Crônica: Meu Amigo Marcos
Walcyr Carrasco
Conheci MARCOS REY há mais de vinte anos, quando sonhava-me tornar
escritor. Certa vez confessei esse desejo à atriz Célia Helena, que deixou sua
marca no teatro paulista. Tempos depois, ela me convidou para tentar adaptar um
livro para teatro. Era “O Rapto do Garoto de Ouro”, de Marcos. Passei noites me
torturando sobre as teclas. Célia marcou um encontro entre mim e ele, pois a
montagem dependia da aprovação do autor.
Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh60_pAQHZelqEP5hjcmBOxq7_EeMOj3Ixno1FltdyVOLiqcbfiLiLkqbJkthuv5qvRY9po9WmzX3hApZcM5XD5EhKqPiJFvPm1v6DjrXEagB4uBcZr74_YmW6llXVN2b5GbV6j0L_jl2sui9TjgV0lQmc5G87lolDUblgOt2FpyAQRd9fN53ig9gerZX0/s320/O%20RAPTO.jpg
Quando adolescente, eu ficara
fascinado com Memórias de um Gigolô, seu livro mais conhecido. Nunca tinha
visto um escritor de perto. Imaginava uma figura pomposa, em cima de um
pedestal. Meu coração quase saiu pela boca quando apertei a campainha. Fui
recebido por Palma, sua mulher. Um homem gordinho e simpático entrou na sala.
Na época já sofria de uma doença que lhe dificultava o movimento das mãos e dos
pés. Cumprimentou-me. Sorriu. Estava tão nervoso que nem consegui dizer
"boa tarde". Gaguejei. Mas ele me tratou com o respeito que se dedica
a um colega. Propôs mudanças no texto. Orientou-me. Principalmente, acreditou
em mim. A peça permaneceu em cartaz por dois anos. Muito do que sou hoje devo
ao carinho com que me recebeu naquele dia.
Continuei
a vê-lo esporadicamente. Era alegre, divertido. Todo sábado, de manhã, ia tomar
cerveja e uísque com outros escritores na Livraria Cultura, no Conjunto
Nacional. As vezes nos telefonávamos para falar da vida. Escritores costumam
ser competitivos e ciumentos. Buscam defeitos nas obras alheias, como mulheres
vaidosas, comparando vestidos umas das outras. Marcos, não. Conheci muitos
autores beneficiados por suas opiniões. Era generoso. Quando deu uma entrevista
no programa do Jô Soares, a escritora Fanny Abramovich lhe telefonou. Elogiou
seu suéter, de uma bonita cor cinza. Marcos mandou-o de presente para ela.
Sempre
me senti orgulhoso por ser seu companheiro aqui na última página de Veja São
Paulo. Quando começamos as crônicas, fui visitá-lo. Ele acabara de comprar um
apartamento em Perdizes. Seus livros ficarão na história da literatura. Mas,
até poucos anos atrás, lutava com o aluguel. Não costumávamos nos telefonar em
aniversários ou datas especiais. Mas, em janeiro último, ligou para desejar
feliz ano novo. Chamou-me de colega. Emocionei-me:
—
Tomara que você também tenha um ano maravilhoso.
Como
é a vida, não?
Palma me contou que tudo aconteceu muito
depressa. Hospitalização, operação. Os médicos foram francos. Ela o visitou na
UTI.
—
Marcos, não fique sofrendo. Pode partir em paz, meu amor.
Estava
adormecido, mas ela tem uma certeza íntima de que ele entendeu. Depois de 39
anos juntos, Palma tem o direito de ter certezas. Quando alguém nos deixa, até
as pessoas mais céticas sentem o desejo de acreditar no desconhecido.
Pessoalmente, nunca tive dúvida de que existe algo mais, em algum lugar. Ainda
bem.
Marcos,
algum dia a gente se encontra por aí.
Entendendo a crônica:
01 – Qual é o título
do livro que Walcyr Carrasco adaptou para o teatro, escrito por Marcos Rey?
a)
Memórias de um Gigolô.
b) O Rapto do Garoto de Ouro.
c)
Meu Amigo Marcos.
d)
A Última Página.
02 – Como o autor
descreveu Marcos Rey quando o conheceu pessoalmente?
a)
Como uma figura pomposa em um pedestal.
b) Como um homem gordinho e simpático.
c)
Como um escritor distante e arrogante.
d)
Como uma presença intimidadora.
03 – O que Marcos
Rey propôs ao autor após a leitura de sua adaptação para teatro?
a)
Que mudasse de editora.
b) Que fizesse mais alterações no texto.
c)
Que desistisse do projeto.
d)
Que o apresentasse a outros escritores.
04 – O que Marcos
Rey costumava fazer aos sábados de manhã com outros escritores?
a)
Ir ao teatro.
b)
Ir à praia.
c) Tomar cerveja e uísque na Livraria Cultura.
d)
Participar de competições de escrita.
05 – Qual era uma
característica marcante de Marcos Rey em relação aos outros escritores?
a)
Ele era competitivo e ciumento.
b)
Ele buscava constantemente defeitos nas obras
alheias.
c) Ele era generoso e não competitivo.
d)
Ele evitava conversar com outros escritores.
06 – O que Marcos
Rey enviou de presente para a escritora Fanny Abramovich após receber um elogio
dela?
a)
Uma cópia autografada de seu livro.
b)
Um suéter cinza.
c)
Um convite para um evento literário.
d)
Um exemplar de uma revista.
07 – Onde Marcos Rey
e Walcyr Carrasco eram companheiros na última página de Veja São Paulo?
a)
Na seção de cultura do jornal.
b)
Na coluna de opinião.
c)
Na seção de viagens.
d) Na seção de crônicas.
08 – Qual era a
situação financeira de Marcos Rey antes de sua consolidação como escritor
famoso?
a)
Ele era um autor bem-sucedido desde o início.
b) Ele tinha dificuldades com aluguel.
c)
Ele vivia em um apartamento luxuoso.
d)
Ele era um escritor de renome internacional.
09 – O que Palma,
esposa de Marcos Rey, disse a ele quando o visitou na UTI?
a) Que ele não deveria sofrer e poderia partir em paz.
b)
Que ele deveria lutar mais contra a doença.
c)
Que ela não queria mais viver com ele.
d)
Que eles precisavam viajar juntos.
10 – Qual foi a
última mensagem emocionante que Marcos Rey deixou para Walcyr Carrasco?
a)
"Espero que você tenha um ano
maravilhoso."
b)
"A vida é breve, colega."
c)
"Até logo, amigo."
d) "Nos encontraremos por aí."