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sexta-feira, 28 de abril de 2017

O ATENEU - RAUL POMPEIA - (FRAGMENTO) COM GABARITO

 O ATENEU
Raul Pompéia


        A mais terrível das instituições do Ateneu não era a famosa justiça do arbítrio, não era ainda a cafua, asilo das trevas e do soluço, sanção das culpas enormes. Era o livro das notas.
        Todas as manhãs, infalivelmente, perante o colégio em peso, congregado para o primeiro almoço, às oito horas, o diretor aparecia a uma porta, com a solenidade tarda das aparições, e abria o memorial das partes.
        Um livro de lembranças comprido e grosso, capa de couro, rótulo vermelho na capa, ângulos do mesmo sangue. Na véspera cada professor, na ordem do horário, deixava ali a observação relativa à diligência dos seus discípulos. Era o nosso jornalismo. Do livro aberto, como as sombras das caixas encantadas dos contos de maravilha, nascia, surgia, avultava, impunha-se a opinião do Ateneu. Rainha caprichosa e incerta, tiranizava essa opinião sem corretivo como os tribunais supremos. O temível noticiário, redigido ao sabor da justiça suspeita de professores, muita vez despedidos por violentos, ignorantes, odiosos, imorais, erigia-se em censura irremissível de reputações. O julgador podia ser posto fora por uma evidenciação concludente dos seus defeitos; a difamação estampada era irrevogável.
        E pior é que lavrava o contágio da convicção e surpreendia-se cada um consecutivamente de não haver reparado que era mesmo tão ordinário tal discípulo, tal colega, reforçando-se passivamente o conceito, até consumar-se a obra de vilipêndio quando, por último, o condenado, sem mais uma sugestão de revolta, achava aquilo justo e baixava a cabeça. A opinião é um adversário infernal que conta com a cumplicidade, enfim, da própria vítima.
        Com exceção dos privilegiados, os vigilantes, os amigos do peito, os que dormiam à sombra de uma reputação habilmente arranjada por um justo conchavo de trabalho e cativante doçura, havia para todos uma expectativa de terror antes da leitura das notas. O livro era um mistério.

                   POMPÉIA, Raul. O Ateneu. 9. ed. São Paulo, Ática, 1986. p. 43-4.

Cafua: quarto escuro onde e prendiam os alunos castigados.
Sanção: medida repressiva.
Ao sabor de: conforme a vontade de.
Vilipêndio: desprezo, aviltamento.

1. Em O Ateneu, Raul Pompeia denuncia, como exemplifica o texto:

a) perversidade do sistema educacional           d) vontade de poder do educador.
b) relação perigosa entre os adolescentes.              e) política interesseira da escola.
c) brutalidade física na educação

2.(UFSC) A(s) citação(ões extraída(s) do livro O Ateneu é (são):

a)”Na repartição, os pequenos empregados, amanuenses e escreventes, tendo notícia desse seu estudo do idioma tupiniquim, deram não se sabe por que em chama-lo – Ubirajara.”

b) “…chegou a senhora do diretor, D. Ema. Bela mulher em plena prosperidade dos trinta anos de Balzac, formas alongadas por graciosa magreza, erigindo, porém, o tronco sobre quadris amplos, fortes como a maternidade…”

c)“ Aristarco todo era anúncio. Os gestos calmos, soberanos, era um rei – o autocrata excelso.”

d) “ Ralf pega a velha maleta do Homig, abre-a devagarinho, como quem abre uma gaiola de pássaro, para pegá-lo mansamente.”
e) “Entrei apressado, atravessei o corredor do lado direito e no meu quarto dei com algumas pessoas soltando exclamações. Arrede-as e estanquei; Madalena estava estirada na cama, branca, de olhos vidrados, espuma nos cantos da boca.”

 3. (ITA-SP)  Sobre o Ateneu, de Raul Pompeia, não se pode afirmar que:

a) o colégio Ateneu reflete o modelo educacional da época, bem como os valores da sociedade da época.
b) o romance é narrado em um tom otimista, em terceira pessoa.
c) a narrativa expressa um tom de ironia e ressentimento.
d) as pessoas são descritas, muitas vezes, de forma caricatural.
e) são comuns comparações entre pessoas e animais.

4.(UFTM-MG)
“ Assim,  pela primeira vez irrompe na ficção brasileira a psicologia infantil, visto que o romance romântico preferia focalizar o adolescente ou adulto enredado nas malhas do amor e da honra, reservando à criança um olhar complacente e via de regra puxado ao folclórico e ao melodramático, o que redundava fatalmente em estereotipia e superficialidade.”
Esse filão, que procura aprofundar a análise da alma infantil, foi aberto por:

a)Aluísio Azevedo, em O Mulato
b) José de Alencar, em O Sertanejo.
c) Raul Pompeia, em O Ateneu.
d) Machado de Assis, em Memórias Póstumas de Brás Cubas.
e) Manuel Antônio de Almeida, em Memórias de um Sargento de Milícias.

5.(FGV-SP) Raul Pompeia é consagrado na literatura brasileira pela obra O Ateneu, de largo senso psicológico e preciosidade de estilo. A temática da obra, a par do seu valor literário, é um depoimento que ilustra:
a) as discussões e os conflitos entre os escritores do Ateneu Literário do Rio de  Janeiro, nos fins do Império.
b) a vida social e os hábitos quotidianos da aristocracia imperial, pouco antes da República.
c) a vida escolar no Império Brasileiro, tendo o sistema de internato como modelo educacional de elite na época.
d) a influência da cultura clássica e dos valores greco-romanos na formação da personalidade dos intelectuais brasileiros da época.
e) os hábitos e o comportamento urbano da classe média em ascensão no Rio de Janeiro, após a Proclamação da República.

6.(UFRGS-RS) Leias as afirmações sobre o romance O Ateneu, de Raul Pompeia.
I. Sérgio, em seu relato memorialista, revela a outra face da fachada moralista e virtuosa que circundava O Ateneu, a face em que se incluem a corrupção, o interesse econômico, a bajulação, as intrigas e a homossexualidade entre os adolescentes.
II.A narrativa, ainda que feita na primeira pessoa, evita o comentário subjetivo e as impressões individuais, uma vez que o narrador adota uma postura rigorosa, condizente com o cientificismo da época.
III. Através da figura de Dr. Aristarco, diretor do colégio, com sua retórica pomposa e vazia, Raul Pompeia critica o sistema educacional da época e a hipocrisia da sociedade.
Quais estão corretas:
a) apenas I         b) apenas II    c) apenas I e III     d) apenas II e III     e) I, II e III

7.(Umesp) Assinale a alternativa correta sobre o romance O Ateneu, de Raul Pompeia.
a)O romance se realiza pelo processo memorialista do narrador, permeado por uma profunda visão crítica.
b) Trata-se de uma crônica de saudades, em que o narrador revela, a cada instante, vontade de voltar.
c) O Ateneu representa uma apologia aos colégios internos como forma ideal para a formação do adolescente.
d) Apesar da tentativa de atingir um estilo realista, a obra mantém uma estrutura romântica aos moldes de José de Alencar.
e) Todas as personagens do romance buscam identificar-se.


MEMÓRIAS PÓSTUMAS DE BRÁS CUBAS - MACHADO DE ASSIS - (FRAGMENTO) COM GABARITO

 MEMÓRIAS PÓSTUMAS DE BRÁS CUBAS

        Sim, eu era esse garção bonito, airoso, abastado; e facilmente se imagina que mais de uma dama inclinou diante de mim a fronte pensativa, ou levantou para mim os olhos cobiçosos. De todas porém a que me cativou logo foi uma... uma... não sei se diga; este livro é casto, ao menos na intenção; na intenção é castíssimo. Mas vá lá; ou se há de dizer tudo ou nada. A que me cativou foi uma dama espanhola, Marcela, a “linda Marcela”, como lhe chamavam os rapazes do tempo. E tinham razão os rapazes. Era filha de um hortelão das Astúrias; disse-mo ela mesma, num dia de sinceridade, porque a opinião aceita é que nascera de um letrado de Madrid, vítima da invasão francesa, ferido, encarcerado, espingardeado, quando ela tinha apenas doze anos. Cosas de Espanã. Quem quer que fosse, porém, o pai, letrado ou hortelão, a verdade é que Marcela não possuía a inocência rústica, e mal chegava a entender a moral do código. Era boa moça, lépida, sem escrúpulos, um pouco tolhida pela austeridade do tempo, que lhe não permitia arrastar pelas ruas os seus estouvamentos e berlindas; luxuosa, impaciente, amiga de dinheiro e de rapazes. Naquele ano, morria de amores por um certo Xavier, sujeito abastado e tísico, --- uma pérola.
        Vi-a, pela primeira vez, no Rossio Grande, na noite das luminárias, logo que constou a declaração da independência, uma festa de primavera, um amanhecer da alma pública. Éramos dois rapazes, o povo e eu; vínhamos da infância, com todos os arrebatamentos da juventude. Vi-a sair de uma cadeirinha, airosa e vistosa, um corpo esbelto, ondulante, um desgarre, alguma coisa que nunca achara nas mulheres puras. --- Segue-me, disse ela ao pajem. E eu segui-a, tão pajem como o outro, como se a ordem me fosse dada, deixei-me ir namorado, vibrante, cheio das primeiras auroras. A meio caminho, chamaram-lhe “linda Marcela”; lembrou-me que ouvira tal nome a meu tio João, e fiquei, confesso que fiquei tonto.
        Três dias depois perguntou-me meu tio, em segredo, se queria ir a uma ceia de moças, nos cajueiros. Fomos; era em casa de Marcela. O Xavier, com todos os seus tubérculos, presidia ao banquete noturno, em que eu pouco ou nada comi, porque só tinha olhos para a dona da casa. Que gentil que estava a espanhola! Havia mais uma meia dúzia de mulheres, --- todas de partido, --- e bonitas, cheias de graça, mas a espanhola... O entusiasmo, alguns goles de vinho, o gênio imperioso, estouvado, tudo isso me levou a fazer uma coisa única; à saída, à porta da rua, disse a meu tio que esperasse um instante, e tornei a subir as escadas.
        --- Esqueceu alguma coisa? perguntou Marcela de pé no patamar.
        --- O lenço.
        Ela ia abrir-me caminho para tornar à sala; eu segurei-lhe nas mãos, puxei-a para mim, e dei-lhe um beijo. Não sei se ela disse alguma coisa, se gritou, se chamou alguém; não sei nada; sei que desci outra vez as escadas, veloz como um tufão, e incerto como um ébrio.

                MACHADO DE ASSIS. Memórias de Brás Cubas. In: obra completa.
1.     v. Rio de Janeiro, Nova Aguilar, 1985. p. 532-4. 3v.

1 – Transcreva do primeiro parágrafo as frases e expressões que caracterizam Marcela e que opõem às personagens femininas tipicamente românticas.
        Não possuía a inocência rústica; mal chegara a entender a moral do código; sem escrúpulos; luxuosa; impaciente, amiga do dinheiro e dos rapazes.

2 – Releia o segundo parágrafo. Na caracterização de Marcela o narrador enfatiza a descrição física ou psicológica?
        Descrição física.

3 – A expressão “morrer de amor” (linha 25) é ocorrência muito comum no Romantismo. Nesse texto, ela aparece utilizada em sentido irônico. Copie da linha 24 a expressão responsável por esse efeito irônico.
        “Naquele ano...”

4 – No fim do terceiro parágrafo, o narrador personagem justifica sua atitude (voltar e beijar Marcela), atribuindo-a a três fatores. Quais?
        O entusiasmo, alguns goles de vinho e o gênio imperioso e estouvado.

(FUVEST-SP) As questões 5, 6, 7 e 8 referem-se ao trecho seguinte:
"Algum tempo hesitei se devia abrir estas memórias pelo princípio ou pelo fim, isto é, se poria em primeiro lugar o meu nascimento ou a minha morte. Suposto o uso vulgar seja começar pelo nascimento, duas considerações me levaram a adotar diferente método: a primeira é que eu não sou propriamente um autor defunto, mas um defunto autor, para quem a campa foi outro berço; a segunda é que o escrito ficaria assim mais galante e mais novo. Moisés, que também contou a sua morte, não a pôs no intróito, mas no cabo: a diferença radical entre este livro e o Pentateuco."
(Machado de Assis, Memórias póstumas de Brás Cubas).
5. (FUVEST-SP) o autor afirma que:
  1. vai começar suas memórias pela narração de seu nascimento.
  2. vai adotar uma seqüência narrativa invulgar.
  3. que o levou a escrever suas memórias foram duas considerações sobre a vida e a morte.
  4. vai começar suas memórias pela narração de sua morte.
  5. vai adotar a mesma seqüência narrativa utilizada por Moisés.
6. (FUVEST-SP) Definindo-se como um "defunto autor", o narrador:
  1. pôde descrever sua própria morte.
  2. escreveu suas memórias antes de morrer.
  3. ressuscitou na sua obra após a morte.
  4. obteve em vida o reconhecimento de sua obra.
  5. descreveu a morte após o nascimento.
7. (FUVEST-SP) Segundo o narrador, Moisés contou sua morte no:
  1. promontório.
  2. meio do livro.
  3. fim do livro.
  4. intróito.
  5. começo da missa.
8. (FUVEST-SP) O tom predominante no texto é de:
  1. luto e tristeza.
  2. humor e ironia.
  3. pessimismo e resignação.
  4. mágoa e hesitação
  5. surpresa e nostalgia.
9. (E.E. Mauá-SP) Sobre o romance Memórias póstumas de Brás Cubas, não é correto afirmar que:
  1. é uma obra inovadora do processo narrativo, que introduz o Realismo no Brasil.
  2. Brás Cubas atua como defunto-narrador, capaz de alterar a seqüência do tempo cronológico.
  3. memorialismo exacerbado acaba por conferir à obra um caráter de crônica.
  4. constitui um romance de crítica ao Romantismo, deixando entrever muita ironia em vários momentos da narrativa.
  5. revela crítica intensa aos valores da sociedade e ao próprio público leitor da época.
10. (UFRGS)
"Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado de nossa miséria"
O texto acima é:
  1. final do testamento de Quincas Borba, que faz de Rubião seu herdeiro, sob a condição de que cuide de seu cachorro.
  2. um comentário de Bentinho, o protagonista de Dom Casmurro, cujo temperamento azedo e melancólico lhe valeu o apelido.
  3. a conclusão pessimista do Dr. Bacamarte, ao final do conto O Alienista, após dedicar sua vida ao estudo da "patologia cerebral".
  4. desabafo do "defunto-autor" das Memórias Póstumas de Brás Cubas, ao final da narrativa.
  5. a reflexão do Conselheiro Aires ao encerrar a narrativa do drama de Flora, em Esaú e Jacó.

TRISTE FIM DE POLICARPO QUARESMA - LIMA BARRETO - (FRAGMENTO) -COM GABARITO


TRISTE FIM DE POLICARPO QUARESMA

        Noiva havia quase cinco anos, Ismênia já se sentia meio casada. Esse sentimento junto à sua natureza pobre fê-la não sentir um pouco mais de alegria. Ficou no mesmo. Casar, para ela, não era negócio de paixão. nem se inseria no sentimento ou nos sentidos: era uma ideia, uma pura ideia. Aquela sua inteligência rudimentar tinha separado da ideia de casar o amor, o prazer dos sentidos, uma tal ou qual liberdade, a maternidade, até o noivo. Desde menina, ouvia a mamãe dizer: “Aprenda a fazer isso, porque quando você se casar” ... ou senão: “Você precisa aprender a pregar botões, porque quando você se casar...”
        A todo instante e a toda hora, lá vinha aquele --- “porque, quando você se casar...” --- e a menina foi se convencendo de que toda a existência só tendia para o casamento. A instrução, as satisfações íntimas, a alegria, tudo isso era inútil; a vida se resumia numa cousa: casar.
        De resto, não era só dentro de sua família que ela encontrava aquela preocupação. No colégio, na rua, em casa das famílias conhecidas, só se falava em casar. “Sabe, Dona Maricota, a Lili casou-se, não fez grande negócio, pois parece que o noivo não é lá grande cousa”; ou então: “A Zezé está doida para arranjar casamento, mas é tão feia, meu Deus! ...”
        A vida, o mundo, a variedade intensa dos sentimentos, das ideias, o nosso próprio direito à felicidade, foram parecendo ninharias para aquele cerebrozinho; e, de tal forma casar-se se lhe representou cousa importante, uma espécie de dever, que não se casar, ficar solteira, “tia”, parecia-lhe um crime, uma vergonha.
        De natureza muito pobre, sem capacidade para sentir qualquer cousa profunda e intensamente, sem quantidade emocional para a paixão ou para um grande afeto, na sua inteligência a ideia de “casar-se” incrustou-se teimosamente como uma obsessão.
        Ela não era feia; amorenada, com os seus traços acanhados, o narizinho mal feito, mas galante, não muito baixa nem muito magra e a sua aparência de bondade passiva, de indolência de corpo, de ideia e de sentidos --- era até um bom tipo das meninas a que os namorados chamam --- “bonitinhas”. O seu traço de beleza dominante, porém, eram os seus cabelos: uns bastos cabelos castanhos, com tons de ouro, sedosos até ao olhar.
        Aos dezenove anos arranjou namoro com o Cavalcânti, e à fraqueza de sua vontade e ao temor de não encontrar marido não foi estranha a facilidade com que o futuro dentista a conquistou.

                           LIMA BARRETO. Triste fim de Policarpo Quaresma (1. frag.).    
                                                                              São Paulo, Ática, 1983. p. 38-9.

1 – A proximidade do casamento não alterou os sentimentos de Ismênia. Copie do primeiro parágrafo a frase que comprova essa afirmativa.
       “Ficou no mesmo”.

2 – Para Ismênia, o casamento baseia-se no sentimento individual ou na pressão social?
       Na pressão social, visto que lhe foi incutida, durante toda a vida, a ideia de que ficar solteira era uma grande tragédia.

3 – Qual é a denúncia que o autor faz a respeito da educação recebida por Ismênia?

       O aluno deverá deduzir que a personagem, graças à influência do meio familiar e social, tem uma ideia distorcida do amor e do casamento.

QUINCAS BORBA - MACHADO DE ASSIS - (FRAGMENTO) - COM GABARITO


QUINCAS BORBA

        --- Não há morte. O encontro de duas expansões, ou a expansão de duas formas, pode determinar a supressão de uma delas; mas, rigorosamente, não há morte, há vida, porque a supressão de uma é a condição da sobrevivência da outra, e a destruição não atinge o princípio universal e comum. Daí o caráter conservador e benéfico da guerra. Supõe tu um campo da batatas e duas tribos famintas. As batatas apenas chegam para alimentar uma das tribos, que assim adquire forças para transpor a montanha e ir à outra vertente, onde há batatas em abundância; mas, se as duas tribos dividirem em paz as batatas do campo, não chegam a nutrir-se suficientemente e morrem de inanição. A paz nesse caso, é a destruição; a guerra é a conservação. Uma das tribos extermina a outra e recolhe os despojos. Daí a alegria da vitória, os hinos, aclamações, recompensas públicas e todos os demais efeitos das ações bélicas. Se a guerra não fosse isso, tais demonstrações não chegariam a dar-se, pelo motivo real de que o homem só comemora e ama o que lhe é aprazível ou vantajoso, e pelo motivo racional de que nenhuma pessoa canoniza uma ação que virtualmente a destrói. Ao vencido, ódio ou compaixão; ao vencedor, as batatas.

                    MACHADO DE ASSIS. Quincas Borba. In: --- Obra completa. 1. v.
                                                 Rio de Janeiro, Nova Aguilar, l985. p. 648-9. 3v.

Inanição: enfraquecimento extremo por falta de alimentação.
Despojos: restos.
Canonizar: louvar, enaltecer.

1 – O texto pode ser dividido em duas partes: a hipótese e o exemplo. Delimite as partes.
        1ª: De “Não há morte...” até “...guerra.” (Linha 4)
        2ª: De “Supõe tu... “ até o final.

2 – Explique a afirmativa do narrador: “Não há morte”.
       Segundo a teoria de Quincas Borba, a supressão de alguma coisa é necessária à sobrevivência de outra, sempre que duas forças se enfrentam. Logo, vida = morte.

3 – Que princípio naturalista orienta esta hipótese?
       A lei do mais forte.

4 – No exemplo sugerido pelo narrador, por que uma das tribos deveria ser necessariamente eliminada?
       Porque as batatas não seriam suficientes para ambas; se a divisão fosse feita em paz, ambas sucumbiriam.


quinta-feira, 27 de abril de 2017

SIMULADO DE PRONOMES PARA ENSINO FUNDAMENTAL - COM GABARITO

SIMULADO DE PRONOMES

1)   Quais pronomes abaixo são exemplos dos classificados como INDEFINIDOS?
a)   Vossa Senhoria, Vossa Alteza
b)   Vós e eles
c)   Algum, quaisquer, pouco
d)   Cada, isso, aquilo
e)   Eu, assaz, alhures, atalho

2)   Assinale o pronome relativo que completa a frase: “O garoto _______a cobra picou, passa bem”.
a)   a quem;
b)   cuja;
c)   o qual;
d)   em quem;
e)   cuja a.

3)   Marque a única frase abaixo que NÃO tem o pronome interrogativo.
a)   Quem entende essa criança?
b)   Nosso povo está despertando.
c)   Você já leu este livro?
d)   Ninguém vai entender esse problema?
e)   Qual é a atriz principal da peça?

4)   Assinale a frase onde o pronome é indefinido.
a)   Esses livros aí não devem sair da biblioteca.
b)   Aquele jornal é bom?
c)   Ninguém quer discutir a questão.
d)   Ela sempre gostou de ler.
e)   Os estudantes participaram da festa.
  
5)   Coloque (x) na única frase que tem pronome relativo.
a)   Ontem encontrei Camila, a quem dei flores.
b)   Quando você vai trazer meus cds?
c)   Meu tio foi ao parque com minha tia.
d)   Você mora no meu coração.
e)   João vai comigo ao supermercado.

6)   O indefinido nada significa nenhuma coisa. Contudo, em qual das frases a seguir o pronome ganha o sentido de alguma coisa?
a)   Não compreendi nada do que a professora falava.
b)   O senhor não quer comer nada antes de viajar?
c)   Nada do que aconteceu importa.

7)   Complete as lacunas com o pronome demonstrativo adequado:
1)   “_______ documento que tens à mão é importante, Pedrinho?”
2)   “A estrada do mar, larga e oscilante ________ sim, o tentava.”
3)   “Na traseira do caminhão lia-se _____frase: Tristeza não paga dívida.”
4)   “Cuidado, mergulhador, _________ animais são venenosos: a arraia miúda, o peixe-escorpião, a medusa, o mangangá.”
a)   esse – esse – esta – estes;
b)   este – esta – esta – estes;
c)   este – esta – essa – esses;
d)   esse – essa – essa – esses;
e)   este – esta – essa – estes.

8)   O pronome de tratamento usado para o papa é :
a)   Vossa Excelência
b)   Vossa Magnificência
c)   Vossa Eminência
d)   Vossa Santidade
e)   N.D.A.

9)   Suponha que você deseje dirigir-se a personalidades eminentes, cujos títulos são: papa, juiz, cardeal, reitor e príncipe. Assinale a alternativa que contém a abreviatura certa da “expressão de tratamento” correspondente ao título enumerado:
a)   Papa....... V.Sª
b)   Juiz..........V.
c)   Cardeal ......V.Exª
d)   Reitor ........V.A
e)   Príncipe ...... V.A.

10)                Marque (x) na alternativa que NÃO tem pronome possessivo.
a)   O meu boné é azul e o seu é vermelho.
b)   Ela fez boas provas e suas notas foram ótimas.
c)   Seu chapéu é de palha e o meu é de pano.
d)   Aquela bicicleta é minha.
e)   N.D.A.


“Grandes resultados requerem grandes ambições.” (Heróclito)


INOCÊNCIA - VISCONDE DE TAUNAY - (FRAGMENTO) COM GABARITO

INOCÊNCIA
        Visconde de Taunay

         Descrever o abalo que sofreu Inocência ao dar, cara a cara, com Manecão fora impossível. Debuxaram-se-lhe tão vivos na fisionomia o espanto e o terror, que o reparo, não só da parte do noivo, como do próprio pai, habitualmente tão despreocupado, foi repentino.
        --- Que tem você? perguntou Pereira apressadamente.
        --- Homem, a modos, observou Manecão com tristeza, que meto medo à senhora dona...
        Batiam de comoção os queixos da pobrezinha: nervoso estremecimento balanceava-lhe o corpo todo.
        A ela se achegou o mineiro e pegou-lhe o braço.
        --- Mas você não tem febre?... Que é isso, rapariga de Deus?
        Depois, meio risonho e voltando-se para Manecão:
        --- Já sei o que é... ficou toda fora de si... vendo o que não contava ver... Vamos, Nocência, deixe-se de tolices.
        --- Eu quero, murmurou ela, voltar para o meu quarto.
        E encostando-se à parede, com passo vacilante se encaminhou para dentro.
        Ficara sombrio o capataz.
        De sobrecenho carregado, recostara-se à mesa e fora, com a vista, seguindo aquela a quem já chamava esposa.
        Sentou-se defronte dele Pereira com ar de admiração.
        --- E que tal? exclamou por fim... Ninguém pode contar com mulheres, iche!
       Nada retorquiu o outro.
       --- Sua filha, indagou ele de repente com voz muito arrastada e parado a cada palavra, viu alguém?
       Descorou o mineiro e quase a balbuciar:
       --- Não... isto é, viu... mas todos os dias... ela vê gente... Por que me pergunta isso?
       --- Por nada...
       --- Não; ... explique-se... Você faz assim uma pergunta que me deixa um pouco... anarquizado. Este negócio é muito, muito sério. Dei-lhe palavra de honra que minha filha haverá de ser sua mulher... a cidade já sabe e ... comigo não quero histórias... É o que lhe digo.
       --- Está bom, replicou ele, nada de precipitações. Toda a vida fui assim ... Já volto; vou ver onde para o meu cavalo.
       E saiu, deixando Pereira entregue a encontradas suposições.
       Decorreram dias, sem que os dois tocassem mais no assunto que lhes moía o coração. Ambos, calmos na aparência, viviam comum, visitavam as plantações, comiam juntos, caçavam e só se separavam à hora de dormir, quando o mineiro ia para dentro e Manecão para a sala dos hóspedes.
       Inocência não aparecia.
       Mal saía do quarto, pretextando recaída de sezões: entretanto, não era o seu corpo o doente, não; a sua alma, sim, essa sofria morte e paixão; e amargas lágrimas, sobretudo à noite, lhe inundavam o rosto.
       --- Meu Deus, exclamou ela, que será de mim? Nossa senhora da Guia me socorra. Que pode uma infeliz rapariga dos sertões contra tanta desgraça? Eu vivia tão sossegada neste retiro, amparada por meu pai... que agora tanto medo me mete... Deus do céu, piedade, piedade.
       E de joelhos, diante de tosco oratório alumiado por esguias velas de cera, orava com fervor, balbuciando as preces que costumava recitar antes de se deitar.
       Uma noite, disse ela:
       --- Quisera uma reza que me enchesse mais o coração... que mais me aliviasse o peso da agonia de hoje...
       E, como levada de inspiração, prostrou-se murmurando:
       --- Minha Nossa Senhora mãe da Virgem que nunca pecou, ide adiante de Deus. Pedi-lhe que tenha pena de mim... que não me deixe assim nesta dor cá de dentro tão cruel. Estendei a vossa mão sobre mim. Se é crime amar a Cirino, mandai-me a morte. Que culpa tenho eu do que me sucede? Rezei tanto, para não gostar deste homem! Tudo... Tudo... foi inútil! Por que então este suplício de todos os momentos? Nem sequer tem alívio no sono? sempre ele... ele!
       Às vezes, sentia Inocência em si ímpetos de resistência: era a natureza do pai que acordava, natureza forte, teimosa.
       --- Hei de ir, dizia então com olhos a chamejar, à igreja, mas de rastos! No rosto do padre gritei: Não, Não! ... Matem-me... mas eu não quero...
       Quando a lembrança de Cirino se lhe apresentava mais viva, estorcia-se de desespero. A paixão punha lhe o peito em fogo...
       --- Que é isto, Santo Deus? Aquele homem me teria botado um mau olhado? Cirino, Cirino, volta, vem tomar-me... leva-me! ... eu morro! Sou tua, só tua... de mais ninguém.
                    VISCONDE DE TAUNAY. Inocência. 7. ed. São Paulo, Ática, 1978.
                                                                                                                   p. 109-10.
Sobrecenho: semblante severo; carrancudo.
Sezão: febre intermitente ou periódica.

1 – Em que linha fica evidente a preocupação de Pereira em manter a palavra empenhada junto a Manecão?
       Linhas 30 e 31.

2 – Das características românticas abaixo relacionadas, quais são as que se aplicam ao texto?
a)     Idealização.
b)    Evasão do tempo;
c)     Supervalorização do amor.
d)    Supervalorização da natureza.
e)     Religiosidade.

3 – O aproveitamento da fala do sertanejo é uma das características marcantes da linguagem de Taunay. Transcreva do texto quatro termos que comprovam essa afirmativa e dê o significado de cada um deles.
       Iche! = Virgem! (interjeição)                haverá = haveria, teria
       Anarquisado = perturbado                   ansim = assim
       Percipitação = precipitação, pressa.


A MORENINHA - JOAQUIM MANUEL DE MACEDO - (FRAGMENTO) - COM GABARITO

   A MORENINHA
         Joaquim Manuel de Macedo

          Um sarau é o bocado mais delicioso que temos, de telhado abaixo.
          Em um sarau todo o mundo tem que fazer. O diplomata ajusta, com um copo de champanha na mão, os mais intrincados negócios; todos murmuram e não há quem deixe de ser murmurado. O velho lembra-se dos minuetes e das cantigas do seu tempo, e o moço goza de todos os regalos da sua época; as moças são no sarau como as estrelas no céu; estão no seu elemento; aqui uma, cantando suave cavatina, eleva-se vaidosa nas asas dos aplausos, por entre os quais surde, às vezes, um bravíssimo inopinado, que solta de lá da sala do jogo o parceiro que acaba de ganhar sua partida do écarté, mesmo na ocasião em que a moça se espicha completamente, desafinando um sustenido; daí a pouco vão outras pelo braço de seus pares, se deslizando pela sala  e marchando em seu passeio, mais a compasso que qualquer de nossos batalhões da Guarda Nacional, ao mesmo tempo que conversam sempre sobre objetos inocentes que movem olhaduras e risadinhas apreciáveis. Outras criticam de uma gorducha vovó, que ensaca nos bolsos meia bandeja de doces que vieram para o chá, e que ela leva aos pequenos que, diz, lhe ficaram em casa. Ali vê-se um ataviado dândi que dirige mil finezas a uma senhora idosa, tendo os olhos pregados na sinhá, que senta-se ao lado. Finalmente, no sarau não é essencial ter cabeça nem boca, porque, para alguns é regra, durante ele, pensar pelos pés e falar pelos olhos.
          E o mais é que nós estamos num sarau: inúmeros batéis conduziram da corte para a ilha de... senhoras e senhores, recomendáveis por caráter e qualidade: alegre, numerosa e escolhida sociedade enche a grande casa, que brilha e mostra em toda a parte borbulhar o prazer e o bom gosto.
          Entre todas essas elegantes e agradáveis moças, que com aturado empenho se esforçam por ver qual delas vence em graças, encantos e donaires, certo que sobrepuja a travessa Moreninha, princesa daquela festa.
          Hábil menina é ela! Nunca seu amor-próprio produziu com tanto estudo seu toucador e, contudo, dir-se-ia que o gênio da simplicidade a penteara e vestira. Enquanto as outras moças haviam esgotado a paciência de seus cabeleireiros, posto em tributo toda a habilidade das modistas da rua do Ouvidor e coberto seus colos com as mais ricas e preciosas joias, d. Carolina dividiu seus cabelos em duas tranças, que deixou cair pelas costas; não quis adornar o pescoço com seu adereço de brilhantes nem com seu lindo colar de esmeraldas; vestiu um finíssimo, mas simples vestido de garça, que até pecava contra a moda reinante, por não ser sobejamente comprido. Vindo assim aparecer na sala, arrebatou todas as vistas e atenções.
          Porém, se um atento observador a estudasse, descobriria que ela adrede se mostrava assim, para ostentar as longas e ondeadas madeixas negras, em belo contraste com a alvura de seu vestido branco, e par mostrar, todo nu, o elevado colo de alabastro, que tanto a aformoseava, e que seu pecado contra a moda reinante não era senão um meio sutil de que se aproveitara para deixar ver o pezinho mais bem feito e mais pequeno que se pode imaginar.

                      MACEDO, Joaquim Manuel de. A Moreninha. 9. ed. São Paulo,
                                                                                                 Ática, 1979. p. 80-1.
Minuete: antiga dança francesa.
Cavatina: pequena ária.
Écarté: jogo entre dois parceiros com 32 cartas.
Ataviado: enfeitado, ornado.
Dândi: homem que se veste com extremo apuro; almofadinha.
Batel: pequeno barco.
Toucador: espécie de cômoda encimada por um espelho; penteadeira.
Adereço: joia, objeto de adorno.
Sobejamente: demasiadamente.
Adrede: intencionalmente; de propósito.
Colo: parte do corpo formada pelo pescoço e ombros.
Alabastro: rocha pouco dura e muito branca; brancura, alvura.

1 – A que classe social pertencem as personagens que aparecem no texto?
       Pertencem à elite da sociedade carioca da época.

2 – Segundo Werneck Sodré, Macedo refletiu as “trivialidades” dos meados do século XIX. Identifique, no texto lido, elementos que denotam essa trivialidade.
       A preocupação com a indumentária, os galanteios, os mexericos.

3 – O baile era muito importante na vida social e sentimental do século passado, pois as mulheres viviam reclusas no ambiente doméstico e o baile propiciava os encontros que poderiam se transformar em namoro e casamento. Como se reflete essa preocupação na indumentária das mulheres?
       Todas procuravam atingir o requinte máximo de elegância, de acordo com a moda da época.

4 – Que característica romântica se pode notar na descrição da personagem central da narrativa?
       A personagem é idealizada.