Crônica: UM PÉ
DE MILHO
Rubem Braga
Os americanos, através do radar,
entraram em contato com a Lua, o que não deixa de ser emocionante. Mas o fato
mais importante da semana aconteceu com o meu pé de milho.
Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEirmSJdOpPf8maZvGoH3oYGTDOTK4FUJNNopg63TsLph7Zr_Ppgm5erRgNf-eEOm2XNtH03ayJu_pfxphJuGV412iQ7aV_UcDcoyNIE8mpQTiOkUnqHfgclSFacAFEc2XXToAp_jADY0DpE2o1JfqfCnQX_4HXuGxBDBBV68FswP5KgUvcr-i-2yVRoN5A/s1600/MILHO.jpg
Aconteceu que no meu quintal, em um
monte de terra trazido pelo jardineiro, nasceu alguma coisa que podia ser um pé
de capim — mas descobri que era um pé de milho. Transplantei-o para o exíguo
canteiro na frente da casa. Secaram as pequenas folhas, pensei que fosse
morrer. Mas ele reagiu. Quando estava do tamanho de um palmo veio um amigo e
declarou desdenhosamente que na verdade aquilo era capim. Quando estava com
dois palmos veio outro amigo e afirmou que era cana.
Sou um ignorante, um pobre homem de
cidade. Mas eu tinha razão. Ele cresceu, está com dois metros, lança as suas
folhas além do muro — e é um esplêndido pé de milho. Já viu o leitor um pé de
milho? Eu nunca tinha visto. Tinha visto centenas de milharais — mas é
diferente.
Um pé de milho sozinho, em um canteiro,
espremido, junto do portão, numa esquina de rua — não é um número numa lavoura,
é um ser vivo e independente. Suas raízes roxas se agarram no chão e suas
folhas longas e verdes nunca estão imóveis. Detesto comparações surrealistas —
mas na glória de seu crescimento, tal como o vi em uma noite de luar, o pé de
milho parecia um cavalo empinado, as crinas ao vento — e em outra madrugada
parecia um galo cantando.
Anteontem aconteceu o que era
inevitável, mas que nos encantou como se fosse inesperado: meu pé de milho
pendoou. Há muitas flores belas no mundo, e a flor de milho não será a mais
linda. Mas aquele pendão firme, vertical, beijado pelo vento do mar, veio
enriquecer nosso canteirinho vulgar com uma força e uma alegria que fazem bem.
É alguma coisa de vivo que se afirma com ímpeto e certeza. Meu pé de milho é um
belo gesto da terra. E eu não sou mais um medíocre homem que vive atrás de uma
chata máquina de escrever: sou um rico lavrador da Rua Júlio de Castilhos.
Crônica extraída da
obra 200 crônicas escolhidas. Rio de Janeiro: Record, 2014.
Entendendo a crônica:
01 – “Detesto comparações
surrealistas – mas na glória de seu crescimento, tal como o vi em uma noite de
luar, o pé de milho parecia um cavalo empinado, as crinas ao vento – e em outra
madrugada parecia um galo cantando”. Sobre esse fragmento, é correto afirmar:
a)
O enunciador evidencia uma
contradição gerada pela sua percepção que transcende a realidade.
b)
A linguagem utilizada pelo cronista
caracteriza-se pelo uso predominante de termos no sentido denotativo.
c)
O termo “na glória do seu crescimento” expressa
uma ideia de modo.
d)
Os elementos linguísticos “mas” e “e” agrupam
dois enunciados, estabelecendo entre eles uma relação de oposição.
e)
O elemento linguístico “tal” constitui um
marcador textual que retoma “comparações”.
02 – Assinale a opção errada
quanto ao emprego dos verbos:
a)
Se reescrevêssemos o segundo período
do último parágrafo no imperfeito, ele assim ficaria: “Havia muitas flores
belas no mundo, e a flor de milho não seria a mais linda”.
b)
O cronista, com habilidade, mescla algumas
vezes o presente com o imperfeito, como se observa nos dois períodos iniciais
do terceiro parágrafo.
c)
No geral, o autor escreve no presente sobre
fatos acontecido em passado recente.
d)
O verbo “trazer”, no segundo parágrafo, está
empregado numa construção em que a voz é passiva.
e)
Passa para voz passiva, a frase “Já viu o
leitor um pé de milho?” ficaria assim: “Um pé de milho já foi visto pelo
leitor?”.
03 – O motivo que levou o autor
a escrever a crônica foi:
a)
os americanos terem estabelecido comunicação
com a lua.
b)
ter nascido um pé de milho em seu canteiro.
c)
o pé de milho de seu canteiro ter
pendoado.
d)
o pé de milho de seu canteiro ter conseguido
sobreviver ao transplante.
e)
ter sido confirmada a sua opinião de que o que
nascia era um pé de milho.
04 – A expressão sublinhada
em: “Os americanos, através do radar, ...”, indica:
a)
lugar.
b)
instrumento.
c)
meio.
d)
causa.
e)
Condição.
05 – “...nasceu alguma coisa
que podia ser um pé de capim...”, “...e declarou desdenhosamente que aquilo era
capim.”; os dois elementos sublinhados no texto indicam, respectivamente:
a)
desprezo / desconhecimento;
b)
desconhecimento / desprezo;
c)
desconhecimento / desconhecimento;
d)
desprezo / desprezo;
e)
afetividade / menosprezo.
06 – A substituição correta do
termo sublinhado por um sinônimo está em:
a)
“Transplantei-o para o exíguo canteiro...” =
raso;
b)
“...e declarou desdenhosamente que
aquilo era capim” = depreciativamente;
c)
“...veio enriquecer o nosso canteirinho
vulgar...” = popular;
d)
“Anteontem aconteceu o que era inevitável...” =
imprevisível;
e)
“...que se afirma com ímpeto e certeza” =
velocidade.
07 – Nos excertos há um
sintagma substantivo + adjetivo. Assinale a alternativa em que a troca da
posição entre esses vocábulos traz mudança de sentido.
a)
“Transplantei-o para o exíguo canteiro da
casa”.
b)
“Secaram as pequenas folhas”.
c)
“...em um canteiro espremido...”.
d)
“...e é um esplêndido pé de milho”.
e)
“Sou um ignorante, um pobre homem da
cidade.”
08 – Assinale o item que
contém um vocábulo que não pertence ao mesmo campo semântico das demais.
a)
quintal/ jardineiro/ capim.
b)
folhas/canas/milharais.
c)
lavoura/ raízes/chão.
d)
flores/pendão/terra.
e)
lavrador/ pé de milho/cavalo.
09 – O fato de comparar o pé
de milho a um cavalo empinado e a um galo cantando destaca uma característica
do pé de milho, que é o(a):
a)
altivez;
b)
solidão;
c)
mediocridade;
d)
colorido;
e)
beleza.
10 – O item em que o adjetivo
tem valor objetivo e não representa uma opinião do cronista é:
a)
“...esplêndido pé de milho...”;
b)
“...um pobre homem da cidade...”;
c)
“Um pé de milho sozinho...”;
d)
“...muitas flores lindas no mundo...”;
e)
“...nosso canteirinho vulgar...”.
11 – O cronista compõe
inicialmente sua crônica em primeira pessoa do singular, mas no quinto
parágrafo muda para a primeira pessoa do plural: “... mas que nos encantou...”,
“...veio enriquecer nosso canteirinho vulgar...”; isto significa que:
a)
o cronista enganou-se na estruturação do texto;
b)
a crônica passou a considerar também o leitor
como participante;
c)
outras pessoas devem viver com o
cronista;
d)
o canteiro devia pertencer ao condomínio;
e)
o cronista ampliou as apreciações para todo o
gênero humano.
12 – “Já viu o leitor um pé de
milho?” Transpondo-se essa oração para a ordem direta, obtém-se:
a)
Um pé de milho já foi visto pelo leitor?
b)
Um pé de milho o leitor já viu?
c)
Já viu um pé de milho, leitor?
d)
O leitor um pé de milho já viu?
e)
O leitor já viu um pé de milho?