Conto: Epílogo – Emília no país da gramática
Monteiro Lobato
Quando Emília voltou para onde se
achavam os meninos, viu-os em preparativos para o regresso. Estavam com uma
fome danada.
— E o Visconde? — indagou ela. —
Apareceu?
— Está aqui, sim — respondeu Pedrinho
—, mas nega a pés juntos que haja furtado o Ditongo.

Emília aproximou-se do velho sábio, que
tinha uma bochecha inchada de dor de dente.
— Então, onde está o Ditongo, Senhor
Visconde? — interpelou ela, de mãozinha na cintura e olhar firme.
O pobre fidalgo pôs-se a tremer, todo
gago.
— Eu... eu...
— Sim, o senhor mesmo! — disse Emília
com vozinha de verruma. — O senhor raptou o Ditongo Ão e escondeu-o em qualquer
lugar. Vamos. Confesse tudo.
— Eu... eu... — continuava o fidalgo,
que não sabia lutar com a boneca.
Emília refletiu uns instantes. Depois
agarrou-o e fê-lo abrir a boca à força. O Ditongo furtado caiu no chão...
— Vejam! — exclamou Emília, vitoriosa.
— Ele tinha escondido o pobre Ditongo na boca, feito bala. Que vergonha,
Visconde! Um homem da sua importância, grande sábio, ledor de álgebra, a furtar
Ditongo...
— Eu explico tudo — declarou por fim o
Visconde, muito vexado. — O caso é simples. Desde que caí no mar, naquela
aventura no País da Fábula 8 fiquei sofrendo do coração e muito sujeito a
sustos. Ora, este Ditongo me fazia mal. Sempre que gritavam perto de mim uma
palavra terminada em Ão, como Cão, Ladrão, Pão e outras, eu tinha a impressão
dum tiro de canhão ou dum latido de canzarrão. Por isso me veio a ideia de
furtar o maldito Ditongo, de modo que desaparecessem da língua portuguesa todos
esses latidos e estouros horrendos. Foi
isso só. Juro!
Emília ficou radiante de haver
adivinhado.
— Eu não disse? — gritou para os
meninos. — Eu não disse que devia ser isto?
E para o desapontadíssimo fidalgo:
— Pegue o Ditongo e vá botá-lo onde o
achou. Você não é Academia de Letras para andar mexendo na língua...
Meia hora mais tarde já estavam todos
no sítio, contando ao Burro Falante o maravilhoso passeio pelas terras da
Gramática.
OBRA INFANTO-JUVENIL DE
MONTEIRO LOBATO. Edição do Círculo do Livro. Emília no País da Gramática. As figuras de sintaxe. https://www.fortaleza.ce.gov.br.
Entendendo o conto:
01
– Qual era a condição física do Visconde de Sabugosa no momento em que Emília o
reencontrou, e qual era a sua atitude em relação à acusação de furto?
O Visconde estava
com uma bochecha inchada de dor de dente e, apesar disso, negava a pés juntos
que tivesse furtado o Ditongo.
02
– Como Emília conseguiu, de forma vitoriosa, provar que o Visconde havia de
fato escondido o Ditongo "Ão"?
Emília agarrou o
Visconde e fê-lo abrir a boca à força. O Ditongo furtado caiu no chão, pois ele
o tinha escondido "na boca, feito bala."
03
– Qual foi a explicação completa do Visconde para o "crime" de ter
furtado o Ditongo?
O Visconde
explicou que, desde que caíra no mar na aventura no País da Fábula, ficou
sofrendo do coração e sujeito a sustos. O Ditongo "Ão" o fazia mal
porque as palavras que o continham (como Cão, Ladrão ou Pão) lhe davam a
impressão de um "tiro de canhão ou dum latido de canzarrão."
04
– Qual era o objetivo final do Visconde ao tentar remover o Ditongo
"Ão" da língua portuguesa?
O único objetivo
dele era fazer com que "desaparecessem da língua portuguesa todos esses
latidos e estouros horrendos" que o assustavam.
05
– Qual foi a ordem final de Emília ao Visconde e qual o argumento que ela usou
para criticar a sua intromissão na língua?
Emília ordenou
que ele pegasse o Ditongo e fosse botá-lo onde o achou. Ela o repreendeu
dizendo: "Você não é Academia de Letras para andar mexendo na
língua...".
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