sexta-feira, 4 de maio de 2018

CONTO: UM HOMEM DE CONSCIÊNCIA - MONTEIRO LOBATO - COM GABARITO

CONTO: UM HOMEM DE CONSCIÊNCIA
                 Monteiro Lobato
  
     Chamava-se João Teodoro, só. O mais pacato e modesto dos homens. Honestíssimo e lealíssimo, com um defeito apenas: não dar o mínimo valor a si próprio. Para João Teodoro, a coisa de menos importância no mundo era João Teodoro.
     Nunca fora nada na vida, nem admitia a hipótese de vir a ser alguma coisa. E por muito tempo não quis nem sequer o que todos queriam: mudar-se para terra melhor.
     Mas João Teodoro acompanhava com aperto de coração o desaparecimento visível de sua Itaoca.
     – Isto já foi muito melhor, dizia consigo. Já teve três médicos bem bons – agora só um, e bem ruinzote. Já teve seis advogados e hoje mal dá serviço para um rábula ordinário como o Tenório. Nem circo de cavalinhos bate mais por aqui. A gente que presta se muda. Fica o restolho. Decididamente, a minha Itaoca está se acabando…
     João Teodoro entrou a incubar a ideia de também mudar-se, mas para isso necessitava dum fato qualquer que o convencesse de maneira absoluta de que Itaoca não tinha mesmo conserto ou arranjo possível.
     – É isso, deliberou lá por dentro. Quando eu verificar que tudo está perdido, que Itaoca não vale mais nada de nada de nada, então eu arrumo a trouxa e boto-me fora daqui.
     Um dia aconteceu a grande novidade: a nomeação de João Teodoro para delegado. Nosso homem recebeu a notícia como se fosse uma porretada no crânio. Delegado, ele! Ele que não era nada, nunca fora nada, não queria ser nada, não se julgava capaz de nada…
     Ser delegado numa cidadezinha daquelas é coisa seríssima. Não há cargo mais importante. É o homem que prende os outros, que solta, que manda dar sovas, que vai à capital falar com o governo. Uma coisa colossal ser delegado – e estava ele, João Teodoro, de-le-ga-do de Itaoca!
     João Teodoro caiu em meditação profunda. Passou a noite em claro, pensando e arrumando as malas. Pela madrugada, botou-as num burro, montou no seu cavalinho magro e partiu.
     Antes de deixar a cidade, foi visto por um amigo madrugador.
     – Que é isso, João? Para onde se atira tão cedo, assim de armas e bagagens?
     – Vou-me embora, respondeu o retirante. Verifiquei que Itaoca chegou mesmo ao fim.
      – Mas como? Agora que você está delegado?
     – Justamente por isso. Terra em que João Teodoro chega a delegado, eu não moro. Adeus.
     E sumiu.
(Monteiro Lobato, CIDADES MORTAS. 12a Edição.
São Paulo, Editora Brasiliense, 1965)


Entendendo o texto:
01 – O texto de Monteiro Lobato retrata uma cidade que teve seus grandes dias na cultura do café. Pouco a pouco, entretanto, a cidade foi-se acabando. Dentre as alternativas abaixo qual a que explica a debilidade de Itaoca:
a.(  ) A deficiência dos meios de transporte impedia o escoamento da produção do café.
b.(X) As pessoas mais cultas mudavam-se, buscando o conforto das grandes cidades.
c.(  ) O enfraquecimento das terras fazia o eixo econômico deslocar-se para outra região.
d.(  ) Os cargos importantes foram dados, por abuso de poder político, a pessoas incapacitadas.

02 – O autor descreve João Teodoro como homem pacato, modesto, honesto, leal. Qual destas características poderia também fazer parte dessa descrição?
a.(  ) otimista                               b.(  ) derrotista          
c.(  ) idealista                              d.(X) conformista.


03 – João Teodoro resistiu à ideia de mudar-se, mas essa decisão não era definitiva. Em que situação ele se mudaria?
a.( ) Quando não tivesse mais ninguém morando na cidade.
b.( ) Quando a cidade voltasse a ser o que era antes.
c.(X) Quando algum fato o convencesse de que a cidade não oferecia mais motivo para continuar morando nela.
d.( ) Quando a cidade não tivesse mais nem médicos e advogados.

04 – No entender de João Teodoro, as atribuições do delegado são: “…que prende os outros, que solta, que manda dar sovas, que vai à capital falar com o governo.” Ele está:
a.(  ) certo, pois são essas as atribuições de todo delegado, de acordo com a Lei.
b.(X) errado, pois os delegados só podem prender ou soltar pessoas mediante autorização do juiz; não podem autorizar nenhum tipo de castigo corporal, psicológico ou mental.
c.(  ) certo, porque são os delegados que decidem tudo o que deve ser feito na cidade onde atuam.
d.(  ) errado, porque são do governador essas atribuições.
  
05 – Dê o significado dos verbos destacados nas frases abaixo:
a.   Nem circo de cavalinho bate mais por aqui.
Aparece.
b.   João Teodoro entrou a incubar a ideia de também mudar-se.
Pensar na ideia, amadurecer a ideia.
  
06 – Dê o significado das seguintes palavras que aparecem no texto:
a. pacato: Homem que não fala muito, é quieto e que não briga com ninguém.
b. rábula: Pessoa que atua como advogado, sem ter concluído um curso de Direito.
c. restolho: Resto, material ou pessoa sem qualidade.

07 – Explique a diferença de sentido entre:
a) ser delegado: Ter estudado e ter feito um concurso público para exercer tal profissão.
b) estar delegado: Exercer a atividade porque foi designado por autoridade governamental, sem concurso.

quinta-feira, 3 de maio de 2018

CONTO: COMO SE FOSSE DINHEIRO - RUTH ROCHA - COM GABARITO

Conto: Como se fosse dinheiro
             Ruth Rocha

    Todos os dias, Catapimba levava dinheiro para a escola para comprar o lanche.
     Chegava no bar, comprava um sanduíche e pagava seu Lucas.
     Mas seu Lucas nunca tinha troco:
     – Ô, menino, leva uma bala que eu não tenho troco.
     Um dia, Catapimba reclamou de seu Lucas:
     – Seu Lucas, eu não quero bala, quero meu troco em dinheiro.
     – Ora, menino, eu não tenho troco. Que é que eu posso fazer?
     – Ah, eu não sei! Só sei que quero meu troco em dinheiro!
     – Ora, bala é como se fosse dinheiro, menino! Ora essa… […]
     Aí, o Catapimba resolveu dar um jeito.
     No dia seguinte, apareceu com um embrulhão debaixo do braço. Os colegas queriam saber o que era. Catapimba ria e respondia:
     – Na hora do recreio vocês vão ver…
     E, na hora do recreio, todo mundo viu.
    Catapimba comprou o seu lanche. Na hora de pagar, abriu o embrulho. E tirou de dentro… uma galinha.
     Botou a galinha em cima do balcão.
     – Que é isso, menino? – perguntou seu Lucas.
    – É para pagar o sanduíche, seu Lucas. Galinha é como se fosse dinheiro… O senhor pode me dar o troco, por favor?
    Os meninos estavam esperando para ver o que seu Lucas ia fazer.
     Seu Lucas ficou um tempão parado, pensando…
     Aí, colocou umas moedas no balcão:
     – Está aí seu troco, menino!
     E pegou a galinha para acabar com a confusão.
     No dia seguinte, todas as crianças apareceram com embrulhos debaixo do braço.
     No recreio, todo mundo foi comprar lanche.
     Na hora de pagar…
    Teve gente que queria pagar com raquete de pingue pongue, com papagaio de papel, com vidro de cola, com geleia de jabuticaba…
    E, quando seu Lucas reclamava, a resposta era sempre a mesma:
     – Ué, seu Lucas, é como se fosse dinheiro…
                                                                                     Ruth Rocha.

Entendendo o conto:
01 – Qual é o título do texto?
      O título do texto é “Como se fosse dinheiro”.

02 – Em que local se ocorre à história?
      A história se passa na escola de Catapimba.

03 – Quantos e quais são os personagens da história?
      Os personagens da história são o Catapimba, seu Lucas e os colegas.

04 – Qual o principal conflito da história?
      O principal conflito da história é que seu Lucas ao invés de dar o troco ele dava balinhas.

05 – O que seu Lucas usava como dinheiro?
      Ele usava balinhas como troco.

06 – O que Catapimba resolveu usar como dinheiro?
      Catapimba resolveu usar uma galinha como se fosse dinheiro.

07 – Como seu Lucas reagiu quando Catapimba pagou sem usar dinheiro?
      Ele ficou confuso, mas acabou aceitando para evitar confusão.

08 – Como se resolveu essa situação?
      Seu Lucas resolveu aceitar os pagamentos das crianças, porque ele sempre dava balas dizendo que valia como dinheiro.

09 – Esta história possui um narrador, ele participa da história ou só faz a narração?
      A história possui um narrador que não participa.

10 – Já aconteceu com você, situação parecida com a da história? Conte o que aconteceu.
      Resposta pessoal, o aluno deve contar uma situação em que recebeu outro tipo de troco.

11 – Quando o Seu Lucas reclamava, qual era a resposta dos meninos?
      “Ué, seu Lucas, é como se fosse dinheiro...”.

FÁBULA: UM TOMATE FAZENDO DE CONTA QUE ERA BOLA - KARINA KASPER - COM GABARITO


Fábula: UM TOMATE FAZENDO DE CONTA QUE ERA BOLA
              Karina Kasper


    Enquanto acontecia a feira naquela pequena cidade, existia um tomate muito infeliz.
     Ele sabia que logo adiante, em uma linda pracinha, muitos meninos jogavam futebol entusiasmados. Só que o pobre tomate tinha uma imensa vontade de também ter alguém que brincasse com ele, sorrisse para ele, vivesse com ele. Talvez já soubesse que tomates não tem amigos, a não ser, é claro, os outros tomates. Tudo isso ia o deixando muito triste.
       Certa noite, quando todas as frutas e verduras já haviam sido recolhidas de suas tendas, o pequeno tomate resolveu dar um jeito na sua situação e saiu em busca de novos amigos. Passou por uma florzinha vermelha como sua cor e lhe disse:
         – Olá linda flor! Quer ser minha amiga?
       E a flor muito tímida vendo aquele tomate a seu lado, quase não sabia o que dizer naquele momento. Suas pétalas tremiam e achou melhor fazer de conta que não sabia falar. Muito desapontado o tomate seguiu seu caminho. Numa curva encontrou duas figuras muito estranhas conversando e decidiu entrar no papo.
         – Olá. Gostariam de ser meus amigos?
     O sapo que vestia uma roupa esquisita, analisou aquele pequeno e frágil tomate e disse:
       – Não lhe conhecemos e você é apenas um horrível tomate! Acha que seríamos amigos de um tomate?
         – Desculpe, eu pensei… E antes do tomate poder se explicar o besouro com um chapelão enorme interrompeu:
       – Desde quando tomates pensam? E além do mais aqui não tem lugar para você! Tchau. E foram-se embora, em um lugar bem longe, onde jamais o tomate os encontrariam.
    Pobre tomate! Sentia-se cada vez mais só. Mas não desistiu de encontrar alguém que pudesse ser seu amigo de verdade. Porém, ao parar em baixo de uma árvore, ouviu vozes. Olhou para o seu lado direito e viu duas crianças rindo. De quê, ele não sabia.
        – Já sei! Vou perguntar por que riem tanto e assim pode ser que gostem de mim.
        – Olá. Posso saber do que estão rindo?
     As crianças agora não acharam nenhuma graça, estavam assustadas com o que estava acontecendo.
       – Uma bola que fala? Perguntou a menina que se chamava Lia.
       – É. Parece que ela falou alguma coisa. Respondeu Manuel.
       – Sim, eu falo. Mas… não sou uma bola.
      As crianças se olharam e continuaram a rir sem parar. O tomate se incomodou com isso e tentou somente mais uma vez:
     – Está bem! Podem continuar rindo se quiserem, mas saibam que eu só queria ser amigo de vocês. Eu queria muito. Mas vi que vocês não gostaram nada de mim e por isso vou embora.
      Ao ouvir isso, Lia o chamou:
      – Ei, espere! Nós rimos porque você disse que não era bola.
      – Sim, e eu não sou bola. Sou um tomate.
     As gargalhadas voltaram a se repetir. O tomate foi se retirando devagar, sem que fosse percebido. Naquele momento, só pensava nos meninos que jogavam bola naquela pracinha perto da feira e na maneira gostosa que brincavam com a bola no gramado. Chegou a pensar que se aqueles meninos quisessem que ele fosse bola, aceitaria sim. Aos poucos ia se dando conta de que todos fugiam só porque era um tomate. Na certa, achavam que não valia a pena ser amigo de alguém tão vermelho, pequeno e que ainda por cima se chamava tomate. E só pensava agora em ser bola.     A bola daqueles meninos. E daí então teria amigos. Passou na frente da pracinha, onde doze meninos jogavam bola alegremente. Ficou horas parado observando o jogo. De repente, a bola que era uma bola pequena, meio alaranjada, foi parar no meio da rua. Neste instante veio um carro em alta velocidade e passou por cima da bola. Artur, o dono da bola, ficou desconsolado com o acidente e sentiu até vontade de chorar. Então o jogo terminou. Sem bola, seria impossível continuar um jogo de futebol. O tomate que queria ser bola para assim ter amigos, mudou de ideia na mesma hora. Não queria ser esmagado por um carro, ou chutado com força por um menino. Ele se deu conta de que não poderia ser amigo de alguém que o chutasse. Assim, pensou que o melhor a fazer era voltar para a feira. Lá teria amigos como ele: vermelhos, redondos e o que é melhor, com seu mesmo nome.
                                                                        Autora: Karina Kasper
Entendendo a fábula:

01 – Qual é o título do texto?
      O título do texto é “Um tomate fazendo de conta que era bola”.

02 – Quem é o autor do texto?
      A autora do texto é Karina Kasper.

03 – Quem é o personagem principal do texto?
      O personagem principal do texto é o tomate.

04 – Quantos e quais são os personagens que se apresentam no texto?
      Os personagens do texto são 7, o tomate, a florzinha, o sapo, o besouro, Lia, Manuel, Artur.

05 – Onde se passa a história?
      Esta história se passa em um bairro que tem uma feira.

06 – O que mais desejava o tomate?
      O que ele mais queria era ter um amigo.

07 – Ele conseguiu o que queria quando saiu da feira? Justifique sua resposta.
      Ele não conseguiu, ele voltou para a feira para seus amigos tomates.

08 – O que pensou o tomate quando o carro passou por cima da bola?
      Ele pensou que gostaria de ser amigos das pessoas, mas ele pensou melhor e decidiu que não queria ser amigo de pessoas que o chutassem ou que ele pudesse ser atropelado.

09 – Por que o tomate decidiu voltar para casa?
      Ele decidiu voltar para casa pois percebeu que lá estavam seus amigos de verdade.



TEXTO: TROCANDO AS BOLAS - PEDRO BANDEIRA - COM INTERPRETAÇÃO/GABARITO


TEXTO:  TROCANDO AS BOLAS

     — Atirei o pau no gato-to-to, vamos todos cirandar, o cravo saiu ferido-do-do, para o meu amor passar.

    __Que mania você tem de misturar tudo, Troca Bolas!  — reclamava a meninada.  — Assim não dá para brincar de roda. Você nunca canta os versos direito!
     Troca Bolas era assim mesmo. Adorava confundir tudo.
    Quando a irmãzinha do Troca Bolas pedia para ele contar uma história, o menino saía com esta:
      — Era uma vez uma menina muito bonita, com a pele branca como a neve, que vivia num castelo de uma madrasta muito má. Um dia, ela colocou um chapeuzinho vermelho e foi levar doces para a vovozinha. Aí ela subiu uma escada e perdeu o sapatinho de cristal. Por isso, a bruxa prendeu a coitadinha numa torre e os cabelos dela ficaram compridos e o príncipe subiu neles para salvá-la...
     É claro que a irmã do Troca Bolas não entendia nada. Mas como ainda era muito pequena, ria a valer.
     E assim Troca bolas ia vivendo. Misturava tudo e o pessoal tinha de fazer um esforço tremendo para desmisturar as histórias dele.
     Um dia a criançada estava brincando na praça, numa tarde de sol, em volta de um laguinho de cimento, quando alguém gritou:
      — Acudam! A gatinha da irmã de Troca Bolas caiu no lago!
      — Quem vai entrar no lago para tirar a gatinha de lá?
      Só que não foi preciso que ninguém se molhasse. Rapidamente, a água do lago começou a baixar e a gatinha conseguiu sair do lago.
     O que tinha acontecido? Troca Bolas tinha corrido para abrir o registro da água e esvaziar o lago. Todos aplaudiram:
      — Grande ideia, Troca Bolas! Como é que você pensou nisso?
      — Muito simples! — respondeu o menino. — Vocês não estavam pensando em tirar a gatinha da água? Pois eu pensei em tirar a água da gatinha.
(Pedro Bandeira – adaptação)

Entendendo o texto:
01 – Enumere os parágrafos.  
O texto tem 07 parágrafos.

02 – Leia o 1º parágrafo e escreva o que você descobriu.
      Que o menino misturava todos os versos.

03 – Escreva um parágrafo contando por que o personagem principal da história se chama Troca Bolas.
      Troca Bolas era assim mesmo. Adorava confundir tudo.

04 – Circule, no texto, o parágrafo em que Troca Bolas conta uma história para sua irmãzinha.
      2º parágrafo.

05 – Releia o parágrafo que você circulou. Escreva o nome de duas histórias que aparecem nesse parágrafo.
       - Rapunzel e Chapeuzinho vermelho.

06 – Leia com atenção as frases abaixo e marque com um ( X ) as expressões que melhor substituem as expressões grifadas.
a) Mas, como era muito pequena, ria a valer.
(   ) sorria
(Xria muito
(   ) ria baixo.

b) O pessoal tinha que fazer um esforço tremendo para desmisturar as histórias dele.
(Xgrande esforço/desfazer
(   ) pouco esforço/juntar
(   ) relaxamento/bagunçar

07 – Explique o que aconteceu com a gata da irmã de Troca Bolas.
       Ela conseguiu sair do lago.

08 – Justifique a afirmativa abaixo.
      “Ninguém se molhou para salvar a gatinha.”
      Porque o Troca Bola esvaziou o lago.





CONTO: A MODORRA - MONTEIRO LOBATO - COM GABARITO

CONTO: A MODORRA
                 Monteiro Lobato


        Um dia Pedrinho enganou Dona Benta que ia visitar o tio Barnabé, mas em vez disso tomou o rumo da mata virgem de seus sonhos. Nem o bodoque levou consigo. “Para que bodoque, se levo o saci na garrafa e ele é uma arma melhor do que quanto canhão ou metralhadora existe?”
    Que beleza! Pedrinho nunca supôs que uma floresta virgem fosse tão imponente. Aquelas árvores enormes, velhíssimas, barbadas de musgos e orquídeas; aquelas raízes de fora dando ideia de monstruosas sucuris; aqueles cipós torcidos como se fossem redes; aquela galharada, aquela folharada e sobretudo aquele ambiente de umidade e sombra, lhe causaram uma impressão que nunca mais se apagou.
        Volta e meia ouvia um rumor estranho, de inambu ou jacu a esvoaçar por entre a folhagem, ou então, de algum galho podre que tombava do alto e vinha num estardalhaço — brah, ah, ah… — esborrachar-se no chão.
        E quantas borboletas, das azuis, como cauda de pavão; das cinzentas, como casca de pau; das amarelas, cor de gema de ovo!
        E pássaros! Ora um enorme tucano de bico maior que o corpo e lindo papo amarelo. Ora um pica-pau, que interrompia o seu trabalho de bicar a madeira de um tronco para atentar no menino com interrogativa curiosidade.
        Até um bando de macaquinhos ele viu, pulando de galho em galho com incrível agilidade e balançando-se, pendurados pela cauda, como pêndulos de relógio.
        Pedrinho foi caminhando pela mata adentro até alcançar um ponto onde havia uma água muito límpida, que corria, cheia de barulhinhos mexeriqueiros, por entre velhas pedras verdoengas de limo. Em redor erguiam-se as esbeltas samambaiaçus, esses fetos enormes que parecem palmeiras. E quanta avenca de folhagem mimosa, e quanto musgo pelo chão!
        Encantado com a beleza daquele sítio, o menino parou para descansar. Juntou um monte de folhas caídas; fez cama; deitou-se de barriga para o ar e mãos cruzadas na nuca. E ali ficou num enlevo que nunca sentira antes, pensando em mil coisas em que nunca pensara antes, seguindo o voo silencioso das grandes borboletas azuis e embalando-se com o chiar das cigarras.
        De repente, notou que o saci dentro da garrafa fazia gestos de quem quer dizer qualquer coisa.
        Pedrinho não se admirou daquilo. Era tão natural que o capetinha afinal aparecesse…
        — Que aconteceu que está assim inquieto, meu caro saci? — perguntou-lhe em tom brincalhão.
      — Aconteceu que este lugar é o mais perigoso da floresta; e que se a noite pilhar você aqui, era uma vez o neto de Dona Benta…
        Pedrinho sentiu um arrepio correr-lhe pelo fio da espinha.
        — Por quê? — perguntou, olhando ressabiadamente para todos os lados.
        — Porque é justamente aqui o coração da mata, ponto de reunião de sacis, lobisomens, bruxas, caiporas e até da mula-sem-cabeça. Sem meu socorro você estará perdido, porque não há mais tempo para voltar para casa, nem você sabe o caminho. Mas o meu auxílio eu só darei sob uma condição…
        — Já sei, restituir a carapuça — adiantou Pedrinho.
        — Isso mesmo. Restituir-me a carapuça e com ela a liberdade. Aceita?
        Pedrinho sentia muito ver-se obrigado a perder um saci que tanto lhe custara a apanhar, mas como não tinha outro remédio senão ceder, jurou que o libertaria se o saci o livrasse dos perigos da noite e pela manhã o reconduzisse, são e salvo, à casa de Dona Benta.
        — Muito bem — disse o saci. — Mas nesse caso você tem de abrir a garrafa e me soltar. Terei assim mais facilidade de ação. Você jurou que me liberta; eu dou minha palavra de saci que mesmo solto o ajudarei em tudo. Depois o acompanharei até o sítio para receber minha carapuça e despedir-me de todos.
        Pedrinho soltou o saci e durante o resto da aventura tratou-o mais como um velho camarada do que como um escravo. Assim que se viu fora da garrafa, o capeta pôs-se a dançar e a fazer cabriolas com tanto prazer que o menino ficou arrependido de por tantos dias ter conservado presa uma criaturinha tão irrequieta e amiga da liberdade.
        — Vou revelar os segredos da mata virgem — disse-lhe o saci — e talvez seja você a primeira criatura humana a conhecer tais segredos. Para começar, temos de ir ao “sacizeiro” onde nasci, onde nasceram meus irmãos e onde todos os sacis se escondem durante o dia, enquanto o sol está fora. O sol é o nosso maior inimigo. Seus raios espantam-nos para as tocas escuras. Somos os eternos namorados da lua. É por isso que os poetas nos chamam de filhos das trevas. Sabe o que é trevas?
        — Sei. O escuro, a escuridão.
        — Pois é isso. Somos filhos das trevas, como os beija-flores, os sabiás e as abelhas são filhos do Sol.
        Assim falando, o saci levou o menino para uma cerrada moita de taquaraçus existente num dos pontos mais espessos da floresta.
        Pedrinho assombrou-se diante das dimensões daqueles gomos quase da sua altura e grossos que nem uma laranja de umbigo.
(LOBATO, Monteiro. O saci)
Vocabulário

Modorra: vontade incontrolável de dormir.
Bodoque: arco com duas cordas e uma rede (malha) ou couro em que se põe a bola de barro, pedra ou chumbo, com
que se atira. Também conhecido como estilingue.
Virgem: intacto, puro; diz-se da mata que ainda não foi explorada.
Inambu e jacu: espécies de ave.
Taquaraçu: espécie de bambu.
Pilhar: Agarrar, pegar.

Entendendo o texto:
01 – Após capturar o Saci, Pedrinho enganou Dona Benta e foi para a mata. Diz o texto que o menino não levou sequer o bodoque. Segundo seus conhecimentos sobre esse ser lendário, explique por que o menino acreditava que o Saci era a melhor arma existente.

      Pedrinho acreditava que o Saci possuía poderes mágicos e que poderia ajudá-lo em uma situação de risco.

02 – Pedrinho surpreendeu-se pela imponência, pela grandiosidade daquela floresta. Por que essa mata virgem impunha sua importância? O que ela tinha de diferente de outras florestas?
      A mata visitada por Pedrinho ainda não havia sido explorada pelo homem, não havia qualquer interferência humana, permanecendo com sua estrutura intacta.

03 – No texto narrativo, há o momento em que se tem a apresentação, o início dos acontecimentos. Quais são os fatos que indicam a situação inicial do texto?
      Os fatos que correspondem a situação inicial são quando Pedrinho engana Dona Benta e vai para a mata virgem.

04 – O que Pedrinho fazia no momento em que notou que o Saci dentro da garrafa parecia querer dizer alguma coisa?
      O menino estava deitado, descansando.

05 – No início da conversa entre o Pedrinho e o Saci, aquele falava em um tom brincalhão. O que o Saci disse para que Pedrinho ficasse assustado? Explique o motivo do medo do menino.
      O saci afirmou que ali era o ponto mais perigoso da floresta, pois estavam bem no coração da mata, lugar em que outros seres lendários habitavam.

06 – Saci ofereceu ajuda para livrar Pedrinho dos perigos da noite e levá-lo de volta para casa. Qual foi a condição estabelecida para que isso acontecesse
       Pedrinho deveria devolver a carapuça ao Saci, bem como a liberdade dele.

07 – Segundo o texto, “Pedrinho soltou o Saci e durante o resto da aventura tratou-o mais como um velho camarada do que como um escravo.” O que significa tratar alguém como um velho camarada? E como um escravo?
      Tratar alguém como um velho camarada é o mesmo que tratar a um amigo, com respeito, com brincadeiras e com certa intimidade. Já tratar a um escravo e exigir que se cumpram determinados trabalhos, dar ordens e fazer com que estas sejam cumpridas.

08 – O Saci é chamado no texto de “capeta”. Por que ele recebeu esse apelido?
      Saci levou esse apelido por ser muito sapeca, fazer muitas travessuras.

09 – O primeiro lugar a que o Saci levaria Pedrinho seria o sacizeiro. Como e onde era esse lugar?
      Era uma cerrada moita de taquaraçus num dos pontos mais espessos da floresta.

10 – De acordo com o desfecho desse texto, Pedrinho chegou a ver algum outro Saci, que não o que estava com ele? Qual foi a reação do menino nesse trecho?
      O menino não chega a ver outro Saci, apenas sente-se assombrado por estar naquele lugar em que esses seres nascem.

11 – Releia os trechos a seguir e indique a quem corresponde a fala.
a) “Para que bodoque, se levo o saci na garrafa e ele é uma arma melhor do que quanto canhão ou metralhadora existe?”
      Corresponde a fala de Pedrinho.
b) “Que beleza!”
      Corresponde a fala do narrador.
c) “E pássaros!”
      Corresponde a fala do narrador.



TEXTO: A VIDA - DR. LUIZ ALBERTO PY - COM GABARITO

TEXTO: A VIDA

      A vida é difícil para todos nós. Saber disso nos ajuda porque nos poupa da auto piedade. Ter pena de si mesmo é uma viagem que não leva a lugar nenhum. A auto piedade, para ser justificada, nos toma um tempo enorme na construção de argumentos e motivos para nos entristecermos com uma coisa absolutamente natural: nossas dificuldades. Não vale a pena perder tempo se queixando dos obstáculos que têm de ser superados para sobreviver e para crescer. É melhor ter pena dos outros e tentar ajudar os que estão perto de você e precisam de uma mão amiga, de um sorriso de encorajamento, de um abraço de conforto. Use sempre suas melhores qualidades para resolver problemas, que são: capacidade de amar, de tolerar e de rir. Muitas pessoas vivem a se queixar de suas condições desfavoráveis, culpando as circunstâncias por suas dificuldades ou fracassos. As pessoas que se dão bem no mundo são aquelas que saem em busca de condições favoráveis e se não as encontram se esforçam por criá-las. Enquanto você acreditar que a vida é um jogo de sorte vai perder sempre. A questão não é receber boas cartas, mas usar bem as que lhe foram dadas.
  (Dr.Luiz Alberto Py, in O Dia, 30/04/00).

Entendendo o texto:
01 – Segundo o texto, evitamos a auto piedade quando:
a) aprendemos a nos comportar em sociedade.
b) nos dispomos a ajudar os outros.
c) passamos a ignorar o sofrimento.
d) percebemos que não somos os únicos a sofrer.
e) buscamos o apoio adequado.

02 – Para o autor, o mais importante para a pessoa é:
a) perceber o que ocorre à sua volta.
b) ter pena das pessoas que sofrem.
c) buscar conforto numa filosofia ou religião.
d) esforçar-se para vencer as dificuldades.
e) estar ciente de que, quando menos se espera, surge a dificuldade.

03 – A auto piedade, segundo o autor:
a) é uma doença.
b) é problema psicológico.
c) destrói a pessoa.
d) não pode ser evitada.
e) não conduz a nada.

04 – A vida é comparada a um jogo em que a pessoa:
a) precisa de sorte.
b) deve saber jogar.
c) fica desorientada,
e) geralmente perde.
e) não pode fazer o que quer.

05 – A superação das dificuldades da vida leva:
a) à paz
b) à felicidade
c) ao equilíbrio
d) ao crescimento
e) à autoestima.

06 – Os sentimentos que levam à superação das dificuldade são:
a) fé, tolerância, abnegação
b) amor, desapego, tolerância
c) caridade, sensibilidade, otimismo
d) fé, tolerância, bom humor
e) amor, tolerância, alegria.

07 – Para o autor:
a) não podemos vencer as dificuldades.
b) só temos dificuldades por causa da nossa imprevidência.
c) não podemos fugir das dificuldades.
d) devemos amar as dificuldades.
e) devemos procurar as dificuldades.