sábado, 30 de maio de 2020

FÁBULA: URUBUS E SABIÁS - RUBEM ALVES - COM GABARITO

Fábula: Urubus e sabiás
             Rubem Alves


    “Tudo aconteceu numa terra distante, no tempo em que os bichos falavam... Os urubus, aves por natureza becadas, mas sem grandes dotes para o canto, decidiram que, mesmo contra a natureza eles haveriam de se tornar grandes cantores.

E para isto fundaram escolas e importaram professores, gargarejaram dó-ré-mi-fá, mandaram imprimir diplomas, e fizeram competições entre si, para ver quais deles seriam os mais importantes e teriam a permissão para mandar nos outros. Foi assim que eles organizaram concursos e se deram nomes pomposos, e o sonho de cada urubuzinho, instrutor em início de carreira, era se tornar um respeitável urubu titular, a quem todos chamam de Vossa Excelência. Tudo ia muito bem até que a doce tranquilidade da hierarquia dos urubus foi estremecida. A floresta foi invadida por bandos de pintassilgos tagarelas, que brincavam com os canários e faziam serenatas para os sabiás... Os velhos urubus entortaram o bico, o rancor encrespou a testa, e eles convocaram pintassilgos, sabiás e canários para um inquérito.
        — Onde estão os documentos dos seus concursos? E as pobres aves se olharam perplexas, porque nunca haviam imaginado que tais coisas houvessem. Não haviam passado por escolas de canto, porque o canto nascera com elas. E nunca apresentaram um diploma para provar que sabiam cantar, mas cantavam simplesmente...

        — Não, assim não pode ser. Cantar sem a titulação devida é um desrespeito à ordem.
        E os urubus, em uníssono, expulsaram da floresta os passarinhos que cantavam sem alvarás...”.
        MORAL: Em terra de urubus diplomados não se houve canto de sabiá.

O texto acima foi extraído do livro "Estórias de quem gosta de ensinar — O fim dos Vestibulares", editora Ars Poética — São Paulo, 1995, pág. 81.
Entendendo a fábula:

01 – Identifique o fato que motivou a fábula.
      Foi motivado pelo interesse dos urubus em se tornarem cantores, apesar de se tratar de algo que não faz parte da sua natureza.

02 – No trecho: “Os urubus, aves por natureza becadas, mas sem grandes dotes para canto, decidiram que, mesmo contra a natureza, eles haveriam de se tornar grandes cantores”.
        As palavras e a passagem em destaque exprimem, respectivamente, relações de:
a)   Oposição, finalidade e consequência.
b)   Adversidade, finalidade e concessão.
c)   Adição, lugar e exceção.
d)   Oposição, local e condição.
e)   Adversidade, objetividade e exclusão.

Considere o trecho a seguir par responder:
“E as pobres aves se olharam perplexas, porque nunca haviam imaginado que tais coisas houvessem”.
03 – Não mudaria o sentido da frase, se substituíssemos a palavra “perplexas” por:
a)   Tristes.
b)   Magoadas.
c)   Felizes.
d)   Comprometidas.
e)   Hesitantes.

04 – Sobre a moral da fábula: “Em terra de urubus diplomados não se ouve canto de sabiá”, assinale a opção correta.
a)   O período é composto por duas orações.
b)   O sujeito do verbo ouvir é canto de sabiá.
c)   Nessa frase, houve exploração da ênclise.
d)   O texto está na voz ativa.
e)   “... de urubus diplomados” é sujeito simples.

05 – Assinale a alternativa que aponte o clímax da fábula.
a)   Os urubus decidiram se tornar cantores.
b)   Os urubus fizeram competições de canto entre si.
c)   Os pássaros invadiram a floresta.
d)   Os velhos urubus convocaram os pássaros para um inquérito.

06 – Como termina a fábula?
a)   “... quando ‘Os velhos urubus entortaram o bico, o rancor encrespou a testa...’”.
b)   “[...] quando as pobres aves se olharam perplexas [...]”
c)   “[...] quando apresentaram um diploma para provar que sabiam cantar [...]”
d)   “[...] quando os urubus expulsaram da floresta os passarinhos que cantavam sem alvarás”.

07 – Julgue se os itens abaixo estão corretos (C) quanto aos aspectos semânticos e gramaticais. (E) errado.
a)   (E) “Cantar sem titulação devida é um desrespeito à ordem”. Em tal contexto, eram ordeiros apenas os intitulados.
b)   (E) O segmento “o rancor encrespou a testa” caracteriza uma comparação como figura de linguagem.
c)   (E) O termo “gargarejaram” pode ser substituído por “gargantearam” sem prejuízos de ordem semântica.
d)   (E) A mudança topológica do adjetivo acarreta variações semânticas no segmento “Os velhos urubus” assim como em: os velhos marinheiros e marinheiros velhos.

08 – Julgue os itens quanto aos aspectos morfossintáticos e semânticos. (C) correto. (E) errado.
a)   (E) O texto classifica-se como fábula ou um apólogo, por atribuir a seres inanimados características de seres humanos.
b)   (E) O objetivo dos urubus era coibir o direito de canto dos pintassilgos; caçá-los, portanto.
c)   (E) Tornou-se impossível urubus e pintassilgos coabitarem a mesma floresta.
d)   (E) Trata-se de uma estrutura exclusivamente dissertativa.

09 – Julgue os itens com (C) correta e (E) errada.
a)   (C) “O saber institucionalizado não aceita outras formas de saber que não as controladas por lei”. A proposição identifica-se com a moral do texto.
b)   (C) O poder dos urubus pode ser comparado ao das corporações ditatoriais que não aceitam o sucesso de quem não podem controlar.
c)   (C) Considerando a ordem estabelecida na floresta pelos urubus, pode-se afirmar que os canários, pintassilgos e sabiás são amorais.
d)   (E) A exceção dos sabiás, os outros pássaros poderiam viver na floresta desde que participassem dos concursos.

POEMA: AULA DE LEITURA - RICARDO AZEVEDO - COM GABARITO

Poema: Aula de leitura
         
    Ricardo Azevedo

A leitura é muito mais
do que decifrar palavras.
Quem quiser parar pra ver
pode até se surpreender:
vai ler nas folhas do chão,
se é outono ou se é verão;
nas ondas soltas do mar,
se é hora de navegar;
e no jeito da pessoa,
se trabalha ou se é à-toa;
na cara do lutador,
quando está sentindo dor;
vai ler na casa de alguém
o gosto que o dono tem;
e no pêlo do cachorro,
se é melhor gritar socorro;
e na cinza da fumaça,
o tamanho da desgraça;
e no tom que sopra o vento,
se corre o barco ou vai lento;
também na cor da fruta,
e no cheiro da comida,
e no ronco do motor,
e nos dentes do cavalo,
e na pele da pessoa,
e no brilho do sorriso,
vai ler nas nuvens do céu,
vai ler na palma da mão,
vai ler até nas estrelas
e no som do coração.
Uma arte que dá medo
é a de ler um olhar,
pois os olhos têm segredos
difíceis de decifrar.

                       Poema extraído do livro: AZEVEDO, Ricardo. Dezenove poemas desengonçados. São Paulo: Ática,1999.
Entendendo o poema:

01 – Depois de ler o poema, e considerar o passo a passo do processo para a leitura do texto verbal, podemos afirmar que:
I – Trata-se de um poema, isto é, um texto no gênero poético (forma e conteúdo da expressão) que diz, em forma de verbos agrupados em estrofes, como é o ato de ler.
II – Nesse processo entra em jogo a cultura, o nível de escolaridade, a visão de mundo, o conhecimento da língua e dos gêneros textuais.
III – Ler é dar sentido à vida, a si mesmo, ao mundo. Ler é a habilidade de decifrar os sinais gráficos da língua (as letras / os signos verbais ou não verbais) e atribuir sentidos a eles.
IV – A leitura só pode ser realizada a partir de textos verbais.

Está correto o que se diz em:
a)   I e II.
b)   III e IV.
c)   I, II e III.
d)   II e IV.
e)   II, III e IV.

02 – O texto poético foi escrito de uma determinada forma. Assinale a correta.
(X) Verso.
(   ) Prosa.

03 – Comente de acordo com o poema, o que é possível ler:
a)   Nas folhas do chão.
As estações do ano.

b)   Nas ondas do mar.
Se o mar está calmo ou não.

c)   Na casa de alguém.
O gosto que a pessoa tem.

d)   Na cinza da fumaça.
O que está queimando.

e)   No cheiro da comida.
Se é gostosa ou não.

f)    No tom que sopra o vento.
Se o vento é fraco ou forte.

g)   No brilho do sorriso.
Se a pessoa está feliz...


CRÔNICA: COBRANÇA - MOACYR SCLIAR - COM GABARITO


Crônica: COBRANÇA
                Moacyr Scliar

      Ela abriu a janela e ali estava ele, diante da casa, caminhando de um lado para outro. Carregava um cartaz, cujos dizeres atraíam a atenção dos passantes: "Aqui mora uma devedora inadimplente".
  ― Você não pode fazer isso comigo ― protestou ela.
   ― Claro que posso ― replicou ele.  ― Você comprou, não pagou. Você é uma devedora inadimplente. E eu sou cobrador. Por diversas vezes tentei lhe cobrar, você não pagou.
 ― Não paguei porque não tenho dinheiro. Esta crise...
 ― Já sei ― ironizou ele. ― Você vai me dizer que por causa daquele ataque lá em Nova York seus negócios ficaram prejudicados. Problema seu, ouviu? Problema seu. Meu problema é lhe cobrar. E é o que estou fazendo.
        ― Mas você podia fazer isso de uma forma mais discreta...
        ― Negativo. Já usei todas as formas discretas que podia. Falei com você, expliquei, avisei. Nada. Você fazia de conta que nada tinha a ver com o assunto. Minha paciência foi se esgotando, até que não me restou outro recurso: vou ficar aqui, carregando este cartaz, até você saldar sua dívida.
        Neste momento começou a chuviscar.
        ― Você vai se molhar ― advertiu ela. ― Vai acabar ficando doente.
        Ele riu, amargo:
        ― E daí? Se você está preocupada com minha saúde, pague o que deve.
        ― Posso lhe dar um guarda-chuva...
        ― Não quero. Tenho de carregar o cartaz, não um guarda-chuva.
        Ela agora estava irritada:
        ― Acabe com isso, Aristides, e venha para dentro. Afinal, você é meu marido, você mora aqui.
        ― Sou seu marido ― retrucou ele ― e você é minha mulher, mas eu sou cobrador profissional e você é devedora. Eu avisei: não compre essa geladeira, eu não ganho o suficiente para pagar as prestações. Mas não, você não me ouviu. E agora o pessoal lá da empresa de cobrança quer o dinheiro. O que quer você que eu faça? Que perca meu emprego? De jeito nenhum. Vou ficar aqui até você cumprir sua obrigação.
        Chovia mais forte, agora. Borrada, a inscrição tornara-se ilegível. A ele, isso pouco importava: continuava andando de um lado para outro, diante da casa, carregando o seu cartaz.
                                                           Moacyr Sclair
Entendendo a crônica:

01 – Qual é o tema central do texto?
      Trata-se de uma cobrança.

02 – Explique o que a personagem quis dizer com a seguinte frase: “Mas você podia fazer isso de uma forma mais discreta”.
      Porque o cobrador estava diante de sua casa carregando um cartaz que dizia: “Aqui mora uma devedora inadimplente”.

03 – Acabe com isso, Aristides”. O que entendemos ao ler a expressão destacada?
      Que era para ele guardar aquele cartaz e vir para dentro de casa, pois era seu marido e morava ali.

04 – Você acha que o autor escolheu um bom título para o texto? Por quê?
      Resposta pessoal do aluno. Sugestão: Sim, pois desperta a curiosidade para saber de que se trata.

05 – Por que o cobrador insistia na cobrança?
      Porque ele trabalha numa empresa de cobrança.

06 – “Aqui mora uma devedora inadimplente”. A frase apresentada pode ser definida como fato ou opinião?
      Um fato.

07 – Que tipo de linguagem apresenta o texto lido?
      Linguagem informal, pois traz aspectos de oralidade para a escrita: expressão de conversa familiar e íntima, repetições e o pronome “você”.

08 – A quem se referem as expressões em destaque em cada frase a seguir?
a)   “Meu problema é lhe cobrar”.
A devedora.

b)   “Posso lhe dar um guarda-chuva”.
Ao cobrador.

09 – A atitude do cobrador é gerada por qual fato ocorrido no texto?
      Sua mulher comprou uma geladeira e estava com as prestações atrasadas.

10 – Quem são as personagens da crônica?
      O cobrador e a devedora inadimplente.

11 – Que elemento surpresa o cronista introduz na história?
      O marido cobrador, o Aristides.

12 – O texto traz um recurso de desdobramento dos papéis. Explique.
      São os papeis (marido/mulher; cobrador / devedora).
                              



quarta-feira, 27 de maio de 2020

MÚSICA(ATIVIDADES): PERFUME DE FLOR - RASTACLONE - COM GABARITO

Música(Atividades): Perfume De Flor
                                                    Rastaclone

Perfume de flor, invadiu a minha janela
Só lembrei de você, minha vida minha rosa mais bela

Que no meu coração sua flor se fez jardim
Que a natureza trouxe no presente pra mim (bis)

O Perfume de Flor, só sinto quando fico com ela
É tão bom viver, só vivo quando vivo por ela
Olhando o oceano, um arco-íris no fim
Só penso em você aqui bem perto de mim
Eu olho o oceano, um arco-íris no fim
Só penso em vc aqui bem perto de mim

Perfume de flor, só sinto quando fico com ela
É tão bom viver, só vivo quando vivo por ela

                                        Composição: Bob Reggae

Entendendo a canção:

01 – Marque a alternativa correta. A canção aborda:
a)   O perfume de modo similar, figurativo e subjetivo.
b)   A ideia de que há perfumes adequados e peculiares.
c)   A categorização dos perfumes femininos e naturais
d)   A importância de sentir diferentes aromas de flores.
e)   A beleza das flores de forma idêntica, literal e objetiva.

02 – Qual o cenário em que começa a história?
      Uma janela.

03 – Que tema é abordado na canção?
      Fala da saudade que o eu lírico sente de sua amada.

04 – O eu lírico é feminino ou masculino? Explique extraindo um verso ou uma palavra da canção que comprove sua resposta.
      Masculino. “O Perfume de Flor, só sinto quando fico com ela”.

05 – Que verso da canção expressa mais claramente o entusiasmo e paixão do eu lírico pela pessoa amada?
      “É tão bom viver, só vivo quando vivo por ela”.

06 – De que forma se apresentam os efeitos sonoros na canção?
      Apresentam no final dos versos, em forma de rima.

07 – As repartições utilizadas favorecem a construção da canção?
      Tais repetições são a base para os efeitos da musicalidade ou eufonia.


CONTO: UMA GALINHA - CLARICE LISPECTOR - COM GABARITO

Conto: Uma Galinha
           
              Clarice Lispector

      Era uma galinha de domingo. Ainda viva porque não passava de nove horas da manhã.
    Parecia calma. Desde sábado encolhera-se num canto da cozinha. Não olhava para ninguém, ninguém olhava para ela. Mesmo quando a escolheram, apalpando sua intimidade com indiferença, não souberam dizer se era gorda ou magra. Nunca se adivinharia nela um anseio.
        Foi, pois uma surpresa quando a viram abrir as asas de curto voo, inchar o peito e, em dois ou três lances, alcançar a murada do terraço. Um instante ainda vacilou — o tempo da cozinheira dar um grito — e em breve estava no terraço do vizinho, de onde, em outro voo desajeitado, alcançou um telhado. Lá ficou em adorno deslocado, hesitando ora num, ora noutro pé. A família foi chamada com urgência e consternada viu o almoço junto de uma chaminé. O dono da casa, lembrando-se da dupla necessidade de fazer esporadicamente algum esporte e de almoçar, vestiu radiante um calção de banho e resolveu seguir o itinerário da galinha: em pulos cautelosos alcançou o telhado onde está, hesitante e trêmula, escolhia com urgência outro rumo. A perseguição tornou-se mais intensa.
        De telhado a telhado foi percorrido mais de um quarteirão da rua. Pouco afeita a uma luta mais selvagem pela vida, a galinha tinha que decidir por si mesma os caminhos a tomar, sem nenhum auxílio de sua raça. O rapaz, porém, era um caçador adormecido. E por mais ínfima que fosse a presa o grito de conquista havia soado.
        Sozinha no mundo, sem pai nem mãe, ela corria, arfava, muda, concentrada. Às vezes, na fuga, pairava ofegante num beirai de telhado e enquanto o rapaz galgava outros com dificuldade tinha tempo de se refazer por um momento. E então parecia tão livre.
        Estúpida, tímida e livre. Não vitoriosa como seria um galo em fuga.
        Que é que havia nas suas vísceras que fazia dela um ser? A galinha é um ser. É verdade que não se poderia contar com ela para nada. Nem ela própria contava consigo, como o galo crê na sua crista. Sua única vantagem é que havia tantas galinhas que morrendo uma surgiria no mesmo instante outra tão igual como se fora a mesma.
        Afinal, numa das vezes em que parou para gozar sua fuga, o rapaz alcançou-a. Entre gritos e penas, ela foi presa. Em seguida carregada em triunfo por uma asa através das telhas e pousada no chão da cozinha com certa violência. Ainda tonta, sacudiu-se um pouco, em cacarejos roucos e indecisos.
        Foi então que aconteceu. De pura afobação a galinha pôs um ovo. Surpreendida, exausta. Talvez fosse prematuro. Mas logo depois, nascida que fora para a maternidade, parecia uma velha mãe habituada. Sentou-se sobre o ovo e assim ficou, respirando, abotoando e desabotoando os olhos.
        Seu coração, tão pequeno num prato, solevava e abaixava as penas, enchendo de tepidez àquilo que nunca passaria de um ovo. Só a menina estava perto e assistiu a tudo estarrecida. Mal, porém conseguiu desvencilhar-se do acontecimento, despregou-se do chão e saiu aos gritos:— Mamãe, mamãe, não mate mais a galinha, ela pôs um ovo! Ela quer o nosso bem!
        Todos correram de novo à cozinha e rodearam mudos a jovem parturiente. Esquentando seu filho, esta não era nem suave, nem arisca, nem alegre, nem triste, não era nada, era uma galinha. O que não sugeria nenhum sentimento especial. O pai, a mãe e a filha olhavam já há algum tempo, sem propriamente um pensamento qualquer. Nunca ninguém acariciou uma cabeça de galinha. O pai afinal decidiu-se com certa brusquidão:
        — Se você mandar matar esta galinha nunca mais comerei galinha na minha vida!
        — Eu também! jurou a menina com ardor. A mãe, cansada, deu de ombros.
        Inconsciente da vida que lhe fora entregue, a galinha passou a morar com a família. A menina, de volta do colégio, jogava a pasta longe sem interromper a corrida para a cozinha. O pai de vez em quando ainda se lembrava: "E dizer que a obriguei a correr naquele estado!" A galinha tornara-se a rainha da casa. Todos, menos ela, o sabiam. Continuou entre a cozinha e o terraço dos fundos, usando suas duas capacidades: a de apatia e a do sobressalto.
        Mas quando todos estavam quietos na casa e pareciam tê-la esquecido, enchia-se de uma pequena coragem, resquícios da grande fuga — e circulava pelo ladrilho, o corpo avançando atrás da cabeça, pausado como num campo, embora a pequena cabeça a traísse: mexendo – se rápida e vibrátil, com o velho susto de sua espécie já mecanizado.
        Uma vez ou outra, sempre mais raramente, lembrava de novo a galinha que se recortara contra o ar à beira do telhado, prestes a anunciar.
        Nesses momentos enchia os pulmões com o ar impuro da cozinha e, se fosse dado às fêmeas cantar, ela não cantaria, mas ficaria muito mais contente.
        Embora nem nesses instantes a expressão de sua vazia cabeça se alterasse. Na fuga, no descanso, quando deu à luz ou bicando milho — era uma cabeça de galinha, a mesma que fora desenhada no começo dos séculos.
        Até que um dia mataram-na, comeram-na e passaram-se os anos.

Fonte: https:// arquivos.gconcursos.com/prova/arquivo.prova/47449/itame-2015-camara-municipal-de-inhumas-go-arquivista-prova-pdf. Acesso: 06 abr. 2020.
Interpretando e analisando o conto:
01 – Assinale a alternativa correta. “A galinha tornara-se a rainha da casa”.
a)   Por ter tido coragem para fugir da morte;
b)   Por cantar como um galo todas as manhãs;
c)   Por ter botado um ovo, começado a chocá-lo e comovido a todos.
d)   Por ter cabeça de galinha, a mesma que fora desenhada no começo dos séculos.

02 – Se em “Mesmo que ela cante baixinho, fará sucesso” o trecho em negrito fosse substituído por “Mesmo que ela cantasse baixinho”, a continuação correta seria:
a)   Faz sucesso.
b)   Fez sucesso.
c)   Fará sucesso.
d)   Faria sucesso.

03 – Assinale a alternativa em que contém discurso direto:
a)   Era uma galinha de domingo. Ainda viva porque não passava de nove horas da manhã. Parecia calma.
b)   Mal porém conseguiu desvencilhar-se do acontecimento, despregou-se do chão e saiu aos gritos: – Mamãe, mamãe, não mate mais a galinha, ela pôs um ovo! Ela quer o nosso bem!
c)   Uma vez ou outra, sempre mais raramente, lembrava de novo a galinha que se recortara contra o ar a beira do telhado, prestes a anunciar.
d)   Afinal, numa das vezes em que parou para gozar sua fuga, o rapaz alcançou-a. Entre gritos e penas, ela foi presa.

04 – Em todos os trechos citados do texto há adjetivo, exceto em:
a)   [...] não souberam dizer se era gorda ou magra.
b)   Sozinha no mundo, sem pai nem mãe, ela corria, arfava, muda, concentrada.
c)   Até que um dia mataram-na, comeram-na e passaram-se os anos.
d)   [...] hesitante e trêmula, escolhia com urgência outro rumo.

05 – Assinale a alternativa correta no que se refere ao uso da vírgula – “O rapaz, porém, era um caçador adormecido”.
a)   Para isolar o vocativo.
b)   Para isolar o aposto.
c)   Para separar conjunções.
d)   Para separar adjuntos adverbiais deslocados.

06 – Por que, afinal, a família desistiu de comer a galinha? E por que, tempos depois, eles decidem comê-la?
      Exemplo de hipóteses interpretativas: A família desistiu de comer a galinha porque percebeu que ela era agora necessária para dar vida ao ovo que ela chocava. Depois eles decidem comê-la porque ela não está mais chocando ovo nenhum.   
  
07 – Às vezes, a narrativa do conto oscila entre a humanização e animalização da galinha. Cite trechos do texto que comprovam essa afirmativa.
      Parecia calma. Desde sábado encolhera-se num canto da cozinha. Não olhava para ninguém, ninguém olhava para ela. Mesmo quando a escolheram, apalpando sua intimidade com indiferença, não souberam dizer se era gorda ou magra. Nunca se adivinharia nela um anseio.

08 – Percebe-se, no conto, que o narrador(a) faz uma projeção da galinha para uma mulher / mãe que gostaria muito de não ter o sentido de sua vida reduzido à maternidade. Não quer (ou não ousa) cantar como o galo (ou cantar de galo), mas ficaria feliz em saber que pode. Qual a relação da projeção feita pelo narrador(a) com as mulheres anuais? Justifique sua resposta.
      As mulheres, atualmente, não gostam de ver suas vidas reduzidas à maternidade. Muitas mulheres amam o papel da maternidade, mas a maioria delas desejam ser vistas, não apenas como mães, mas como pessoas independentes, capazes, boas profissionais, etc.

09 – Qual é a(s) personagens principal do conto?
      A galinha.

10 – Em que tempo e em que lugar se passa essa narrativa? Justifique sua resposta.
      Tempo psicológico – Terceira pessoa. Era uma galinha de domingo. Ainda viva porque não passava de nove horas da manhã. Parecia calma. Desde sábado encolhera-se num canto da cozinha.
      Na casa da família – na murada do terraço, no terraço do vizinho – Foi pois uma surpresa quando a viram abrir as asas de curto voo, inchar o peito e, em dois ou três lances, alcançar a murada do terraço. Um instante ainda vacilou – o tempo da cozinheira dar um grito – e em breve estava no terraço do vizinho, de onde, em outro voo desajeitado, alcançou um telhado. Lá ficou em adorno deslocado, hesitando ora num, ora noutro pé.

11 – Que tipo de narrador está presente nesta narrativa? Justifique sua resposta.
      Narrador observador.

12 – Faça um resumo desse conto em, no máximo, cinco linhas, contando com suas próprias palavras o que você leu.
      Resposta pessoal do aluno.