domingo, 23 de junho de 2019

CONTO: O GATO MALHADO E A ANDORINHA SINHÁ - JORGE AMADO - COM GABARITO

Conto: O gato malhado e a Andorinha Sinhá
         
                                  Jorge Amado

        A história em questão acontece entre o gato malhado e a andorinha Sinhá e se desenvolve em um parque muito arborizado e habitado por animais de várias espécies. Com o desenrolar da história percebemos que o tempo, com suas estações, cria uma atmosfera que influencia o humor dos personagens.

        “É tão impossível avivar o fogo com a neve quanto apagar o fogo do amor com palavras”.
                                                      Willian Shakespeare

        Jorge Amado descreve o gato malhado como alguém de meia idade, distante da juventude. “Não existia nos arredores nenhuma criatura mais egoísta e solitária que o gato malhado. Ele não tinha relações de amizade com os seus vizinhos e quase nunca respondia aos raros cumprimentos que por medo, e não por gentileza, alguns transeuntes lhe dirigiam.
        Nada alterava o dia a dia do parque até que a primavera chegou com as suas cores alegres, aromas inebriantes e sonoras melodias. O gato malhado estava dormindo quando a primavera chegou, repentina e poderosa. Mas a sua presença era tão insistente e forte que o acordou do seu sono sem sonhos, abriu os seus olhos castanhos e esticou os braços”.
        Neste novo estado primaveril, o gato malhado experimentou um estado de otimismo incomum. “Ele se sentia leve, queria falar sem compromisso, andar sem rumo e até mesmo conversar com alguém. Olhou em volta com seus olhos castanhos, mas não viu ninguém. Todos tinham fugido”.
        No entanto, “no galho de uma árvore a andorinha Sinhá piava e sorria para o gato malhado. Enquanto isso, dentro dos seus esconderijos, todos os habitantes do parque olhavam espantados para a andorinha Sinhá”.
        Jorge Amado relata como era a outra protagonista da história: “Quando ela passeava, risonha e coquete, não havia nenhum pássaro em idade de casar que não suspirasse por ela. Era muito jovem ainda, mas onde quer que estivesse, todos os jovens do parque se aproximavam.
        Ela ria com todos, mas não amava ninguém. Voava despreocupadamente de árvore em árvore pelo parque; era curiosa, gostava de conversar e era inocente de coração. Na verdade, não existia em nenhum parque da redondeza uma andorinha tão bela e gentil como a andorinha Sinhá”.
        A andorinha conversou com o gato malhado e chegou até a insultá-lo, um fato que os demais habitantes do parque viram como uma sentença de morte para o pássaro. Seus pais a haviam proibido de se relacionar com os gatos, pois eles eram os predadores naturais dos pássaros. Mas ela ignorou o conselho e conversou com ele.
        Naquela noite, a andorinha “deitou suavemente a cabeça na pétala de rosa que lhe servia de travesseiro e decidiu continuar a sua conversa com o gato no outro dia: – Ele é feio, mas é simpático… – murmurou ao adormecer.
        Quanto ao gato malhado, ele também pensava na arisca andorinha Sinhá. No entanto, havia algo que ele não possuía: um travesseiro. Além de feio e mau, o gato malhado era pobre e descansou a cabeça sobre os braços”.
        A doença do gato

        O gato estava muito cansado e achou que estava doente. Depois percebeu que tinha febre e foi buscar água do lago para se refrescar do ardor que sentia por dentro. E ali, nas águas do lago, ele viu o reflexo da andorinha Sinhá que o observava: “ele a reconheceu em cada folha, em cada gota de orvalho, em cada raio de sol do crepúsculo e em cada sombra da noite que se aproximava”. Quando ele conseguiu dormir, “sonhou com a andorinha e era a primeira vez que sonhava em muitos anos”.
        O gato malhado não percebeu que havia se apaixonado; não conseguiu reconhecer os seus sentimentos. Quando era jovem havia se apaixonado muitas vezes, quase todas as semanas, mas nunca deu muita importância a esses sentimentos. Na verdade, ele tinha machucado muitos corações. Quando acordou, se lembrou que tinha sonhado durante toda a noite com a andorinha, mas decidiu não se preocupar com isso.
        No entanto, durante toda a primavera ele seguiu a andorinha Sinhá para conversar e nunca faltava assunto. Logo, começaram a passear juntos pelo parque; ele caminhava pelo parque e ela o acompanhava voando ao seu lado. Vagavam sem rumo e comentavam sobre a cor das flores e a beleza do mundo.
        O gato malhado passou por uma transformação. Já “não ameaçava os outros seres vivos, não despedaçava as flores com suas patadas, não eriçava os pelos quando um estranho se aproximava, não repelia os cães eriçando os bigodes, os insultando entre dentes. Ele se tornou um ser suave e gentil, era o primeiro a cumprimentar os habitantes do parque, ele que antigamente não respondia aos cumprimentos que lhes dirigiam”.

        O amor tem fronteiras?

        No final do verão, a andorinha e o gato jantaram juntos. Enquanto conversavam, o gato não se conteve e lhe disse que se não fosse um gato, a pediria em casamento. “Naquela noite, a andorinha não retornou. O gato tentava entender o que estava acontecendo com ele e se debatia com sentimentos contraditórios. Envolto em tristeza e solidão, decidiu conversar com a coruja”.
        No início, conversaram sobre vários assuntos sem importância. Mas a coruja era sábia e percebeu o que estava acontecendo. Sem esperar que ele perguntasse, ela lhe contou sobre os rumores que haviam no parque sobre os seus encontros com a andorinha.
        Todos pensavam mal dele e isso o enfureceu. No final, a velha coruja deu a sua opinião: “Velho amigo, não há nada a fazer. Como você pôde imaginar que a andorinha o aceitaria como marido? Nunca houve um caso assim, mesmo que ela o amasse”.
        No entanto, quando o outono chegou, o gato malhado procurou novamente a andorinha. Ela estava séria e distante, já não sorria mais e não demonstrava a mesma simpatia de outros tempos. O gato não conseguia esconder que estava muito triste. No seu coração ressoavam as palavras da coruja e só conseguia passear com a andorinha em silêncio.
        Nessa noite, o gato malhado voltou a ser o vilão de sempre. Ele perseguiu o pato preto, assustou o papagaio, arranhou o focinho de um cão e roubou e jogou fora os ovos do galinheiro. Todos os habitantes do parque espalharam a notícia e voltaram a temer o gato que parecia a encarnação da maldade.

        O final da história

        Depois de alguns dias, o gato recebeu uma carta da Andorinha Sinhá, graças a um pombo correio. Nele, ela dizia que uma andorinha nunca poderia se casar com um gato e que não deviam voltar a se ver.
        No entanto, também acrescentou que nunca havia sido tão feliz como durante os passeios pelo parque com ele. Terminou o bilhete com uma declaração que lhe queimou o coração: “Sempre sua, Sinhá”. O gato malhado leu essa carta várias vezes até guardar tudo na memória.
        Algum tempo depois, a andorinha apareceu sem aviso prévio. Ela estava tão linda e terna, como na primavera. Agia como se nada tivesse acontecido, como se a distância que os separava tivesse se diluído. O gato estava comovido, mas no final da tarde ele soube da verdade. “Ficaram juntos até que a noite chegou e então ela lhe disse que seria a última vez que ele a veria, porque iria se casar com um rouxinol. Por quê? Porque uma andorinha não pode se casar com um gato”.
        O gato malhado ficou arrasado com a notícia. Durante o casamento, ele não conseguiu aguentar e foi à festa. A andorinha, que conhecia o som dos seus passos, sabia que ele estava lá, deixou que uma das suas lágrimas fossem levadas pelo vento e caíssem nas mãos do gato.
        “Isto iluminou o caminho solitário do gato malhado na noite sem estrelas. O gato tomou a direção dos caminhos estreitos que conduzem para a encruzilhada do fim do mundo”.
        Definitivamente, uma bela história que nos lembra da eterna tristeza dos amores impossíveis.

        Moral da história: Todos nós temos preconceitos. Por muito que o mundo evolua, é quase impossível haver alguém que não tenha um único preconceito. Muitas vezes nem nos apercebermos que certas ideias ou gostos que manifestamos são preconceitos: aproximarmos-nos de pessoas mais magras ou mais gordas, mais altas ou mais baixos, gostar de estar só com pessoas mais novas ou mais velhas... Todos nós temos as nossas preferências e nem sempre nos apercebemos de que se trata de preconceitos. Se estes não nos levarem a afastar ou discriminar pessoas apenas por aquilo que aparentam ser, o problema não é grave. Mais ainda há quem marginalize os outros, baseado em conceitos de raça, crença, poder...
        Esta história do Gato Malhado e da Andorinha Sinhá mostra como isso pode acontecer, como a felicidade de dois animais é colocado em causa porque pertencem a mundos diferentes.

Entendendo o conto:

01 – Indique o nome da primeira personagem que aparece neste capítulo?
        É o gato malhado.

02 – Faça a característica física e psicológica do gato.
      Características física: um gato feio, gordo, forte, às riscas amarelas e negras, gato de meio idade, com olhos que transmitem maldade e grande bigodes.

      Características psicológica: solitário, egoísta, mal humorado, antipático, desagradável, convencido e insensível.

03 – por que motivo se assustaram os animais do parque?
      Os animais do parque assustaram-se porque pensavam que o gato ia matar a Andorinha.

04 – A Andorinha não fugiu. Por quê?
      A Andorinha não fugiu porque como não conseguia voar, não a podia alcançar.

05 – Na opinião da Andorinha, o Gato Malhado era.
      Tolo, feíssimo e convencido.

06 – De que modo reagiu o Gato Malhado à crítica da Andorinha?
      O Gato Malhado, fez o inesperado: riu-se da crítica da Andorinha.

07 – O que significa a expressão: “riso espantosa de quem se havia desacostumado de rir”?
      A expressão significa que o Gato já não se ria há muito tempo.

08 – Reações dos outros animais:
      A árvore Pau-Brasil tremeu de medo, o Cã Dinamarquês pensou que o Gato se ia vingar da Andorinha, o Reverendo Papagaio fechou os olhos e a Andorinha voou um galho mais alto.

09 – Sensações visuais, olfativas e auditivas presentes nesta estação.
      Sensações visuais: “vestidas de luz e de cores”; “riscas amarelas e negras”; ...
      Sensações auditivas: “seguem o cacarejar da orgulhosa galinha”; “murmuravam”; ...
      Sensações olfativas: “olorosa de perfumes sutis”; “botões nasciam perfumados”; ...

10 – Como se designam as expressões “Santo Deus!”; “Ui” e “Ai, Meu Deus”? Quais os sentimentos que exprimem?
      As expressões “Santo Deus”; “Ui” e “Ai, Meu Deus!” são interjeições que exprimem medo, susto e terror.

11 – A estação do verão é curta, por quê?
      A estação do verão é curta, passou rapidamente “com o seu sol ardente e noites cheias de estrelas”, pois é sempre rápido o tempo de felicidade. “O tempo é um ser difícil”, isto é, quando queremos que o tempo passe depressa (momentos de infelicidade) ele vai andando devagar, pormenorizando cada momento. Quando há o desejo de viver para sempre um capítulo de uma vida o tempo corre. Então, esta estação ser curta deve-se ao facto do tempo em que a Andorinha e o Gato estiveram juntos passasse num ápice. A Andorinha pergunta ao Gato o porque da sua infelicidade.

12 – O que é que o Gato lhe responde?
      O Gato diz-se que se ela não fosse uma Andorinha lhe pedia para casar com ele.

13 – Qual a reação da Andorinha?
      A Andorinha não ficou surpreendida pois já sabia o que se passava no coração do Gato; zanga também não deveria ser pois aquelas palavras foram-lhe gratas, mas tinha medo, ele era um Gato e os gatos são inimigos das andorinhas.

14 – Como se sente o Gato Malhado quando resolve ir conversar com a Coruja?
      O Gato Malhado sente-se só, triste e confuso.

15 – A Coruja sugere a única solução para vencer a lei das andorinhas. Qual?
      A solução que a Coruja sugere é uma revolução de mentalidades e de comportamentos.

16 – Na opinião da Coruja a lei das andorinhas impede o casamento entre o Gato e a Andorinha. Transpondo para o plano humano, esta lei representa...
      Representa um tipo de conduta social e racial interiorizada pela sociedade.

17 – Tristes e em silêncio, o Gato e a Andorinha “tinham ambos o ar de quem quer evitar um assunto que se impõe”. Que assunto é esse?
      O assunto que é evitado pelo Gato e a Andorinha é a separação inevitável deles, devido aos rumores e à lei das andorinhas.

18 – O que aconteceu durante o casamento da Andorinha e do Rouxinol?
      Durante o casamento da Andorinha e do Rouxinol, onde estavam presentes todos os animais do parque menos o Gato Malhado que permanecia solitário, caiu sobre o Gato uma pétala das rosas vermelhas e este colocou-a no seu peito.

19 – A andorinha deixou cair uma pétala de rosa com que intensão?
      A Andorinha deixou cair uma pétala de rosa com a intensão de iluminar o caminho do gato que estava só e triste.

20 – Por que era este amor impossível?
      Este amor era impossível porque a Andorinha e o Gato são seres de espécies diferentes e, até, inimigos.

21 – Qual é o acontecimento mais importante desta narrativa?
      O acontecimento mais importante desta narrativa é o desenrolar da paixão entre o Gato Malhado e a Andorinha Sinhá.
     


TEXTO: RECEITA DE NEUROSE - JÔ SOARES - COM QUESTÕES

Texto: Receita de Neurose
        

   Jô Soares

        Pegam-se quatro idas à cidade todo dia, duas pitadas de monóxido de carbono em cada respirada, sem esquecer da buzinada no trânsito constante.
        Juntam-se um terno e uma gravata, para mulheres um vestido justo e um terninho num salto alto apertando os dedinhos, com 40 graus à sombra. E sem protetor solar. Xingam-se uns 3 motoristas, escutam-se uns seis xingamentos.
        Atravessa-se a avenida, sem correr, de lá pra cá, na hora do rush. Tropeça numa pedra ou enfia-se num buraco e reza pra não ter torcido o pé ou quebrado o salto. Nisso o celular toca, está no fundo da bolsa ou no bolso da calça e depois de ter feito tanto esforço para atender. Era engano ou alguém de casa ligando a cobrar perguntando-se vai demorar muito pra chegar!
        Espera-se uma condução durante duas horas e volta-se pra casa, de preferência em pé, no ônibus cheio. Ou numa Van pirata. Cheia de gente cansada, motorista e trocador estressados. Riocard não passa, o trocador não tem troco a roleta emperra. No corredor, que já não é mais um corredor de tanta agente amontoada, ficamos ali exprimidos pensando:
        -- Como vou sair daqui, pela janela? E sacode pra lá e pra cá, lugar pra sentar? Isso é artigo de luxo. De repente uma freada, pra descansar o sacolejo. Nem dá pra sentir é tanta gente que até amortece. Enfim, de volta ao lar.
        Depois, é só levar ao divã do analista, quatro vezes por semana, durante quinze anos!
        Mas isso se você ganhar na loteria, receber uma herança. Na pior das hipóteses, casar com milionário.
                                                                          Jô Soares
Entendendo o texto:

01 – Observe, no texto “Receita de neurose”, o uso dos verbos: pegam-se, juntam-se, xingam-se, escutam-se, atravessa-se, espera-se, volta-se

Responda:
a)   É possível determinar a quem os verbos se referem?
Não. Pode ser qualquer pessoa; não há determinação do sujeito.

b)   Com que objetivo foram empregadas essas formas verbais?
Para generalizar, isto é, para mostrar que qualquer pessoa pode passar por isso.

02 – Na sua opinião, por que o autor aborda as neuroses do dia-a-dia numa cidade grande em forma de receita?
      Resposta pessoal do aluno. Sugestão: Para conferir humor ao texto.

03 – Que “ingrediente” da receita você considera o maior causador de neurose no ser humano? Justifique.
      Resposta pessoal do aluno.

04 – Estabeleça possíveis consequências para as situações destacadas abaixo:
·        Estar de terno e gravata a 40 graus à sombra: sentir calor, mal-estar.

·        Esperar a condução em pé, durante duas horas: sentir cansaço, dor nas pernas.

·        Atravessar a rua na hora do rush: correr perigo de ser atropelado.

·  Ouvir constantemente o som da buzina no trânsito: sofrer problemas de audição, causar irritação.
     

sábado, 22 de junho de 2019

POEMA: PROCURAR O QUÊ - CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE - COM QUESTÕES GABARITADAS

Poema: PROCURAR O QUÊ      

    Carlos Drummond de Andrade

        O que a gente procura muito e sempre não é isto nem aquilo.
        É outra coisa.
        Se me perguntam que coisa é essa, não respondo,
        Porque não é da conta de ninguém o que estou procurando.
        Mesmo que quisesse responder, eu não podia. Não sei o que procuro.
        Deve ser por isso mesmo que procuro.
        Me chamam de bobo porque vivo olhando aqui e ali, nos ninhos, nos caramujos, nas panelas, nas folhas de bananeira, nas gretas do muro, nos espaços vazios.
        Até agora não encontrei nada. Ou, encontrei coisas que não eram a coisa procurada sem saber, e desejada.
        Meu irmão diz que não tenho mesmo jeito, porque não sinto o prazer dos outros na água do açude, na comida, na manja, e procuro inventar um prazer que ninguém sentiu ainda. 
        Ele tem experiência de mato e de cidade, sabe explorar os mundos, as horas. Eu tropeço no possível, e não desisto de fazer a descoberta do que tem dentro da casca do impossível.
        Um dia descubro. Vai ser fácil, existente, de pegar na mão e sentir. Não sei o que é. Não imagino forma, cor, tamanho. Nesse dia vou rir de todos. 
        Ou não. A coisa que me espera, não poderei mostrar a ninguém. Há de ser invisível para todo mundo, menos para mim, que de tanto procurar fiquei com merecimento de achar e direito de esconder.

                                                      Carlos Drummond de Andrade 
Entendendo o poema:

01 – Como o eu lírico entende o significado da palavra PROCURAR?
      Como um ato de buscar por alguma coisa, tentar encontrar, embora não tem tanta certeza do que busca.

02 – É possível caracterizar a pessoa que nos fala no poema?
      Sim, ele está na infância, época de grandes descobertas, de grandes aventuras para o conhecimento do mundo.

03 – Como é caracterizada a coisa que a gente procura muito?
      O que a gente procura muito não é isto nem aquilo. É outra coisa.

04 – Qual a atitude em relação às perguntas das pessoas?
        Não respondo, porque não é da conta de ninguém o que estou procurando.

05 – O que nosso herói acaba admitindo sobre o que tanto procura?
      Ele admite que mesmo que quisesse responder, não podia porque não sabia o que procurava.

06 – Por que nosso eterno investigador é chamado de bobo?
      Porque vive olhando aqui e ali, nos ninhos, nos caramujos, nas panelas, nas folhas de bananeira, nas gretas do muro, nos espaços vazios.

07 – O que pensa o irmão do nosso herói?
      Diz que ele não tem jeito mesmo, pois procura inventar um prazer que ninguém sentiu antes.

08 – Retire do texto a passagem em que nosso herói afirma não se dar bem com o que o mundo oferece, sentindo necessidade de procurar coisas novas.
      “...porque não sinto o prazer dos outros na água do açude, na comida, na manja, e procuro inventar um prazer que ninguém sentiu ainda.”    

09 – Qual o contraste estabelecido entre nosso herói e seu irmão?
        O irmão tem experiência de mato e de cidade, sabe explorar os mundos, as horas, e ele tropeça no possível.

10 – Que certeza tem nosso herói?
      Tem certeza que um dia irá descobrir.

11 – Por que o nosso herói constata que não poderá rir de todos?
      Porque a coisa que busca, não poderá mostrar a ninguém, haverá de ser invisível para todo mundo, menos para ele.

12 – E você? Já terminou essa eterna busca? Já resolveu essa insatisfação, já encontrou a eterna outra coisa?
      Resposta pessoal do aluno.



CONTO: UM PEIXE - LUIZ VILELA - COM QUESTÕES GABARITADAS

Conto: Um Peixe
         Luiz Vilela

        Virou a capanga de cabeça para baixo, e os peixes espalharam-se pela pia. Ele ficou olhando, e foi então que notou que a traíra ainda estava viva. Era o maior peixe de todos ali, mas não chegava a ser grande: pouco mais de um palmo. Ela estava mexendo, suas guelras mexiam-se devagar, quando todos os outros peixes já estavam mortos. Como que ela podia durar tanto tempo assim fora d'água? ...
        Teve então uma ideia: abrir a torneira, para ver o que acontecia. Tirou para fora os outros peixes: lambaris, chorões, piaus; dentro do tanque deixou só a traíra. E então abriu a torneira: a água espalhou-se e, quando cobriu a traíra, ela deu uma rabanada e disparou, ele levou um susto – ela estava muito mais viva do que ele pensara, muito mais viva. Ele riu, ficou alegre e divertido, olhando a traíra, que agora tinha parado num canto, o rabo oscilando de leve, a água continuando a jorrar da torneira. Quando o tanque se encheu, ele fechou-a.
        – E agora? – disse para o peixe. – Quê que eu faço com você? ...
        Enfiou o dedo na água: a traíra deu uma corrida, assustada, e ele tirou o dedo depressa.
        – Você tá com fome? ... E as minhocas que você me roubou no rio? Eu sei que era você; devagarzinho, sem a gente sentir... Agora está aí, né? ... Tá vendo o resultado? ... 
        O peixe, quieto num canto, parecia escutar. Podia dar alguma coisa para ele comer. Talvez pão. Foi olhar na lata: havia acabado. Que mais? Se a mãe estivesse em casa, ela teria dado uma ideia – a mãe era boa para dar ideias. Mas ele estava sozinho. Não conseguia lembrar de outra coisa. O jeito era ir comprar um pão na padaria. Mas sujo assim de barro, a roupa molhada, imunda.
        – Dane-se – disse, e foi.
        Era domingo à noite, o quarteirão movimentado, rapazes no footing, bares cheios. Enquanto ele andava, foi pensando no que acontecera. No começo fora só curiosidade; mas depois foi bacana, ficou alegre quando viu a traíra bem viva de novo, correndo pela água, esperta. Mas o que faria com ela agora? Matá-la, não ia; não, não faria isso. Se ela já estivesse morta, seria diferente; mas ela estava viva, e ele não queria matá-la. Mas o que faria com ela? Poderia criá-la; por que não? Havia o tanquinho do quintal, tanquinho que a mãe uma vez mandara fazer para criar patos. Estava entupido de terra, mas ele poderia desentupi-lo, arranjar tudo; ficaria cem por cento. É, é isso o que faria. Deixaria a traíra numa lata d'água até o dia seguinte e, de manhã, logo que se levantasse, iria mexer com isso.
        Enquanto era atendido na padaria, ficou olhando para o movimento, os ruídos, o vozerio do bar em frente. E então pensou na traíra, sua trairinha, deslizando silenciosamente no tanque da pia, na casa escura. Era até meio besta como ele estava alegre com aquilo. E logo um peixe feio como traíra, isso é que era o mais engraçado.
        Toda manhã – ia pensando, de volta para casa – ele desceria ao quintal, levando pedacinhos de pão para ela. Além disso, arrancaria minhocas, e de vez em quando pegaria alguns insetos. Uma coisa que podia fazer também era pescar depois outra traíra e trazer para fazer companhia a ela; um peixe sozinho num tanque era algo muito solitário.
        A empregada já havia chegado e estava no portão, olhando o movimento.
        – Que peixada bonita você pegou...
        – Você viu?
        – Uma beleza... Tem até uma trairinha.
        – Ela foi difícil de pegar, quase que ela escapole; ela não estava bem fisgada.
        – Traíra é duro de morrer, hem?
        – Duro de morrer? ...
        Ele parou.
         – Uai, essa que você pegou estava vivinha na hora que eu cheguei, e você ainda esqueceu o tanque cheio d'água... Quando eu cheguei, ela estava toda folgada, nadando. Você não está acreditando? Juro. Ela estava toda folgada, nadando.
        – E aí?
        – Aí? Uai, aí eu escorri a água para ela morrer; mas você pensa que ela morreu? Morreu nada! Traíra é duro de morrer, nunca vi um peixe assim. Eu soquei a ponta da faca naquelas coisas que faz o peixe nadar, sabe? Pois acredita que ela ainda ficou mexendo? Aí eu peguei o cabo da faca e esmaguei a cabeça dele, e foi aí que ele morreu. Mas custou, ô peixinho duro de morrer! Quê que você está me olhando?
        – Por nada.
        – Você não está acreditando? Juro; pode ir lá na cozinha ver: ela está lá do jeitinho que eu deixei.
        Ele foi caminhando para dentro.
        – Vou ficar aqui mais um pouco – disse a empregada. – depois vou arrumar os peixes, viu?
        – Sei.
        Acendeu a luz da sala. Deixou o pão em cima da mesa e sentou-se. Só então notou como estava cansado.

  Luiz Vilela. O violino e outros contos. 7. ed. São Paulo: Ática, 2007. p. 36-38.
Entendendo o conto:
01 – De acordo com o texto, qual o significado das palavras abaixo:
·    Capanga: bolsa pequena, de tecido, couro ou plástico, usada a tiracolo.
·        Footing: passeio a pé, com o objetivo de arrumar namorado(a).
·  Guelra: estrutura do órgão respiratório da maioria dos animais aquáticos.
·        Rabanada: movimento brusco com o rabo.
·        Vozerio: som de muitas vozes juntas.

02 – Qual é o foco narrativo do conto? Justifique com elementos do texto.
      O texto é narrado em terceira pessoa. Os verbos e pronomes na terceira pessoa justificam essa resposta.

03 – Quais são as características do narrador dessa história?
      É um narrador em terceira pessoa, que não participa da história, mas sabe de tudo sobre as personagens, incluindo o que estão pensando.

04 – Releia o trecho a seguir: “[...] Como que ela podia durar tanto tempo assim fora d’água? ...”. De quem é essa voz?
      É a voz do narrador onisciente, que conhece até mesmo os pensamentos das personagens.

05 – O conto é um gênero de narrativa no qual se desenvolve um único conflito envolvendo o(s) protagonista(s). Nesse conto, assistimos a um conflito interior, que se passa no íntimo do protagonista.
a)   Qual é esse conflito?
O conflito é o que fazer com o peixe que não havia morrido.

b)   Que fato provoca tal conflito?
O fato de a traíra ainda estar viva quando a personagem principal despeja os peixes na pia.

06 – O conflito interior do protagonista se inicia e vai se desenvolvendo até a decisão final.
a)   Qual é a decisão do protagonista a respeito do peixe?
A decisão é criar a traíra no tanquinho do quintal.

b)   Quais são as etapas desde o conflito até a tomada de decisão?
No começo, a personagem principal fica apenas curiosa, mas depois se anima com a ideia de o peixe estar vivo. Resolve sair para comprar comida para o peixe e decide limpar o tanquinho para ele cria-lo.

07 – Reproduza o trecho que corresponde ao clímax desse conto e explique por que você considera esse o momento de maior tensão da história.
      O clímax se dá no momento em que a empregada diz “—Traíra é duro de morrer, hem?”; porque, então, a personagem principal vê desmoronar seu sonho de criar a traíra como um peixe de estimação.

08 – A escolha do foco narrativo em terceira pessoa permite que exista um diálogo, como o que se dá entre a personagem principal e a empregada, carregado de tensão. Se esse conto fosse narrado em primeira pessoa, isso seria possível? Por quê?
      Não. Se o narrador fosse o menino, ele diria o que pensou ao ouvir a empregada, e todo o clima de tensão desapareceria.

09 – Considerando o que foi estudado neste capítulo sobre os determinantes do substantivo, podemos dizer que, no início da narrativa, a traíra era realmente “um peixe” para a personagem principal, mas, no final, o menino já poderia se referir a ela como “o peixe”. Por quê?
      No início da narrativa, o uso do artigo um mostra que o peixe é desconhecido, um peixe qualquer, igual a outros que o menino já viu. No fim, o artigo o individualiza esse peixe: não se trata mais de qualquer peixe, mas daquele ao qual a personagem se afeiçoou.

10 – Nos primeiros parágrafos, o narrador descreve a cena em que a personagem principal volta de uma pescaria. Logo em seguida, esse mesmo narrador oferece ao leitor uma informação que vai alterar a situação inicial da história.
a)   Que informação é essa?
Trata-se da informação de que a traíra estava viva.

b)   Por que essa informação vai alterar o rumo da trama?
Porque, a partir deste momento, a traíra mostra-se realmente viva. E o que fazer com ela é a questão que se segue.

11 – A personagem começa a gostar do peixe. Como isso aparece no texto?
      A personagem começa a conversar com o peixe.

12 – Releia: “[...] E então pensou na traíra, sua trairinha, deslizando silenciosamente no tanque da pia, na casa escura.”
a)   O que o diminutivo trairinha revela sobre os sentimentos da personagem?
O diminutivo mostra que a personagem já estava se afeiçoando à traíra.

b)   Como a personagem encara essa relação com a traíra?
O menino acha curioso se interessar pela traíra, afeiçoar-se a um peixe que nem bonito era.

13 – Releia:
        “– Traíra é duro de morrer, hem?
        – Duro de morrer? ...
        Ele parou.
         – Uai, essa que você pegou estava vivinha na hora que eu cheguei, e você ainda esqueceu o tanque cheio d'água... Quando eu cheguei, ela estava toda folgada, nadando. Você não está acreditando? Juro. Ela estava toda folgada, nadando.”

a)   Em vez de dizer tudo o que a personagem sentiu ao ouvir a empregada, o narrador limitou-se a uma frase curta e seca: “Ele parou”. Que efeito esse recurso provoca no leitor?
Frases curtas e secas são mais diretas. Neste caso, a frase cria um suspense, deixando o leitor na expectativa do que poderia ter de fato acontecido ao peixe.

b)   O que a personagem pode ter pensado naquele momento?
Resposta pessoal do aluno.

c)   Explique o uso do diminutivo vivinha nesse trecho.
O diminutivo, nesse trecho, intensifica a ideia de vivacidade e vitalidade; vivinha quer dizer “muito viva, bem viva”.

14 – Há no texto perguntas não indicadas por travessão. Observe:
        “[...]No começo fora só curiosidade; mas depois foi bacana, ficou alegre quando viu a traíra bem viva de novo, correndo pela água, esperta. Mas o que faria com ela agora? Matá-la, não ia; não, não faria isso. Se ela já estivesse morta, seria diferente; mas ela estava viva, e ele não queria matá-la. Mas o que faria com ela? Poderia criá-la; por que não?”

a)   Essas perguntas estão relacionadas à voz de qual personagem?
À voz da personagem principal, o menino.

b)   Que informações essas perguntas revelam ao leitor?
Essas perguntas permitem que o leitor conheça as dúvidas, os sentimentos e pensamentos da personagem principal.




MENSAGEM ESPÍRITA: PRECIPITAÇÃO - PARA REFLEXÃO

Precipitação

    A precipitação responde por muitos males que afligem o homem. Um comportamento ansioso leva a estados de perturbação, geradores de sofrimentos perfeitamente evitáveis. Sob o estigma da ansiedade as atitudes são incorretas, fomentando resultados inadequados à edificação interior.
          O exercício da calma, por isso mesmo, faz-se imprescindível para uma jornada harmônica face às perplexidades que a vida moderna impõe. A calma ensina a esperar pelos resultados de qualquer realização, que não podem ser antecipados.
         O ritmo do tempo é inalterável, razão por que os acontecimentos sucedem naturalmente dentro de espaços que não podem ser modificados. À instância da precipitação o homem ouve e vê mediante óptica deformada, que mais o perturba, desde que obnubilandolhe o discernimento, precipita-o em despenhadeiros de infortúnio.
          Há tempo de semear, sendo, portanto, compreensível que chegará o tempo de segar. Inutilmente se pretenderá com êxito precipitar os fenômenos da vida, entre a germinação e a frutescência do grão. No campo moral, o mecanismo é equivalente. Cada fase tem um período próprio; cada ocorrência seu instante azado.
          Reúne as tuas forças morais na disciplina do equilíbrio, não precipitando sucessos que devem seguir o seu curso normal. Consciente de que somente te ocorrerá o que esteja na tua programação cármica, não sofras por antecipação, propiciando estados de ansiedade e amargura, que poderiam ser evitados. Quando suceder que o sofrimento desabe sobre ti, enfrenta-o com nobreza, sabendo que o mesmo se te faz necessário, como forma de crescimento para a vida e de recuperação pessoal, na contabilidade dos valores espirituais...
          Fixa-te nos ideais da beleza e do amor, sem te preocupares com as excentricidades em voga e acende a esperança nas almas, conduzindo as tuas aspirações superiores ao encontro da tua ressurreição ditosa. Nas ciladas que se te apresentem na senda, assume a atitude de fé e ora, prosseguindo com destemor, na certeza da vitória inquestionável que conseguirás.
            Disse Jesus: Somente caem as folhas das árvores pela vontade de Deus, demonstrando que toda ocorrência está subordinada a leis que comandam todos os fenômenos do Cosmo. Da mesma forma, sucedem no teu universo pessoal, acontecimentos a que fazes jus e de que necessitas.
            Tem, portanto, paciência e não te precipites nunca. Arrepender-te-ás pela decisão arroubada, ansiosa, e nunca por aquela que nasce da reflexão e da calma. Se parecer-te impossível suportar em paz os problemas que te angustiam, recorre à oração e deixa-te acalmar pela blandícia do intercâmbio entre ti, que rogas, e a Divindade que te responde, asserenando-te e poupando-te à precipitação.