quarta-feira, 14 de fevereiro de 2018

CRÔNICA: SESSÃO DE HIPNOTISMO - FERNANDO SABINO - COM GABARITO

CRÔNICA - SESSÃO DE HIPNOTISMO
               Fernando Sabino

     A dona da casa nos abriu a porta de mansinho, pediu silêncio com um dedo sobre os lábios e fez sinal que entrássemos. 
 Entramos, pé ante pé, já meio hipnotizados. Curvado sobre uma poltrona no canto mais escuro da sala, o hipnotizador tentava adormecer uma jovem. Ao fundo, cinco ou seis vítimas aguardavam a vez, uns muito sérios, outros contendo risos. Na poltrona a jovem nunca mais que dormia e, já meio chateada, olhava o relógio de pulso que o hipnotizador segurava no ar.
          “Você vai dormir… Suas pálpebras estão pesadas… Tudo vai desaparecendo” – insistia ele, com voz macia, mas acabou ordenando: “Feche os olhos.” A jovem fechou. Com a mão ele fez sinal que nos aproximássemos. “Levante o braço”. A moça     levantou. “Agora você não pode abaixar o braço”. Voltou-se para nós: “Viram? Ela está dormindo. Não consegue abaixar o braço. Se tentar, encontra resistência.” Ouvindo isto, a bela adormecida abaixou o braço imediatamente, não encontrando resistência nenhuma.
        “Bem”, prosseguiu o homem, “às vezes a pessoa fica assim, meio rebelde. Obedece direitinho, mas ao contrário.” Aproximou-se de novo da poltrona: “Agora”, sussurrou para ela, “preste bem atenção: você queria parar de roer unha, não é? Pois bem: quando acordar, nunca mais vai roer unha. Vai ter consciência de que é um hábito muito feio, desagradável. E pronto: quando eu contar até três, pode acordar.”
        No que ele disse “um” a moça se ergueu da poltrona, lépida e satisfeita. “Você dormiu mesmo?” perguntamos, impressionados. “Como é que vocês queriam que eu dormisse, com ele falando o tempo todo no meu ouvido?” Concordamos em que ela fizera muito mal em abaixar o braço: “Muito feio isso, desobedecer o homem dessa maneira.” Ela ergueu os ombros: “Tanta coisa só para me dizer que roer unha é muito desagradável. Essa não!” E afastou-se, roendo as unhas.
                                                               (Fernando Sabino)
Entendendo o texto:

Marque com um “x” o sinônimo da palavra ou expressão sublinhada.
01 – Em: “A dona da casa nos abriu a porta de mansinho…” a expressão sublinhada pode ser substituída por:
a.(   ) com receio                  b.(   ) curiosamente        
c.(X) levemente                   d. (   ) timidamente

02 – Na frase: “Entramos, pé ante pé, já meio hipnotizados…” a expressão sublinhada significa:
a.(X) cautelosamente                    b.(   ) ligeiramente        
c.(   ) distraídamente                      d.(   ) atentamente.

03 – Em: “Curvado sobre uma poltrona no canto mais escuro da sala…”a palavra sublinhada significa:
a.(   ) dobrado                    b.(   ) voltado          
c.(   ) ajoelhado                  d.(X) envergado.

04 – Em: “Tudo vai desaparecendo – insistia ele” a palavra sublinhada significa:
a.(X) continuava dizendo              b.(   ) continuava perguntando
c.(   ) continuava mostrando          d.(   ) continuava observando.

05 – Na frase: “Se tentar encontra resistência” a palavra sublinhada tem o mesmo significado que em:
a.(   ) A resistência do atleta aumentou com os treinos.
b.(X) Tentou abrir a porta, mas encontrou resistência.
c.(   ) O material usado na casa tem muita resistência.
d.(   ) A causa do incêndio foi a queima da resistência elétrica.

06 – Em: “…às vezes a pessoa fica assim meio rebelde” a palavra sublinhada significa:
a.(   ) revoltada                     b.(X) teimosa   
c.(   ) antipática                     d.(   ) exagerada.

07 – Em: “…sussurrou para ela…” a palavra sublinhada significa:
a.(X) segredou                      b.(   ) exclamou   
c.(   ) comentou                     d.(   ) ordenou.

08 – Na frase: “Vai ter consciência de que é um hábito muito feio …”, a palavra sublinhada significa:
a.(X) noção                   b.(   ) senso de responsabilidade          
c.(   ) cuidado                d.(   ) razão.

09 – Em: “… perguntamos impressionados…”, a palavra sublinhada significa:
a.(   ) curiosos                  b.(X) perturbados        
c.(   ) deslocados              d.(   ) arrepiados

10 – Em: “Concordamos em que ela fizera muito mal em abaixar o braço…”, a palavra sublinhada tem o mesmo significado que em:
a. (X) Todos concordaram em que foram muitos os culpados do desastre.
b. (   ) Ela concorda seus gastos com seu salário.
c. (   ) Os sapatos não concordavam com o vestido.
d. (  ) Os irmãos estavam brigados, mas agora, concordaram as opiniões.

11 – Nesta crônica, o narrador conta-nos que a dona da casa pediu silêncio com um dedo sobre os lábios. Isso significa que, para comunicar-se, ela utilizou:
a. (   ) somente palavras           b. (   ) palavras e gestos
c. (X) somente gestos               d. (   ) palavras e gestos diferentes.

12 – No trecho: “Ao fundo cinco ou seis vítimas aguardavam a vez…”, a palavra sublinhada refere-se às pessoas que aguardavam a vez de serem hipnotizadas. Usando esta palavra, o narrador está sendo:
a. (   ) realista               b. (   ) pessimista      
c. (X) irônico                 d. (   ) otimista.

13 – Na frase: “Ouvindo isto, a bela adormecida abaixou o braço imediatamente, não encontrando resistência nenhuma.”, a expressão sublinhada refere-se:
a. (X) à moça que está sendo hipnotizada
b. (   ) a uma personagem de um conto infantil
c. (   ) à moça que abriu a porta
d. (   ) a uma moça que adormeceu esperando a vez de ser hipnotizada

14 – Ao dizer: “… às vezes a pessoa fica assim, meio rebelde. Obedece tudo direitinho, mas ao contrário.”, o hipnotizador quer:
a. (   ) criticar a rebeldia da moça
b. (   ) brincar com as pessoas presentes
c. (X) justificar a sua incompetência
d. (   ) desculpar a atitude da moça.




CRÔNICA: ESTADO DE COMA - CHICO ANÍSIO - COM GABARITO

CRÔNICA: ESTADO DE COMA


    Quando entrou, a mulher parecia uma louca.
        – Estou nas últimas.
        – Calma – solicitou Dr. Novaes.
  A mulher não obedeceu ao pedido. Num histerismo preocupante começou a despir-se, mostrando feridas inexistentes e mazelas prováveis. Falava muito e muito depressa. Dr. Novaes não conseguia acompanhar os sintomas que ela expunha.
        – Isto, doutor, não pode ser câncer?
        – Bem…
        – Veja como está arroxeado. Eu já li muito sobre isso. Esta mancha escura não pode ser um melanoma? Eu tenho pavor de câncer, doutor. E o meu pulmão? Examine.
        Tirou a blusa e o sutiã para que Dr. Novaes encostasse o ouvido na suas costas, sem que nada o obstasse.
        – Seu pulmão – começou o doutor…
        – Se eu ainda tiver pulmão. E as palpitações, doutor, são constantes. Disritmia. Tem hora que o coração parece ter parado. Fico fria, sinto um torpor no corpo, o braço dormente. Braço esquerdo. Esquerdo, frisava, de olho rútilo. – Não é coisa de coração? Quais são os sintomas de enfarte?
        – O enfarte…
        – E o fígado? Bata no meu fígado.
        O doutor obedeceu por obedecer. Ressoou um “tum-tum” surdo.
        – Se eu já não tiver com hepatite, ando por perto.
        – A senhora está nervosa.
        – E deveria estar calma? E os rins, que não funcionam direito? E nem falo da cistite, que não me dá um dia de sossego.
        Tirou a saia para mostrar melhor as varizes que nasciam nos tornozelos e iam em frente. O doutor, muito paciente, fazia o que ela mandava.
        – Aperte aqui.
        Ele apertava.
        – Veja aqui.
        Ele via.
        – Empurre aqui.
        Ele empurrava.
        – Ausculte, pressione, experimente, observe.
        Ele auscultava, pressionava, experimentava, observava, obedecia com muita tranquilidade, uma calma que não era muito do agrado da mulher que, neste momento, não usava no corpo nada além dos sapatos que acabava de tirar.
        – Já viu meu pé?
        – Estou vendo.
        – Pé chato. Isso pode ser a causa do cansaço. Mas eu uso sapato ortopédico, o pé chato nada tem a ver com o cansaço, tem?
        – Não, não tem.
        – No entanto, parece que não há um palmo cúbico de ar para que eu respire. Veja como suo nas mãos.
        Ele viu que ela suava realmente.
        E tinha dores no estômago pela manhã, o intestino não funcionava a contento, a vesícula devia estar preguiçosa, o pâncreas ficava como se tivesse comido brasa, a urina era escura um dia, avermelhada no outro.
        Dr. Novaes não se abalou em nenhum instante. A mulher, inteiramente desnuda, deliberadamente deitou-se na mesa para um exame mais detalhado. Dr. Novaes fez.
        – Pode se vestir.
        – Como? Sem que o senhor examine o baço?
        Ele, com um dedo sobre o baço, bateu várias vezes nele com o rígido médio.
        – Vista-se agora.
        Ela se disse impossibilitada. Sentia o tal sintoma de prostração de que tanto falara. Viu? Ainda bem que no consultório lhe tinha dado, para que o Dr. Novaes não pensasse que se tratava de hipocondria ou coisa semelhante.
        Foi-lhe dado um pouco de água mexida com uma colher. Nada havia além da água no copo, mas o mexer da colher fez com que, ao beber a água pura, ela chegasse a sentir um gosto muito ruim.
        – O que foi que o senhor me deu para beber?
        – Nada – disse o Dr. Novaes.
        – Eu preciso saber o nome deste remédio. Em dois minutos me deixou outra. Estou reanimada, recuperada.
        – Vista-se.
        Ela começou a se vestir.  Vestiu-se sem parar de falar de doença. Dores de cabeça ao amanhecer, uma ponta de febre no começo da noite, insônia progressiva – Mandrix já fazia efeito semelhante à Cibalena – perda de apetite.
        – Como isso, parece que comi um boi.
        E a memória, não raro, lhe faltava. Seria amnésia? Essa doença existe mesmo, ou é coisa de filme? E os olhos sempre vermelhos. Há uma mancha num deles, vê? O olho direito. Não seria um carcinoma? Os seios doídos. Às vezes, não suportava o sutiã.
        – A senhora está nervosa demais.
        – Se fosse somente o sistema nervoso, era ótimo. Eu tomava uns sedativos, uns tranquilizantes, pronto. O estado geral é que é o drama. Devo me hospitalizar? Diga, Doutor. Preciso ser operada? É caso de cirurgia, ou…? O que o senhor disser eu faço.
        – Então faça o seguinte – disse o Dr. Novaes. – Procure um médico.
        – Hem?
        – Eu sou economista. O Dr. Drúlio, que tinha consultório aqui, mudou-se para a Rua Sorocaba.
        Daí, ela apressou-se a vestir a roupa.

CHICO ANÍSIO. Feijoada no Copa. Editora Rocco, 1976, Rio de Janeiro.

Entendendo o texto:
01 – Pesquise e informe os órgãos do corpo humano que são diretamente atacados por estas doenças:
a) hepatite: Fígado.           b) pneumonia: Pulmões.                    
c) cistite: Bexiga.               d) rinite: Mucosas do nariz.

02 – O que são sintomas?
      Quaisquer fenômenos ou mudanças no organismo humano, cuja descrição pode auxiliar o médico nos diagnóstico de doenças.

03 – Identifique e transcreva as palavras do texto que tenham estes significados:
a)   Dilatação permanente das veias.
Varizes.
b)   Abatimento, enfraquecimento, debilidade.
Prostração.
c)   Estado mórbido que se manifesta pelo aumento da temperatura anormal do corpo.
Febre.
d)   Diminuição ou perda da memória por motivo orgânico ou emocional.
Amnésia.

04 – Já sabemos que a mulher esteve no escritório de um economista e não num consultório médico. Qual foi o motivo do engano?
a. (   ) Ainda existia a placa do Dr. Drúlio na porta.
b. (   ) O Dr. Drúlio e o Dr. Novaes eram muito parecidos.
c. (   ) A mulher estava habituada a ir aquele local.
d. (X) A mulher pensou que Dr. Novaes fosse médico.

05– Que doença foi a primeira preocupação da mulher?
      Câncer.

06– Quando a mulher perguntou quais os sintomas do enfarte, Dr. Novaes esboçou uma resposta, mas foi interrompido. Na sua opinião, como ele completaria a frase?
      Resposta pessoal do aluno. Mas, deve ser adequada a situação.

07– Mesmo não sendo médico, Dr. Novaes efetuou alguns exames na mulher. Na sua opinião por que ele agiu assim?
      Resposta pessoal do aluno. Mas, deve ser adequada a situação.

08 – A mulher já havia feito outras consultas sem que os médicos encontrassem qualquer doença. Ela, entretanto, não concordava com seus diagnósticos porque não se considerava portadora de:
a. (   ) tuberculose                   b. (   ) hepatite        
c. (X) hipocondria                   d. (   ) disritmia.

09 – Quando o Dr. Novaes lhe deu água, houve uma súbita melhora no estado nervoso em que a mulher se encontrava. Por quê?
      A mulher, por ser hipocondríaca, achou que o Dr. Novaes havia lhe dado algum remédio para seu nervoso.

10 – Nesse texto, o autor quis nos divertir com uma situação incômoda para os personagens. Entretanto, é possível extrair uma lição desse episódio. Qual seria?
  As pessoas fragilizadas por alguma doença, principalmente os hipocondríacos, são vítimas fáceis de aproveitadores (certos médicos, farmacêuticos, vendedores de farmácia, curandeiros) e com isso põem a vida em risco, além de se exporem ao ridículo.



TEXTO: MÃES PARA UM MUNDO NOVO - PADRE VIRGÍLIO - COM GABARITO


TEXTO:  MÃES PARA UM MUNDO NOVO

      Vivemos sonhando com o mundo novo: o mundo do Bom Pastor, onde a violência ceda o lugar à paz, à justiça, à fraternidade. Para que o sonho se realize, o Bom Pastor é a última esperança. A penúltima são as mães, depositárias do amor infinito de Deus.
     Quando vejo a violência praticada nas ruas contra pessoas indefesas, eu digo: “Será que não têm mãe, esses violentos? Antes de puxar o gatilho ou arremessar a faca, por que não pensam na aflição das mães dos violentados?”
        E quando vejo a violência legalizada dos homens do governo a impor cargas pesadas às costas do pobre, do trabalhador, do assalariado, eu digo: “Será que não têm mãe, esses senhores? Ao aprontarem pacotes econômicos tão desumanos, por que não pensam em como ficariam as senhoras mães deles, se elas não tivessem pão para dar a seus filho?”
        Hoje, antes de fazermos um discurso patético e comovente em homenagem às nossas mães, preferimos lançar a elas um grande desafio: o que é que elas podem fazer para deter a escalada da violência?
        Nossos jovens estão se metendo num caminho de violência. Mas nós, os adultos, não temos nem um pouco de razão para censurá-los, uma vez que somos mais violentos do que eles. Porque, enquanto eles se agitam e gritam nas praças de punho fechado, nós pais, homens de governo e homens de Igreja, baixamos leis e decretos insuportáveis. Enquanto eles quebram vidraças e incendeiam carros, nós fazemos massacre dos valores cristãos, da fé e dos mandamentos.
        Debaixo da cruz, estava a Mãe para receber o último suspiro do Inocente violentado. Com sua coragem e seu perdão, com suas lágrimas de amor, as mães dos violentos e dos violentados de hoje conseguirão derrotar a violência.

Pe. Virgílio, SSP, Jornal O Domingo. São Paulo,
Ed. Pia Sociedade de São Paulo, ano LII, n° 24, 13/05/1984.

Entendendo o texto:
01 – No texto, encontramos as palavras violentos e violentados. Que diferença de significado há entre elas?
      Violentos: pessoas que praticam a violência.
      Violentados: pessoas que sofrem com a ação violenta.

02 – Preencha adequadamente as lacunas do texto com as palavras abaixo, fazendo as adaptações necessárias à frase.
Aflição – desumanos – discurso – indefesas – justiça – lançou – massacres – patético – violência.
O conferencista lançou seu olhar demoradamente pela plateia. Depois, demonstrando certa aflição, iniciou seu discurso. Falou da violência que se pratica contra pessoas indefesas. Finalizou em tom patético, acusando de desumanos todos esses massacres que abalam a justiça.

03 – Localize, no texto, e transcreva as palavras que tenham os significados abaixo:
a)    amor ao próximo, convivência como irmãos: Fraternidade.
b)    lançar com força para longe: Arremessar.
c)    remissão da pena, indulto: Perdão.

04 – Dá-se o nome de pacote a um pequeno embrulho. No texto, porém, pacote foi empregado com outro significado. Qual?
      Série de leis expedidas de uma só vez visando um determinado problema ou assunto.

05 – O texto informa que vivemos sonhando com um mundo novo. Como deveria ser esse mundo na opinião ao autor?
      De paz, justiça e fraternidade.

06– Como a violência tomou dimensões imensuráveis, o autor aponta duas esperanças para que tenhamos um mundo novo. Quais são?
      O Bom Pastor e as mães.

07– O autor faz referências a duas formas diferentes de violência. Uma é praticada por bandidos, malfeitores, criminosos. Qual é a outra?
      A violência legalizada, que atinge a maioria das pessoas através de leis desumanas como as relacionadas à economia.

08- Quando o autor diz que os adultos não podem censurar os jovens, pretende mostrar que:
a. (   ) a violência é consequência da falta de amor das mães pelos filhos.
b. (   ) cabe à juventude, a culpa pela escalada abusiva da violência.
c. (X) os atos da juventude são consequência dos exemplos dos adultos.
d. (   ) o governo é o verdadeiro culpado pela escalada da violência.

09 – O autor faz uma pergunta: o que as mães podem fazer para deter a violência? E sugere uma solução. Qual é?
      As mães de hoje devem ter como exemplo a Mãe de Jesus e usar de coragem, perdão e lágrimas.

 10 – Na sua opinião, a solução dada pelo autor é suficiente para deter a escalada da violência em nossos dias?
(    ) sim          (     ) não          Por quê?
      Resposta pessoal do aluno.




segunda-feira, 12 de fevereiro de 2018

ARTIGO DE OPINIÃO: RESPONSABILIDADE PENAL - LINHA DIVISÓRIA - ALYRIO CAVALLIERI- COM GABARITO

ARTIGO DE OPINIÃO:  RESPONSABILIDADE PENAL -  LINHA DIVISÓRIA


        Fixar uma idade a partir da qual o adolescente está em condições de responder por crimes que venha a cometer é uma decisão que tem necessariamente uma grande dose de arbitrariedade.
        É natural que não se possa processar criminalmente uma criança de 5 anos, mas que um rapaz de 19 anos que tenha cometido um crime deva cumprir pena; quanto a isso, dificilmente haverá quem discorde. Entretanto, não se conhece um critério definitivo para estabelecer que, por exemplo, quem completou 14 anos já está em condições de assumir responsabilidade penal. Porque o discernimento, é evidente, não surge magicamente, num determinado dia, e sim se forma gradualmente.
        Não existe, entretanto, alternativa razoável. É impossível evitar a arbitrariedade, pois em algum ponto será preciso traçar a linha divisória, exatamente como se faz para determinar em que idade se deve cumprir o serviço militar ou votar, ou em que idade se pode tirar a carteira de motorista – e todos sabem que um carro, em mãos irresponsáveis, pode se tornar uma arma mortal.
        Os 18 anos de idade para a responsabilidade penal, se algum dia foram justos, hoje certamente são demais. Em países desenvolvidos, como a Inglaterra, Estados Unidos França e outros, menores de 18 anos vão a julgamento, e por todos os motivos uma política semelhante deveria ser adotada no Brasil. Não há como supor que um rapaz de 16 anos seja incapaz de distinguir o que é ilícito ou de prever as consequências de seus atos; de saber para que serve uma arma ou de compreender a diferença entre o roubo e uma travessura.
        Contra a ideia de diminuição da idade da responsabilidade penal costumam ser apresentados argumentos aparentemente válidos, como o de que a cadeia é na realidade uma escola do crime, ou de que os criminosos são sempre fruto da sociedade em que vivem. Mas essas considerações, embora convincentes, são irrelevantes. Fazem parte de uma discussão bem mais ampla, sobre a maneira mais eficiente de combater a criminalidade e de fazer justiça, mas não tem aplicação na questão da responsabilidade penal, pois dizem respeito a qualquer idade.

        MENOR NA CADEIA?

        O Congresso Nacional começa a discutir projeto que pretende alterar a idade da responsabilidade penal.
        Quando se pergunta ao auditório, em aulas ou conferências, com que idade o menor deve ir para a cadeia pela prática de um crime, a quase unanimidade responde: 16 anos. Alguns preferem os 14 ou até menos. Se escolhe alguém para explicar o porquê, a resposta é infalível: “Se pode votar, pode ir para a cadeia.” Esta resposta está dentro do raciocínio do “se sabe o que faz, deve pagar pelo que fez”. No entanto, este argumento é o mais frágil de todos e por duas razões.
        O sistema não é baseado no “sabe o que está fazendo”, mas na idade, independentemente da sabedoria. O critério da idade não é justo, nem científico, porque, primeiro, um único dia determina uma diferença absoluta quanto aos direitos e deveres; segundo, porque não existe ciência no mundo que garanta que o discernimento de um ser humano começa ou acaba no dia de um aniversário.
        No entanto, embora imperfeito o sistema da idade é o único capaz de evitar discriminação, porque é absolutamente universal. É por isso que mulher só casa com 16, com autorização dos pais, e homem com 18 anos;
Com 16 anos até o analfabeto vota; mas o deputado mais votado do Brasil não pode ser senador antes dos 35 anos; o mais hábil motorista não consegue a carteira antes dos 18 anos; o mais sábio desembargador deixa de julgar no dia em que completa 70 anos. E o criminoso só vai para a cadeia com 18 anos. Em nenhum caso, qualquer que seja a “sabedoria” da pessoa, ela adquire ou perde direitos se não tiver essa idade, mesmo que haja uma diferença de um único dia. Afinal, a consciência do certo e do errado todos tem, desde tenra idade.
        A discussão tem que mudar de eixo. Deve-se indagar é se a cadeia é a solução para a delinquência juvenil. A prisão e a gravidade de pena por si só não resolvem.
        Temos um exemplo histórico. A pena máxima para o traficante de drogas aumentou de cinco para sete e para 15 anos e, agora, é crime hediondo; os maiores criminosos estão em presídio de segurança máxima e o tráfico não diminuiu. Uma boa lei para menores infratores impõe consequências dentro de um sistema de justiça, muito mais eficazes que o puro e simples encarceramento.
        Solução? Manter os 18 anos para a responsabilidade penal e um exame profundo do Estatuto da Criança e do Adolescente, nove anos depois de sua vigência. Ele não permite que um menor traficante, preso em flagrante com grande quantidade de tóxicos e armas, seja internado; fixa prazos para as medidas socioeducativas, impedindo a reeducação; e muitas outras imperfeições estão demonstrando que é hora de ser avaliado. A cadeia, por si só, não é a solução.

                                  Alyrio Cavallieri é desembargador e ex-juiz de menores.
                                                                                              O Globo, 18/04/1999.

1 – Por que o autor intitulou o texto de Linha Divisória?
      O estabelecimento de limite entre ser ou não responsável por atos praticados.

2 – O que é definido como arbitrariedade no texto?
       Julgamento pessoal.

3 – Reescreva, com suas próprias palavras, o 1º parágrafo do texto, resumindo-o.
       Resposta pessoal.

4 – De que argumento o autor se utiliza, no 2º parágrafo, para comprovar a ideia veiculada sobre a dificuldade de estabelecer-se um critério definitivo para que o adolescente tenha condições de assumir responsabilidades?
       Da falta de critério para julgar se um jovem está ou não em condições de assumir responsabilidade sobre seus atos.

5 – Reescreva, com suas próprias palavras, o 2º parágrafo, resumindo-o.
       Resposta pessoal.

6 – No 3º parágrafo, de que recurso lança mão o autor para sustentar o argumento principal de seu texto?
       A exemplificação.

7 – E no 4º parágrafo, qual o recurso?
       A citação exemplificativa.

8 – O último parágrafo do texto contém argumentos e contra-argumento. Aponte-o.
        Argumentos: A cadeia é uma escola do crime e os criminosos são frutos da sociedade em que vivem.
       Contra-argumento: A maneira mais eficiente de combater a criminalidade e de fazer justiça.

9 – No 2º parágrafo de Menor na Cadeia, ocorre a frase “se sabe o que faz, deve pagar pelo que fez”. Com que finalidade ela foi utilizada?
       Servir como argumento para quem defende a ideia de responsabilidade criminal para jovens com 16 anos, ou menos, de idade.

10 – Cite dois pontos de contato entre os textos, ou seja, pontos de vista com idêntica base de sustentação.
        Na discussão da “linha divisória” e na necessidade de rever-se o combate da criminalidade em suas formas de atuação.

11 – E você? Qual é o seu ponto de vista sobre o tema?
        Resposta pessoal.