quarta-feira, 18 de outubro de 2017

POEMA: VOU-ME EMBORA PRA PASÁRGADA - MANUEL BANDEIRA - COM INTERPRETAÇÃO/GABARITO

Fonte da imagem - https://www.blogger.com/u/4/blog/post/edit/7220443075447643666/7118670276075777877#     
VOU-ME EMBORA PRA PASÁRGADA
Manuel Bandeira

Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada

Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconsequente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive.

E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau de sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d’água.

Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada

Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcaloide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar.

E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
--- Lá sou amigo do rei ---
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada.
                                            Manuel Bandeira. Idem, ibid. p. 117-8.
Interpretação do texto:
1 – Qual o significado de Pasárgada para o eu lírico?
      Pasárgada pode ser entendido como o mundo do sonho, da fantasia, da ilogicidade, onde é possível realizar tudo.

2 – No poema ocorre antítese entre aqui e lá. Identifique o espaço a que se refere cada um desses advérbios.
      Aqui refere-se à realidade concreta do poeta; lá identifica o sonho, a utopia do eu lírico.

3 – Qual verso do poema sintetiza o motivo da evasão da realidade?
      “Aqui eu não sou feliz”.

4 – Esse mecanismo de evasão da realidade foi frequente em outro estilo de época. Qual?
      No Romantismo.

5 – A realidade de Pasárgada não obedece à lógica. Cite dois fatos dessa realidade que permitem tal conclusão.
1-   O parentesco entre o eu lírico e Joana, a Louca de Espanha.
2-   A possibilidade de chamar a mãe d’água para lhe contar histórias.

6 – Na adolescência, o poeta Manuel Bandeira contraiu tuberculose, que na época era uma doença fatal. Releia a terceira estrofe do poema e reflita: as atividades que o eu lírico vê como possíveis em Pasárgada são rotineiras na juventude. Por que, então, ele as valoriza tanto?
      Porque o dado biográfico é interessante para a compreensão e a análise da poesia de Bandeira. As atividades possíveis em Pasárgada parecem excepcionais para um indivíduo doente, privado de realiza-las.

7 – Os anseios que o eu lírico pretende concretizar em Pasárgada são de natureza predominantemente espirituais ou materiais?
      São predominantemente materiais.

8 – Na biografia de Bandeira consta que lhe serviu de babá uma mulata chamada Rosa, que é citada no poema. Quem lá em Pasárgada, exercerá o papel que Rosa desempenhou aqui? Por quê?
      A mãe-d’água, que lhe contará histórias.

9 – A mãe-d’água é, grosso modo, uma versão da sereia, personagem da mitologia europeia. De que poder mágico era dotada essa personagem? Identifique a semelhança entre esse poder e o da mãe-d’água citado no poema.
      A sereia procurava seduzir os marinheiros com seu canto irresistível para que eles, seguindo-a, morressem no fundo do mar. O canto da sereia corresponderia às histórias da mãe-d’água.

10 – Para se livrar de dogmas, preconceitos, limitações de todo tipo, é necessário, mesmo em Pasárgada, gozar de uma condição. Qual?
      Ser amigo do rei.


TEXTO: A LÍNGUA ABSOLVIDA - ELIAS CANETTI - COM GABARITO

 A LÍNGUA ABSOLVIDA
      [...]
      O Danúbio, em seu curso inferior, onde banha a Bulgária, é muito largo. Giurgiu, a cidade na outra margem, pertencia à Romênia. De lá, assim me contavam, viera a ama que me alimentou com seu leite. Fora uma camponesa forte e sadia que ao mesmo tempo amamentava seu próprio filho, que trouxera consigo. Sempre ouvi elogios a seu respeito, e embora não consiga lembrar-me dela, por sua causa a palavra romeno, para mim, sempre teve um som doce.
        Houve anos, bastante raros, em que o Danúbio congelou no inverno, o que deu origem a histórias excitantes. Minha mãe, em sua juventude, várias vezes viajara à Romênia de trenó, e me mostrou as peles quentes com que se agasalhava. Quando o frio se tornava muito intenso, os lobos, famintos, desciam da montanha e atacavam os cavalos que puxavam os trenós. O cocheiro tentava afugentá-los com o relho, mas isso de nada adiantava e era necessário atirar neles. Numa dessas viagens, verificou-se que não se havia trazido nenhuma arma de fogo. Deveria ter-lhes acompanhado um tcherquesse armado, que vivia em casa como criado, mas se atrasara e o cocheiro partira sem ele. Foi difícil defenderem-se dos lobos, e o perigo foi grande. Se, por acaso, não tivesse vindo a seu encontro um trenó com dois homens, que mataram um lobo a tiros e afugentaram os demais, o fim poderia ter sido triste. Minha mãe ficara aterrorizada, e descrevia as línguas vermelhas dos lobos, que haviam chegado tão perto; após muitos anos ela ainda sonhava com eles.
       Muitas vezes lhe pedi essa história, e ela gostava de conta-la. Assim, os lobos foram os primeiros animais selvagens que povoaram a minha fantasia. O terror que eles me infundiam era alimentado pelos contos que ouvia das camponesas búlgaras. Sempre havia cinco ou seis delas vivendo em nossa casa. Eram muito jovens, talvez com dez ou doze anos, e suas famílias as haviam trazido das aldeias à cidade para emprega-las como domésticas nas casas dos burgueses.
        Andavam descalças pela casa e sempre bem-dispostas; pouco tinham que fazer e faziam tudo em conjunto: foram meus primeiros companheiros de infância.
        À noite, quando meus pais saíam, eu ficava em casa com elas. Ao longo das paredes da grande sala de estar, em todo o seu comprimento, havia otomanas baixinhas. Além dos tapetes, que havia por toda parte, e de algumas mesinhas, eram os únicos móveis de que me lembro daquela sala. Quando escurecia, as meninas ficavam com medo. Nos aconchegávamos todos juntos numa das otomanas, logo abaixo da janela; eu ficava no meio, e então elas começavam com suas histórias de lobisomens e vampiros. Assim que uma terminava, começava a outra; era aterrorizante, contudo me sentia bem, comprimido de todos os lados pelas meninas. Ficávamos tão aterrorizados que ninguém ousava levantar-se, e quando meus pais voltavam para casa, nos encontravam aglomerados num monte trêmulo.
        Dos contos que ouvi então, só conservei na memória os de lobisomem e vampiros. Talvez não me contassem outros. Não posso tomar nas mãos um livro de contos balsâmicos sem logo reconhecer vários deles. Eu os tenho presentes em todos os seus detalhes, mas não na língua em que os ouvi. Eu os ouvi em búlgaro, mas os conheço em alemão, e esta tradução talvez seja o fato mais estranho de minha juventude que tenho para relatar, e já que o destino linguístico da maioria das crianças transcorre diferente, talvez eu deva falar um pouco sobre isso.
        Entre si, meus pais falavam alemão, do que eu nada devia entender. Conosco, os filhos, e com todos os parentes e amigos, falavam em ladino. Essa era, afinal, a língua corrente, aliás um castelhano antigo, que também mais tarde ouvi com frequência e jamais esqueci. As meninas camponesas que ficavam em nossa casa só falavam búlgaro, e com certeza foi com elas, principalmente, que eu o aprendi. Mas como jamais frequentei uma escola búlgara, e abandonei Ruschuk com seis anos, em breve o esqueci completamente. Todos os acontecimentos daqueles primeiros anos se desenrolaram em latino ou búlgaro. Mais tarde se traduziram, em grande parte, para o alemão. Apenas as ocorrências mais dramáticas, mortes e assassinatos, por assim dizer, e os meus maiores sustos, conservaram-se para mim em ladino, mas neste caso de forma muito precisa e indelével. Todo resto, portanto a maior parte, e principalmente tudo quanto era búlgaro, como os contos, trago na cabeça em língua alemã.
        Não sei exatamente como isso aconteceu. Não sei em que época e em que circunstâncias se traduziu isto ou aquilo dentro de mim. Nunca cheguei a investigar este tema, talvez porque receasse que uma análise metódica, e conduzida por princípios rígidos, pudesse destruir as lembranças mais preciosas que trago comigo. Só estou certo de uma coisa: tenho presentes os acontecimentos daqueles anos toda força e todo vigor – há mais de sessenta anos eles me alimentaram –, mas, em sua maior parte, estão ligados a palavras que, naquela época, eu não conhecia. Parece-me perfeitamente natural que eu agora as escreva e não tenha a impressão de estar alterando ou adulterando alguma coisa. Não é como a tradução literária de um livro, de um idioma para outro; é antes uma tradução espontânea que se produziu no inconsciente, e como costumo evitar como a peste esta palavra, cujo uso indiscriminado tornou inócua, espero que me seja relevado o seu uso neste só e 125 único caso.
                                    Elias Canetti. A Língua absolvida. São Paulo:
                                                Companhia das Letras, 2006. p. 17-9.

RELHO: chicote, açoite.
OTOMANA: espécie de sofá baixo e largo, em que cabem várias pessoas sentadas ao mesmo tempo.
INDELÉVEL: permanente.
INÓCUO: que não produz o efeito pretendido.

1 – No primeiro parágrafo, o autor garante saber a origem de sua ama de leite? Justifique sua resposta.
      Não. Ele afirma que está repetindo o que lhe contavam: “... assim me contavam...”

2 – Releia:
      [...] por sua causa, a palavra romeno, para mim, sempre teve um som doce.
      Reflita: essa afirmativa é objetiva ou subjetiva? Explique.
      Espera-se que os alunos identifiquem a subjetividade da afirmativa. Pergunte a eles, por exemplo, que palavras têm som “doce” ou som “áspero”, ou seja, mostre que se trata de aspectos subjetivos.

3 – Releia:
      Muitas vezes lhe pedi essa história, e ela gostava de conta-la. Assim, os lobos foram os primeiros animais selvagens que povoaram a minha fantasia. O terror que eles me infundiam era alimentado pelos contos que ouvia das camponesas búlgaras. [...].
      Em seu caderno, explique o trecho destacado acima.
      A origem do medo estava na narrativa materna sobre os lobos, mas sua permanência (a “alimentação” do terror) se devia aos contos que as camponesas búlgaras contavam ao garoto.

4 – Você deve ter observado que mesmo a lembrança de coisas materiais está associada ao ato de contar e de ouvir histórias, na mente de enunciador. Identifique o trecho em que se percebe essa ideia.
      “... eram os únicos móveis de que me lembro daquela sala...”

5 – O narrador relata o misto de pavor e prazer que era ouvir histórias de lobisomens e vampiros. Como você interpreta esses sentimentos opostos?
      Resposta pessoal do aluno. Ao sintetizar as opiniões, lembre aos alunos que o ficção permite que se corram grandes riscos sem arriscar nada. Por meio dela é possível viver situações perigosas e assustadoras, sem entender perigo real.

6 – Releia:
      [...] Todos os acontecimentos daqueles primeiros anos se desenrolaram em ladino ou búlgaro. [...]
      Em seu caderno, explique essa frase do autor, uma vez que acontecimentos não “se desenrolam” em uma língua ou em outra.
      Resposta pessoal do aluno. Explique aos alunos que o autor tem a consciência de que os acontecimentos ficaram gravados em sua memória por meio da língua ladina ou búlgara.

7 – No texto há várias passagens metalinguísticas. Por quê?
      Porque o narrador conviveu com falantes de diferentes línguas e ficou exposto a elas durante a infância, época de aquisição e desenvolvimento da língua falada. Ele comenta esse fato e reflete sobre o ato de escrever suas memórias.



ARTIGO DE OPINIÃO: A SUSTENTABILIDADE PESSOAL - EUGENIO MUSSAK - COM GABARITO

Artigo de Opinião: A sustentabilidade pessoal
                                 Eugenio Mussak

   Você já ouviu falar em uma mulher chamada Gro Harlem Brundtland? Ela foi primeira-ministra da Noruega há uns 20 anos e presidiu a comissão do ONU que criou o conceito de "sustentabilidade". O que ela diz é bastante simples — que nós devemos "satisfazer as necessidades do presente sem comprometer a capacidade de garantir as necessidades do futuro". Simples, mas não fácil. 

Por isso, atenção, pois, ainda que o Relatório Brundtland refira-se à sustentabilidade planetária, quem lidera empresas, equipes ou simplesmente a si mesmo não pode ignorá-lo.
        Pensar no futuro não é só tarefa dos futurólogos ou preocupação dos ecologistas. É atributo de quem pensa estrategicamente. Todos temos necessidades e procuramos atendê-las rapidamente, pois provocam desconforto. Antigamente precisávamos de comida, roupas, abrigo. Hoje acrescentamos outras prioridades — educação, lazer, relações, tecnologia, comunicação, transporte. Além disso, mudou a frequência das necessidades. Consumimos hoje coisas que precisaremos de novo amanhã e depois de amanhã. E assim por diante.

        Essa lógica nos obriga a pensar sobre a linha do tempo, pois temos de atender às necessidades pessoais de hoje lembrando das outras no futuro, próximo ou remoto. Vem daí a ideia da sustentabilidade pessoal. Nosso progresso não pode comprometer nossa fonte de riqueza. Medir se uma prestação cabe no orçamento e enfiar-se em uma dívida para comprar algo que precisamos no momento pode prejudicar o orçamento por um bom tempo. E, como consequência, sacrificar as necessidades do amanhã.

        O conselho de Gro é para ser levado a sério na vida pessoal também, pois, no fundo, ele quer dizer que você até pode gastar hoje o que vai ganhar amanhã, desde que não perca de vista que amanhã você vai ter outras coisas para gastar. Desejos e recursos são passageiros do mesmo barco. Isso vale para o planeta, para uma empresa, para uma família e para cada um de nós. Além disso, sempre é bom lembrar que liderança começa por auto liderança. E que pensar estrategicamente é um ótimo começo.

Eugenio Mussak. A sustentabilidade pessoal. Revista Você S/A, mar. 2008. 


1. O artigo de Eugenio Mussak é introduzido por uma pergunta.

a)   Qual é a pergunta?
“Você já ouviu falar em uma mulher chamada Gro Harlem Brundtland?

b)  A sequência do texto mostra que se espera do leitor uma resposta afirmativa ou negativa a essa pergunta? Justifique sua resposta.
Negativa, pois na sequência o texto apresenta Gro Harlem Brundtland.

c)   Por que essa pergunta é importante para o desenvolvimento do artigo?
Porque ela desencadeia uma explicação a respeito da origem e da aplicação da ideia de sustentabilidade.

d)  O autor trata o conceito de sustentabilidade no mesmo contexto em que ele foi proposto por Gro Brundtland? Justifique sua resposta com elementos do texto. 
Não, como vemos em “ainda que o Relatório Brundtland refira-se à sustentabilidade planetária, quem lidera empresas, equipes ou simplesmente a si mesmo não pode ignorá-lo.

2. Releia. 

        "O que ela diz é bastante simples - que nós devemos 'satisfazer as necessidades do presente sem comprometer a capacidade de garantir as necessidades do futuro'. Simples, mas não fácil."

a)   Quais são os motivos enumerados no artigo que justificam a dificuldade de se aplicar essa ideia?
- Em primeiro lugar, tendemos a não pensar no futuro.
- Em segundo lugar, hoje nessas necessidades são mais numerosas do que momentos históricos anteriores.
- Em terceiro lugar, nossas demandas são ininterruptamente renovadas.

b)  O texto se vale de fatos concretos (pesquisas, dados estatísticos, episódios históricos, etc.) para fundamentar esses motivos? Explique sua resposta levantando hipóteses sobre a escolha feita pelo autor.
O texto não cita fatos concretos. Os motivos são todos calçados no senso comum. Mesmo a comparação entre as necessidades de “hoje” e as de “antigamente” é feita sem a citação de datas ou eventos históricos. O articulista trabalha com ideias disseminadas na sociedade e aceitas por ela e parece, portanto, não sentir necessidade de comprová-las.

3. Gro Harlem Brundtland conceituou a sustentabilidade planetária; o articulista parte dessa definição e desenvolve outros conceitos.

a)   Como ele conceitua a sustentabilidade pessoal?
Ele sintetiza a ideia de sustentabilidade pessoal do seguinte modo: “Nosso progresso não pode comprometer nossa fonte de riqueza”.

b)  De que modo o articulista afirma ter chegado ao conceito de sustentabilidade pessoal? Indique o trecho que justifica sua resposta.
Com base no raciocínio lógico: “Essa lógica nos obriga a pensar [...]; Vem daí a ideia de sustentabilidade pessoal”.

4. Releia o último parágrafo do texto.

a) Quais ideias exploradas na introdução ou no desenvolvimento do texto são resgatadas na conclusão? Anote-as abaixo:
- Ideias exploradas - introdução e desenvolvimento: “ainda que o Relatório de Brundtland refira-se à sustentabilidade planetária, quem lidera empresas, equipes ou simplesmente a si mesmo não pode ignorá-lo”; “[...] pensar estrategicamente é um ótimo começo”.
- Ideias resgatadas na conclusão: “Isso vale para o planeta, para uma empresa, para uma família e para cada um de nós”; “Pensar no futuro [...] é atributo de quem pensa estrategicamente”.

c)Considere sua resposta ao item e responda: que função tem o parágrafo que conclui o artigo?
A conclusão desse artigo funciona como uma síntese das ideias expostas na introdução e no desenvolvimento.


terça-feira, 17 de outubro de 2017

ARTIGO DE OPINIÃO: OS FREMENTES ANOS 20 - COM GABARITO

ARTIGO DE OPINIÃO: OS FREMENTES ANOS 20

        [...]
        Por trás dessa vertigem coletiva da ação e da velocidade, engendrando-a, estimulando-a, sem permitir a reflexão sobre suas consequências nas mentes e na cultura, as inovações tecnológicas invadiam o cotidiano num surto inédito, multiplicando-se mais rapidamente do que as pessoas pudessem se adaptar a elas e corroendo os últimos resquícios de um mundo estável e um curso de vida que as novas gerações pudessem modelar pelas antigas. As novas formas de energia ampliavam o tempo sem parar, na proporção inversa em que encurtavam os espaços. A matéria passava a obedecer cegamente a essas fontes invisíveis de energia e tudo parecia instável, a se mover, até as estruturas de aço maciço da Torre Eiffel subindo aos céus, ou as seculares muralhas de Viena desaparecendo da noite para o dia, para dar lugar a novas avenidas cheias de veículos velozes e palácios modernos erguidos num piscar de olhos. É muito sugestivo, nesse sentido, o depoimento de Raymond Loewy.
        Aos catorze anos, em Paris, onde eu havia nascido, eu já tinha visto o nascimento do telefone, do aeroplano, do automóvel, da eletricidade doméstica, do fonógrafo, do cinema, do rádio, dos elevadores, dos refrigeradores, dos raios X, da radioatividade e, não menos importante, da moderna anestesia.
        Pode parecer impressionante, mas o fato é que Loewy foi muito discreto na sua avaliação. Ele, por exemplo, deixou de mencionar as linhas de montagem, os transatlânticos, as motocicletas, as instalações de gás domésticas, os modernos fogões e sistemas de aquecimento, a máquina de costura, o aspirador de pó, as máquinas de lavar, as instalações sanitárias e válvulas hídricas modernas, o concreto armado, os alimentos enlatados, os refrigerantes gaseificados, os sorvetes industrializados, a aspirina, as lâmpadas elétricas, as máquinas de escrever e de calcular, o ditafone, a caixa registradora e – essas revoluções dos sentidos – o parque de diversões eletrificadas, a roda-gigante e a montanha-russa. A lista é ainda muito modesta, mas pode servir como referência. Num intervalo menor que o de uma geração, o mundo se transformara completamente. A voracidade de mercados de consumo dos grandes complexos industriais o forçava a orientarem a sua produção para as grandes massas urbanas, o que também era inédito. O automóvel, aparecido como extravagância no final do século XIX, tornou-se produto de luxo no começo do século e recebeu suas primeiras versões populares no contexto da Guerra, tornando-se imediatamente uma necessidade. O problema geral das imaginações era menos o de conceber o novo mundo do que livrar-se do antigo. A Guerra se encarregaria disso em grande parte. Seu rescaldo, porém, seria o culto da ação coletiva e da violência, que ela decantara em estado puro em suas várias manifestações.
        As modernas formas de comunicação de massas, a fotografia, o cinema e os cartazes reiteravam essa ênfase tecnológica sobre a ação e a velocidade, ressaltando ademais o papel privilegiado conceito nessa nova ordem cultural à imagem, à luz e à visualidade.
[...]
                                 Nicolau Sevcenko. Orfeu extático na Metrópole:
                    São Paulo, sociedade e cultura nos frementes anos 20.
                           São Paulo: Companhia das Letras, 1992. p. 162-3.

DECANTAR: livrar-se das impurezas, voltar ao estado puro.
DITAFONE: aparelho que grava textos ditados para transcrição.
REITERAR: confirmar.
RESCALDO: resultado de alguma coisa, saldo.
VORACIDADE: grande atividade, avidez.

Interpretação do texto:
1 – O primeiro parágrafo do texto trata das inovações tecnológicas e suas consequências.
a)   No próprio texto, o autor dá inúmeros exemplos dessas inovações tecnológicas. Há alguma(s) delas que ainda provoca(m) surpresa no meio em que você vive? Quais?
Resposta pessoal do aluno.

b)   Cite duas consequências dessas inovações tecnológicas no início do século XX.
- Estimular a ação e a velocidade.
- Corroer os últimos resquícios de um mundo estável.


2 – Veja a litogravura ao lado. Que trecho do primeiro parágrafo tem relação com essa litogravura?
      “... tudo parecia instável, a se mover...”.

3 – No terceiro parágrafo, caracteriza-se a roda-gigante e a montanha-russa como “revoluções do sentido”. Em sua opinião, por quê?
      Porque permitem o deslocamento rápido do ponto de vista do observador.

4 – Explique, com suas palavras, estre trecho do texto:
      [...] “A voracidade dos mercados de consumo dos grandes complexos industriais os forçava a orientar a sua produção para as grandes massas urbanas” [...].
      Resposta pessoal do aluno.


MITO: EROS E PSIQUE - COM GABARITO

MITO: EROS E PSIQUE

  Não havia criatura humana ou divina que fosse mais bela que Psique. No entanto, ela era uma simples mortal.
 Certo dia, ao descer do Olimpo, Eros se apaixonou por Psique e quis se casar com ela. Ordenou a Zéfiro, o vento, que a transportasse para os ares e a instalasse num palácio magnífico.
 Psique foi levada, conforme as ordens de Eros, e ficou extasiada com o esplendor de sua nova morada.
        Quando a noite caiu, a moça ouviu uma voz misteriosa e doce:
        --- Não se assuste, Psique, sou o dono desse palácio. Ofereço-o a você como presente de nosso casamento, pois quero ser seu esposo. Tudo o que você está vendo lhe pertence. Se tiver algum desejo, bastará pronunciá-lo para que seja realizado. Zéfiro estará às suas ordens, ele fará tudo o que você ordenar. Em troca de minha afeição, só lhe faço uma exigência: não tente me ver. Só sob essa condição poderemos viver juntos e ser felizes.
        A aurora se aproximou e o ser misterioso desapareceu, sem mostrar o rosto a Psique.
        Mas, à medida que as noites iam passando, a moça ia ficando mais curiosa para ver seu companheiro. Morria de vontade de saber quem era ele. Certa noite, assim que o sol se pôs, ela pegou uma lamparina, escondeu-a entre as flores e ficou à espera. O marido não demorou a chegar. Falou-lhe com sua voz suave, enquanto ela aguardava ansiosa a hora de dormir. Logo Eros se deitou e adormeceu. Psique ergueu a lamparina para enxergar melhor e viu um belo jovem, de faces coradas e cabelos loiros. Com uma respiração regular e tranquila, ele exalava um hálito doce e perfumado. Psique não conseguia tirar os olhos do belo quadro. Sua mão tremeu de emoção, a lamparina balançou e uma gota de óleo caiu no braço do rapaz, que acordou assustado. Ao ver Psique, ele desapareceu. O encanto se rompeu. Foi-se o belo palácio, acabaram-se os jardins mágicos, as flores perfumadas. Não havia mais nada nem ninguém! Psique viu-se caminhando num lugar pedregoso e selvagem, corroída pelo arrependimento e maldizendo sua curiosidade.
        Desolado, Eros voltou para o Olimpo e suplicou a Zeus que lhe devolvesse a esposa amada. O senhor dos deuses respondeu:
        --- O deus do amor não pode se unir a uma mortal.
        Mas Eros protestou. Será que Zeus, que tinha tanto poder, não podia tornar Psique imortal?
        O deus dos deuses sorriu, lisonjeado. Além do mais, como poderia deixar de atender a um pedido de Eros, que lhe trazia lembranças tão boas? O deus do amor o tinha ajudado muitas vezes, e talvez algum dia Zeus precisasse recorrer de novo a seus favores. Seria mais prudente não o contrariar.
        Desta vez, Hermes substituiu Zéfiro. Zeus ordenou que o mensageiro fosse buscar Psique e a trouxesse para o reino celeste. Lá ele lhe ofereceria ambrosia e néctar, tornando-a imortal.
        Nada mais se opôs aos amores de Eros e Psique. Seu casamento foi celebrado com muito néctar, na presença de todos os deuses. As Musas e as Graças aclamaram a nova deusa em meio a danças e cantos.

                     In: Émile Genest, José Féron e Marguerite Desmurger.
                                   As mais belas lendas da mitologia. São Paulo:
                                                           Martins Fontes, 2005. p. 203-6.

AMBROSIA: alimento dos deuses do Olimpo. Dizia-se que a ambrosia era deliciosa, muito mais doce do que o mel e que tornava imortal quem a provasse.

GRAÇAS: figuras da mitologia romana que simbolizam a beleza. Eram as companheiras de Vênus. Correspondem às Cárites na mitologia grega.

HERMES: na mitologia grega, corresponde a Mercúrio, deus mensageiro.

MUSAS: na mitologia grega, nove jovens encantadoras, que acompanhavam Apolo, cantando. Dançando e declamando poemas. Desde a Antiguidade, sempre foram o símbolo da inspiração dos poetas e músicos.

NÉCTAR: bebidas dos deuses do Olimpo. Tornou-se sinônimo de qualquer bebida deliciosa.

1 – Como você interpreta o fato de Psique ter sido levada para um palácio nos ares? Com isso, o que parece ter acontecido a essa mortal?
      O fato conota a ascensão de Psique ao universo dos deuses, seu desligamento do plano terreno, humano.

2 – Por que Psique não podia ver Eros?
      Porque segundo a mitologia aos humanos não é permitido ver os deuses.

3 – Explique o seguinte trecho: “O encanto se rompeu”.
      Os poderes mágicos (encanto, encantamento) que permitiram a Psique tornar-se esposa de um deus romperam-se quando ela o desobedeceu.

4 – Qual seria a solução para que Eros e Psique pudessem reatar o romance?
      Seria transformá-la em uma deusa, uma criatura imortal.

5 – Os mitos relatam histórias fantásticas de “seres que encarnam, sob forma simbólica, as forças da natureza e os aspectos gerais da condição humana” (Dicionário eletrônico Houaiss da língua portuguesa). Em sua opinião, que aspecto da condição humana é simbolizado pela união de Eros e Psique?
      Resposta pessoal do aluno.

6 – Em sua opinião, para que servem os mitos?
      Resposta pessoal do aluno. Compreendendo que os mitos são explicações formuladas pelo ser humano para compreender questões fundamentais.






MÚSICA(ATIVIDADES): SOBRADINHO - SÁ E GUARABYRA - COM GABARITO

Música(Atividades): Sobradinho

                                                                  Sá e Guarabyra
O homem chega, já desfaz a natureza
Tira gente, põe represa, diz que tudo vai mudar
O São Francisco lá pra cima da Bahia
Diz que dia menos dia vai subir bem devagar
E passo a passo vai cumprindo a profecia do beato que dizia que o Sertão ia alagar

O sertão vai virar mar, dá no coração
O medo que algum dia o mar também vire sertão

Adeus Remanso, Casa Nova, Sento-Sé
Adeus Pilão Arcado vem o rio te engolir
Debaixo d'água lá se vai a vida inteira
Por cima da cachoeira o gaiola vai subir
Vai ter barragem no salto do Sobradinho
E o povo vai-se embora com medo de se afogar.

Remanso, Casa Nova, Sento-Sé
Pilão Arcado, Sobradinho
Adeus, Adeus ...

1 – Qual o tema principal da música?
      Sobradinho.

2 – Quais cidades foram afetadas com a construção da barragem em Sobradinho?
      Remanso, Casa Nova, Santo Sé e Pilão Arcado.

3 – O que acontece com os habitantes das cidades que foram afetadas com a construção da barragem?
      Tiveram que mudar por causa da inundação.

4 – Por que o músico diz que o sertão vai virar mar?
      Porque a construção da hidrelétrica inundou cidades do sertão.

5 – A música faz referência a um importante rio brasileiro. Qual o nome deste rio?
      O Rio São Francisco.    

6 – A letra da música fala que “o homem chega e já desfaz a natureza”. Você acha que essa atitude pode influenciar na quantidade de água potável disponível para os seres humanos?
      Sim. Porque essas alterações podem influir no clima, aumentando ou diminuindo a quantidade de chuvas, e assim interferir no regime de águas. Diminuindo ou aumentando exageradamente sua quantidade em uns lugares e podendo deixar outros lugares secos.

7 – Em qual das bacias hidrográficas do brasil foi construído a hidrelétrica de Sobradinho?
      Na bacia hidrográfica do São Francisco.

8 – Por que os autores da música dizem que têm medo que o “mar também vire sertão”?
      Porque a construção de barragens e a formação de lagos artificiais para a construção das hidrelétricas pode alterar o clima, causando secas imprevisíveis.

9 – Que consequências sociais podem estar relacionadas à construção da barragem de uma hidrelétrica?

      O desaparecimento de lugares que ficam sob as águas, para dar espaço à hidrelétrica, faz com que os moradores percam sua identidade com o lugar onde nasceram.