Crônica: Onde já se viu?
Tatiana Belinky
Uma
tarde de inverno, estava eu lá, na Rua Barão de Itapetininga, mexendo nas
estantes de uma livraria. (Não consigo passar por uma sem entrar pra fuçar no
meio dos livros. Desde que eu tinha quatro anos de idade – o que já faz muito
tempo – livro para mim é a coisa mais gostosa do mundo. A gente nunca sabe que
surpresa vai encontrar entre duas capas. Pode ser coisa de boniteza, ou de
tristeza, ou de poesia, ou de risada, ou de susto, sei lá. Um livro é sempre
uma aventura, vale a pena tentar!)
Fonte:https://www.google.com/url?sa=i&url=http%3A%2F%2Fsaopaulo-40s-50s-60s.blogspot.com%2F2017%2F01%2Frua-barao-de-itapetininga.html&psig=AOvVaw0hkA3QRH-GuMW7FQWPmMM7&ust=1719869126581000&source=images&cd=vfe&opi=89978449&ved=0CBEQjRxqFwoTCOiZt_mhhIcDFQAAAAAdAAAAABAE
Pois bem, estava eu ali, muito
entretida, examinando os livros, quando de repente senti que alguém me puxava
pela manga. Olhei para baixo e vi um menino – um garotinho de uns nove ou dez
anos, magrelo, sujinho, de roupa esfarrapada e pé no chão. Uma dessas crianças
que andam largadas pelas ruas da cidade, pedindo esmola. Ou, no melhor dos
casos, vendendo colchetes ou dropes, essas coisas. Eu já ia abrindo a bolsa
para livrar-me logo dele, quando o garoto disse:
-- Escuta, dona... (Naquele tempo,
ninguém chamava a gente de tia: tia era só a irmã do pai ou da mãe.)
-- O quê? – perguntei. – O que você
quer?
-- Eu... dona, me compra um livro? –
disse ele baixinho, meio com medo.
Dizer que fiquei surpresa é pouco. O
jeito do menino era de quem precisava de comida, de roupa, isso sim. Duvidei do
que ouvira:
-- Você não prefere algum dinheiro? –
perguntei.
-- Não, dona – disse o garoto, mais
animado, olhando-me agora bem nos olhos. – Eu queria um livro. Me compra um
livro?
Meu coração começou a bater forte.
-- Escolha o livro que você quiser –
falei.
As pessoas na livraria começaram a
observar a cena, incrédulas e curiosas. O menino já estava junto à prateleira,
examinando ora um ora outro livro, todo excitado. Um vendedor se aproximou,
meio desconfiado, com cara de querer intervir:
-- Deixe o menino escolher um livro –
falei. – Eu pago.
As pessoas em volta me olhavam
admiradas. Onde já se viu alguém comprar um livro para um molequinho
maltrapilho daqueles?
Pois vou lhes contar: foi exatamente o
que se viu naquela tarde, naquela livraria. O menino acabou se decidindo por um
livro de aventuras, nem me lembro qual. Mas me lembro bem da minha emoção
quando lhe entreguei o volume e vi seus olhinhos brilhando ao me dizer um
apressado "obrigada, dona!" antes de sair em disparada abraçando o
livro apertado ao peito.
Quanto aos meus próprios olhos, estes
se embaçaram estranhamente, quando pensei comigo: "Tanta criança rica não
sabe o que perde, não lendo, e este pobre menino – que certamente não era um
pobre menino – sabe o valor que tem essa maravilha que se chama livro!"
Isso aconteceu há vários anos. Bem que
eu gostaria de saber o que foi feito daquele menino...
BELINKY, Tatiana. Onde já se viu? Em: Olhos de ver. São Paulo: Moderna,
2015. p. 19-21. (Coleção Veredas).
Entendendo
a crônica:
01
– Onde a autora estava quando encontrou o menino?
A autora estava
na Rua Barão de Itapetininga, em uma livraria.
02
– Qual era a primeira reação da autora quando o menino puxou sua manga?
A primeira reação
da autora foi pensar em abrir a bolsa para dar dinheiro ao menino e livrar-se
logo dele.
03
– O que o menino pediu à autora?
O menino pediu
para a autora comprar um livro para ele.
04
– Como a autora se sentiu ao ouvir o pedido do menino?
A autora ficou
surpresa e seu coração começou a bater forte.
05
– Qual foi a resposta da autora ao pedido do menino?
A autora disse ao
menino para escolher o livro que ele quisesse, e que ela pagaria.
06
– Como as pessoas na livraria reagiram à situação?
As pessoas na
livraria observaram a cena incrédulas e curiosas, admiradas com a situação.
07
– Qual foi a reflexão final da autora sobre o acontecimento?
A autora refletiu
que muitas crianças ricas não sabem o que perdem por não lerem, enquanto o
menino pobre sabia o valor que um livro tem. Ela também expressou curiosidade
sobre o que teria acontecido com aquele menino nos anos seguintes.