OS SERTÕES - FRAGMENTOS
Euclides da Cunha
Texto I
Então, a travessia das veredas
sertanejas é mais exaustiva que a de uma estepe nua.
Nesta, ao menos, o viajante tem o
desafogo de um horizonte largo e a perspectiva das planuras francas.
Ao passo que a caatinga o afoga;
abrevia-lhe o olhar; agride-o e estonteia-o; enlaça-o na trama espinescente e
não o atrai; repulsa-o com as folhas urticantes, com o espinho, com os gravetos
estalados em lanças; e desdobra-se-lhe na frente léguas e léguas, imutável no
aspecto desolado: árvores sem folhas, de galhos estorcidos e secos, revoltos,
entrecruzados, apontando rijamente no espaço ou estirando-se flexuosos pelo
solo, lembrando um bracejar imenso, de tortura, da flora agonizante . . .
Texto II
O sertanejo é, antes de tudo, um forte.
Não tem o raquitismo exaustivo dos mestiços neurastênicos do litoral. A sua
aparência, entretanto, ao primeiro lance de vista, revela o contrário.
Falta-lhe a plástica impecável, o desempeno, a estrutura corretíssima das
organizações atléticas.
[...]
Este contraste impõe-se ao mais leve
exame. Revela-se a todo o momento, em todos os pormenores da vida sertaneja --
caracterizado sempre pela intercadência impressionadora entre extremos impulsos
e apatias longas.
Texto III
Decididamente era indispensável que a
campanha de canudos tivesse objetivo superior à função estúpida e bem pouco
gloriosa de destruir um povoado dos sertões. Havia um inimigo mais sério a
combater, em guerra mais demorada e digna. Toda aquela campanha seria um crime
inútil e bárbaro, se não se aproveitassem os caminhos abertos à artilharia para
uma propaganda tenaz, continua e persistente, visando trazer para o nosso tempo
e incorporar à nossa existência aqueles rudes compatriotas retardatários. [...]
Canudos não se rendeu.
Fechemos este livro.
Canudos não se rendeu. Exemplo único em
toda a história, resistiu até ao esgotamento completo. Expugnado palmo a palmo,
na precisão integral do termo, caiu no dia 5, ao entardecer, quando caíram os
seus últimos defensores, que todos morreram. Eram quatro apenas: um velho, dois
homens feitos e uma criança, na frente dos quais rugiam raivosamente 5 mil
soldados.
Fragmentos da obra Os Sertões de Euclides da
Cunha, São Paulo: Círculo do Livro, 1975.
01 – De acordo o texto I,
como é a natureza no lugar onde vive o sertanejo? Ela se mostra acolhedora ao
homem?
A natureza NÃO mostra acolhedora.
Ao passo que a caatinga o afoga;
abrevia-lhe o olhar; agride-o e estonteia-o; enlaça-o na trama espinescente e
não o atrai; repulsa-o com as folhas urticantes, com o espinho, com os gravetos
estalados em lanças; e desdobra-se-lhe na frente léguas e léguas, imutável no
aspecto desolado: árvores sem folhas, de galhos estorcidos e secos, revoltos,
entrecruzados, apontando rijamente no espaço ou estirando-se flexuosos pelo
solo, lembrando um bracejar imenso, de tortura, da flora agonizante . . .
02 – O texto II, ao
descrever o sertanejo, apresenta como contraditória certos aspectos de sua
constituição física e seu comportamento. Comente essa contradição.
O sertanejo embora seja magro e franzino,
ao mesmo tempo se torna um homem forte e trabalhador.
03 – No 1º parágrafo do
texto III, o autor crítica a guerra em si e afirma que outra “guerra mais
demorada e digna” deveria ser travada. Qual é essa guerra?
A guerra de
combate à seca da região nordeste.
04 – Identifique no texto II
um trecho que comprove a influência de teorias raciais existente no começo do
século XX.
Falta-lhe a
plástica impecável, o desempeno, a estrutura corretíssima das organizações
atléticas.