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Espírita: O livro dos Espíritos
ALLAN KARDEC –
Tradução Matheus R. Camargo
Perguntas
e respostas
Livro Segundo
MUNDO
ESPÍRITA OU DOS ESPÍRITOS
Capítulo II
ENCARNAÇÃO DOS ESPÍRITOS
MATERIALISMO
147 – Por que os
anatomistas, os fisiologistas e, em geral aqueles que se aprofundam nas
ciências naturais são tão frequentemente levados ao materialismo?
-- O fisiologista
relaciona tudo àquilo que vê. Orgulho de homens que julgam tudo saber, não
admitindo que algo possa ultrapassar o seu entendimento. Seu próprio
conhecimento lhes dá essa presunção; pensam que a Natureza não lhes pode ter
ocultado nada.
148 – Não é lamentável que
o materialismo seja uma consequência de estudos que deveriam, ao contrário,
mostrar ao homem a superioridade da inteligência que governa o mundo? Deve-se
concluir que eles são perigosos?
-- Não é verdade
que o materialismo seja uma consequência desses estudos; é o homem que deles
tira uma falsa consequência, pois pode fazer mau uso de tudo, mesmo das
melhores coisas. O nada, aliás, assusta-os mais do que eles querem demonstrar,
e os espíritos fortes são, muitas vezes, mais fanfarrões do que valentes. A
maior parte deles só é materialista por não ter nada que preencha este vazio
experimentado ante o abismo que se abre à sua frente. Mostrai-lhes uma tábua de
salvação, e eles se agarrarão prontamente a ela.
Por uma aberração
da inteligência, há pessoas que só veem nos seres orgânicos a ação da matéria,
atribuindo a ela todos os nossos atos. Veem, no corpo humano, somente a máquina
elétrica. Limitaram o estudo do mecanismo da vida ao funcionamento dos órgãos;
viram a vida extinguir-se pela ruptura de um fio, e não perceberam nada além
desse fio. Procuraram descobrir se restava algo, e como só encontraram a
matéria inerte, não viram a alma escapar e nem puderam apanhá-la, concluíram
que tudo estava nas propriedades da matéria e que, assim, após a morte há penas
a aniquilação do pensamento. Triste consequência, se assim fosse, pois então
não haveria finalidade para o bem e o mal, o homem estaria certo em pensar
apenas em si mesmo e em colocar a satisfação de seus prazeres materiais acima
de tudo; os laços sociais seriam rompidos e os afetos mais puros
irreversivelmente destruídos. Felizmente, essas ideias estão longe de ser
generalizadas; pode-se até dizer que elas são muito circunscritas e que
constituem apenas opiniões individuais, pois em parte alguma foram
transformadas em doutrina. Uma sociedade fundada sobre essas bases traria em si
o germe de sua dissolução, e seus membros iriam dilacerar-se mutuamente como
animais ferozes.
O homem tem,
instintivamente, a convicção de que, para ele, nem tudo termina com a vida; tem
horror ao nada. Em vão se esforça para resistir à ideia da vida futura, quando
chega o momento supremo; poucos são os que não se perguntam o que vai ser de
si, pois a ideia de deixar sem retorno tem algo de desolador. Quem realmente
poderia encarar com indiferença uma separação absoluta e eterna de tudo o que
amou? Quem suportaria, sem terror, ver abrir-se diante de si o imenso abismo do
nada, onde seriam tragadas todas as nossas faculdades, todas as nossas
esperanças, e dizer: “O quê! Depois de mim, nada, mais nada, a não ser o vazio;
tudo está irreversivelmente acabado; mais alguns dias e minha lembrança será
apagada da memória dos que sobreviveram a mim; em breve não restará nenhum
traço de minha passagem pela Terra; até mesmo o bem que fiz será esquecido
pelos ingratos a quem ajudei. E não há para compensar tudo isso, nenhuma outra
perspectiva, a não ser a do meu corpo devorado pelos vermes!”
Esse quadro não tem algo de tenebroso, de
glacial? A religião nos ensina que não pode ser assim e a razão nos confirma
isso. No entanto, essa existência futura, vaga e indefinida, não tem nada que
satisfaça nosso amor pela positividade; e é isso que, em muitos, engendra a
dúvida. Temos uma alma, que seja; mas o que é a nossa alma? Ela tem uma forma,
uma aparência qualquer? É um ser limitado ou indefinido? Uns dizem que é um
sopro de Deus; outros, que é uma centelha, outros, uma parte do Grande Todo, o
princípio da vida e da inteligência. Mas o que tudo isso nos ensina? De que nos
vale ter uma alma se, extinguindo-se nossa vida, ela se perde na imensidão como
as gotas d’água no Oceano? A perda de nossa individualidade não equivale, para
nós, ao nada? Diz-se ainda que a alma é imaterial; mas uma coisa imaterial não
poderia ter proporções definidas; e, para nós, isso não é nada. A religião
também nos ensina que seremos felizes ou infelizes, conforme o bem ou o mal que
tivermos feito. Mas que bem-aventurança é esta que nos aguarda no seio de Deus?
É uma beatitude, uma contemplação eterna, sem outra finalidade senão cantar
louvores ao Criador? As chamas do inferno são uma realidade ou uma figura? A
própria Igreja entende o inferno nesse último sentido, mas que sofrimentos são
esses? Onde fica esse lugar de suplício? Em resumo, o que se faz e o que se vê
nesse mundo que espera por todos nós? Costuma-se dizer que ninguém retornou
para nos prestar contas. Isto é um erro, e a missão do Espiritismo é precisamente
esclarecer-nos sobre esse futuro, fazer-nos – até certo ponto – tocá-lo com os
dedos e olhos, não mais através do raciocínio, mas pelos fatos. Graças às
comunicações espíritas, isto não é mais uma presunção, uma probabilidade sobre
a qual cada um aborda a seu modo, e que os poetas embelezam com suas ficções ou
semeando imagens alegóricas que nos enganam.
É uma realidade que nos
aparece, pois são os próprios seres de além-túmulo que nos vêm descrever sua
situação, dizer-nos o que fazem, permitir-nos assistir, por assim dizer, a
todas as peripécias de sua nova vida. Dessa forma, mostram-nos o destino
inevitável que nos é reservado, de acordo com nossos méritos e delitos. Há
nisto algo de anti-religioso? Muito pelo contrário, pois os incrédulos aí encontram
a fé, e os indecisos um meio de renovar o fervor e a confiança. O Espiritismo
é, portanto, o mais poderosos aliado da a religião. E, se é assim, é porque
Deus o permite, e Ele o permite com o intuito de reanimar nossas esperanças
vacilantes e de conduzir-nos de volta ao caminho do bem, pela perspectiva do
futuro.