinheiro. Não dei. Ele perguntou: “Já aconteceu de você falar com alguém na rua e a pessoa fingir que você não existe?" Me lembrei do quanto doía quando isso ocorria. Convidei o menino para passar uns dias lá em casa. Ele ficou para sempre. Depois dele, vieram outros onze.
          "O brasileiro adora vender uma imagem de coitado. Por melhor que ele seja, se sente inferior, subestima sua capacidade e suas qualidades. Isso é cultural"

        CLAUDIA – Os seus filhos adotivos são adolescentes. Como lida om eles?

      ROBERTO CARLOS – Eles me chamam de velho e me respeitam muito. Eu imponho limites, mas dou amor e carinho. Claro que eles passam pelos problemas típicos da adolescência, mas a gente supera conversando. Todos têm responsabilidades em casa, são obrigados a estudar e os mais velhos a trabalhar. O salário de cada um é dividido: 30% para as despesas pessoais, 30% para terminar a construção da nossa casa, 30% para alimentação e 10% para um projeto de vida (viagens, cursos, auto-escola).
        [...]

        CLAUDIA – O que você diria para aqueles que têm preconceito de adotar crianças mais velhas?

        ROBERTO CARLOS – Existem casais que passam meses, até anos, esperando por um bebê com a cara da família. E eles não Se dão conta de que, às vezes, o filho tão esperado, que trará muita alegria, está pronto há seis anos, aguardando para ser adotado.

        CLAUDIA – A criminalidade está aumentando na classe média. Por que isso está ocorrendo?

       ROBERTO CARLOS – Os jovens têm estudo, internet, carro, roupas caras, carinho dos pais, mas falta perspectiva de vida. As famílias querem proporcionar tudo aos filhos e acabam tolhendo o direito de lutar para conquistar algo. O resultado é a total desmotivação. O que sobra é o desejo de se aventurar, de se drogar, de consumir coisas caras. Isso é um atalho para a criminalidade.
          "Ninguém deve tentar chegar rapidamente ao seu objetivo. Quando se escolhe o caminho mais longo, sobra tempo para refletir e até mudar de rota"

        CLAUDIA – Quando surgiu sua habilidade para contar histórias?

        ROBERTO CARLOS - Cresci inventando várias histórias. Era uma forma de fugir da realidade, de ser aceito na turma. Percebi que podia ser um profissional quando conheci uma espanhola que contou um caso sobre Napoleão e me mostrou um lindo pote que havia pertencido a ele. Ofereci 20 francos pela relíquia. Depois, vi que ela tinha dezenas de potes iguais. Logo falei: "Você me enganou". Ela respondeu: "Não, você acabou de comprar uma boa história". Estudei formas de fazer narrativas interessantes e me apresentava a amigos. Veio o primeiro convite para trabalhar numa festa. A fama se espalhou e eu não parei mais.

        CLAUDIA – E as palestras, de onde veio a ideia?

    ROBERTO CARLOS – Estava contando histórias para crianças na Fundação Acesita, que mantém escolas em Timóteo (MG), quando fui convidado a falar aos funcionários da empresa. Eles achavam que minha experiência de vida ajudaria a aumentar a motivação pessoal e a produtividade. Funcionou. Hoje recebo vários convites para dar palestras em empresas.
        CLAUDIA – Você é feliz?

     ROBERTO CARLOS – Fui batalhando, correndo atrás de projetos durante anos e nunca havia parado para pensar nessa resposta. Uma rede de televisão da França veio ao Brasil para documentar o trabalho que faço. Quando vi o programa editado, não acreditei que o personagem daquele conto de fadas era eu. Claro que sou feliz ... mas quero muito mais.
                       Monica Gailewitch. Cláudia, nov. 2000.
Fonte: Livro- PORTUGUÊS: Linguagens – Willian R. Cereja/Thereza C. Magalhães – 6ª Série – Atual Editora -2002 – p. 165-8.
Entendendo a entrevista:
01 – O que significa a sigla Febem?
      Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor.

02 – Em linguagem jornalística, entrevista é o texto resultante de um encontro previamente marcado entre duas pessoas, em que uma interroga a outra sobre sua profissão, suas ações, suas ideias. O entrevistado é quase sempre uma figura de destaque num determinado campo da vida social e é ele quem autoriza ou não a publicação de suas declarações. Na entrevista em estudo:

a)   Quem é o entrevistador?
Monica Gailewltch, jornalista da revista Claudia.

b)   Em que se destaca o entrevistado Roberto Carlos Ramos?
O entrevistado é uma pessoa que conseguiu se destacar profissionalmente, depois de ter sido interno da Febem e de ter convivido com a violência e as drogas.

03 – Essa entrevista foi publicada numa revista cujo público é predominantemente feminino e adulto. O título da entrevista, "O contador de histórias", refere-se a uma habilidade do entrevistado. Levante hipóteses: Por que a jornalista teria escolhido esse título?
      Resposta pessoal do aluno. Sugestão: Para atrair a atenção de seu público leitor – mulheres, profissionais, donas de casa, mães – para o assunto da entrevista.

04 – Abaixo da fotografia do entrevistado, há um texto que se destaca, escrito com um tipo de letra em corpo maior. Que tipo de informação ele transmite?
      Uma síntese a respeito do entrevistado.

05 – Antes da entrevista propriamente dita, há um texto que a introduz. Qual é a finalidade desse texto introdutório?
      Fazer uma apresentação do entrevistado, dando, em linhas gerais, informações sobre sua vida pessoal e profissional, e do assunto que será tratado.

06 – Essa entrevista está sob a forma de perguntas e respostas, precedidas do nome do entrevistado e do nome da revista que o entrevistador representa. Observe as perguntas feitas ao entrevistado.
a)   As perguntas demonstram que elas foram previamente preparadas? Justifique sua resposta.
Sim, pois elas não se repetem e fazem referências à vida pessoal e profissional do entrevistado, o que mostra que a entrevistadora já tinha informações sobre o entrevistado.

b)   Com vistas a chamar a atenção do público leitor da revista – formado principalmente por mulheres adultas –, para que tipos de assunto as perguntas se direcionam?
Para assuntos como a criminalidade, a Febem, a adoção de crianças mais velhas, o trabalho voluntário com crianças, como lidar com adolescentes.

07 – Observe as respostas do entrevistado.
a)   Elas revelam que ele está à vontade diante da entrevistadora? Justifique sua resposta.
Sim, porque as respostas demonstram que o entrevistado tem conhecimento do assunto abordado, dá exemplos e opiniões sobre eles.

b)   O entrevistado tem filhos adotivos adolescentes. Em que se baseia o relacionamento entre o entrevistado e os adolescentes?
Na colocação de limites, no carinho e no amor, no diálogo, na cooperação mútua.

08 – Observe a linguagem empregada pela entrevistadora e pelo entrevistado. Que variedade linguística ele usam?
      A variedade padrão.

09 – Quando conversamos, é comum interrompermos o pensamento, deixando frases incompletas, empregarmos gestos no lugar de uma frase, usarmos palavras e expressões como , então, como eu disse, , etc. Nessa entrevista, não há marcas de informalidade desse tipo. Levante hipóteses: Por que você acha que elas não apareceram na entrevista escrita?
      Resposta pessoal do aluno.

10 – Reúna-se com seus colegas de grupo e concluam: Quais são as características da entrevista?
      Resposta pessoal do aluno.