sábado, 16 de janeiro de 2021

BIOGRAFIA/RELATO: A CASA - JOSÉ PAULO PAES - COM GABARITO

 RELATO/BIOGRAFIA: A CASA                      

  José Paulo Paes

       Não acredito que o futuro de quem quer que seja possa estar escrito com antecedência na configuração das linhas da mão ou dos astros do céu. Mas não posso deixar inteiramente de lado a ideia de o local de meu nascimento ter influído nos rumos de minha vida. Pois nasci numa livraria. Melhor dizendo, num quarto bem ao lado da Livraria, Papelaria e Tipografia J.V. Guimarães. É o que diz a placa da loja do meu avô materno, em cuja casa de Taquaritinga vim ao mundo no dia 22 de julho de 1926.

      Não me lembro evidentemente desse dia. Mas não deve ter sido diferente dos dias em que nasceram, anos depois, minhas duas irmãs, Ernestina e Fernanda. Em dias assim, a rotina da casa patriarcal de J. V. Guimarães mudava muito. As mulheres corriam apressadas de um lado para o outro, cochichando misteriosamente entre si. As crianças eram mandadas cedo para o quintal, advertidas de não fazer barulho para não incomodar minha mãe, cujos gemidos de parturiente eu e meu primo Quinzinho ouvíamos de longe, meio assustados.

        Nesses dias remotos os bebês não nasciam em hospitais. Nasciam em casa mesmo, pelas mãos de uma parteira ou de um clínico geral amigo da família. Para cada um dos seus dois filhos e de suas três filhas, meu avô mandava fazer um quarto. O de meus pais era o primeiro da casa, ao lado da sala de visitas e logo atrás da livraria, cujas largas portas de madeira, pintadas de azul, davam para a rua do Comércio. Mais tarde, mudaram-lhe o nome para rua Prudente de Morais, receio que para desgosto do meu avô. Ele não simpatizava muito com o regime republicano, porque exilara o velho Imperador, a quem ele admirava. Tanto assim que havia um retrato da família imperial pendurado em nossa sala de visitas, logo acima do piano alemão.

        Meu avô era português, mas viera ainda rapazola para o Brasil. Tivera uma vida meio aventurosa de bombeiro e soldado nos tempos de Floriano Peixoto. Já era tipógrafo e dono de jornal em Ribeirão Bonito, São Paulo, quando se casou com minha avó, Cândida Marçal, ou Dona Zizinha, emérita contadora de histórias de sacis, bruxas e assombrações. Os filhos do casal nasceram todos em Ribeirão Bonito. A família veio completa para Taquaritinga quando meu avô resolveu para lá transferir seus negócios, menos o jornal. [...]

        [...] De meu pai, Paulo Artur Paes da Silva, herdei o Paulo do meu nome; o José veio-me do avô paterno, conforme era praxe nas famílias portuguesas. Meu pai era português de nascença e nunca chegou a perder de todo o sotaque. Conheceu minha mãe em uma de suas passagens de caixeiro-viajante por Taquaritinga e com ela se casou em 1925.

        Embora tivesse apenas o curso primário, era um homem inteligente, ativo, habilidoso. Foi dono de um semanário, A Notícia, e de um escritório de contabilidade e corretagem de seguros. Mas terminou seus dias como caixeiro-viajante. Gostava de ler: tinha no quarto uma pequena biblioteca, na qual predominavam os romances policiais, por que era fanático, e livros sobre maçonaria, de que era membro. Além de marceneiro amador, era um excelente cozinheiro de fim de semana. Nos sábados e domingos, apossava-se da cozinha para fazer um arroz de frango e umas iscas de bacalhau simplesmente divinos. Uma festa culinária para a família toda, que nos outros dias tinha de suportar a comida insossa de vovó Zizinha.

        Minha mãe, que se chamava Diva Guimarães Paes, completara apenas o primário, mas redigia com correção e certo apuro literário, numa letra bonita, as cartas que me escrevia toda semana quando fui estudar fora. Era uma mulher baixinha e vivaz, sempre risonha (raríssimas vezes a vi triste), de uma bondade e de uma solicitude a toda prova. Com meu avô aprendera rudimentos de arte tipográfica e chegara a imprimir um jornalzinho seu. Era uma leitora voraz dos romances água-com-açúcar da coleção das Moças e dos folhetins de capa e espada assinados pela minha avó, que os recebia semanalmente pelo correio e os encadernava em grossos volumes. Para a criançada ainda analfabeta da casa, os folhetins de Dona Zizinha não interessavam. Interessavam, sim, as histórias de assombração por ela contadas numa voz de arrepiar, cheia de efeitos sonoros.

        Nos dias da minha infância interioriana, havia uma separação nítida entre o mundo dos adultos e o mundo das crianças. Ficávamos o menos possível dentro de casa, pois ali estávamos sob o olhar vigilante e autoritário dos mais velhos. Em especial da tia Aglai, que supervisionava a arrumação da casa. Ela nos dava bons pitos quando, vindos do quintal, sujávamos o seu chão de tábuas lavadas, que mais tarde passaram a ser enceradas a capricho. Durante as refeições na grande mesa de abrir – meu avô ocupava a cabeceira e eu tinha o privilégio de sentar-me à sua direita –, tia Aglai me chamava a atenção toda vez que eu apoiava o cotovelo para segurar a cabeça numa das mãos, enquanto comia enfastiadamente com a outra: “Tem medo que a sua cabeça caia dentro do prato, é?”

        Longe dos pitos dos adultos, o quintal era a pátria da liberdade que nos pertencia quase por inteiro. Quase, porque, se bem pudéssemos trepar pelas árvores de fruta e nos empanturrar de mangas, laranjas, tangerinas, jabuticabas e uvaias, os canteiros de verduras plantadas pelo meu avô e os canteiros de flores ciumentamente cuidados pela minha avó eram-nos zona proibida. Quem se atrevesse a passar-lhes a fronteira estava sujeito a um puxão de orelhas. O meu companheiro de brinquedos era o primo Quinzinho, seis meses mais novo que eu e hoje um veterano endodontista e, São José do Rio Preto.

        Para a nossa imaginação inflamada pelas aventuras dos seriados das matinês de sábado e domingo, o quintal se transformava, com a maior facilidade do mundo, em deserto árabe, selva africana ou faroeste bravio. Tínhamos um gosto especial por inventar esconderijos e passagens secretas. Quando meu tio Arnóbio, pai de Quinzinho, construiu casa própria e para ela se mudou, eu ia às vezes brincar no seu pomar. Ali ajudei meu primo a escavar uma passagem secreta sob o muro da frente, por onde nos esgueirávamos para a rua quando nos dava na telha. O diabo foi que, com a primeira chuva, um pedaço do muro desabou sobre o buraco sorrateiramente escavado, para surpresa do tio Arnóbio, que nunca conseguiu descobrir a verdadeira causa do desastre.

             Quem, eu? – Um poeta como outro qualquer. São Paulo, Atual, 1996.

Fonte: Livro – Ler, entender, criar – Língua Portuguesa, 6ª série- Editora Ática – São Paulo, 2003 – p.108-112.

Fonte da imagem acima:https://www.google.com/url?sa=i&url=https%3A%2F%2Fmyloview.com.br%2Ffotomural-desenho-de-esboco-da-antiga-casa-entre-o-pomar-no-11C239&psig=AOvVaw0xijOgcVlXiQVQEQxMsiCk&ust=1610929117935000&source=images&cd=vfe&ved=0CAIQjRxqFwoTCOitiunYoe4CFQAAAAAdAAAAABAD

Entendendo o relato:

01 – Nesse texto o autor nos conta um pouco de sua infância. Converse com seus colegas: que pessoas e fatos marcaram sua infância? Você se lembra de suas brincadeiras, de seus companheiros?

      Resposta pessoal do aluno.

02 – Mesmo que você não conheça algumas palavras empregadas no texto, provavelmente conseguiu entender o significado pelo contexto. Se ainda for necessário, consulte o dicionário.

·        Avultar: aumentar, acentuar.

·        Emérita: sábia, conhecedora.

·        Endodontista: profissional que pratica endodontia.

·        Esgueirar-se: escapulir, safar-se.

·        Parturiente: mulher que está prestes a parir.

·        Patriarcal: que se refere ao pai.

03 – Logo no início do texto o autor afirma não acreditar que o futuro de alguém possa estar escrito nas linhas da mão ou na configuração dos astros.

a)   Você concorda com a opinião dele?

Resposta pessoal do aluno.

b)   Releia o boxe “Conheça o autor”. Qual a profissão de José Paulo Paes?

Escritor.

c)   Que fato passado ele acredita que o influenciou na escolha de sua profissão?

O fato de ter nascido em uma casa vizinha a uma livraria.

04 – Quando e onde o autor do texto nasceu?

      Em 22 de julho de 1926, em Taquaritinga.

05 – Releia:

        “... As mulheres corriam apressadas de um lado para o outro, cochichando misteriosamente entre si. As crianças eram mandadas cedo para o quintal, advertidas de não fazer barulho para não incomodar minha mãe, cujos gemidos de parturiente eu e meu primo Quinzinho ouvíamos de longe, meio assustados.” Essa cena é descrita do ponto de vista de uma criança ou de um adulto? Justifique sua resposta.

      Do ponto de vista de uma criança. Os meninos viam as mulheres correrem e não eram informados sobre o que estava acontecendo; mandados para o quintal, ouviam gemidos cuja natureza não identificavam e que, por isso, assustavam.

06 – José Paulo Paes conta como foi escolhido seu nome: a partir dos nomes do avô paterno, José, e do pai, Paulo, como era costume nas famílias portuguesas. E o seu nome, como foi escolhido? Se não souber, converse com seus pais e familiares sobre isso e anote suas observações. Traga-as para a classe e comente-as com seus colegas.

      Resposta pessoal do aluno.

07 – Forma dupla com um colega para responder às questões:

a)   Na sua opinião, o leitor desse texto fica conhecendo alguns aspectos da época em que o autor viveu? Por quê?

Sim, em geral, ao ler o relato da vida de uma pessoa, o leitor entra também em contato com a cultura da época em que essa pessoa viveu.

b)   Que semelhanças e diferenças há entre os costumes descritos no texto e os que existem em sua região hoje em dia, no que se refere a relações familiares, atividades ou profissões dos adultos e atividades e brincadeiras das crianças?

Resposta pessoal do aluno.

08 – Ao longo do texto, o autor vai caracterizando os familiares com os quais conviveu na infância: o pai, a mãe, o avô, a avó, a tia Aglai, o primo Quinzinho. Descreva oralmente cada um deles. Na sua opinião, qual o mais interessante? Por quê?

      Resposta pessoal do aluno.

09 – Releia um trecho em que o autor fala sobre sua mãe: “Era uma leitora voraz dos romances água-com-açúcar da coleção das Moças e dos folhetins de capa e espada assinados pela minha avó [...]”.

a)   Qual o significado das expressões destacadas no trecho acima?

A expressão água-com-açúcar significa “romântico, piegas, ingênuo”; “romances água-com-açúcar” são histórias de amor ingênuas e adocicadas. Folhetins de capa e espada eram os fragmentos de romances de aventuras cavalheirescas publicadas nos jornais, dia a dia ou semanalmente.

b)   Perguntes a algumas pessoas idosas de sua família ou conhecidas que livros elas costumavam ler no passado. Elas conhecem as leituras mencionadas no texto? Anote no caderno as informações recolhidas e comente-as com os colegas.

Resposta pessoal do aluno.

10 – A avó do autor gostava muito de ler e era grande contadora de histórias. Converse com seus colegas: alguém contava ou ainda conta histórias para você? Você gosta dessa atividade? Que lembranças você tem de sua infância em relação a ouvir histórias?

      Resposta pessoal do aluno.

      

ORTOGRAFIA - MAL E MAU - ATIVIDADES COM GABARITO

 ORTOGRAFIA - MAL E MAU


Você sabe quando devemos escrever mal ou mau?

Existe uma forma simples de sabermos: mal é o contrário de bem, enquanto mau é o contrário de bom.

As palavras mau e bom estão ligadas a substantivos, caracterizando-os. São adjetivos.

Já as palavras mal e bem estão ligadas a verbos, acrescentando-lhes circunstâncias de modo. São advérbios.

As palavras mal e bem também podem funcionar como substantivos.

Exemplo: O bem vence o mal.

VAMOS PRATICAR

1.   Aproveitando o que você aprendeu, empregue mal ou mau nas frases que seguem. Indique se você usou substantivo, adjetivo ou advérbio.

a)   Ele estava passando muito  _____ quando o encontrei.

Mal – advérbio

b)   Eles ____haviam chegado, e já apareceram muitos problemas. Mal – advérbio

c)   Não sei se hoje o diretor está de ______ humor.

Mau – adjetivo.

d)   Aquela senhora, coitada, sofre de um _____ incurável.

Mal – substantivo.

e)   Não acho que ele seja um _______sujeito. Mau – adjetivo.

f)    Estava muito _____acomodada naquela poltrona.

Mal – advérbio.

g)   Ler um bom livro não é nada______. Mau-adjetivo.

h)   Você agiu muito _______ ontem! Mal – advérbio.

i)     No conto de fadas, a bruxa representa o ______.

Mal – substantivo.

j)     Não vejo nenhum ____ em sair mais cedo hoje.

Mal – substantivo.

 

Fonte: Livro: Português – Palavra Aberta – Isabel Cabral - 5ª série –São Paulo: Atual Editora.1995, p.161.


sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

CRÔNICA: QUEM MATOU ABEL? ALEXANDRE AZEVEDO - COM GABARITO

 CRÔNICA: QUEM MATOU ABEL?   

                        Alexandre Azevedo

         O inspetor escolar, para verificar o conhecimento geral dos alunos, entra na sala de aula. Interrompe a professora de Ensino Religioso e pergunta:

          -- Alguém sabe me dizer quem matou Abel?

          A sala permanece em silêncio. Ninguém se atreve a responder. O inspetor insiste na pergunta, agora dirigindo-se a um aluno:

          -- Pedrinho, quem matou Abel?

          O Pedrinho, suando frio, responde:

          -- Juro pro senhor que eu não fui. Ando com esse canivete no bolso, mas é só pra apontar o lápis!

          O inspetor, surpreso com a resposta do aluno, dirige-se à professora:

          -- Dona Marlene, a senhora ouviu o que ele disse?

          -- Ouvi sim senhor, seu Percival, mas eu conheço o Pedrinho desde que nasceu. Se ele disse que não matou, é porque não matou! Esse guri aí não mente, pode ter certeza.

          Indignado, o inspetor sai da classe e se encaminha à diretoria:

          -- Dona Gertrudes, eu exijo uma explicação!

          A diretora, estranhando o procedimento do inspetor, pergunta:

          -- O que aconteceu, seu Percival?

          -- Eu fui à sala da professora Marlene e perguntei a um aluno quem é que tinha matado Abel. E sabe o que ele respondeu? Que não tinha sido ele. E o pior de tudo é que a professora concordou!

          A diretora coloca a mão no ombro do inspetor, tentando acalmá-lo:

          -- Olha, inspetor, eu não conheço muito bem o menino, mas, se a professora disse que não foi ele, o senhor pode ficar tranquilo. E, no mais, aquele menino é uma criança, ele não faria uma coisa dessas.

          Enfurecido, o inspetor vai à Secretaria de Educação. No gabinete do secretário, relata, tintim por tintim, toda a história:

          -- E foi isso que aconteceu. Dá pra acreditar?

          O secretário, abismado com o acontecido, não quis acreditar:

          -- O senhor tem certeza? É muito difícil acreditar que uma criança tenha cometido tal crime! Talvez fosse melhor entregar o caso à polícia. Tenho certeza de que o delegado tomará as providências necessárias.

           Desesperado, o inspetor invade a sala do governador. Ele, por sua vez, ouve toda a história. No final, tenta tranquilizá-lo:

           -- Pode ficar tranquilo, senhor Percival. Nós acharemos o verdadeiro culpado. A justiça falha, mas não tarda! Quero dizer, tarda, mas não falha! Pode ter certeza de que quem matou Abel será punido, eu prometo!

            O inspetor está agora totalmente transtornado:

            -- Pelo amor de Deus! Eu não posso acreditar no que estou ouvindo!

            Sem se preocupar com o local, ele grita:

            -- Caim e Abel eram filhos de Eva! O senhor nunca leu a Bíblia?!

            O governador, aliviado, dá uma bronca no inspetor:

             -- Ah! Está na Bíblia, é? Ora, então já devem ter arquivado o processo! Eu tenho mais o que fazer, passar bem!

                                        Alexandre Azevedo. O vendedor de queijos e outras crônicas. São Paulo: Atual, 1991.

                               Fonte: Livro – Português – 5ª série- Palavra Aberta- Isabel Cabral – São Paulo: Atual, 1995, p. 89, 90 e 91.


Entendendo o texto

1.   Vamos observar as personagens do texto.

a)   Quais são as personagens que participam da história?

O inspetor escolar, a professora, os alunos, a diretora, o secretário de Educação e o governador.

b)   Quem é a personagem mais importante? Por quê?

O inspetor de alunos. A história gira em torno dele.

c)   O narrador também é personagem?

Não.

2.   O inspetor escolar queria verificar o conhecimento geral dos alunos e ficou surpreso ao perceber que eles não conheciam a história de Caim e Abel.

a)   De acordo com o texto, o que significa não conhecer essa história bíblica?

Significa que o conhecimento geral dos alunos era péssimo.

b)   Apenas os alunos não tinham bom conhecimento geral? Quem mais confundiu a morte de Abel com um crime comum?

Não. A professora, a diretora, o secretário de Educação e o governador.

c)   Podemos afirmar que, utilizando o humor, o autor critica todos os que participam do funcionamento das escolas? Retire dois trechos do texto que comprovem a sua resposta.

Sim, pois ocorre o contrário do esperado: que as pessoas que se relacionam às escolas tenham um bom conhecimento geral. “[...] se a professora disse que não foi ele, o senhor pode ficar tranquilo” / “É muito difícil acreditar que uma criança tenha cometido tal crime!”.

3.   Todos os conhecimentos que temos são aprendidos na escola? Por quê?

              Resposta pessoal do aluno.

 

       

CRÔNICA: QUANDO A ESCOLA É DE VIDRO - ADAPTADO DE: RUTH ROCHA - COM GABARITO

 CRÔNICA: QUANDO A ESCOLA É DE VIDRO

                                        Adaptado de Ruth Rocha


       Naquele tempo eu até que achava natural que as coisas fossem daquele jeito. Eu ia pra escola todos os dias de manhã e quando chegava, logo, logo, eu tinha que me meter no vidro.

      É, no vidro! Cada menino ou menina tinha um vidro. O tamanho dependia da classe em que a gente estudava. Se você estava no primeiro ano ganhava um vidro de um tamanho. Se estava no segundo, o vidro era um pouquinho maior. E assim por diante.

       A gente só podia tirar o vidro na hora do recreio ou na aula de educação física. Mas aí a gente já estava desesperado de tanto ficar preso, e começava a correr, a gritar, a bater uns nos outros.

        Se a gente reclamava? Alguns reclamavam. E então os grandes diziam que sempre tinha sido assim; ia ser assim o resto da vida. Uma vez um colega meu disse que existiam lugares onde as escolas não usavam vidro nenhum. Então a professora respondeu que era mentira, que isso era conversa de comunistas. Ou até coisa pior...

         Mas, um dia veio para a minha escola um menino, o Firuli, que parece que era favelado, carente, essas coisas. Aí não tinha vidro pra botar esse menino. Então os professores acharam que não fazia mal, não, já que ele não pagava a escola mesmo...

         Então o Firuli começou a assistir às aulas sem estar dentro do vidro. Ele desenhava melhor, respondia perguntas mais depressa e era muito mais engraçado. Os professores não gostavam nada disso... Nós morríamos de inveja dele, que ficava no bem-bom, de perna esticada.

          Então um dia um menino da minha classe falou que também não ia entrar no vidro. Dona Demência ficou furiosa, deu um coque nele e ele acabou tendo que se meter no vidro. Já no outro dia a coisa tinha engrossado. Oito meninos não queriam saber de entrar nos vidros.

          Dona Demência mandou chamar seu Hermenegildo, o diretor da escola. Ele começou a pegar os meninos e enfiar à força dentro dos vidros. Para cada um que ele enfiava dentro do vidro – já tinha dois fora. Todo mundo começou a correr dele e na correria começamos a quebrar os vidros. E quebramos um, depois outro e outro.

          Os professores das outras classes mandaram ver o que estava acontecendo. Ao saber da farra que estava na 6ª série todo mundo ficou assanhado e começou a sair dos vidros. Na pressa começaram a esbarrar uns nos outros e os vidros começaram a cair e a quebrar.

          Foi um custo botar ordem na escola e o diretor achou melhor mandar todo mundo pra casa. Então eles descobriram que a maior parte dos vidros estava quebrada e que ia ficar muito caro comprar aquela vidraria toda de novo.

          Diante disso seu Hermenegildo pensou um bocadinho, e começou a contar pra todo mundo que em outros lugares tinha umas escolas que não usavam vidro nem nada, e que dava bem certo, as crianças gostavam muito mais. E que de agora em diante ia ser assim: nada de vidro. E que a escola agora ia se chamar Escola Experimental.

          Dona Demência ainda disse timidamente:

          - Mas seu Hermenegildo, Escola Experimental não é bem isso...

         Seu Hermenegildo não se perturbou:

         - Não tem importância. A gente começa experimentando isso. Depois a gente experimenta outras coisas...

         E foi assim que na minha terra começaram a aparecer as Escolas Experimentais.

               Adaptado de: Ruth Rocha. Admirável mundo louco; uns pelos outros; quando a escola é de vidro. Rio de Janeiro: Salamandra, 1986.

Fonte: Livro – Português – 5ª série – Palavra Aberta- Isabel Cabral – Atual Editora- São Paulo, 1995 – p.86-89.

Fonte da imagem acima:https://www.google.com/url?sa=i&url=https%3A%2F%2Fwww.slideshare.net%2Fmaristelamafort%2Fescola-de-vidro1%2F2&psig=AOvVaw3D7K8M2JFcC4lF2TZwiZMF&ust=1610819442504000&source=images&cd=vfe&ved=0CAIQjRxqFwoTCNDnsKHAnu4CFQAAAAAdAAAAABAD


Entendendo o texto

        1.   Vamos dividir essa história em três grandes partes.

             A primeira parte mostra como funcionava a escola de vidro.

         A segunda parte mostra a chegada de um novo aluno e as suas diferenças em relação aos demais.

        A terceira parte mostra as consequências da chegada desse novo aluno.

       Agora, você vai identificar onde começa e onde termina cada parte.

      1º Do início até “coisa pior”;

      2º “Mas, um dia, veio [...]” até “perna esticada”;

      3º “Então um dia” até o final.

         2.   Pense e responda:

a)   Onde se passa a história?

Nossa escola.

b)   Quem são as personagens da história?

Os alunos antigos; Firuli, o novo aluno; dona Demência e o diretor.

c)   O narrador também é personagem?

Sim.

3.   Com base no que conta o narrador-personagem, caracterize as seguintes personagens:

a)   Firuli

Menino pobre, com habilidades mais desenvolvidas devido à liberdade que tinha.

b)   Dona Demência

Professora rígida, tradicional.

4.   Imagine-se dentro de um vidro.

a)   Você pode se mexer livremente?

Possivelmente não.

b)   Você pode falar com outras pessoas?

Resposta pessoal.

c)   Como você se sente dentro do vidro?

Resposta pessoal.

5.   Todos nós sabemos que é impossível assistir às aulas dentro de um vidro de verdade.

       a)   Então, o que significa, no texto, os alunos permanecerem “dentro de um vidro”?

Falta de liberdade.

 

       b)   Como seria uma “escola de vidro”? Descreva-a com suas palavras.

  Uma escola sem participação dos alunos, alunos passivos.

 6.   No recreio e na aula de Educação Física, sem os vidros, os alunos corriam, gritavam e se batiam. Por quê?

              Porque não estavam acostumados a ter liberdade.

              7.   Alguns alunos começaram a se recusar a entrar nos vidros.

      a)   O que causou esse fato?

      Firuli não ter de ficar dentro do vidro.

     b)   Qual foi a consequência da recusa dos alunos em entrar nos vidros?

     Uma confusão, na qual os vidros foram quebrados.

 

 

 

quinta-feira, 14 de janeiro de 2021

POEMA: NOME DA GENTE - PEDRO BANDEIRA - COM GABARITO

 POEMA:  Nome da gente


            
        Pedro Bandeira

 

Por que é que eu me chamo isso

e não me chamo aquilo?
Por que é que o jacaré

não se chama crocodilo?



Eu não gosto

do meu nome 
Não fui eu

quem escolheu. 
Eu não sei

por que se metem 
com um nome

que é só meu!


O nenê

que vai nascer 
vai chamar

como o padrinho,

vai chamar

como o vovô, 
mas ninguém

vai perguntar
o que pensa

o coitadinho.


Foi meu pai quem decidiu 
que meu nome fosse aquele. 
Isto só seria justo 
se eu escolhesse

o nome dele.


Quando eu tiver um filho, 
não vou pôr nome nenhum. 
Quando ele for bem grande, 
ele que procure um!

 Pedro Bandeira. Cavalgando o arco-íris. São Paulo: Moderna, 1984.

Livro: Português – 5ª série – Palavra Aberta – Isabel Cabral – Atual Editora – p.47.


ATIVIDADE ESCRITA

Pense e responda:
1) Quem escolheu seu nome?

    Resposta pessoal.

2) Se você não se chamasse ________ que nome gostaria de ter?     

    Resposta pessoal.

3) Qual o assunto principal do poema?

    O poema fala sobre o nome das pessoas.

4) Quem escolheu o nome da pessoa do poema?

     Foi o pai que escolheu o nome.

5) O que o menino diz sobre o seu nome?

     Que não gosta de seu nome, porque não foi ele que escolheu.

6) O que ele vai fazer quando tiver um filho?

     Não vou por nome nenhum.