Texto: Sem
gravidade
Marcos Pontes
Viver em órbita. Sem gravidade. Coisas
interessantes. Coisas bonitas. Coisas estranhas. O corpo também acha. É
necessário adaptação. O nosso organismo, desenvolvido por milhares de anos no
ambiente da superfície do planeta e submetido à gravidade terrestre, reclama.
Enjoos são sintomas comuns durante a fase inicial, mas não são os únicos.
Desorientação espacial é também muito
frequente nos primeiros dias. Esses dois sintomas são ligados diretamente aos
efeitos do ambiente novo sobre o nosso sistema vestibular. O cérebro passa a
ter informações confusas entre os sensores, isto é, os olhos dizem uma coisa,
enquanto o sistema vestibular diz outra. Resultado? Grande chance de ver o
alimento pela segunda vez.
A circulação sanguínea também sofre
impactos do ambiente. Nosso sistema circulatório naturalmente compensa os
efeitos da aceleração vertical constante da gravidade sobre o movimento do
nosso sangue pelo corpo. E no espaço? Aí não tem mais gravidade. Mas o corpo
ainda “não sabe” disso nos primeiros dias. Assim, continua a pensar que é mais
difícil levar o sangue à cabeça do que aos pés. Provavelmente, durante a
primeira transmissão de TV, ao vivo, diretamente da FEI/ISS, você vai pensar
que eu engordei uns 20 quilos. Rosto inchado e vermelho. Características
normais, além das dores de cabeça, desse estágio de adaptação do corpo para
controlar a distribuição do sangue sem gravidade.
Também vou crescer cerca de uma
polegada durante o tempo em órbita. Ocorre uma distensão da coluna vertebral
devido à falta da força vertical causada pela gravidade. Cuidado é necessário.
Ajustar o comprimento do macacão para o regresso também. Depois do pouso
voltamos ao normal, espero.
A questão de perda de densidade óssea
também é fato, mais é mais pronunciada, logicamente, para os voos de grande
duração. Espero não ficar com osteoporose depois do voo.
Radiação é problema sério. A falta da
proteção da nossa atmosfera nos expõe a um ambiente com níveis bem mais altos
de radiação. Carregamos conosco, o tempo todo no espaço, um medidor de dosagem
de radiação. Sem qualquer função de proteção, serve apenas para controle após
voo.
Também perdemos tônus muscular. Por
essa razão, precisamos de exercícios diários em órbita. Não resolve totalmente,
mas ajuda na recuperação pós-voo.
Existem outros efeitos, mais talvez
seja bom parar por aqui com essa propaganda negativa. Afinal, queremos mais
brasileiros no espaço em breve. Eu estarei lutando por isso, e não quero perder
candidatos!
Vamos falar das coisas da órbita. Vamos
olhar pela janela. Ver o mundo passar rapidamente sob nossos pés. Ver esse
nosso Brasil por inteiro, tão rico e cobiçado. Nossa terra, nossa gente, nossa
responsabilidade. Ver o nascer e o pôr do sol a cada 90 minutos, iluminando e
fazendo brilhar uma espécie de “aura” ao redor desse nosso maravilhoso planeta
azul.
Vamos olhar para as estrelas, e ver o
quanto somos pequenos nesse universo. E quanto é importante entender que somos
parte de uma coisa tão grandiosa. Ser feliz por isso. Sentir a calma de saber
que não controlamos o universo, mas que recebemos dele a força para vivermos,
felizes.
Dentro da Estação, um pequeno “mundo”
de tecnologia e ciência, com uma grande responsabilidade: é possível
construirmos juntos algo bom para todos, independentemente de cultura, raça,
língua, religião ou qualquer outra desculpa para discórdia.
O dia-a-dia a bordo se divide em
atividade do cotidiano, como dormir, escovar os dentes, fazer barba, ir ao
banheiro, fazer as refeições, tomar banho (com toalhas molhadas), etc., e
tarefas profissionais, cuidar da manutenção dos sistemas dos veículos e
realizar os experimentos brasileiros.
Tudo é sincronizado por dois
documentos: o plano de voo e o formulário 24. Eles descrevem com detalhes o que
devemos fazer a cada minuto a bordo.
Nossos experimentos estão localizados
no compartimento de acoplamento do segmento russo. Aqui é onde passa a maior parte
do meu dia. Entre equipamentos, fios, procedimentos, outros papéis, e a
bandeira do Brasil estendida na parede. Tudo precisa ser feito corretamente.
Cada segundo é precioso.
A vida é dura por aqui. Mas vale a
pena. Não dá vontade de dormir. Parece tempo perdido. Mas os médicos insistem.
É necessário. Entro no meu “saco de dormir”. De tempos em tempos olho pela
janela. Penso em muitas pessoas, situações, sorrisos, emoções, lembranças boas.
A cor do planeta me lembra os olhos de minha mãe. Ela deve estar feliz.
Saudades e um sorriso de satisfação. “Obrigado!” ... Boa noite!
Marcos Pontes. Sem
gravidade. Extraído do site:
Entendendo o texto:
01 – Em sua opinião, como
podemos classificar esse texto: narrativo ou relato?
Pode ser
considerado um relato.
02 – Você se recorda de
algum outro texto semelhante a este quanto à forma e ao assunto abordado? Qual?
Resposta pessoal do aluno.
03 – Em sua opinião, de que
forma a leitura desse texto pode influenciar o leitor?
Resposta pessoal
do aluno.
04 – O recurso empregado
pelo produtor do texto, ao criar o título, amplia os seus sentidos e convida o
leitor a participar da leitura.
a)
Que sentidos podem ser atribuídos ao título
desse texto?
Pode ser interpretado como a falta de ação da lei de gravidade do
espaço, ou pode fazer referência a doenças não graves, pois o autor relata
alguns dos efeitos negativos no corpo dos astronautas que a falta de gravidade
traz.
b)
Qual é a relação entre o título e o assunto
abordado?
A relação consiste no fato de que o título remete à falta de
gravidade existente no espaço, cenário dos fatos apresentados no texto.
05 – O texto lido apresenta
características que são próprias da estrutura desse gênero textual.
a)
Qual é o tema abordado nesse texto?
O relato de um dia na vida do astronauta Marcos Pontes quando estava
em órbita.
b)
Com que finalidade esse texto foi publicado?
A fim de divulgar como é o cotidiano em uma nave espacial em órbita
e como foi a “Missão Centenário”.
c)
Em um diário de viagem, o registro empregado
pode ser formal ou informal, dependendo da intenção do seu autor. Explique o
emprego do registro nesse gênero.
O registro utilizado está relacionado à situação comunicativa e ao
grau de intimidade entre quem escreve e seu destinatário. No texto de Marcos
Pontes, por exemplo, o registro é mais formal, pois os leitores do texto não
são, necessariamente, próximos ao autor.
06 - Que tipo de texto predominou nesse diário de
viagem: o relato, a descrição ou a argumentação? Explique.
A descrição. Pois
ele está relatando de forma detalhada sua rotina de trabalho.
07 – Marcos Pontes, nos sete
primeiros parágrafos, apresenta alguns aspectos de como é a vida em órbita. Ele
destaca essas informações como negativas.
a)
Quais reações estar em órbita causa ao ser
humano? Por que elas ocorrem?
Causa enjoos, desorientação, aceleração da circulação sanguínea,
distensão da coluna vertebral, perda de densidade óssea, exposição à radiação,
perda de tônus muscular, entre outros. Essas reações ocorrem em razão da
ausência de gravidade e devido ao fato de ser um ambiente novo.
b)
Qual dessas informações você desconhecia e
qual mais chamou sua atenção?
Resposta pessoal do aluno.
08 – Após relatar as
situações incômodas que a falta de gravidade causa no corpo humano, o
astronauta expõe os pontos positivos. Quais pontos ele destaca?
Ver todo o planeta Terra, o nascer e o
pôr do sol a cada 90 minutos, olhar as estrelas, etc.
09 – Releia o seguinte
trecho: “A vida é dura por aqui. Mas vale a pena. Não dá vontade de dormir.
Parece tempo perdido.”. Por que Marcos Pontes considera dormir uma perda de
tempo?
Porque ele estava
em um ambiente completamente novo e diferente, para onde não é possível ir
quando se quer e porque trata-se de um lugar onde há muitas coisas para ver,
admirar e descobrir.
10 – No final do texto, o
astronauta agradece e se despede. Com base nessa informação, a quem ele parece
destinar seu diário de viagem? Explique.
Por ser divulgado na internet, o texto
pode atingir desde estudiosos da área até o público em geral.
11 – Marcos Pontes recomenda
que dentro da Estação é necessário ter consciência de que um precisa ajudar o
outro, independentemente das diferenças entre as pessoas.
a)
Que tipos de diferenças podem existir entre
os seres humanos?
Culturais, étnicas, linguísticas, religiosas, entre outras.
b)
Em sua opinião, por que essas diferenças
podem causar conflitos?
Porque muitas pessoas não respeitam as diferenças e acabam criando
conflitos desnecessários.
12 – Releia o seguinte
trecho: “Vamos olhar para as estrelas, e
ver o quanto somos pequenos nesse universo. E quanto é importante entender que
somos parte de uma coisa tão grandiosa. Ser feliz por isso. Sentir a calma de
saber que não controlamos o universo, mas que recebemos dele a força para
vivermos, felizes.”
a)
Apesar de ser tão pequeno em relação ao
universo, o ser humano busca tentar controla-lo. Para você, por que isso ocorre?
Resposta pessoal do aluno.
b)
Em sua opinião, essa tentativa pode ser
considerada positiva ou negativa? Explique.
Resposta pessoal do aluno.
13 – No trecho: “[...] Sem gravidade. Coisas interessantes.
Coisas bonitas. Coisas estranhas.”. As frases curtas foram empregadas na
construção do texto com determinada intenção pelo autor.
a)
O que teria pretendido o autor ao construir
uma sequência de frases curtas?
Evidenciar cada uma das adjetivações dos elementos percebidos no
espaço.
b)
Que efeito causa no texto a construção de
frases curtas?
Causa um efeito de pausa constante, de câmera lenta e ações
vagarosas.
c)
Essa forma de pontuar as frases é mais uma
questão gramatical ou de estilo do autor?
É um estilo do autor.
14 – No 2° parágrafo, o
autor fez uso de um eufemismo,
figura de linguagem que consiste em amenizar, suavizar uma informação
desagradável ou grosseira. Identifique essa expressão e explique que termo ela
substitui.
“Grande chance de ver o alimento pela
segunda vez”. Essa expressão substitui a palavra vômito.
15 – Na frase: “Enjoos são
sintomas comuns durante a fase inicial, mas não são os únicos”. Ocorre uma zeugma, omissão, em uma oração
subsequente, de um termo expresso na oração anterior.
a)
Que termo é omitido?
Sintomas.
b)
Reescreva a frase inserindo esse termo.
Enjoos são sintomas comuns durante a fase inicial, mas não são os
únicos sintomas.
c)
Indique em qual das formas a leitura é mais
dinâmica e explique por que isso ocorre.
A omissão do termo torna a leitura mais dinâmica, pois evita a
repetição de uma palavra que não é essencial para a compreensão textual.