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domingo, 3 de agosto de 2025

POEMA: O TEATRO, CASA DOS SONHOS - BERTOLD BRECHT - COM GABARITO

 Poema: O TEATRO, CASA DOS SONHOS

             Bertold  Brecht

Muitos veem o teatro como casa

De produção de sonhos. Vocês atores são vistos

Como vendedores de drogas. Em seus locais escurecidos

As pessoas se transformam em reis e realizam

Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgAckNp32tmRQv64huv2wwDkyBA5CWxLIheSLttO2T0827uT9k3IqkbvdCANzvnYJE8mqb00TtkiqlgcuEp5eRo0Gs_d8dmXXZq-HxMWziZRFfh5cCUpZOg1otArHC_kRPLWEohv1YzFLCQ_xWess7OijRbxZLRFuK3TNbDICn9QZLkP9JSpIZS2g_-yZc/s320/165824021662d6bcd8a82ec_1658240216_5x2_lg.jpg

Atos heroicos sem perigo. Tomado de entusiasmo

Consigo mesmo ou de compaixão por si mesmo

Fica-se sentado, em feliz distração esquecendo

As dificuldades do dia a dia – um fugitivo.

Todo tipo de fábula preparam com mãos hábeis, de modo a

Mexer com nossas emoções. Para isso utilizam

Acontecimentos do mundo real. Sem dúvida, alguém

Que aí chegasse de repente, o barulho do tráfico ainda nos ouvidos

E ainda sóbrio, mal reconheceria sobre essas tábuas

O mundo que acabou de deixar. E também

Saindo por fim desses locais,

Novamente o homem pequeno, não mais o rei

Deslocado na vida real. Muitos, é verdade

Veem essa atividade como inocente. Na mesquinhez

E uniformidade de nossas vidas, dizem, sonhos

São bem-vindos. Como suportar

A vida mesquinha e uniforme, e a renunciar

Por si mesmo. Mas vocês

Mostram um falso mundo, descuidadamente juntado

Tal como os sonhos o mostram, transformado por desejos

Ou desfigurado por medos, tristes

Enganadores.

BRECHT, Bertolt. Poemas 1913-1956. 5. ed. São Paulo: Ed. 34, 2000.

Fonte: Arte em Interação – Hugo B. Bozzano; Perla Frenda; Tatiane Cristina Gusmão – volume único – Ensino médio – IBEP – 1ª edição – São Paulo, 2013. p. 255-256.

Entendendo o poema:

01 – Qual a principal crítica que Brecht faz à percepção comum do teatro como uma "casa de produção de sonhos"?

      Brecht critica fundamentalmente a visão do teatro como um refúgio escapista, uma "casa de produção de sonhos", onde o público se transforma em "reis" e esquece as "dificuldades do dia a dia". Ele descreve os atores como "vendedores de drogas", sugerindo que a arte teatral, nesse modelo, atua como um narcótico que aliena o espectador da realidade. A crítica reside no fato de que, ao se entregar a essa "feliz distração", o indivíduo se torna um "fugitivo" que, ao sair do teatro, volta a ser o "homem pequeno, não mais o rei / Deslocado na vida real". Para Brecht, essa forma de teatro oferece um "falso mundo, descuidadamente juntado", que, como os sonhos, é "transformado por desejos / Ou desfigurado por medos", resultando em uma experiência ilusória e, em última instância, enganadora.

02 – De que forma o poema contrasta a experiência do público dentro e fora do teatro?

      O poema de Brecht estabelece um contraste marcante entre a experiência do público dentro e fora do teatro. Dentro dos "locais escurecidos", as pessoas se transformam, tornam-se "reis" e realizam "atos heroicos sem perigo", sentindo entusiasmo ou compaixão por si mesmas em uma "feliz distração". É um mundo de fábula onde as emoções são manipuladas e a realidade cotidiana é esquecida. No entanto, o poema enfatiza a abrupta transição ao sair desses locais: "Saindo por fim desses locais, / Novamente o homem pequeno, não mais o rei / Deslocado na vida real." Essa antítese ressalta a artificialidade da experiência teatral criticada por Brecht, onde a euforia e o escapismo são temporários, e a volta à vida "mesquinha e uniforme" é inevitável e, por vezes, mais dolorosa devido ao contraste.

03 – O que Brecht quer dizer ao afirmar que o teatro utiliza "acontecimentos do mundo real" para "mexer com nossas emoções" e qual é a sua ressalva a isso?

      Brecht reconhece que o teatro, mesmo em sua forma criticada, utiliza "acontecimentos do mundo real" para "mexer com nossas emoções". Isso significa que as histórias e situações encenadas têm suas raízes na vida cotidiana e nas experiências humanas, servindo como base para as narrativas dramáticas. No entanto, sua ressalva reside no modo como esses acontecimentos são apresentados e percebidos. Ele aponta que, para o espectador ainda "sóbrio" e com "o barulho do tráfico ainda nos ouvidos", seria difícil reconhecer nessas "tábuas" (o palco) o mundo que acabou de deixar. A crítica não está no uso da realidade em si, mas na sua transformação e distorção para fins de entretenimento e escapismo, onde o mundo real é "descuidadamente juntado" e "transformado por desejos / Ou desfigurado por medos", perdendo sua capacidade de provocar reflexão crítica e ação.

04 – Como o poema caracteriza os atores e sua função nesse tipo de teatro?

      No poema "O Teatro, Casa dos Sonhos", Brecht caracteriza os atores como "vendedores de drogas". Essa metáfora é profundamente crítica e sugere que a função dos atores, nesse modelo de teatro, é a de induzir um estado de alheamento e ilusão no público. Eles são os agentes que administram essa "droga" do escapismo, preparando "todo tipo de fábula com mãos hábeis, de modo a / Mexer com nossas emoções". A implicação é que, em vez de provocarem o pensamento crítico ou a conscientização social, os atores servem para anestesiar o público, oferecendo um refúgio temporário da realidade. Eles são, na visão de Brecht, "tristes / Enganadores", pois mostram um "falso mundo" que, embora possa trazer alívio momentâneo, não contribui para uma compreensão genuína ou para a transformação da vida real.

05 – Qual é a crítica subjacente de Brecht à inércia ou complacência do público diante desse tipo de representação teatral?

      A crítica subjacente de Brecht à inércia e complacência do público diante desse tipo de representação teatral é evidente em sua descrição do espectador como um "fugitivo" que se senta em "feliz distração". Ele questiona a aceitação generalizada dessa "atividade como inocente", onde os "sonhos / São bem-vindos" para suportar a "vida mesquinha e uniforme". Brecht parece lamentar que o público, ao invés de buscar a verdade ou a transformação de suas condições, se contente com uma ilusão momentânea. Há uma implicação de que essa complacência contribui para a perpetuação de um sistema que oferece fugas, mas não soluções. A crítica reside no fato de que o teatro, em vez de ser um catalisador para a mudança e a reflexão crítica sobre a realidade social, torna-se um cúmplice na manutenção da "mesquinhez / E uniformidade de nossas vidas", ao permitir que o indivíduo "renunciar / Por si mesmo" em favor de um mundo fabricado.

 

 

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