terça-feira, 3 de outubro de 2017

QUESTÕES DE LITERATURA PARA VESTIBULARES - COM GABARITO

QUESTÕES DE VESTIBULARES


01 – (UCP-PR) Capitu é uma das mais bem construídas personagens da literatura brasileira. Quem a criou e em que obra?
     a)     Machado de Assis, Dom Casmurro.
     b)    José de Alencar, O Guarani.
     c)     Machado de Assis, O Alienista.
     d)    José de Alencar, Til.
     e)     José de Alencar, Senhora.


02 – (UFSCAR-SP) O que sobressai na atividade criadora de Machado de Assis é:
a)     A minuciosa busca de soluções aperfeiçoadoras, que só conseguiu após inúmeros e continuados exercícios.
b)    A grande capacidade de inspiração, uma vez que a quantidade de romances que escreveu foi facilitada pela improvisação.
c)     O equilíbrio entre o improvisador, o inspirado e o artista, que é demonstrado pelas obras de valor desigual que ocorrem no decorrer de sua produção literária.
d)    A sinceridade com que manifesta, por linguagem desprovida de metáforas, em cada romance que escreveu, as várias fases de sua biografia.
e)     Ter iniciado a carreira escrevendo romances realistas, convertendo-se, mais tarde, ao Naturalismo.


03 – (UFMG) “A concretização do abstrato é uma técnica da ironia machadiana.” Todas as atividades explicam essa afirmação, exceto:
      a)     “A alma do Rubião bracejava debaixo desse aguaceiro de palavras; mas, estava num beco sem saída por um lado nem por outro. Tudo muralhas. Nenhuma porta aberta, nenhum corredor, e a chuva a cair.”


      b)    “Vá desapontamento. Misturem-lhe o pesar da separação, não esqueçam a cólera que o primeiro trovejou surdamente, e não faltará quem ache que a alma deste homem é uma colcha de retalho. Pode ser; moralmente as colchas inteiriças são tão raras!”
c)     “Não esqueça dizer que Rubião tomou a si dizer uma missa por alma do finado, embora soubesse ou pressentisse que ele não era católico. Quincas Borba não dizia pulhices a respeito de padres, nem desconceituava doutrinas católicas; mas não falava nem da Igreja, nem dos padres.”
d)    “A outra que ri a alma do Rubião. Escutai a cantiga alegre, brilhante, com que ela desce o morro, dizendo as cousas mais íntimas à estrelas, espécie de rapsódia feita de uma linguagem que ninguém nunca alfabetou, por ser impossível achar um sinal que lhe exprime os vocábulos.”
e)     “Tédio por dentro e por fora. Nada em que espraiasse a vista e descansasse a alma. Sofia meteu a alma em um caixão de chumbo do dia, e deixou-se estar sinceramente defunta.”

04 – (UFPA):
        “Mas o ilustre médico, com os olhos acesos da convicção, trancou os ouvidos à saudade da mulher, e brandamente a repeliu. Fechada a porta da Casa Verde, entregou-se ao estudo e à cura de si mesmo.”
        Sobre o autor do texto acima é incorreto afirmar que:
a)     É um dos mais festejados representantes da prosa literária no Brasil.
b)    Autor eclético, destacou-se na produção de uma vasta obra constituída de romances, contos, poesia, crônicas, etc.
c)     São personagens definitivos que nasceram de sua pena: Simão Bacamarte, Capitu, Brás Cubas, Quincas Borba, etc.
d)    Produziu uma obra marcada pela fina ironia e profundo pessimismo.
e)     Seus princípios romances desenvolvem o tema do amor, colocando os sentimentos mais nobres acima de qualquer obstáculo.

05 – (PUCCAMP-SP) Identifique o trecho em que o narrador de Dom Casmurro introduz o romance e considera seu sentido profundo:
a)     “Horas inteiras eu fico a pintar o retrato dessa mãe angélica, com as cores que tiro da imaginação, e vejo-a assim, ainda tomando conta de mim. Dando-me banhos e me vestindo. A minha memória ainda guarda detalhes bem vivos que o tempo não conseguiu destruir.”
b)    “O meu fim evidente era atar as duas pontas da vida, e restaurar na velhice a adolescência. Pois, senhor, não conseguiu recompor o que foi nem o que fui. Em tudo, se o rosto é igual, a fisionomia é diferente. É o que vais entender, lendo.”
c)     “Faz dois anos que Madalena morreu, dois anos difíceis. E quando os amigos deixaram de vir discutir política, isto se tornou insuportável. Foi aí que me surgiu a ideia esquisita de, com o auxílio de pessoas mais entendidas que eu, compor esta história.”
d)    “Suposto o uso vulgar seja começar pelo nascimento, duas considerações me levaram adotar diferente método: a primeira é que não sou propriamente um autor defunto, mas um defunto autor; a segunda é que o escrito ficaria assim mais galante e mais novo.”
e)     “Sua história tem pouca coisa de notável. Fora Leonardo algibebe em Lisboa, sua pátria; aborrecera-se porém no negócio, e viera ao Brasil. Aqui chegando, não se sabe por proteção de quem, alcançou o emprego de que o vemos empossado.”

06 – (UCP-PR) São obras da fase realista de Machado de Assis:
a)     Dom Casmurro / Casa de Pensão.
b)    O Mulato / Casa de Pensão.
c)     Dom Casmurro / O Mulato.
d)    Memórias Póstumas de Brás Cubas / Dom Casmurro.
e)     Memórias Póstumas de Brás Cubas / A mão e a luva.

07 – (UFPA) Os personagens realistas-naturalistas têm seus destinos marcados pelo determinismo. Identifica-se esse determinismo:
a)     Pela preocupação dos autores em criar personagens perfeitos, sem defeitos físicos ou morais.
b)    Pelas forças atávicas e / ou sociais que condicionam a conduta dessas criaturas.
c)     Por ser fruto, especificamente, da imaginação e da fantasia dos autores.
d)    Por se notar a preocupação dos autores de voltarem para o passado ou para o futuro ao criarem seus personagens.
e)     Por representarem a tentativa dos autores nacionais de reabilitar uma faculdade perdida do homem: o senso do mistério.

08 – (FUVEST):
        “E naquela terra encharcada e fumegante, naquela umidade quente e lodosa, começou a minhacar, a esfervilhar, a crescer, um mundo, uma coisa viva, uma geração, que parecia brotar espontânea, ali mesmo, daquele lameiro, a multiplicar-se como larva no esterco.”
        O fragmento de O Cortiço, romance de Aluísio Azevedo, apresenta uma característica fundamental do Naturalismo. Qual?
a)     Compreensão psicológico do Homem.
b)    Compreensão biológica do Mundo.
c)     Concepção idealista do Universo.
d)    Concepção religiosa da Vida.
e)     Visão sentimental da Natureza.

09 – (UFRS) Leia o seguinte texto:
        “A Praça da Alegria apresentava um ar fúnebre. De um casebre miserável, de porta e janela, ouviam-se gemer os armadores enferrujados de uma rede e uma voz tísica e aflautada de mulher, cantar em facete a gentil Carolina era bela; doutro lado da praça uma preta velha, vergada por imenso tabuleiro de madeira sujo e seboso, cheio de sangue e coberto por uma nuvem de moscas, as apregoava em tom muito arrastado e melancólico: ‘fígado, rins e coração’. Era uma vendeira de fatos de boi. As crianças nuas, com as perninhas tortas pelo costume de cavalgar as ilhargas maternas, as cabeças avermelhada pelo sol, a pele crestada, os ventrezinhos amarelados e crescidos, corriam e guinchavam, empinando papagaio de papel.”
        A descrição acima caracteriza o ambiente, focalizando ao mesmo tempo a paisagem física e a paisagem humana e acentuando a grande identidade entre ambas. Ao fazê-lo o autor retrata a realidade sem adornos, buscando a exatidão, embora carregue nas tintas para enfatizar os aspectos mais sórdidos. Tal parágrafo pode pertencer à obra de:
a)     José de Alencar.
b)    Aluísio Azevedo.
c)     Joaquim Manoel de Macedo.
d)    Clarice Lispector.
e)     Bernardo Guimarães.

10 – (UFRS) Assinale a alternativa em que está incorreta a relação autor/obra/personagem:
a)     Manoel Antônio de Almeida / Memórias de um Sargento de Milícias / Leonardo.
b)    Joaquim Manoel de Macedo / A Moreninha / Carolina.
c)     Raul Pompeia / O Ateneu / Carlos.
d)    José de Alencar / O Guarani / Cecília.
e)     Aluísio Azevedo / O Cortiço / João Romão.

11 – (CARLOS CHAGAS-BA) Assinale a alternativa onde estão indicados os textos que analisam corretamente alguns aspectos do romance realista.
I – As personagens independem do julgamento do narrador, reagindo cada uma de acordo com sua própria vontade e temperamento.
II – A linguagem é poeticamente elaborada nos diálogos, mas procura alcançar um tom coloquial, com traços de oralidade, nas parte narrativas e descritivas.
III – Observa-se o predomínio da razão e da observação sobre o sentimento e a imaginação.
a)     I, II e III.
b)    I e II.
c)     II e III
d)    I e III.
e)     II.

12 – (UCP-PR) Eixos dramáticos ao redor dos quais se desenvolve a trama romanesca de O mulato, romance de Aluísio Azevedo:
a)     A doença sem cura da heroína e a embriaguez.
b)    A marginalidade do mulato e o anticlericalismo.
c)     A saúde deficiente e precária do mulato e a decadência da sociedade burguesa.
d)    O comportamento geneticamente desavergonhado do mulato e o fanatismo religioso.
e)     O desprendimento inabalável da heroína e a fidelidade à memória do amado.

13 – (UFPB) As seguintes afirmações de Alfredo Bosi sobre estilo de época:
        “Na França, a partir de 1820, e na Alemanha e na Inglaterra, desde os fins do século XVIII, uma nova escritura substituíra os códigos clássicos em nome da liberdade criadora do sujeito.”
        “Há um esforço, por parte do escritor (...), de acercar-se impessoalmente dos objetos, nas pessoas. E uma sede de objetividade que responde aos métodos científicos cada vez mais exatos nas últimas décadas do século.”
        “A poética da novidade tanto no plano das ideias (conceptismo) como no das palavras (cultismo) deságua no efeito retórico-psicológico e na expressão do bizarro. O que importa, pois, é não nomear plebeiamente o objeto, mas envolve-lo em agudezas e torneios de engenho, critérios básicos de valor na arte seiscentista.”
        Correspondem, respectivamente, ao:
a)     Arcadismo – Realismo – Simbolismo.
b)    Simbolismo – Realismo – Barroco.
c)     Romantismo – Realismo – Barroco.
d)    Simbolismo – Arcadismo – Barroco.
e)     Romantismo – Arcadismo – Simbolismo.

14– (FUVEST):
        “Esta de Áureos relevos, trabalhada
        De divas mãos, brilhantes copa, um dia,
        Já de aos deuses servir como cansada,
        Vinda do Olimpo, a um novo deus servia.”

A poesia que se concentra na reprodução de objeto decorativo, como exemplifica a estrofe de Alberto de Oliveira, assinala a tônica da:
a)     Espiritualização da vida.
b)    Visão do real.
c)     Arte pela arte.
d)    Moral das coisas.
e)     Nota do intimismo.

15 – (UFPR):
        “Se se pudesse, o espírito que chora,
        Ver através da máscara da face;
        Quanta gente, talvez que inveja agora
        Nos causa, então piedade nos causasse!”
                                       Raimundo Correia, Mal Secreto.

Assinale a alternativa que exprime a oposição fundamental deste texto:
a)     Corpo versus espírito.
b)    Essência do ser versus aparência.
c)     Gente feliz versus gente infeliz.
d)    Piedade versus falsidade.
e)     Dor versus falsidade.

16 – (UFPB) A propósito da poesia parnasiana, é correto afirmar que ela:
a)     Caracteriza-se como forma de evocação de sentimentos e emoções.
b)    Revela-se no emprego da palavras de grande valor conotativo e ricas em sugestões sensoriais.
c)     Acentua a importância da forma, concebendo a atividade poética como a habilidade no manejo do verso.
d)    Faz aluzões a elementos evocadores de rituais religiosos, impregnando a poesia de misticismo e espiritualidade.

e)     Explora intensamente a cadeia fônica da linguagem, procurando associar a poesia à música.

segunda-feira, 2 de outubro de 2017

ARTIGO DE OPINIÃO: APAIXONAR-SE É BOM, MAS É ESTRESSANTE - AILTON AMÉLIO DA SILVA - COM GABARITO

APAIXONAR-SE É BOM, MAS É ESTRESSANTE

       “Amor à vista!” As turbulências de um marinheiro de
        primeira viagem no mundo dos relacionamentos.

        Qual foi a época mais feliz na sua vida? Se você pudesse escolher, que idade teria de novo? Se você tem, digamos, mais de 30 anos, provavelmente já ouviu essas perguntas muitas vezes. As respostas variam. Muitas pessoas voltar à época da faculdade, outras voltariam infância, outras ao início do casamento, e assim por diante. No entanto, raramente ouvimos a resposta: “Voltaria à minha adolescência”.
        Por que pouca gente gostaria de voltar à adolescência? À primeira vista, existe muita coisa boa nessa época: não temos de ganhar a vida, nossos pais estão vivos, temos roupa lavada e comida de graça. É, também, a época da descoberta do amor. Paradoxalmente, esse é um dos motivos pelos quais ninguém quer voltar à adolescência. A iniciação na vida amorosa geralmente é muito tensa, muito intensa, muito turbulenta, muito permeada de gozos e agruras. Antes, na infância, o amor era algo que apenas víamos na TV, entre os mais velhos e, com um pouco de sorte, entre nossos pais. Agora, na adolescência, o amor está acontecendo com os amigos mais próximos e (que espanto!) conosco. Aquelas pessoas horrorosas de sexo oposto de repente estão se tornando suportáveis... admissíveis... interessantes... altamente interessantes... imprescindíveis!!! Em todos os locais que frequento existem vários possíveis parceiros amorosos na mesma situação que eu: com os hormônios sexuais transbordando, disponíveis e muito dispostos a se envolver amorosamente. Os meus pares já estão namorando, a mídia, as músicas, os livros, o zunzum que ouço, tudo proclama as maravilhas de um relacionamento amoroso. Preciso arranjar um! Puxa, como seria bom ficar com aquela pessoa! Faria qualquer coisa para dar um beijo nela! Quem sou eu? Qual meu cacife para atrair aquele ser tão interessante?
        É aí que começam as agruras amorosas. Geralmente, aquelas pessoas que são mais atraentes para mim também o são para todos os meus colegas. Assim sendo, poucos de nós seremos bem-sucedidos (é a velha questão da relação entre oferta e procura). O pior de tudo é que aquela pessoa que parecia estar interessada em mim, parecia estar me paquerando, me rejeitou. Apaixonei-me e, quando tentei ficar com ela, levei um fora. O que agrava esse quadro é que ele é recorrente: a todo momento estou novamente me interessando por uma nova pessoa e toda a história se repete. “Como é bom e como é sofrido!!”, confessou a esse respeito uma adolescente que participou de uma pesquisa que fiz sobre o assunto. Se sou tímida a coisa piora de vez. Não consigo “ficar” ou namorar. Perto da pessoa amada baixa uma bobeira. Fico tenso. Não consigo falar coisas inteligentes, dá um branco, faço coisas idiotas para atrair sua atenção, o meu charme me abandona. A timidez é extremamente frequente entre os adolescentes. [...] É estressante. É solitário. Mas é inevitável. Como escreveu o poeta Carlos Drummond de Andrade, amar se aprende amando. A notícia boa é que a adolescência acaba um dia. A ruim é que esse aprendizado dura a vida inteira.

           Ailton Amélio da Silva. Veja Jovens, edição especial da Veja.
                                                           Ano 34, n. 38, set. 2001. p. 87.

1 – Segundo o autor, por que a maioria das pessoas não gostaria de voltar à época da adolescência? Você concorda com os argumentos apresentados por ele?
      Porque é na adolescência que se dá a iniciação amorosa. São muitas as dúvidas, as ansiedades, as decepções ocorrem a todo momento. Resposta pessoal do aluno.

2 – Os seguintes trechos desse texto se aplicam à personagem Brás Cubas? De que maneira?
a)   “A iniciação da vida amorosa geralmente é muito tensa, muito intensa, muito turbulenta, muito permeada de gozos e agruras.”
b)   “Puxa, como seria bom ficar com aquela pessoa! Faria qualquer coisa para dar um beijo nela! Quem sou eu? Qual meu cacife para atrair aquele ser tão interessante?”
      Sim. O relacionamento de Brás Cubas com Marcela era realmente turbulento: havia as delícias e havia os amargores. Com relação ao cacife, Brás Cubas usava das prerrogativas de filho de pai abastado para conseguir o dinheiro de que precisava e conquistar Marcela.

3 – Além da concorrência, da inexperiência, do medo da rejeição, da timidez, o jovem que ainda não trabalha enfrenta uma outra limitação, em seus relacionamentos, que é vivida pela personagem Brás Cubas:
a)   Que limitação é essa?
É o fato de não possuir, ainda, algum rendimento que lhe dê independência econômica.

b)   Em que isso pode influir num relacionamento amoroso?
Haverá limitação de passeios, cinema, teatro, restaurantes e outros programas que acarretem despesa.

c)   No caso de Brás Cubas, como esse empecilho foi vencido? Esse mesmo artifício poderia ser utilizado nos dias de hoje?
Brás Cubas pediu empréstimos na praça, provavelmente em nome de seu pai. Hoje tudo seria diferente: é preciso dar garantias legais ou fiadores e ser maior de idade para se conseguir um empréstimo.

4 – Se os problemas vividos pelos adolescentes da atualidade, diante de suas primeiras experiências amorosas, são os mesmos vividos por Brás Cubas, no século XIX, o que é possível concluir?
      É possível concluir que os jovens costumam enfrentar as mesmas dificuldades, não importando a época em que vivam, principalmente no que se refere à vida afetiva. A timidez e a insegurança são características da adolescência de todos os tempos.

5 – Para fechar seu texto, o autor do artigo cita Drummond, segundo o qual “amar se aprende amando” e dá duas notícias: uma boa e uma ruim. Comente a notícia ruim.
      A notícia ruim não é, afinal, tão ruim assim: de fato, o aprendizado do amor recomeça a cada novo relacionamento. Como o desenrolar de um caso amoroso é praticamente imprevisível, só se pode aprender enquanto ele estiver em curso. Talvez esteja nesse eterno aprender a graça do jogo.

6 – Após a leitura do texto Apaixonar-se é bom, mas é estressante, você reconsideraria os atos de Brás Cubas? Por quê?
      Sim. Ele estava na fase de auto afirmação, de querer manter o objetivo de sua paixão a qualquer preço.


CRÔNICA: ONZE CONTOS DE RÉIS- (MEMÓRIAS PÓSTUMAS DE BRÁS CUBAS) - COM GABARITO


ONZE CONTOS DE RÉIS

...Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de réis; nada menos. Meu pai, logo que teve aragem dos onze contos, sobressaltou-se deveras; achou que o caso excedia as raias de um capricho juvenil.
        --- Desta vez, disse ele, vais para a Europa; vais cursar uma universidade, provavelmente Coimbra; quero-te para homem sério e não para arruador e gatuno. E como eu fizesse um gesto de espanto: -- Gatuno, sim senhor; não é outra coisa um filho que me faz isto...
        Sacou da algibeira os meus títulos de dívida, já resgatados por ele, e sacudiu-nos na cara. – Vês, peralta? É assim que um moço deve zelar o nome dos seus? Pensas que eu e meus avós ganhamos o dinheiro em casas de jogo ou a vadiar pelas ruas? Pelintra! Desta vez ou tomas juízo, ou ficas sem coisa nenhuma.
        Estava furioso, mas de um furor temperado e curto. Eu ouvi-o calado, e nada opus à ordem da viagem, como de outras vezes fizera; ruminava a ideia de levar Marcela comigo. Fui ter com ela; expus-lhe a crise e fiz-lhe a proposta. Marcela ouviu-me com os olhos no ar, sem responder logo; como insistisse, disse-me que ficava, que não podia ir para a Europa. [...]
        Marcela franziu a testa, cantarolou uma seguidilha, entre dentes; depois queixou-se do calor, e mandou vir um copo de aluá. Trouxe-lhe a mucama, numa salva de prata, que fazia parte dos meus onze contos. Marcela ofereceu-me polidamente o refresco; minha resposta foi dar com a mão no copo e a salva; entornou-se lhe o líquido no regaço, a preta deu um grito, eu bradei-lhe que se fosse embora. Ficando a sós, derramei todo o desespero de meu coração disse-lhe que ela era um monstro, que jamais me tivera amor, que me deixara descer a tudo sem ter ao menos a desculpa da sinceridade; chamei-lhe muitos nomes feios, fazendo muitos gestos descompostos. Marcela deixara-se estar sentada, a estalar as unhas nos dentes, fria como um pedaço de mármore. Tive ímpetos de a estrangular, de a humilhar ao menos, subjugando-a a meus pés. Ia talvez fazê-lo; mas a ação trocou-se noutra; fui eu que me atirei aos pés dela, contrito e súplice; beijei-lhes, recordei aqueles meses da nossa felicidade solitária, repeti-lhe os nomes queridos de outro tempo, sentado no chão com a cabeça entre os joelhos dela, apertando-lhe muito as mãos; ofegante, desvairado, pedi-lhe com lágrimas que me não desamparasse... Marcela esteve alguns instantes a olhar para mim, calados ambos, até que brandamente me desviou e, com um ar enfastiado:
        --- Não me aborreça, disse.
        Levantou-se, sacudiu o vestido, ainda molhado, e caminhou para a alcova. – Não! Bradei eu; não hás de entrar... não quero... Ia a lançar lhe as mãos: era tarde; ela entrara e fechara-se.
        Saí desatinado; gastei duas mortais horas em vaguear pelos bairros mais excêntricos e desertos, onde fosse difícil dar comigo. Ia mastigando o meu desespero, com uma espécie de gula mórbida; evocava os dias, as horas, os instantes de delírio, e ora me comprazia em crer que eles eram eternos, que tudo aquilo era um pesadelo, ora, enganando-me a mim mesmo, tentava rejeitá-los de mim, como um fardo inútil. Então resolvia embarcar imediatamente para cortar a minha vida em duas metades, e deleitava-me com a ideia de que Marcela, sabendo da partida, ficaria ralada de saudades e remorsos.
        [...]
        Enfim, tive uma ideia salvadora... [...] Era nada menos que fasciná-la, fasciná-la muito, deslumbrá-la, arrastá-la; lembrou-me pedir-lhe por um meio mais concreto de que a súplica. Não medi as consequências: recorri a um derradeiro empréstimo; fui à rua dos Ourives, comprei a melhor joia da cidade, três diamantes grandes, encastoados num pente de marfim; corri à casa de Marcela.
        Marcela estava reclinada numa rede, o gesto mole e cansado, uma das pernas pendentes, a verse-lhe o pezinho calçado de meia de seda, os cabelos soltos, derramados, o olhar quieto e sonolento.
        --- Vem comigo, disse eu, arranjei recursos... temos muito dinheiro, terás tudo o que quiseres... Olha, toma.
        E mostrei-lhe o pente com os diamantes. Marcela teve um leve sobressalto, ergueu metade do corpo, e, apoiada num cotovelo, olhou para o pente durante alguns instantes curtos; depois retirou os olhos; tinha-se dominado. Então, eu lancei lhes as mãos aos cabelos, coligi-os, enlaceios à pressa, improvisei um toucado, sem nenhum alinho, e rematei-o com o pente de diamantes; recuei, tornei a aproximar-me, corrigi lhes as madeixas, abaixei-as de um lado, busquei alguma simetria naquela desordem, tudo com uma minuciosidade e um carinho de mãe.
        --- Pronto, disse eu.
        --- Doido! foi a sua primeira resposta.
        A segunda foi puxar-me para si, e pagar-me o sacrifício com um beijo, o mais ardente de todos. Depois tirou o pente, admirou muito a matéria e o lavor, olhando a espaços para mim, e abanando a cabeça, com um ar de repreensão:
        --- Ora você! dizia.
        --- Vens comigo?
        Marcela refletiu um instante. Não gostei da expressão com que passeava os olhos de mim para a parede, e da parede para a joia; mas toda a má impressão se desvaneceu, quando ela me respondeu resolutamente:
        --- Vou. Quando embarcas?
        --- Daqui a dois ou três dias.
        --- Vou.
        Agradeci-lhe de joelhos. Tinha achado a minha Marcela dos primeiros dias, e disse-lhe; ela sorriu, e foi guardar a joia, enquanto eu descia a escada.

                   Machado de Assis. Memórias póstumas de Brás Cubas.
                                                    São Paulo: Moderna, 1984. p. 24-5.

1 – Observe a frase:
“...Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de réis; nada menos”.
a)   Qual o real significado dessa frase? O que lhe parece a maneira usada pelo narrador para indicar a duração de seu namoro?
O narrador “mede” a paixão de Marcela pelo tempo que durou a relação e pelo dinheiro que lhe custou tal capricho.

b)   A expressão que normalmente se usa é “nada mais, nada menos que”. Por que o narrador omitiu a primeira parte da expressão?
Porque ele parece reforçar a ideia de que Marcela não deixaria por menos os carinhos que lhe deu em troca dos presentes.

c)   Você diria que o narrador está contando algo que aconteceu já há algum tempo ou ele ainda está vivenciando a situação narrada? Justifique sua resposta.
O que ele narra aconteceu há tempos. Segundo o próprio narrador, era um “capricho juvenil”. Ao mesmo tempo que narra, a personagem avalia o que aconteceu.

2 – Em “não é outra coisa um filho que me faz isto...”, que fato a palavra isto está representando?
      O fato de ele ter-se empenhado em dívidas e assinado alguns títulos.

3 – A repreensão que o narrador sofre surte efeito? Justifique sua resposta.
      Não. Logo em seguida, ele faz outro empréstimo. Já que teria de viajar, pensava em levar Marcela consigo. Para convencê-la, compra outra joia.

4 – Que expressões do texto revelam que a peraltice do narrador apontada pelo pai não era a primeira?
      “Desta vez”: significa que houvera outras vezes. “Pensas que eu e meus avós ganhamos o dinheiro em casas de jogo ou a vadiar pelas ruas?”: significa que o narrador fazia isso.

5 – As relações entre as personagens aparecem ser muito diferentes do que realmente são. Como é, de verdade, a relação entre:
a)   O narrador e seu pai?
O pai finge estar furioso com o filho, mas encobre seus deslizes; o filho finge que lhe obedece, mas faz o que acha melhor.

b)   O narrador e sua namorada?
O narrador finge que tudo pode para conquistar Marcela, mas está enterrado em dívidas; ela finge que não liga para os presentes, mas esse é seu único interesse. Ele, por sua vez, finge acreditar em teu amor, embora saiba que é falso. Como se percebe, as relações entre as pessoas são absolutamente hipócritas.

6 – Que atitudes de Marcela demonstram:
a)   Sua frieza?
Domina sua vontade de olhar a joia.

b)   Sua falsidade?
Dá um beijo ardente no narrador.

7 – As três personagens apresentam profundas contradições. Quais?
      Pai: quer dar boa educação ao filho, mas não soube impor-lhe limites.
      Filho: sabe que Marcela é interesseira, mas não abre mão de sua “paixão”, mesmo não sendo correspondido.
      Marcela: não ama o rapaz, mas alimenta suas esperanças porque quer continuar tendo suas vantagens.

8 – Com a joia e a promessa de viagem, o narrador diz ter reencontrado a Marcela dos primeiros dias. Como estaria sendo, então, a Marcela dos últimos dias?
      Provavelmente não era mais carinhosa, estava mudada, enfastiada.

9 – Embora tenha sido publicado em 1881, o livro do qual foi tirado o trecho que você leu se mantém atual em muitos pontos. Você saberia dizer em quê?
      Resposta pessoal do aluno. Considerar as relações entre pai abastado e filho mimado.

10 – Neste trecho, explique por que o autor escolheu o verbo em destaque: “Ficando a sós, derramei todo o desespero de meu coração”.
      É uma metáfora. Observar que, antes de dizer isso, o narrador contara sua explosão, ao dar com a mão no copo de refresco que a mucama lhe trazia. Daí a escolha irônica do derramei.


TEXTO LITERÁRIO: UM DIA TODOS SE ENCONTRAM(FRAGMENTO) - JOÃO GUIMARÃES ROSA - COM GABARITO

TEXTO LITERÁRIO: UM DIA TODOS SE ENCONTRAM
                                         João Guimarães Rosa

        De repente lá vinha um homem a cavalo. Eram dois. Um senhor de fora, o claro da roupa. Miguilim saudou, pedindo a bênção. O homem trouxe o cavalo cá bem junto. Ele era de óculos, corado, alto, com um chapéu diferente, mesmo.
        --- Deus te abençoe, pequeninho. Como é teu nome?
        --- Miguilim. Eu sou irmão do Dito.
        --- E seu irmão Dito é o dono daqui?
        --- Não, meu senhor. O Ditinho está em glória.
        O homem esbarrava o avanço do cavalo, que era zelado, manteúdo, formoso como nenhum outro. Redizia:
        --- Ah, não sabia, não. Deus o tenha em sua guarda... Mas, que é que há, Miguilim?
        Miguilim queria ver se o homem estava mesmo sorrindo para ele, por isso é que o encarava.
        --- Por que você aperta os olhos assim? Você não é limpo de vista? Vamos até lá. Quem é que está em tua casa?
        ---É mãe, e os meninos...
        Estava Mãe, estava Tio Terêz, estavam todos. O senhor alto e claro se apeou. O outro, que vinha com ele, era um camarada. O senhor perguntava à Mãe muitas coisas do Miguilim. Depois perguntava a ele mesmo: --- “Miguilim, espia daí: quantos dedos da minha mão você está enxergando? E agora?”.
        Miguilim espremia os olhos. Drelina e a Chica riam. Tomezinho tinha ido se esconder.
        --- Este nosso rapazinho tem a vista curta. Espera aí, Miguilim...
        E o senhor tirava os óculos e punha-os em Miguilim, com todo o jeito.
        --- Olha, agora!
        Miguilim olhou. Nem não podia acreditar! Tudo era uma claridade, tudo novo e lindo e diferente, as coisas, as árvores, as caras das pessoas. Via os grãozinhos de areia, a pele da terra, as pedrinhas menores, as formiguinhas passeando no chão de uma distância. E tonteava. Aqui, ali, meus Deus, tanta coisa, tudo... O senhor tinha retirado dele os óculos, e Miguilim ainda apontava, falava, contava tudo como era, como tinha visto. Mãe esteve assim assustada; mas o senhor dizia que aquilo era do modo mesmo, só que Miguilim também carecia de usar óculos, dali por diante. O senhor bebia café com eles. Era o doutor José Lourenço, do Curvelo. Tudo podia. Coração de Miguilim batia descompasso, ele careceu de ir lá dentro, contar à Rosa, à Maria Pretinha, à Mãitina. A Chica veio correndo atrás, mexeu: --- “, Miguilim você é piticego...” E ele respondeu: --- “Donazinha...”.
        Quando voltou, o doutor José Lourenço já tinha ido embora.
        --- “Você está triste, Miguilim?” --- Mãe perguntou.
        Miguilim não sabia. Todos eram maiores do que ele, as coisas reviravam sempre dum modo tão diferente, eram grandes demais.
        --- Pra onde ele foi?
        --- A foi p’ra a Vereda do Tipã, onde os caçadores estão. Mais amanhã ele volta, de manhã, antes de ir s’embora para a cidade. Disse que, você querendo, Miguilim, ele junto te leva... --- O doutor era homem muito bom, levava o Miguilim, lá ele comprava uns óculos pequenos, entrava para a escola, depois aprendia ofício. --- “Você mesmo quer ir?”.
         Miguilim não sabia. Fazia peso para não soluçar. Sua alma, até ao fundo, se esfriava. Mas Mãe disse:
         --- Vai, meu filho. É a luz dos teus olhos, que só Deus teve poder para te dar. Vai. Fim do ano, a gente puder, faz a viagem também. Um dia todos se encontram...

        João Guimarães Rosa. Campo geral. In: Manuelzão e Miguilim.
                                Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984. p. 139-40.

1 – “O Ditinho está em glória”; “Você não é limpo de vista?”; “Você é piticego...” Você já tinha ouvido expressões como essas? Onde? Como será o lugar retratado pelo autor? Explique o que levou você a fazer essa suposição.
        Resposta pessoal do aluno. O aluno deve perceber que se trata de um linguajar interiorano.

2 – Miguilim pôde ver em detalhes um mundo que, para ele, até então não existia. Essa conquista, todavia, teve um preço alto. Terá valido a pena?
      Sim. As separações costumam ser dolorosas, mas muitas vezes contribuem para nosso próprio crescimento e amadurecimento.

3 – “Todos eram maiores do que ele, as coisas reviravam sempre dum modo tão diferente, eram grandes demais.” Com essas palavras o autor tenta demonstrar o que se passa no interior de Miguilim. Explique você, com suas palavras, o que o garoto estava sentindo.
      Resposta pessoal do aluno. Observar que o menino se sente dividido.

4 – Como está o estado interior de Miguilim a chance de tentar uma nova vida?
      Miguilim é uma criança que sente nos acontecimentos uma força contra a qual não pode lutar em sua fragilidade infantil. Por isso, e para não preocupar ainda mais a mãe, esforça-se por não chorar.

5 – O que demonstra a atitude da mãe de Miguilim?
     Demonstra desprendimento. Embora ela esteja sofrendo com a possível separação, esforça-se para se controlar.

6 – Faça um comentário sobre o modo de narrar do autor do texto “Um dia todos se encontram”.
      Neste texto, o substantivo comum mãe é transformado em próprio porque ele funciona mesmo como um nome. A personagem não é apenas mãe de Miguilim. Ela encarna a função de mãe na família e desempenha papel fundamental na história.

7 – Afinal, o que dói tanto numa separação?
      Resposta pessoal do aluno.