segunda-feira, 16 de dezembro de 2019

TEXTO: MENINOS DA PERIFERIA - SYLVIO BARRETO - COM GABARITO

Texto: Meninos da periferia
          
Sylvio Barreto

        Com a volta das eleições no Brasil, o Dr. Samuel candidatou-se a prefeito e foi eleito.
        Passado o primeiro impacto, Samuel ouviu a voz do subconsciente: Samuel, e agora, o que você vai fazer?
        Nesse dia prometeu a si mesmo: vou dar de mim tudo o que puder e farei um trabalho honesto para melhorar a vida do pessoal de Ibiraquera.
        Tomada a posse, convocou os vereadores eleitos, que se prontificaram a ajuda-lo no que fosse possível. Além disso, reuniu os moradores da cidade para discutir com eles as necessidades mais urgentes.
        Dona Rosinha, como era agora chamada, também estava se mexendo, reunindo as donas de casa, com a mesma finalidade.
        Isso possibilitou o entrosamento de todos, para a salvação de Ibiraquera.
        As coisas começaram a acontecer...
        Ibiraquera não tinha médico nem no posto de saúde. Era o “seu” Bento, antigo proprietário da única farmácia, quem receitava tudo.
        Dentista também não havia. Professores, apenas três possuíam curso de magistério.
        Mesmo assim, Dr. Samuel e Dona Rosinha não desistiram e, reunião após reunião, veio o primeiro médico, já aposentado, primo de um dos moradores. Depois, um jovem dentista.
        Assim, devagar, o Dr. Samuel foi conseguindo profissionais de grau técnico para atender a população.
        Entretanto, o que entristecia Dona Rosinha era que nenhum filho da terá voltava com grau superior.
        Após uma pesquisa, verificou-se que os jovens que iam para as grandes cidades marginalizavam-se, por falta de instrução.
        Dona Rosinha comentou isso com o marido, pois precisavam mudar a situação, para que os jovens da cidadezinha conseguissem melhores condições de vida e pudessem voltar para Ibiraquera, formados e trazendo reforço técnico e cultural.
        Dona Rosinha também comentou com o marido que havia muitas crianças na rua, sem nada para fazer, principalmente as da periferia, que aguardavam chegar os quinze anos, a fim de irem para a cidade grande.
        Em busca de quê?
        Alguns dias após a reunião com os professores e vendo a necessidade dos alunos, o Dr. Samuel teve a feliz ideia de criar o dia do padrinho.
        Padrinho? O que é isso?
        Convocou os vereadores e toda a comunidade do comércio e demais autoridades e expôs o seu plano.
        Propôs que cada cidadão, que pudesse, aceitasse ser o padrinho de uma criança carente da escola ou da rua. Caberia ao padrinho orientar, olhar e manter o pequeno até sua formação. Isto até os quinze anos, e se fosse possível até mais para frente. Aquele que se destacasse deveria ser encaminhado e mantido na escola superior.
        Com o tempo, inúmeros jovens formados voltariam e contribuiriam para o progresso de Ibiraquera.
        A maioria da população concordou e dentro de cinco dias não se viam mais meninos vadiando e mendigando pelas ruas. O que se via era um vaivém de pequenos garotos e garotas desfilando com seus uniformes e livros debaixo do braço.
        Ibiraquera já começava a se tornar mais alegre e a população, mais unida e interessada, a mostrar os dotes de seus afilhados.
                                 Meninos da periferia. Sylvio Barreto.
                         Fonte: Livro – Encontro e Reencontro em Língua Portuguesa – 5ª Série - Marilda Prates – Ed. Moderna, 2005 – p.142-3.
Entendendo o texto:
01 – Você sabe o que significa “ouvir a voz do subconsciente”?
      Ouvir sua “voz interior”.

02 – Um prefeito pode governar sozinho? Justifique sua resposta.
      Não, porque uma cidade precisa de cuidados diferentes.

03 – Descreva a situação de Ibiraquera. Dr. Samuel, como prefeito e cidadão, tinha muitos problemas para resolver? Opine sobre eles.
      Tinha. São problemas muito comuns em vários lugares, mas que precisam ter uma solução a fim de evitar a violência, a fome, o frio, o abandono, as doenças...

04 – Dona Rosinha, esposa do prefeito, tinha duas preocupações. Quais eram elas? Elas eram importantes? Por quê?
      Reunir-se com as donas de casa e trabalhar com elas, na sua área, para o bem comum.

05 – Fale sobre o dia do padrinho. Qual o seu significado? Por que ele foi criando? Era importante?
      Foi o dia que os que pudessem assumiriam os estudos de uma criança até os 15 anos, pelo menos. Foi criado para incentivar o estudo, a formação superior e a volta para a cidade de origem para exercer sua profissão.

06 – É importante que os jovens do interior venham estudar nas cidades maiores e, depois de formados, voltem para desenvolver sua profissão no lugar em que nasceram? Justifique.
      Sim. Porque eles próprios farão sua comunidade crescer.

07 – Qual a sua opinião sobre o prefeito Dr. Samuel? Existem governantes como ele? Justifique.
      Resposta pessoal do aluno.

quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

POESIA: MEIO-DIA - VERA BEATRIZ SASS - COM GABARITO

Poesia: MEIO-DIA
             Vera Beatriz Sass

É meio-dia
no meio do mundo
balões verdes 
balões vermelhos
cirandam com os raios de sol 
coloridos, dispersos
refletidos nos vitrais 
das igrejas. 

Será o meio do mundo
no país dos egípcios
ou na Montanha Meru
dos hindus? 
Bate meio-dia
no relógio solar
da capital da China, 
abre-se o portão dos deuses 
na Babilônia. 
É meio-dia
no meio do mundo 
no friozinho da barriga
do menino da rua.  
             Gata cigana. Erechim: Edelbra, 1991. p. 12.
                                       Fonte: Livro- PORTUGUÊS: Linguagens – Willian R. Cereja/Thereza C. Magalhães – 7ª Série – Atual Editora – 2002 – p. 35-6.
Entendendo a poesia:

01 – Há, na poesia, uma oração que se repete duas vezes e que é responsável pela indicação do tempo em que ocorrem as ações verbais.
a)   Qual é essa oração?
É meio-dia.

b)   Ela apresenta sujeito? Em caso afirmativo, classifique-o.
Não, é uma oração sem sujeito.

c)   Que diferença sintática ocorre entre a oração apontada no item a e esta: “Bate meio-dia / no relógio solar / da capital da China”?
Na oração “Bate meio-dia”, o sujeito é meio-dia.

02 – A palavra meio é empregada nesse texto com dois sentidos. Qual é o sentido dela nas expressões:
a)   Meio-dia?
Metade (metade do dia).

b)   Meio do mundo?
Centro (centro do mundo).

03 – O poema tem como personagem um menino de rua. O meio-dia provoca nele reações interiores e exteriores.
a)   Que efeitos de luz o meio-dia provoca nos vitrais das catedrais? 
Cria cores e formas.

b)   Por que esses efeitos são associados pelo menino a balões coloridos?
Porque, assim como a luz, também os balões possuem cor, forma, leveza.

04 – Quanto às sensações internas do menino:
·        Que palavra dos últimos versos está em oposição ao calor dos raios de sol do mundo exterior?
O friozinho da barriga.

·        Essa palavra indica que o menino está tendo que tipo de sensação? 
Fome.

05 – Nos primeiros versos, ao afirmar que “É meio-dia / no meio do mundo”, o eu lírico faz referência ao tempo e ao espaço.

a)   Supor que também seja meio-dia em diferentes partes do mundo é um pensamento lógico ou é imaginação do menino?
É imaginação infantil.

b)    Que lugar é o “meio do mundo” para o menino?
Para ele, o meio do mundo é o meio da rua.

06 – Concluindo esse estudo, assinale as afirmativas corretas:
a)   A poesia cria um jogo de tempo e espaço a partir das expressões “meio-dia” e “no meio do mundo”.
b)   A poesia trabalha com oposições, como entre o “friozinho” da barriga do menino e os raios de sol do meio-dia; entre a triste realidade da fome e o alegre mundo de imaginação da criança.
c)   Na construção da poesia há um movimento que caminha do geral — “é meio-dia”, “no meio do mundo” — para o particular — “no friozinho da barriga / do menino da rua”.
d)   No movimento do geral para o particular verificado na poesia, passa-se pelo seguinte caminho: dentro do mundo há um país, dentro deste uma cidade, e dentro desta uma rua. E nessa rua há um menino, e na barriga dele há a fome. A fome, portanto, é uma situação particular, mas na poesia acaba ganhando uma dimensão social e universal, já que esse menino não é o único a viver nas ruas nem o único ser humano a sentir fome.
Todas estão corretas.

POEMA: O NAVIO NEGREIRO - (FRAGMENTO) - TRAGÉDIA NO MAR - CASTRO ALVES - COM GABARITO

Poema: O navio negreiro - Fragmento 

     Tragédia no mar – Castro Alves            

4ª Parte

Era um sonho dantesco... o tombadilho
Que das luzernas avermelha o brilho.
               Em sangue a se banhar.
Tinir de ferros... estalar de açoite...
Legiões de homens negros como a noite,
               Horrendos a dançar...

Negras mulheres, suspendendo às tetas
Magras crianças, cujas bocas pretas
               Rega o sangue das mães:
Outras moças, mas nuas e espantadas,
No turbilhão de espectros arrastadas,
               Em ânsia e mágoa vãs!

E ri-se a orquestra irônica, estridente...
E da ronda fantástica a serpente
               Faz doudas espirais ...
Se o velho arqueja, se no chão resvala,
Ouvem-se gritos... o chicote estala.
               E voam mais e mais...

Presa nos elos de uma só cadeia,
A multidão faminta cambaleia,
               E chora e dança ali!
Um de raiva delira, outro enlouquece,
Outro, que martírios embrutece,
               Cantando, geme e ri!

No entanto o capitão manda a manobra,
E após fitando o céu que se desdobra,
               Tão puro sobre o mar,
Diz do fumo entre os densos nevoeiros:
"Vibrai rijo o chicote, marinheiros!
               Fazei-os mais dançar!..."

E ri-se a orquestra irônica, estridente. . .
E da ronda fantástica a serpente
               Faz doudas espirais...
Qual um sonho dantesco as sombras voam!...
Gritos, ais, maldições, preces ressoam!
               E ri-se Satanás!...

5ª Parte
Senhor Deus dos desgraçados!
Dizei-me vós, Senhor Deus!
Se é loucura... se é verdade
Tanto horror perante os céus?!
Ó mar, por que não apagas
Co'a esponja de tuas vagas
De teu manto este borrão?...
Astros! noites! tempestades!
Rolai das imensidades!
Varrei os mares, tufão!

Quem são estes desgraçados
Que não encontram em vós
Mais que o rir calmo da turba
Que excita a fúria do algoz?
Quem são? Se a estrela se cala,
Se a vaga à pressa resvala
Como um cúmplice fugaz,
Perante a noite confusa...
Dize-o tu, severa Musa,
Musa libérrima, audaz!...

São os filhos do deserto,
Onde a terra esposa a luz.
Onde vive em campo aberto
A tribo dos homens nus...
São os guerreiros ousados
Que com os tigres mosqueados
Combatem na solidão.
Ontem simples, fortes, bravos.
Hoje míseros escravos,
Sem luz, sem ar, sem razão. . .
[...]

6ª Parte
Existe um povo que a bandeira empresta
P'ra cobrir tanta infâmia e cobardia!...
E deixa-a transformar-se nessa festa
Em manto impuro de bacante fria!...
Meu Deus! meu Deus! mas que bandeira é esta,
Que impudente na gávea tripudia?
Silêncio. Musa... chora, e chora tanto
Que o pavilhão se lave no teu pranto! ...

Auriverde pendão de minha terra,
Que a brisa do Brasil beija e balança,
Estandarte que a luz do sol encerra
E as promessas divinas da esperança...
Tu que, da liberdade após a guerra,
Foste hasteado dos heróis na lança
Antes te houvessem roto na batalha,
Que servires a um povo de mortalha!...

[...]

                                                       Castro Alves. “O navio negreiro”. In: Obra completa. 2. ed. Rio de Janeiro, Aguilar, 1966. p. 247-50.
Fonte: Livro- Português – Série – Novo Ensino Médio – Vol. único. Ed. Ática – 2000- p. 210-2.
Entendendo o poema:

01 – De acordo com o texto, qual o significado das palavras abaixo:
·        Dantesco: Evocação das cenas horríveis do “Inferno” descritas por Dante Alighieri na Divina comédia.

·        Vaga: Tipo de onda.

·        Turba: Multidão.

·        Audaz: Corajosa, ousada.

·        Bacante: Devassa, libertina.

·        Luzernas: Clarões.

·        Gávea: Mastro suplementar.

02 – A que é comparado os movimentos dos negros no convés?
      A uma dança.

03 – Como são produzidos os sons dessa dança macabra?
      Pelo tinir dos ferros, pelo estalar do açoite, pelos gritos, choros, gemidos e risos.

04 – Apóstrofe é uma figura retórica que consiste em dirigir-se o orador a uma pessoa ou coisa real ou fictícia, solicitando uma intervenção. Transcreva algumas apóstrofes do início da 5ª parte.
      “Senhor Deus dos desgraçados!”; “Ó mar! por que não apagas...”; “Astros, noites! Tempestades!”

05 – O poeta dignifica os negros, descrevendo-os, no final da 5ª parte, como eram antes de serem escravizados. O que os caracterizava antes de se tornarem “míseros escravos”?
      Eram “guerreiros ousados”, “homens simples, fortes e bravos”.

06 – Qual o motivo da indignação do poeta expressa na 6ª parte?
      Ver a bandeira nacional tremular no mastro do navio negreiro.

07 – Transcreva o verso da última estrofe construído em aliteração.
      “Que a brisa do Brasil beija e balança”.

CONTO: EU NUNCA VOU TE DEIXAR - (FRAGMENTO) - PEDRO BANDEIRA

Conto: Eu nunca vou te deixar - Fragmento
           Pedro Bandeira

       Fazia frio naquela noite. Muito frio.
      Debaixo de um viaduto qualquer, num cantinho mais escuro, Beto e Vô Manduca aconchegavam-se em meio ao monte de papelões que os dois haviam empilhado dentro da carrocinha, depois de todo um dia a empurrá-la pelos quarteirões dos depósitos e dos armazéns, o melhor lugar para encontrar boas pilhas de papelão.
        Logo que amanhecesse, aquilo tudo seria vendido a alguma fábrica de papel e eles teriam dinheiro para sobreviver por mais um dia. Mais um dia para empurrar novamente a carrocinha, catando mais papelão para vender e sobreviver por mais um dia, para catar mais papel...
        No meio do papelão amontoado na carrocinha, o frio quase não penetrava, e Beto começou a adormecer, ouvindo os mesmos sons de todas as noites, o barulho dos carros que passavam, o tempo todo, ao lado e em cima do viaduto sob o qual estava estacionada a carrocinha.
        Em noites como aquela, costumava haver mais um hóspede dentro da carrocinha: um gato. Um gato qualquer, pobre e sujo como eles. Qualquer gato fosco, de indefinida cor e sem nome, que às vezes aparecia para filar uns restos do jantar e acabava pegando uma carona no meio dos trapos, dos papelões e dos dois seres humanos que o acolhiam.
        Quase todas as noites, Beto procurava arranjar um gato como aquele. De manhã ele sumiria, como sempre somem os gatos sem dono. Mas pelo menos durante a noite teria sido uma companhia para ele. Um pedaço vivo, magrelo, quente. Um brinquedo bom de acariciar enquanto o sono não vinha.
        Muitas vezes, principalmente quando fazia frio, abraçado com o gato vagabundo que acolhera, Beto sonhava com um gato só dele:
        – Sabe, vô Manduca? Eu queria um gato que ficasse com a gente. Um gato que aprendesse a me reconhecer. Que todos os dias comesse na minha mão. Que olhasse para mim quando eu o chamasse pelo nome. O nome que eu mesmo daria para ele...
        Vô Manduca sorria seu sorriso sem dentes, acariciava a carapinha do menino e mostrava sua sabedoria das ruas:
        – Durma, Beto. Gatos vagabundos não faltam. Enquanto você tiver algum resto de comida para oferecer, sempre encontrará um gato para comer na sua mão.
        [...]
                               Pedro Bandeira. Eu nunca vou te deixar. In: Byron Stuart Gottfried. Sete faces do destino. São Paulo, Moderna, 1996.
Fonte: Livro – Ler, entender, criar – Português – 6ª Série – Ed. Ática, 2007 – p. 77.

Entendendo o texto:

01 – Releia com atenção as frases em que aparecem as palavras destacadas. Responda as questões abaixo:
a)   O pronome demonstrativo aquela retoma qual ideia exposta anteriormente pelo narrador?
O pronome refere-se à noite fria, com barulho de carros que passavam próximo ao viaduto sob o qual Beto dormia em uma carrocinha cheia de papelão.

b)   O pronome pessoal eles refere-se a quem?
Refere-se ao Beto e ao vô Manduca.

c)   O pronome demonstrativo aquele e os pronomes pessoais ele e o referem-se a um ser já mencionado no texto. Qual?
Esses pronomes referem-se ao gato.


TEXTO: AMARELINHO -(FRAGMENTO) - JOSÉ GANYMÉDES - COM GABARITO

Texto: Amarelinho
    
        José Ganymédes

        O amarelinho gostava de ficar com o nariz achatado nas vitrinas namorando os televisores coloridos funcionando. Legal! Muito mais bonito do que os branco e preto! Ele ficava até que aparecia um empregado para implicar:
        -- Menino, vá embora!
        -- Por quê? 
        -- Porque aí não é lugar de meninos!
        -- Eu tô só vendo...!
        -- Mas fica esfregando a mão no vidro, suja tudo! Não sabe ver só com os olhos? Vamos, vá embora, menino!
        Ele ia. Caminhava um pouco. Magoado, com raiva, querendo brigar. Então, virava-se para trás, fingia que estava com a metralhadora nas mãos e...
        -- Pápápápápá! – fazia com a boca imitando o disparo da automática. – Matei você!
        Em seu mundo de oito anos, o Amarelinho imaginava a vítima caída no chão, morta no meio de uma poça de sangue. Igual ele via na televisão. Aí, ele fugia em um velocíssimo carrão, cujos pneus chiavam pelo asfalto das avenidas. E pronto! – estava vingado.
        Só assim, depois de feita a justiça pelas próprias mãos, que ia embora, à procura de outra vitrina para, outra vez, ficar lambendo com os olhos.
        Estava no jardim público, quando passou uma mulher e perguntou:
        -- Menino, você não tem pai?
        -- Não...
        -- Nem mãe?
        Fez que sim.
        -- Então é melhor ir pra casa, menino! Tão pequeno, aí, sozinho na rua a essas horas? Onde você mora?
        -- Na favela.
        A mulher abriu a bolsa e tirou uma nota.
        -- Tome, é pra comprar um doce...
        Ele pegou a nota e ficou olhando para a mulher. Um doce custava o dobro. O que iria comprar com aquela nota?
        A mulher foi embora. O Amarelinho enfiou a nota e a mão no bolso do short encardido e continuou passeando. Viu um Papai Noel de vermelho que batia um sininho. Ele tinha barba branca, esquisita, não parecia nascer no rosto dele. Papai Noel nem olhou. O Amarelinho encolheu os ombros, entrou no bar, comprou balas. Desembrulhou uma, enfiou na boca, e a outra guardou para mais tarde.
        Na esquina havia uma grande loja de brinquedos. Ele estava passando por lá quando... viu!
        Os olhos arregalaram! Ela estava dependurada, igualzinha à de verdade, o cano de aço, o gatilho, o casco de madeira: a mais linda metralhadora que jamais tinha visto em toda a sua vida!
        Muita gente na loja. Hipnotizado pela arma de brinquedo, ele também entrou. Olhou. Não contente, esticou a mão, passou o dedo. Chegou a rir enquanto fazia pápápápápá com a boca. Nisso aproximou-se um vendedor carrancudo:
        -- Vá embora, moleque!
        -- Só tô vendo, moço!
        -- E precisa passar a mão suja? Vá embora.
        -- Quanto custa?
        -- Um dinheirão. Não é pro seu bico, é só pra filho de gente rica. Vá embora, menino!
        E empurrou-o para fora.
        O Amarelinho saiu. Porém, na calçada, tornou a olhar para a arma. Vendo aquilo, o empregado deu-lhe um carreirão. O Amarelinho correu. Pouco mais adiante, parou, virou-se para trás, fez gesto de quem empunhava a metralhadora:
        -- Pápápápápá, matei você! – disse, cuspindo de lado e imaginando o vendedor morto na calçada.
        Em seguida, retomou o caminho e foi embora. Porém repetindo:
        -- Eu quero uma metralhadora daquelas!
                                              Amarelinho, Ganymédes José.
                              Fonte: Livro – Encontro e Reencontro em Língua Portuguesa – 5ª Série - Marilda Prates – Ed. Moderna, 2005 – p.132-3.
Entendendo o texto:
01 – Que informações o texto nos dá sobre Amarelinho, sua vida e sua família?
      Segundo o texto. Amarelinho é um garoto pobre, que mora na favela. É órfão de pai.

02 – “Igual ele via na televisão”.
a)   A que espécie de programas Amarelinho assistia?
Assistia a filmes violentos, com cenas de assassinato e fuga, do tipo “mocinho e bandido”.

b)   A atitude de Amarelinho mostra que ele se identifica com que personagens desses filmes?
Ele provavelmente se identificava com os “bandidos”.

c)   A história das personagens com que Amarelinho se identificava seria parecida com a dele?
Nos filmes policiais, os “bandidos” são, muitas vezes, pessoas marginalizadas pela sociedade como Amarelinho e que acabam optando pelo crime.

d)   Você já assistiu ao tipo de filme ao qual o texto se refere? Acha que ele influencia o seu comportamento? De que maneira?
Resposta pessoal do aluno.

e)   Nem todas as pessoas que têm uma vida igual a de Amarelinho reagem como ele. Por quê? Justifique sua resposta.
Algumas pessoas são mais conformadas. Outras têm espírito de luta. Outras ainda preferem a não-violência.

03 – O empregado da primeira loja e o vendedor da segunda loja comportam-se de maneira semelhante. Descreva o comportamento dos dois.
      Ambos afirmam que ali não é lugar para Amarelinho e que ambos acreditam que o menino está sujo e pode sujar a vitrine ou a mercadoria.

04 – A reação de Amarelinho é semelhante tanto na primeira loja quanto na segunda. Por quê?
      Porque recebeu o mesmo tratamento por parte dos vendedores, ofereceu a eles uma mesma resposta, ou seja, seu sonho de vingança.

05 – A atitude de Amarelinho em relação a mulher que lhe deu uma nota para comprar um doce foi diferente. Por quê?
      Porque ele reagiu de forma diferente a um tratamento diferente.

06 – A barba do Papai Noel não parecia nascer do rosto dele. Parecia falsa.
a)   Por que Amarelinho deu de ombros, não se importou com a indiferença de Papai Noel?
Porque para Amarelinho, o Papai Noel era falso tanto por sua barba falsa, quanto por sua atitude de desprezo.

b)   O presente da mulher e a indiferença do Papai Noel não parecem afetar muito Amarelinho. Por quê?
Porque ele está habituado a receber auxílio que não auxilia realmente e indiferença. Ambos fazem parte de sua história e contribuem para que sua vida seja o que é.

07 – As atitudes das personagens podem ser consideradas atos de violência? Justifique sua resposta.
      Resposta pessoal do aluno.       
         

sexta-feira, 6 de dezembro de 2019

POEMA: A DOCE CANÇÃO - CECÍLIA MEIRELES -COM GABARITO

Poema: A Doce Canção
           Cecília Meireles

Pus-me a cantar minha pena
com uma palavra tão doce,
de maneira tão serena,
que até Deus pensou que fosse
felicidade – e não pena.

Anjos de lira dourada
debruçaram-se da altura.
Não houve, no chão, criatura
de que eu não fosse invejada,
pela minha voz tão pura.

Acordei a quem dormia,
fiz suspirarem defuntos.
Um arco-íris de alegria
da minha boca se erguia
pondo o sonho e a vida juntos.

O mistério do meu canto,
Deus não soube, tu não viste.
Prodígio imenso do pranto:
– todos perdidos de encanto,
só eu morrendo de triste!

Por assim tão docemente
meu mal transformar em verso,
oxalá Deus não o ausente,
para trazer o Universo
de pólo a pólo contente!

                                MEIRELES, Cecília. “A doce canção”. In: Obra poética. Rio de Janeiro, Nova Aguilar, 1983. p. 156.
Fonte: Livro- Português – Série – Novo Ensino Médio – Vol. único. Ed. Ática – 2000- p. 366-7.

Entendendo o poema:

01 – Que características o eu lírico atribui ao seu canto?
      O eu lírico assinala que utiliza palavras doces e se expressa de maneira serena e com voz pura.

02 – Por que se pode dizer que não havia motivo par as outras criaturas sentirem inveja do canto?
      Porque, apesar de belo, o canto expressa uma profunda tristeza.

03 – Qual o temor manifestado pelo eu lírico na última estrofe?
      O temor de que Deus aumente o seu sofrimento (mal).