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sábado, 23 de março de 2019

CRÔNICA: HISTÓRIA PARA O FLÁVIO - RACHEL DE QUEIROZ - COM QUESTÕES GABARITADAS

Crônica: História para o Flávio
                     Rachel de Queiroz

        "Morava na serra do Estevão um velho por nome Luiz Gonçalves, caçador e famoso matador de onças. Fazendo as contas, dizia que só de onça tigre já matara onze, das pixunas vinte e seis, das pintadas quarenta; maçaroca, suçuarana, onça-vermelha nem contava — para ele já nem era onça, era gato. (...)
        Mestre Luiz queria bem as duas coisas no mundo: à sua espingarda Lazarina, que nunca lhe fizera uma vergonha, e ao seu filho Luizinho, agora com quinze anos, e que o pai andava ensinando nas artes de caçador. (...)
        Ora, um dia mestre Luís recebeu recado do coronel Zé Marinho do Barro vermelho para que fosse matar uma pintada que lhe andava comendo os carneiros e até mesmo se atrevera a sangrar um bezerro no pátio da fazenda. (...) assim que a noite fechou ele amarrou um cabrito mesmo no pé do serrote onde maldava mais que a onça pintada morasse, e ficou na espera junto com o Luizinho e o cachorro onceiro.
        (...) até que, com uma hora de escalar serrote, deu de repente com a entrada da furna.
        O cachorro pôs-se a gemer, ansioso, e de lá de dentro o esturro da bicha acuada foi respondendo. Mestre Luís preparou a forquilha, o chuço, a faca. Mas quando se voltou para chamar o Luizinho viu que o menino apavorado se encolhia num desvão de pedra, amarelo de medo.
        Aí deu no velho, uma raiva danada e ele resolveu ensinar o filho de uma vez por todas.
        Chamou de manso:
        -- Vem cá Luís, não tem medo, quem vai matar a onça sou eu.
        Depois de muito rogo o menino chegou, tremendo. O velho de supetão jogou as armas na boca da furna, e com um pescoção empurrou para dentro o Luizinho. Pegou um pedaço de laje, tapou a entrada das lapa, e gritou para o rapaz:
        -- Filho meu não tem medo de onça, seu mal-ensinado! Vou voltar para minha rede de espera, e não me apareça de volta sem levar o couro da pintada!
        Realmente ao raiar do dia Luizinho apareceu. No ombro trazia as armas, no chão arrastava o couro da onça. Tinha a cara tão lanhada das unhas da fera que quase não se lhe via a feição. A roupa virara molambo, e o chapéu se perdera. Quando ele viu o pai, foi levantando a mão para tomar-lhe a benção. Mas no meio se arrependeu.
        -- A benção não senhor, que nunca mais lhe tomo a benção. Benção se toma ao pai, e quem tranca o filho numa furna com uma onça não é pai, é carrasco! Tai o couro da pintada, e o senhor arranje outro, porque nunca mais me verá.
        Dito isso rebolou o couro nos pés do velho, deu meia-volta e saiu correndo, sem nem ao menos olhar para trás. (...)”

QUEIROZ, Rachel de. O brasileiro perplexo: histórias e crônicas.
Rio de Janeiro: Editora do Autor, 1963.
Entendendo a crônica:

01 – Os primeiros parágrafos são usados para descrever mestre Luiz e seu filho. É o estabelecimento da situação inicial. Identifique-a.
      Um caçador famoso e seu filho de quinze anos vivem na serra do Estevão.

02 – Identifique a quebra da situação inicial, o momento em que algo diferente acontece.
      O dia que mestre Luiz recebeu recado do Coronel Zé Marinho do Barro Vermelho para matar uma onça que estava comendo carneiros em sua fazenda.

03 – O desenvolvimento da história ocorre entre a situação inicial e o estabelecimento do conflito, ou seja, o estabelecimento de uma situação-limite. Identifique o desenvolvimento e o conflito.
      O desenvolvimento começa quando mestre Luiz e seu filho saem em busca da onça e vai até o momento em que mestre Luiz percebe que o filho está com medo.
      O conflito: A descoberta, por mestre Luiz, de que Luizinho estava com medo da onça.

04 – Identifique o final do conflito estabelecido na história.
      Luizinho vence a onça e desaparece no mundo.

05 – O que é possível saber a respeito do espaço e do tempo em que ocorre a história?
      Sabe-se que era uma serra em que havia uma caverna e aproximadamente uma noite, porque o mestre sobe a serra no início da noite e Luizinho aparece ao raiar o dia.

06 – Imagine a história contada por outro narrador. Identifique diferenças que poderia haver se ela fosse contada:
a)   Por Luís Gonçalves.
Se o Luiz Gonçalves fosse o narrador, talvez fosse possível perceber sua zanga, seu arrependimento, ou sua conformação. O texto poderia indicar uma tentativa de justificar seus atos, ou mesmo de destaque para sua culpa.

b)   Por Luizinho.
Se o Luizinho fosse o narrador, talvez fosse possível identificar mágoa em relação ao pai, indiferença, perdão, saudades.

c)   Pela onça.
Se o narrador fosse a onça personificada, ou o seu “fantasma”, aa história seria contada de uma perspectiva totalmente diferente. O destino do Luizinho, por exemplo, talvez sequer fosse mencionado.
  


terça-feira, 18 de setembro de 2018

TEXTO: RIQUEZA - RACHEL DE QUEIROZ, in CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE - COM GABARITO

Texto: RIQUEZA 

    Foi problema que sempre me interessou, esse de ser rico. Ser rico – quer dizer, ter em mãos as possibilidades de poder e os privilégios que o dinheiro dá – é o sonho universal das criaturas. Todo o mundo precisa, quer dinheiro, o pobre para enganar a miséria, o rico para ficar riquíssimo, o pecador para satisfazer seus desejos, o santo para as suas caridades. E isso não é para admirar, pois o dinheiro representa realmente o denominador comum de tudo que tem valor material nesta vida, inclusive coisas de caráter subjetivo, como o poder, o prestígio, o renome, etc. Diz que até o amor. 
        Tudo isso é o dinheiro. E contudo não há coisa mais limitada do que o dinheiro, a riqueza. Pois que ele só nos vale até certo ponto, ou seja, até se chocar com os limites dessa coisa intransponível que se chama a natureza humana. 
        Você por exemplo, que tem o seu contadíssimo orçamento mensal, para você dinheiro é um sonho, representa mundos impossíveis – conforto, luxo, viagens, prazeres – o ilimitado. Querer uma coisa e simplesmente assinar um cheque para obter. Um jardim, um apartamento de luxo, um grande automóvel, ou mesmo o seu avião particular. Boates, teatros. Nova Iorque, Paris! A roda da grã-finagem internacional, que também se chama o “café-soçaite” ou os idle-rich, os ricos ociosos. Jogar Bridge com a Duquesa de Windsor, dançar com o Ali Khan. 
        E entretanto é bom notar que isso tem um limite bastante rígido. Fora uma cota de prazeres e conquistas sociais, no fundo mais subjetivas do que objetivas, além não se pode ir. A riqueza, sendo capaz de nos proporcionar apenas o que está à venda, não nos pode dar nada de genuíno, de autêntico, de natural. Se você perde a perna num acidente, o dinheiro lhe dará a melhor perna artificial do mundo – mas artificial. Tanto no milionário como no pobrezinho com perna de pau, o coto mutilado é o mesmo, porque a natureza não se vende. E assim, quem compra cabelos supostos não pode esperar razoavelmente senão uns postiços, como já o dizia José de Alencar. E quem fura um olho, possua embora o dinheiro do Rockefeller, terá que se arranjar com um olho de vidro, como qualquer de nós. (...)
        Moralidade: Não tenha inveja dos ricos. Não tenha inveja de ninguém, que é melhor. Mas se quer invejar, inveje o simples abastado que pode satisfazer as suas necessidades e, na medida do possível, alguns dos seus sonhos. E quando nem a abastança pode ser atingida, um bom consolo para o pobre é pensar que, quer com o seu salário mínimo, quer com as rendas vertiginosas do tubarão, tanto um como o outro estão trancados nesta nossa mesma prisão de carne, este “saco de tripas” de que falava o velho Gorki; e se dentro dele pouco podemos, fora dele, então, nada nos adianta, nem dinheiro, nem grandeza, nem poderio. Aí, só a terra fria, nada mais. 

               Rachel de Queiroz, in Carlos Drummond de Andrade e outros.
Quatro Vozes. Rio de Janeiro: Record, 1996.

Entendendo o texto:
01 – De acordo com o texto, qual o significado das palavras abaixo:
·        Privilégios: vantagens.
·        Subjetivas: pessoais, individuais.
·        Denominador comum: traço comum.
·        Ilimitado: o que não tem limite, fim.
·        Vertiginosa: extraordinárias, rápidas.
·        Idle-rich: rico preguiçoso.
·        Gorki: escritor russo.

02 – Coloque as palavras abaixo em ordem alfabética, relacionando-as aos seus significados.
        Rígido – renome – genuíno – cota – universal – abastado.
a)   Abastado: rico, endinheirado.
b)   Cota: porção determinada.
c)   Genuíno: verdadeiro, legítimo, autêntico.
d)   Renome: fama, nome, boa reputação.
e)   Rígido: inflexível, rigoroso.
f)    Universal: geral, mundial, de todo o universo.

03 – Assinale em que sentido foram empregadas as palavras rendas e tubarão na frase: “... as rendas vertiginosas do tubarão...”
(   ) Tipo de tecido com malhas abertas / ricaço.
(X) Lucros / industrial ou comerciante muito rico e que se serve de quaisquer meios para aumentar seus lucros.
(   ) Rendimentos / peixe do mar de grande porte.

04 – Relacione os antônimos:
(1)  Abastado.                    (6) Flexível.
(2)  Artificial.                      (4) Ativo.
(3)  Limitado.                     (2) Natural.
(4)  Ocioso.                        (1) Pobre.
(5)  Vertiginoso.                 (3) Ilimitado.
(6)  Rígido.                         (5) Vagaroso.

05 – O que é ser rico, segundo a autora?
      É ter em mãos as possibilidades de poder e os privilégios que o dinheiro dá.

06 – Segundo a autora, para que o pobre, o rico, o pecador e o santo querem dinheiro?
      O pobre, para enganar a miséria; O rico, para ficar riquíssimo; O pecador, para satisfazer seus desejos; O santo, para as suas caridades.

07 – Segundo o texto, o que mais proporciona o dinheiro, além de coisas materiais?
      Poder, prestígio, renome e até amor.

08 – Segundo o texto, para muitas pessoas até o amor pode sofrer influência do dinheiro. E para você? Que tipo de amor pode sofrer tal influência?
      Resposta pessoal do aluno.

09 – A autora divide as pessoas em três grupos, de acordo com a sua condição econômica: o pobre, o abastado e o rico. Como ela define cada um desses grupos?
      O pobre: é aquele que recebe salário mínimo e vive, muitas vezes, na miséria.
      O abastado: é aquele que possui o bastante para satisfazer suas necessidades e alguns de seus sonhos.
      O rico: é aquele que tem em mãos a possibilidade de poder e os privilégios que o dinheiro dá.

10 – Você concorda com essa classificação? Por quê?
      Resposta pessoal do aluno.

11 – Para a autora, o dinheiro é coisa limitada. Por quê?
      Porque não pode comprar tudo, como, por exemplo, a saúde perdida, além de ser impotente contra a morte.

12 – Explique o sentido da frase: “A natureza não se vende”.
      O dinheiro não restitui o que a natureza nos tira, por exemplo: a juventude, um órgão ou membro do corpo.

13 – Assinale o item que melhor resume a mensagem do texto, segundo a autora.
(   ) O dinheiro não consegue restituir o que a natureza nos tira.
(X) A condição econômica determina a distância e o contraste entre ricos e pobres, mas a condição humana os aproxima e os iguala.
(   ) O dinheiro nos leva à conquista do poder, do prestígio e da fama.